A ESCOLA PÚBLICA SERGIPANA NOTICIADA NO PROGRAMA POLICIAL CIDADE ALERTA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10659290


Gleice Ane Queiroz1
Maira Carneiro Bittencourt Maia2


RESUMO:

O objetivo deste artigo é compreender a cobertura jornalística da escola pública sergipana, a partir da análise de conteúdo do telejornal Cidade Alerta. A análise teve como base a matéria veiculada no dia 31 de março de 2022 que narrou uma briga, motivada por uma bala (doce), de duas adolescentes à porta de uma escola pública, no conjunto residencial João Alves, em Nossa Senhora do Socorro. O Cidade Alerta, como um programa sensacionalista, que tem sua programação voltada principalmente para a cobertura da violência, contribui para a problematização do discurso de que a escola pública é violenta.

Palavras-chave: Escola Pública. Cidade Alerta. Educação.

ABSTRACT: The objective of this article is to understand the journalistic coverage of the public school in Sergipe, based on the content analysis of the television news program Cidade Alerta. The analysis was based on an article published on March 31, 2022, which narrated a fight, caused by a candy, between two teenagers outside a public school, in the João Alves residential complex, in Nossa Senhora do Socorro. Cidade Alerta, as a sensationalist program, whose programming is mainly focused on covering violence, contributes to the problematization of discourses that public schools are violent.

Keywords: Public School. Cidade Alerta. Education.

INTRODUÇÃO

A televisão ainda assume papel muito importante no Brasil. Vista em tempo real, ela  ainda domina com folga, registrando 79% de todo o consumo domiciliar. É o que aponta a  pesquisa do Kantar Ibope Media (2022), que mensura a audiência de TV no Brasil e em outros  países. Vale citar também os resultados da Pesquisa Brasileira de Mídia, divulgados pelo  Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE), lançados em 2015. O  levantamento aponta que nos 26 estados do país e no Distrito Federal, 95% dos brasileiros  afirmam assistir à televisão. Desse percentual, 73% assistem à TV diariamente. Nesses dados expostos, em que a televisão representa um meio de comunicação de grande alcance, estão  inseridos os chamados programas policiais televisivos, que têm, normalmente, elevados índices de audiência.

Em julho de 2019, a Kantar IBOPE divulgou a pesquisa que apontava que o Cidade  Alerta Sergipe, veiculado na TV Atalaia, afiliada da Record TV, conquistou na capital, Aracaju, mais de 178.504 mil telespectadores, com 13,48% de audiência. Essa pesquisa revelou também que o programa apresentou 20,48% de participação, destacando-se nas classes C, D e E.

Ao mesmo tempo em que se amplia a audiência desses programas, as violações também aumentaram, a exemplo do desrespeito à presunção de inocência, a privação do direito ao silêncio e tortura psicológica. Em 2016, a Organização Não Governamental Andi – Comunicação e Direitos divulgou um estudo que aponta que programas policiais da TV e do rádio descumprem as leis e a ética. Em apenas 30 dias, narrativas de rádio e TV promoveram 4.500 violações de direitos, cometeram 15.761 infrações a leis brasileiras e multilaterais e desrespeitaram 1.962 vezes normas autorregulatórias, como o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros.

A análise de mídia incidiu sobre 28 programas ‘policialescos’ produzidos em 10  capitais do país. Por ‘policialescos’ compreendem-se os programas de rádio e TV dedicados a narrar violências e criminalidades, sendo caracterizados pelo forte apelo popular. Diferentemente dos noticiosos em geral, que tratam de variados aspectos da vida social de modo relativamente equitativo, essas produções são focadas majoritariamente em temas vinculados a ocorrências de ordem policial, ainda que, eventualmente, insiram entre as narrativas um ou outro assunto estranho ao rol de fatos violentos, delituosos ou criminosos. (ANDI, 2016, p. 12).

Tabela 1: Tipo e número de violações cometidas

  Fonte: ANDI (2016, p. 24).

