REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11522505
Elayne Fernandes Maia1
RESUMO
O presente artigo tem por objetivo orientar acerca dos perigos decorrentes da exposição excessiva de crianças e adolescentes no âmbito virtual, uma vez que, com os avanços da tecnologia, o uso da internet tem se popularizado gradativamente entre os mais jovens, que, consequentemente, por serem inexperientes, se tornam os mais vulneráveis aos perigos nesse âmbito. Aborda ainda, quais são os crimes contra o menor na esfera virtual, como o grooming, cyberbullying e também a pedofilia, que, infelizmente, tem obtido um alto índice no Brasil atualmente, inclusive, por meio das redes sociais. Ademais, descreve como os agentes criminosos costumam agir para realizar tais delitos e fazer suas vítimas; e, quais medidas poderiam ser adotadas à luz da legislação brasileira para diminuir o índice de crimes virtuais contra os mais vulneráveis, bem como informações acerca das leis de proteção à criança e ao adolescente e seu aprimoramento, assim como a importância da conscientização dos responsáveis legais quanto ao uso da internet por parte dos menores.
PALAVRAS-CHAVE: Crianças. Adolescentes. Internet. Crimes Virtuais. Pedofilia. Cyberbullying.
ABSTRACT
This article aims to provide guidance on the dangers arising from excessive exposure of children and adolescents in the virtual environment, since, with advances in technology, the use of the internet has gradually become popular among younger people, who, consequently, due to Being inexperienced, they become the most vulnerable to dangers in this area. It also addresses crimes against minors in the virtual sphere, such as grooming, cyberbullying and also pedophilia, which, unfortunately, has a high rate in Brazil today, including through social networks. Furthermore, describes how criminal agents usually act to carry out such crimes and victimize them; and, what measures could be adopted in light of Brazilian legislation to reduce the rate of virtual crimes against the most vulnerable, as well as information about child and adolescent protection laws and their improvement, as well as the importance of raising awareness among legal guardians regarding the use of the internet by minors.
KEYWORDS: Children. Teenagers. Internet. Virtual crimes. Pedophilia. Cyberbullying.
1 INTRODUÇÃO
A superexposição de crianças e adolescentes nas mídias sociais tem sido uma preocupação crescente atualmente, uma vez que elas estão cada vez mais conectadas ao mundo digital, o que pode torná-las ainda mais vulneráveis aos perigos online, como cyberbullying, grooming, pornografia infantil, e diversos outros crimes virtuais direcionados ao menor.
É inegável que os avanços tecnológicos trouxeram inúmeros benefícios aos seres humanos. Sua evolução vem nos auxiliando na área da educação, em pesquisas relacionadas à área da saúde, facilitando as comunicações, e nossa qualidade de vida.
Entretanto, mesmo com todas as benfeitorias, nos deparamos ainda com algumas perniciosidades, dado que, agentes criminosos também estão acompanhando esta evolução, a fim de encontrar novas maneiras de praticar crimes, e desenvolver novos métodos, denominados como modus operandi, afetando a sociedade como um todo, e, principalmente, os que se encontram em situação de vulnerabilidade.
No que tange à legislação brasileira em razão desse tema, é possível observar uma lacuna significativa. Apesar dos inúmeros esforços para aprimorar leis e medidas, existe ainda uma carência notável de regulamentação, exacerbada pelos rápidos avanços tecnológicos que a legislação não conseguiu acompanhar de forma equivalente ao longo dos anos.
Com tais avanços, e com o mundo ficando cada vez mais imerso nas mídias sociais, a vulnerabilidade de quem fica por trás das telas vem aumentando gradativamente, assim como a impunidade daqueles que usam este meio para praticar tais atos ilícitos, ou seja, os crimes virtuais. Por isso, é tão importante falarmos sobre esse tema, visando a proteção da criança e do adolescente quando estes estão inseridos no mundo digital.
2 A HISTÓRIA DA INTERNET
A internet, consiste numa rede mundial de computadores, que permite o compartilhamento de informações e a comunicação entre seres humanos, trazendo consigo inúmeros benefícios à humanidade.
Deu-se início no auge dos anos 1960, começando com um projeto militar, sendo a ARPANET sua pioneira, Carvalho disserta melhor sobre isso, vejamos:
No auge da Guerra Fria, em um período recheado de testes de bombas nucleares, conflitos em diversas regiões do planeta e uma acirrada corrida espacial, o Departamento de Defesa dos EUA criou uma agência de fomento às pesquisas, a ARPA (Advanced Research Projects Agency), que visava, em última instância, o restabelecimento da liderança norte-americana em ciência e tecnologia, combalida pelos sucessos dos soviéticos nos seus programas nuclear e espacial. Esta Agência, em convênio com algumas universidades escolhidas a dedo, investiu milhões de dólares em diversos projetos e, entre estes, o da criação de uma rede que pudesse conectar os diferentes computadores, distantes e isolados entre si, das universidades patrocinadas. Esta rede, que veio a ser chamada de ARPANET, entrou em operação no final de 1969 e expandiu-se ao longo dos anos 70s (…). Em 1986, a NSF (National Science Foundation), fundação governamental de apoio à pesquisa nos EUA, criou a NSFNET, uma rede TCP/IP mantida pelo governo, inicialmente como uma estrutura de rede que interligava diversas universidades e centros de pesquisa a alguns centros de supercomputação, para que estes caros recursos computacionais fossem compartilhados. Em 1988, quando a ARPANET encerrou suas operações e as instituições militares se reorganizaram na rede MILNET, a NSFNET passou a ser o backbone da já então chamada Internet, abrindo possibilidades de conexão desta rede com as instituições acadêmicas de diversos países no mundo, inclusive para o Brasil, fazendo crescer exponencialmente o número de máquinas e usuários conectados. Vale lembrar que outras redes, como a USENET, também passaram a utilizar o protocolo TCP/IP e outras, como a BITNET, passaram a ter gateways de interconexão com a Internet. (CARVALHO, 2006).
Quando o assunto diz respeito ao surgimento da internet no Brasil, a tecnologia chegou em meados dos anos 80, sendo utilizada como uma ferramenta de pesquisa, quando houve a necessidade de algumas universidades brasileiras se comunicarem com universidades norte-americanas de forma mais rápida, e diante disso, adotaram então o modelo virtual, utilizando o e-mail como modo de comunicação. Porém, o acesso ainda era extremamente limitado devido aos altos custos, então, a população não o usufruía.
“Já em 97, criou-se as ‘redes locais de conexão’ que possibilitou a expansão virtual no país e seu acesso. E no ano de 2004 chega no Brasil, sua primeira rede social, o Orkut” (GOGONI, 2019). Esta rede foi um marco na história das redes sociais, visto que ganhou popularidade massiva entre jovens e adultos da época.
Ao longo dos anos, a internet obteve avanços extremamente significativos, como a criação de sites, novas redes sociais e inúmeros jogos online, o que consequentemente acabou se popularizando entre os mais jovens, muitos acabaram até se tornando dependentes dela e considerando difícil viver num mundo onde ela não exista, já que os seres humanos criaram uma certa compulsão por se tratar de um meio mais fácil de comunicação, de se obter respostas rápidas e até mesmo de adquirir conhecimento.
E por ter se tornado um meio de comunicação tão ágil e de fácil acesso, muitos acabaram se aproveitando disto e usando como meio para praticar condutas delituosas, uma vez que há a possibilidade do anonimato, permitindo que usuários participem de atividades on-line sem revelar sua verdadeira identidade, o que por muitas vezes acaba se tornando um perigo para quem está do outro lado da tela, o que iremos abordar ao longo deste artigo.
3 CRIMES CIBERNÉTICOS
Com o desenvolvimento da tecnologia e seus avanços, surgiram também algumas lacunas para que criminosos desenvolvessem suas atividades delituosas, dando início ao que hoje é denominado como “cybercrimes” ou crimes virtuais.