Registrada na publicação intitulada “Violações de direitos na mídia brasileira” (volumes I e II), a tecnologia social construída foi aplicada, numa segunda fase, sobre uma amostra mais ampla de programas veiculados entre 2 e 31 de março de 2015, abarcando as cidades de Belém  (PA), Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Fortaleza (CE),  Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP).

O monitoramento revelou um volume de violações e infrações que evidencia o caráter não circunstancial das práticas anti-humanistas e antidemocráticas desse modelo de comunicação – além de expor padrões discursivos  incompatíveis com a democracia, com ataques reiterados a suas instituições e instrumentos; discursos de ódio contra o campo de defesa dos direitos humanos; e combate público aos parâmetros que regem o exercício da  imprensa. (ANDI, 2016. p. 1).

Ribeiro (2020) afirma que entre os telejornais atualmente mais consumidos no país estão aqueles normalmente classificados como “policiais”. Os principais exemplos de repercussão nacional são os programas Cidade Alerta (Rede Record) e Brasil Urgente (transmitido pela Rede Bandeirantes), produzidos por duas das maiores emissoras de televisão do país e detentores, em conjunto, dos maiores índices de audiência em seus horários de exibição. O  objetivo deste artigo  é, pois,  analisar  a  cobertura  jornalística  da escola pública em programa policial a partir da análise do telejornal Cidade Alerta Sergipe.

O PROGRAMA CIDADE ALERTA

O Cidade Alerta foi criado em 3 de abril de 1995 e teve como primeiro apresentador Ney Gonçalves Dias. Naquela época, esse programa era um dos carros-chefes da emissora e alcançava altos índices de audiência, o que o tornou, assim, um símbolo jornalístico da casa. Oliveira (2011, p. 02).

Oliveira (2011, p. 02)  ainda define o Cidade Alerta como “um telejornal do subgênero jornalismo policial com temática de teor sensacionalista e espetacular nas notícias, em que a violência urbana está sempre em primeiro plano”.

Mas seu percurso, no entanto, é marcado por interrupções e trocas de apresentador.  Nos primeiros meses, era exibido somente no estado de São Paulo, porém, mais tarde passou  a ser exibido em todo o Brasil.

Atualmente, em 2023, o noticiário é apresentado por Luiz Bacci – perfil jovem e carismático que adota uma postura opinativa ao conduzir o programa – durante a semana. Aos sábados quem assume é Matheus Furlan. O telejornal também conta com a participação do jornalista investigativo Percival de Souza, que desempenha o papel de comentarista e especialista criminal, trazendo análises sobre alguns casos à luz de suas experiências profissionais.

A versão sergipana do programa Cidade Alerta, devido aos impactos da pandemia da covid-19, ficou fora do ar por cerca de um ano e três meses, mas voltou para a programação da TV Atalaia, emissora afiliada da Record TV, no dia 2 de agosto de 2021. A atração é comandada pela apresentadora Mariana Sena, natural da Bahia, a qual ingressou no jornalismo há cerca de 15 anos e passou pela  Record TV de Salvador/BA, depois do Belém/Pará.

A promessa veiculada em anúncios e vídeos institucionais da emissora é a de que o  Cidade Alerta Sergipe alia informação com emoção e descontração ao noticiar os fatos mais importantes do dia para os sergipanos. No site da emissora, eles anunciam: “Fique por  dentro dos últimos acontecimentos e notícias policiais em Sergipe. O programa leva a  informação de forma rápida e precisa, e seu conteúdo faz a diferença para milhares de pessoas  da região”. O Cidade Alerta começa às 18h e tem duração de cerca de uma hora.

A ESCOLA PÚBLICA

A educação e os discursos sobre a escola pública fazem parte das pautas constantes na mídia. Desde a promulgação da Constituição Federal, em 1988, passando pela LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1996; o Bolsa-Família, em 2004, programa social com grande incursão e impacto na escola pública; o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), em 2005; o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), em 1998; o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), criado em 2007; o FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, em 2007, entre outros programas, essas grandes mudanças estruturantes, no âmbito na educação pública, estiveram presentes também nas discussões da imprensa.

Currículos, evasão escolar, correção de fluxo, avaliações externas, dentre outras iniciativas governamentais, fazem parte do cotidiano escolar. Entretanto, esse mundo de mudanças no universo da escola pública não é tão externalizado na cobertura jornalística.  Há uma deficiência em difundir e informar sobre as boas práticas dentro das escolas públicas.  Predomina a pauta com dados negativos, a exemplo da violência como inerente à escola. A Agência de Notícias da Infância (ANDI) realizou, em 2004, uma pesquisa com o objetivo de aprofundar o diálogo profissional e ético entre aqueles que produzem conhecimentos em educação e aqueles que levam informações à sociedade, ou seja, os jornalistas. O levantamento analisou 5.362 textos jornalísticos publicados por 57 jornais brasileiros ao longo daquele ano. O resultado dos estudos da ANDI foi divulgado em 2005, no qual foi apontado que: 

Uma das primeiras constatações é que em 63% [dos textos] houve uma dedicação quase exclusiva aos assuntos próprios do universo educacional. O restante da cobertura – aproximadamente um terço do total – estabeleceu correlações com outras temáticas e buscou inserir as reflexões sobre as questões educacionais em contextos mais amplos. (ANDI, 2005, p.10). 

A pesquisa destaca que a cobertura de Educação não é abrangente no sentido de realizar amplas conexões com outras temáticas. Tal estudo evidencia também que essa cobertura apresenta dificuldades em inovar e ampliar a reflexão dentro do próprio universo educacional.

Se as informações sobre a educação brasileira não são plenamente fundamentadas, discutidas, debatidas, dentro de um pensamento crítico necessário, qual espaço a escola pública terá na imprensa? Considerando, então, a dimensão do problema social aqui exposto e a atuação da mídia, torna-se relevante discutir acerca do tema, pensando em compreender por que a imagem da escola pública é ruim, e verificar se a mídia teria participação na construção desse imaginário social.

A escola pública em Sergipe

          Cerca de 2.080 escolas funcionam em Sergipe. Desse quantitativo, 1.649 (79,3%) são unidades de ensino público, o que apontou o Censo Escolar (2021). A pesquisa ainda apontou um total de 533.450 matrículas, sendo que 417.415 (78,2%) dos estudantes estão matriculados na rede pública.

          O Censo (2021) ainda discorre que em Sergipe, dos 100 estudantes que se matriculam na escola pública, 23,6% terminam o Ensino Fundamental com aprendizagem adequada em Língua Portuguesa. No Ensino Médio, são 22,6%. Além disso, 52 de cada 100 jovens da escola pública sergipana concluem o Ensino Médio até os 19 anos de idade. O Censo (2021) ainda aponta que 73% das escolas beneficiam os moradores das classes C, D e E das cidades sergipanas.

ANÁLISE DE DADOS E DISCUSSÕES

Objetivamos aqui atentar quais tipos de violações de direitos humanos têm ocorrido na cobertura jornalística da escola pública no programa policial Cidade Alerta, além de conhecer paralelamente a linguagem na qual são noticiados. Esse tipo de estudo qualitativo e  documental tende a  seguir  a  mídia  para  compreender sua pauta, agenda, linguagem e enfoque.

A estratégia coletou dados numa matéria noticiada no programa Cidade Alerta Sergipe do dia 31 de março de 2022. Nessa data, o telejornal tratou de diferentes temas, mas dedicou  25% do tempo (25 minutos) para noticiar sobre uma briga de duas estudantes à porta de uma escola pública.

Após análise, foi detectado que a apresentadora abriu o programa com a matéria da briga de duas estudantes à porta de uma escola pública (15´15´´). O programa apresentou um suspeito por tráfico de drogas que foi morto pela polícia (2´03´´). Abordou o caso do policial penal preso suspeito de facilitar a entrada de drogas no presídio (5´17´´). O programa veiculou a ajuda para uma mulher desempregada e doente que espera por cirurgia e pede ajuda até para comer (6´32´´). Noticiou  que cerca de 72% dos passageiros já presenciaram casos de racismo em transporte coletivo em Aracaju (5´51´´). O programa explorou a matéria da briga das estudantes, como se pode ver acima, e dedicou o maior tempo a esse fato.