Os primeiros crimes digitais, em sua grande maioria, eram praticados por especialistas que utilizavam de sua inteligência para arquitetar planos relacionados a aplicar golpes em instituições financeiras (…). A Câmara dos Deputados se dispôs a explicar o início dessa dramaturgia existente no meio tecnológico. Segundo a Câmara dos Deputados: “Na época, começaram a aparecer na imprensa e na literatura científica norte-americana os primeiros casos de uso de computadores para cometer delitos como sabotagens e espionagem. Somente na década seguinte, foram iniciados estudos sistemáticos e científicos sobre o tema. A partir de 1980, as ações criminosas intensificaram-se, envolvendo principalmente manipulação de dados bancários, pirataria de programas de computador, abusos nas telecomunicações e pornografia infantil.” (MAIA, 2023).
Segundo Machado (2017):
Conforme a tecnologia foi avançando, a motivação e metodologia para prática de crimes on-line também foram evoluindo, surgindo novos tipos de ataques. O que antes era apenas uma manifestação da curiosidade por parte dos pioneiros da computação, se tornou um grande problema. O levantamento feito por uma ONG denominada Safernet78, mostra os mais variáveis delitos praticados por intermédio da internet, como: Pornografia infantil, pedofilia, racismo, neonazismo, intolerância religiosa, apologia e incitação a crimes contra a vida, homofobia e maus tratos contra os animais.
Ainda nesse sentido, Campelo e Pires (2019), conceituam o que é considerado atualmente como crimes virtuais, vejamos:
Para o Direito Penal crime é toda conduta típica, antijurídica e culpável. Os crimes de informática – intitulados também de crimes digitais, virtuais, cybercrimes – são aqueles cometidos através dos computadores, contra os mesmos, ou através dele. A maioria dos crimes são praticados através da internet, e o meio usualmente utilizado é o computador. Porém com o avanço tecnológico o computador não é o único meio de cometer esse delito (CAMPELO; PIRES, 2019).
Ou seja, crimes virtuais são aqueles praticados por qualquer meio ou instrumento de acesso à internet. Quanto aos crimes que podem ser cometidos no âmbito digital, Tarcísio Teixeira (2020) explica que:
Podemos dizer que muitos dos crimes já existentes podem ser cometidos pela internet, por exemplo, furto, estelionato, calúnia, pornografia, entre muitos outros, utilizando a rede mundial de computadores como instrumento de execução. Isso porque, via de regra, as características do tipo penal se referem à conduta, ação ou omissão, não necessariamente a maneira como se deu a conduta (TEIXEIRA, 2020).
Tais crimes se subdividem em duas espécies, os crimes virtuais próprios que são caracterizados pelo uso do computador ou sistema informático da vítima por parte do autor do delito, ou seja, invasões aos dados pessoais, modificações, alterações, que impactam diretamente o software ou hardware do computador, isto é, são atos praticados através do computador da vítima, ou contra ele.
E, os crimes virtuais impróprios, que iremos aludir nessa pesquisa, nesta espécie o autor utiliza o computador como meio ou instrumento para praticar as condutas ilícitas contra quem está do outro lado da tela, assim como Damásio de Jesus o conceitua: “crimes informáticos impróprios: em que a tecnologia da informação é o meio utilizado para agressão a bens jurídicos já protegidos pelo Código Penal brasileiro.”, um exemplo disso, seriam os crimes que envolvem a pedofilia, que é um dos temas que iremos abordar nesta pesquisa.
Sabe-se que são inúmeros os crimes cometidos por intermédio da internet, mas, neste artigo, queremos dar ênfase aos crimes contra aqueles considerados como mais vulneráveis perante a sociedade, sendo assim, as crianças e os adolescentes.
3.1 Crianças e adolescentes como principais vítimas de crimes virtuais
É de suma importância deixarmos claro o conceito de criança e adolescente de acordo com a legislação brasileira. A Lei 8.069 de Julho de 1990 que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 2º prevê que “considera-se criança, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”.
Tanto as crianças, como também os adolescentes gozam de todos os direitos fundamentais inerentes a pessoa humana, conforme artigo 3º e 4º da Lei supracitada, sendo dever da família, da sociedade em geral e do Poder Público, assegurar isso, vejamos:
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Ao longo dos anos, a internet foi se popularizando e se tornando algo essencial na vida dos seres humanos, sendo utilizada principalmente pelos mais jovens.
Atualmente é comum vermos adolescentes possuindo aparelhos eletrônicos como computadores, tablets e celulares, e consequentemente fazendo uso das redes sociais, que é algo extremamente presente nessa geração, uma vez que eles já nascem imersos nesse mundo de tecnologia é inevitável não usufruir da mesma.
O grande cerne da questão, é o uso desenfreado dessa ferramenta e os perigos inerentes dela, visto que a maioria dos jovens não possui instruções de como utilizá-la, e nem conhecimento acerca dos perigos que infelizmente estão propensos a sofrer ao usufruí-la.
Com a pandemia, as pessoas acabaram imergindo no mundo virtual, por se verem em casa 24h por dia e tendo que fazer praticamente tudo por meio dela. Com isso, aumentou ainda mais o número de crianças e adolescentes fazendo uso de aparelhos eletrônicos. Segundo dados do IBGE, o número de crianças e adolescentes que fazem uso da internet e possuem celular vêm aumentando gradativamente. Pilar e Guimarães (2023) mencionam:
Chama a atenção a frequência com que crianças acessam a internet: 91,2% das que têm entre 10 a 13 anos usam a rede diariamente, seja navegando em sites, postando em redes sociais ou jogando com amigos. No caso das pessoas com idade entre 14 e 39 anos, mais de 95% afirmaram usar a internet todos os dias.
Em 2022, o percentual de crianças entre 10 a 13 anos que têm celular alcançou 54,8%. Foi um avanço de 3,4 pontos percentuais em relação ao ano anterior.
Por esse viés, vale ressaltar o que Machado (2021) destaca sobre o tema:
As crianças e os jovens são, neste mundo de comunicação em nível global, os destinatários mais vulneráveis: não só porque tem uma grande apetência para tecnologia como, também, são os mais frágeis.
Por isso, falar do crime no âmbito da tecnologia, da informação e do meio informático, obriga-nos, necessariamente, falar de crianças e de adolescentes.
Atualmente os jovens estão cada vez mais ligados ao universo virtual; os delinquentes exploram esses meios para se aproximar e prejudicar esse público, que, na maioria das vezes, se torna mais vulnerável, em decorrência da falta de experiência de vida, facilitando a atuação criminosa.
Com isso, consequentemente aumentaram os números de crimes virtuais envolvendo crianças e adolescentes, pois sem inibição alguma, uma vez que não há o contato físico com a vítima, os criminosos acabam se inclinando para realizar tais condutas, acreditando que ficarão impunes.
3.2 Pedofilia e grooming
Não há no Código Penal Brasileiro, o crime de pedofilia propriamente dito, mas sim, crimes contra a dignidade sexual. Precisamos então entender o conceito de pedofilia, para assim compreendermos de forma mais clara o contexto abrangente.
De acordo com Breier e Trindade “a palavra pedofilia, etimologicamente, deriva do grego paidofilia, a partir das matrizes paidós (criança) e philia (amor, amizade), significando, originalmente, “amor por crianças” (TRINDADE; BREIER, 2013).
Para a Organização Mundial da Saúde a pedofilia é considerada uma Parafilia, ou seja, um transtorno de preferência sexual, que leva o indivíduo a atitudes fora do padrão de normalidade.
Segundo Andrade de Siqueira, em seu artigo A pedofilia na era digital à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente:
“A pedofilia consiste em uma manifestação e numa prática do desejo sexual que alguns adultos ou outros menores desenvolvem em relação a criança de ambos os sexos na pré-puberdade.” (ANDRADE, 2012).
Apesar de tais classificações, como supracitado, não existe no Código Penal Brasileiro o crime de pedofilia propriamente dito, entretanto existe o crime de estupro de vulnerável, atentado violento ao pudor, corrupção de menores, e entre outros que acabam entrando no conceito do que seria a pedofilia.