A apresentadora veiculava as imagens das estudantes no momento da briga e anunciava  que a escola tinha vários problemas oriundos da falta de segurança na região. Ela chama a reportagem completa. O repórter aparece na tela da TV, à porta da escola, em Nossa Senhora  do Socorro, cercado por mães e alunos fardados disputando o microfone. O repórter fala que a briga começou por causa de uma bala (bombom), mas diz que os problemas de violência não paravam por ali; que uma estudante foi vítima de assalto num estabelecimento no bairro.

Ao fazer a cabeça de matéria à porta da escola, anunciando o nome do bairro onde a unidade de ensino está inserida, o repórter lança elementos mediadores nos processos de significação, de modo que quando o telespectador começa a assistir à reportagem, já é informado do “culpado” pela violência do bairro. A briga foi desencadeada por uma bala (bombom) entre duas estudantes, mas a reportagem já trata de ouvir sobre a onda de assaltos na região.

Na transmissão da reportagem, duas mães falam da insegurança que vivem e do medo de mandar os filhos para a escola. Durante toda a entrevista, a tela se divide entre os entrevistados e as imagens da briga das estudantes.

Nesses trechos, percebe-se que a família tem medo de mandar ou levar os filhos para a escola. Por conta da briga de duas estudantes? Por causa da violência no bairro.

A tela que exibe a reportagem volta a focar na âncora do programa, a qual está no estúdio da emissora e repete a alegação de que a escola, mesmo possuindo quadro completo de vigilantes, enfrentava vários problemas relacionados à falta de segurança. Ela continua a narrar que, segundo os moradores, a escola tinha até drogas.

A apresentadora relembra que ouviu dos moradores a informação que havia drogas na escola. Logo após essa fala, a âncora anuncia que vai conversar com uma psicóloga, que fará uma análise do que está acontecendo com as estudantes. Ela frisa em sua fala que são estudantes meninas sendo incitadas a brigar.

A apresentadora anuncia a participação da psicóloga e pede que essa profissional fale  também sobre a terceirização da educação da família para a escola. A âncora veicula mais dois  vídeos, agora de brigas de outras escolas públicas. Quando acaba de exibir os vídeos, a âncora  anuncia que borrou o rosto das estudantes porque não queria expô-las. A apresentadora faz uma breve explanação de como mulheres vivem sendo incitadas e chega a citar como exemplo  mulheres que são impelidas até pelas ex-esposas dos companheiros a brigarem por eles.

A psicóloga entra ao vivo. E enquanto ela fala, são veiculadas na tela da TV as imagens  das brigas das estudantes. A psicóloga comenta sobre a importância da família no processo da  educação e no contexto da escola.

A âncora chega a questionar à psicóloga qual seria a solução para que acabassem as  brigas e ainda pergunta se a solução seria expulsar as estudantes daquele estabelecimento  de ensino a fim de mostrar-lhes que ali é um ambiente que não tolera agressão, ou cobrar do Estado policiamento na escola. 

Os trechos dos discursos da âncora que estão transcritos exemplificam o juízo de valor sobre duas adolescentes. Chega a cogitar a expulsão das alunas da escola pública.

A psicóloga fez a participação e finalizou apelando que é preciso união e parceria entre a família e a escola, reforçou que não se pode transferir para a escola o que é um dever da família e cita valores morais, como exemplo.

Para finalizar, a apresentadora narrou uma nota da Secretaria de Estado da Educação na qual esta informa que vem se reunindo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública para pedir mais ronda em torno das escolas que estão em regiões vulneráveis.

Vale ressaltar que nos 15’15’’ no ar, nem a direção da unidade de ensino e nenhum outro funcionário dessa escola foram ouvidos para confirmar as denúncias.

IMPRENSA SERGIPANA NO DIA 31/03/2022

Para contextualizar o dia abordado no artigo, foram levantadas as principais notícias de Sergipe veiculadas no dia 31 de março por alguns portais de informação e jornais do cotidiano, a saber: a TV Sergipe e os portais Infonet e G1. Esse levantamento pode mostrar o exagero do programa Cidade Alerta Sergipe com a pauta da escola pública.

Na agenda do dia 31 de março de 2022, apresentada pelos três telejornais da emissora  TV Sergipe, afiliada da Globo, houve diversos destaques:

Quadro 1: Matérias veiculadas no dia 31/10/2022 pelos veículos TV Sergipe, G1 e Infonet

VEÍCULOSMATÉRIAS
TV SERGIPEBom Dia Sergipe destacou: Servidores e peritos do INSS de Sergipe seguem em greve; Família de mulher encontrada morta em Itabaiana diz que ex a ameaçava; Previsão do tempo; Notícias sobre esporte; Especialista explica regras sobre o home office; Escolas estaduais de Sergipe começam a vacinar alunos contra a covid-19; e Uso de máscara segue obrigatório no Tribunal de Justiça de SE. O SE TV, 1ª edição, destacou: Agente prisional é preso por  facilitar a entrada de drogas e celulares em presídio; Representante de Sergipe garante vaga na semifinal do The Voice +; Donos procuram por animais desaparecidos; Suspeita de  matar empresário na Bahia continua presa em Sergipe”; e Alerta a população sobre a vacinação  contra a covid-19. Já no SE TV 2ª edição são evidenciadas as notícias: Deputados aprovam  ampliação de contratos de professores temporários; Fiéis católicos mantêm tradição de fé e  penitência na quaresma; Parecer médico esclarece causa da morte de Paulinha Abelha; e  Fevereiro tem saldo positivo na geração de empregos no estado.  
G1Os destaques do G1 foram: Seis novas linhas passam a fazer parte do sistema integrado de transporte público de Aracaju; Novo horário de funcionamento do centro de triagens gripais; e Projeto Teatro no Museu está de volta e agora  na versão para adultos.  
INFONETOs destaques foram: Alese aprova projeto que beneficiará  aposentados e pensionistas; Gari é o segundo sergipano melhor nos 24 km da Corrida Cidade  de Aracaju; Homem armado invade Unimed em Aracaju e agride membro da diretoria; Adema recebe entrega voluntária de jandaia verdadeira; Idoso de Moita Bonita morreu após ser empurrado por enteado, diz PC; Laudo diz que medicamentos não provocaram morte de  Paulinha Abelha; Colisão entre ônibus e veículo deixa uma pessoa ferida; PM apreende  drogas no bairro América; Em vigília na Alese, professores pedem revogação do desconto de  14%; Polícia Civil realiza prisão de homicida em Nossa Senhora do Socorro; Arrecadação federal em Sergipe somou mais de R$ 484 mi em fevereiro; Seletiva de natação da  Gymnasíade 2022 reuniu 450 atletas em Aracaju”; e Policial militar é presa suspeita de tráfico  de drogas.  

Fonte: Elaboração da autora

A partir das principais notícias no dia 31 de março de 2022, veiculadas pelos meios  de informação, e do conteúdo apresentado pelo programa Cidade Alerta, é possível perceber que  na citada edição desse programa televisivo, mesmo com pautas de crimes destacadas pelos demais veículos, estas não foram destaques no Cidade Alerta. O programa desse dia se resumiu à produção de conteúdos vinculados somente às ocorrências de ordem policial e dedicou mais de 15 minutos para noticiar uma briga de duas estudantes, pauta que não foi explorada por outros veículos de informação em Sergipe. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo de nossa pesquisa, tentamos fazer um diagnóstico de como a escola pública é representada no programa policial Cidade Alerta Sergipe. Várias perguntas guiaram nossos  passos: O que um programa de TV, que só noticia crime, está falando sobre a escola pública?  De que forma essas imagens divulgadas pela mídia representam a realidade? Como uma escola  pública é noticiada num programa cuja produção se dá por pautas de crimes?