Ainda nesse sentido, Gomes (2009) destaca:
“No que se refere a existência de um Código Penal datado de 1943, a internet passou a existir meio século depois, as constantes mudanças na lei não têm permitido o enquadramento da maioria dos crimes cometidos por meio da rede mundial de computadores. Desta forma, verifica-se que a legislação brasileira ainda é insuficiente para casos de crimes eletrônicos. A maioria das ocorrências que envolve a pedofilia pode ser enquadrado no Código Penal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na própria Carta Magna” (Gomes-2009, pág. 54):
Diante disso, entende-se que, existe uma grande necessidade de aprimoramento da legislação brasileira referente a esse tema, considerando o fato da internet e as redes sociais estarem se popularizando cada vez mais entre os jovens, e, consequentemente, aumentando a existência de predadores nesse meio.
A Constituição Federal da República de 1988, em seu artigo 227, parágrafo 4°, estabelece a proteção à criança e ao adolescente, assegurando que crimes de violência, abuso e exploração cometidos contra menores serão severamente punidos.
Além da Constituição Federal, o Código Penal Brasileiro também versa sobre o estupro de vulnerável, aquele praticado contra menores de 14 anos, cuja pena é de reclusão de 8 a 15 anos, de acordo com o artigo 217-A, podendo haver variações nas penas de acordo com a gravidade da conduta, o que também se enquadra no que é considerado como pedofilia.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – Lei nº 8.069/1990, a partir do artigo 241 – 241-E, criados por meio da Lei 11.829/2008, para aprimorar o combate à pornografia infantil e pedofilia, passou a prever penas para quem realiza condutas que violem a integridade do menor:
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 1 o Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo; (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
II – Assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)
§ 2 o As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1 o deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo.
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
(…)
Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo.
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:
I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso;
II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita.
Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais.”
A prática do artigo 241-D do Estatuto da Criança e do Adolescente, citado acima, ficou conhecida em outros países como Grooming, termo inglês, que consiste no aliciamento de menores através da internet, onde o agente tem a intenção de conseguir fotos, vídeos ou até mesmo consumar o ato sexual com o menor.
Nesses casos, o agente criminoso costuma usar técnicas sutis para não serem identificados, como por exemplo o uso de identidades falsas, para assim entrar em contato com o menor na intenção de praticar atos de natureza sexual. E as crianças, por possuírem maior ingenuidade e desconhecendo os riscos inerentes à internet, acabam sendo as principais vítimas destes predadores.
Para conseguir criar uma conta nas redes sociais, são necessários inserir dados pessoais, entretanto, tais dados não são verificados de forma devida, se tornando bem mais fácil criar o que chamamos de “perfis fakes” na internet. Onde um indivíduo não releva sua verdadeira identidade, se passando por outra pessoa. E é isso que eles fazem. Acabam se aproximando das vítimas, conquistando sua confiança, que acabam compartilhando informais pessoais de sua vida, endereço onde reside, fotos íntimas, chegando até o momento do encontro físico. Tal conduta é tipificada no Código Penal de diversos países, o que se pode observar que tal delito não é recorrente apenas no Brasil, mas no mundo inteiro.
Barbosa (2023), destaca que muitos criminosos inseridos no mundo digital, buscam perfis de crianças e adolescentes que não possuam nenhum tipo de restrição de privacidade para baixar fotos e vídeos postados por elas, para assim comercializar ou trocar em fóruns na deep/dark web, que consiste numa parte da internet que não é acessada de forma convencional, sendo associada na maioria das vezes a atividades ilícitas.
Siqueira (2015), menciona ainda:
De acordo com Thiago Tavares, presidente da entidade, o que mais ajuda na proliferação das imagens envolvendo pedofilia é justamente a sensação de impunidade:
Perto da quantidade de denúncias que recebemos, o número de prisões é quase insignificante, por falta de estrutura de Estado. O problema não surgiu com a Internet. Ele acompanha a evolução da humanidade, mas a rede deu uma escala maior ao problema”, afirma. Segundo ele, no Brasil, mais de 90% dos casos de pedofilia na Internet se dão por meio de sites de relacionamento, nos quais a troca de informações sobre o assunto é contínua.
Apesar dos esforços das autoridades a fim de combater estas condutas, a internet acabou se tornando um local fértil para tais indivíduos, que se aproveitam das inúmeras possibilidades que o mundo virtual proporciona, para assim, cometer estes delitos desenfreadamente, por isso, é tão importante a conscientização não só do poder público sobre este tema, mas também dos pais e responsáveis, para reforçar a segurança dos menores.
3.3 Cyberbullying
Outro crime que também acarreta inúmeras vítimas no âmbito, é o cyberbullying, que consiste na prática do bullying no ambiente virtual, como redes sociais, chat de jogos, aplicativos de mensagens, e-mail (…), mas, antes de adentrarmos nesse tópico de fato, precisamos primeiro entender o conceito do Bullying propriamente dito.
“A palavra bullying tem origem na língua inglesa e contém o radical bully, que significa valentão. O sufixo -ing (acrescido ao prefixo bully-) denota continuidade, constância” (Porfírio, 2024)
A Lei 13.185 sancionada em 6 de novembro de 2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática, classifica o bullying como uma “intimidação sistemática, quando há violência física ou psicológica em atos de humilhação ou discriminação.”.
O bullying pode manifestar-se de formas diversas, incluindo comportamentos e atitudes que podem ir desde agressões físicas a verbais e ainda a nível social/relacional. De seguida, efetua-se um levantamento dos vários tipos de bullying mencionados na literatura, como: bullying físico, psicológico, bullying social/relacional, sexual, ataques à propriedade, e o cyberbullying, o qual será enfatizado nessa pesquisa (ANDRADE, 2012).
Nesse sentido, Felizardo (2010), destaca:
O cyberbullying é o bullying praticado através da Internet ou qualquer recurso da tecnologia da informação e comunicação, onde o autor expõe, intimida, difama, agride com palavras, humilha e faz piadas ofensivas sobre a vítima, alcançando milhões de pessoas em segundos
Ainda, de acordo com Barbosa (2023), “o que configura o crime é o ato de humilhar, assediar ou difamar a vítima, normalmente assediando-a de forma recorrente e eventualmente causando danos psicológicos.”.
Vale ressaltar que nem todas as ofensas proferidas por meio de aparelhos eletrônicos, são consideradas como cyberbullying, tal tipificação exige características específicas que a definem, sendo estes: a intencionalidade do comportamento, a fim de realmente causar o sofrimento da vítima, fazendo isso de forma corriqueira ao longo do tempo. O anonimato também é uma característica predominante, uma vez que os agentes se sentem protegidos por um pseudônimo, podendo o agressor causar um sofrimento na vítima a qualquer hora do dia, e, obviamente, o fato de ser realizado por meio de aparelhos eletrônicos, por SMS, aplicativos de mensagens e principalmente através das redes sociais.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 assegura a todos o direito à proteção dos direitos fundamentais, a dignidade da pessoa humana e a liberdade de expressão está entre eles. Em seu artigo 5º, inciso X, a Constituição Federal resguardou que todos os indivíduos fossem livres para se expressar, desde que isso não atinja o direito de outrem. Sendo assim, os que praticam cyberbullying não agem de acordo com os princípios constitucionais (ALMEIDA, 2015).
Segundo Marcella Blok, de acordo com uma pesquisa do Instituto Ipsos, o Brasil é o segundo país que registra o maior número de casos de bullying e cyberbullying , atrás apenas da Índia. De acordo com o referido levantamento, 29% dos pais entrevistados contaram já ter relatado que seus filhos foram vítimas de algum tipo de agressão online. A Lei 14.811 de 2024 acrescentou o artigo 146-A ao Código Penal, tipificando a prática do crime de bullying como ação individual, ou em grupo, de intimidar, sistematicamente, “mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. (BITENCOURT, 2024).