O que mais despertou foram as problematizações iniciais da pesquisa, as quais eram justamente os altos índices de audiência atingidos pelo Cidade Alerta na comunidade em que as escolas públicas estão inseridas. O programa domina entre as classes C, D e E e onde reside 74% do público-alvo da escola pública, como aponta o censo escolar (2022).

Alguns pontos sobre o programa Cidade Alerta devem ser destacados ao analisar os  15´15´´ no ar dedicados a noticiar uma briga de estudantes à porta de um estabelecimento de  ensino público. O repórter chega a noticiar que, além de briga, uma estudante foi assaltada nas  proximidades da escola e explicita a falta de segurança pública como um problema daquela unidade escolar, quando,  na verdade, a instituição educacional é tão vítima da violência o quanto é uma academia, por  exemplo. Não é papel da escola garantir segurança pública no bairro. A Constituição Federal de 1988 delimita no art. 144:

Art.144: A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I – polícia federal;

II – polícia rodoviária federal;

III – polícia ferroviária federal;

IV – polícias civis;

V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.

VI – polícias penais federal, estaduais e distrital. (Redação dada pela Emenda  Constitucional nº 104, de 2019).

Em nenhum momento a Secretaria de Segurança Pública foi acionada para falar sobre a insegurança no conjunto João Alves, em Nossa Senhora do Socorro, localidade em que está  inserida a escola noticiada.

Ao dedicar 25% do programa para noticiar uma briga de duas alunas por causa de uma bala (bombom), para render na TV uma pauta de escola pública, o programa policial noticia briga de estudantes e relaciona a unidade de ensino à falta de segurança pública numa comunidade; a causa da briga foi por uma bala (doce), mas a âncora exemplifica relação amorosa como um motivo para gerar uma briga entre mulheres; chega a cogitar como solução a expulsão das alunas da escola; fala que o Estado  precisa acionar o policiamento. E para legitimar seu discurso de que o programa Cidade Alerta  está contribuindo para o fim da violência, a atração televisiva convida uma psicóloga para  opinar sobre o ocorrido. 

A matéria analisada exibiu adolescentes com o uniforme da escola, menores dando  entrevista e falando que na escola há, inclusive, drogas e sexo.

Sobre essa denúncia, o repórter não ouviu a direção da unidade de ensino, nem outro funcionário desta para ao menos checar a denúncia,  violando, assim, a premissa do jornalismo em ouvir os dois lados.

Vale ressaltar que nos vídeos envolvendo menores, os rostos destes foram borrados, mas  os nomes das escolas públicas foram citadas nos três vídeos veiculados no programa do dia .

No que tange à comunicação, sabemos que esta tem uma função fundamental em nossa sociedade; ela tanto pode promover direitos quanto pode prejudicá-los e violá-los. Tendo isso em vista, podemos relacionar a representação da escola pública veiculada no programa policial, que não tem função social, pois ele prima por uma cobertura sensacionalista, como um desserviço à educação porque marginaliza a escola pública. 

Outro ponto captado é a construção de narrativas de que a briga de duas estudantes na  entrada de uma escola é um crime em conflito com a lei. Vale ressaltar que os crimes são os  principais destaques do programa Cidade Alerta. Até mesmo a imagem exibida leva-nos a essa  clareza; são elementos na tela da TV que representam drama constante. Partindo deste ponto,  o programa analisado dedica o maior tempo da grade para falar sobre a briga de estudantes à porta de uma escola pública por causa de uma bala (doce), levando o telespectador a acreditar que  essa briga foi um verdadeiro crime.

É  essencial que  esse  formato  de  comunicação  seja  revisto,  principalmente considerando a responsabilidade social que a imprensa tem com a escola pública.

REFERÊNCIAS

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1Mestranda em Comunicação PPGCOM-UFS
2 Orientadora em Comunicação PPGCOM-UFS