A punição para quem pratica o crime de bullying e cyberbullying, é de reclusão de dois a quatro anos, e multa, podendo variar de acordo com a gravidade do caso.
Art.146-A. Intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais:
Pena – multa, se a conduta não constituir crime mais grave.
Intimidação sistemática virtual (cyberbullying)
Parágrafo único. Se a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de rede social, de aplicativos, de jogos on-line ou por qualquer outro meio ou ambiente digital, ou transmitida em tempo real:
Pena – reclusão, de 2 (dois) anos a 4 (quatro) anos, e multa, se a conduta não constituir crime mais grave.
Apesar de todas as punições para aqueles que praticam tais condutas, isto ainda não é o suficiente, por isso a conscientização dos pais e inclusive dos próprios adolescentes é tão importante para prevenir esses comportamentos. Visto que, de acordo com a Constituição Federal da República, é dever dos pais e responsáveis, assim com do Estado, assegurar ao menor uma vida digna, garantindo o respeito à todos os seus direitos.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Nova redação dada por Emenda Constitucional nº 65 de 13/07/2010)
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas (BRASIL, 1988).
Incluindo nisto, o dever de proporcionar ao menor um ambiente seguro e adequado para sua criação, conduzindo-lhes de forma assertiva para um futuro próspero e promissor por meio da educação, devendo o Estado promover políticas que tutelem isto.
Assim, faz-se necessário o conhecimento dos direitos do menor por parte dos responsáveis e da sociedade, bem como sua aplicação. Uma vez que estamos diante do ser humano em sua forma mais vulnerável, e é nosso dever priorizá-los, como assim estabelece a Constituição Federal da República e a Legislação Brasileira.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após a finalização desse estudo, é inegável a vulnerabilidade dos jovens frente aos avanços consideráveis da tecnologia. O uso de celular e computadores por crianças e adolescentes de forma desenfreada, é de grande perigo para a segurança destas, uma vez que não se sabe quem está do outro lado da tela e quais suas reais intenções. Por isso é tão importante falarmos sobre este tema, sobre os perigos existentes nesse meio, sobre a necessidade de os pais fiscalizarem o que seus filhos estão acessando na internet.
É de extrema necessidade o estudo de projetos voltados à proteção do menor, para que se crie políticas públicas eficazes a fim de combater as condutas delituosas supracitadas, visto que, com o grande avanço da internet, a legislação brasileira mesmo com seus esforços, ainda não consegue acompanhá-la, e são inúmeros os crimes aos quais crianças e adolescentes estão propensos a sofrer no mundo digital, uma vez que, os cibercriminosos os enxergam como principais alvos em potencial, por possuírem maior vulnerabilidade.
Por esse motivo é tão importante que haja a união do Estado frente a Segurança Pública, Educação e Saúde, com os pais e responsáveis, para combater e prevenir tal comportamento. Bem como o aprimoramento de medidas de proteção à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente, e formas de encontrar cibercriminosos que se escondem através de perfis fakes na internet, para que haja a punição adequada.
Conclui-se que a prevenção continua sendo a melhor forma de combater tais condutas, devendo haver a promoção de campanhas nas escolas sobre a conscientização dos perigos existentes no âmbito virtual, para que possamos falar na diminuição da incidência desses crimes, assim como a cautela e a supervisão dos responsáveis legais quando o assunto é a exposição dos filhos na internet, para que assim, se encontre medidas eficazes para garantir a segurança de nossos jovens.
5 REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Nathalie Dutra de; CUNHA, Leandro Reinaldo da. Avanços Tecnológicos, o Direito à Privacidade e o Cyberbullying. Anais do 3º Congresso Internacional de Direito e Contemporaneidade, 2015.
ANDRADE, Luísa Carina Figueira. Bullying e cyberbullying: um estudo num contexto escolar particular cooperativo. Tese de Doutorado. Universidade da Madeira (Portugal). 2012.
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1Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro. E-mail: maiaelaynefme@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0009-0008-3059-5013.