A EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL: OS PARADIGMAS DE RESSOCIALIZAÇÃO DO EGRESSO.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7604180


Dilson Castro Pereira1


RESUMO

A ressocialização do preso tem por fim a reinserção do egresso na Sociedade. Porém, apesar da idéia de ressocialização haver sido inserida no ordenamento jurídico brasileiro, tal finalidade não é atingida. Hodiernamente, não é exagero afirmar que a privação de liberdade institucionalizada, exercida pelos aparelhos estatais, atravessa um crônico processo terminante, representado pela crise de legitimidade e por suas falhas concretas. Nessa esteira, pretender-se-á, por intermédio da uma análise dialética, calcada na metodologia da pesquisa bibliográfica, compreender a eficácia do Sistema Prisional para uma abordagem mais completa acerca da ressocialização e o egresso. Assim, vislumbra-se suas finalidades sociais e jurídicas declaradas, por conseguinte, examinar de forma crítica todas as funções ideológicas construídas sobre o instituto prisional e o egresso. O presente estudo tem por objetivo analisar a eficácia do sistema prisional segundo a percepção dos dados do COMPAJ em Manaus. Para tanto, no mês de janeiro de 2021, efetuou-se pesquisa por meio de dados do DEPEN. Da mesma forma, é imprescindível a reformulação de toda a sistemática penal, haja vista que a falência das funções prisionais encontra-se ligada à problemática dos atuais paradigmas de ressocialização do egresso que levaram a prisão ao iminente e fatal colapso. Apesar da incredibilidade da eficácia do sistema ressocializador, têm-se esperança no ideal reabilitador do ser humano, que apesar de encontrar-se num sistema falho, omisso, reconhece-se como infindável poder de superação.

Palavras-Chave: Egresso; Ressocialização; Reformulação; Falência; Superação.

INTRODUÇÃO

Num país em que 674.163 mil apenados ainda são tratados de maneira aviltante nas prisões, de onde voltam à sociedade ainda mais degradados do que quando entram, num país em que apenas alguns poucos privilegiados têm direito a tratamento carcerário decente, num país em que a justiça igual para todos ainda não passa de distante da utopia. A reabilitação do egresso é focalizada como escopo principal da Lei de Execução Penal, de maneira que, quando o detento conseguir alcançar o direito de reingresso à vida em liberdade, tenha sua reinserção garantida na sociedade, com o fito de poder conviver em harmonia com seus pares.

Não é novidade que as condições de detenção e prisão no sistema carcerário brasileiro desobedecem aos princípios da ética, da cidadania e da dignidade humana, crescendo, num círculo vicioso implacável, os índices de violência, criminalidade e situações de rebelião dentro dos presídios. As penitenciárias brasileiras são negativamente famosas na opinião pública internacional, denegrindo a imagem do Brasil naquilo que há de bom. Junto a esta realidade do sistema prisional brasileiro, e todo o cenário que ele está inserido, rejeitando-o, a população brasileira quase como um todo passa a desacreditar na ressocialização do detento e na sua possível disposição de reaprender a viver em sociedade. Na maior parte das ocasiões, as autoridades operam com descaso, corrupção, abuso de poder e excesso de violência contra os presos. A Constituição Federal prevê, em seu artigo 5°, inciso XLIX, a salvaguarda da integridade física e moral dos presos, dispositivo raramente respeitado pelo sistema carcerário.

Dessa forma, verifica-se a necessidade do estudo, uma vez que, perante a rejeição social, o egresso envolve-se num círculo vicioso de marginalidade, em que o detento regressa a sociedade, sem nenhuma perspectiva de vida digna, pois as oportunidades de trabalho, se existirem, são ínfimas devido ao preconceito que é quase que absoluto por parte dos empregadores. Consequentemente, perante o descaso da sociedade e precisando de necessidades básicas para o sustento próprio e de sua família, torna a delinquir. Observa-se que até agora nenhuma solução foi tomada, no que tange ao precário sistema ressocializador e a rejeição social para com o egresso e com eficácia. Existem muitas críticas junto ao sistema penal, por parte da sociedade, em geral. Diversas dificuldades que promovem a criminalidade são identificadas, entretanto a enorme maioria dos cidadãos não se preocupam em cooperar para sua solução, adequadamente, não considerando, a exemplo, que o detento saiu da sociedade e, em tese, deverá regressar, conferindo a devida responsabilidade unicamente ao Estado, quando é responsabilidade e interesse de todos. De tal modo, a eleição do presente tema justifica-se pela necessidade de um estudo cientifico no tocante ao sistema ressocializador e à rejeição ao egresso, na busca de solução para a segurança pública e a violência.

Dessa forma, a problemática que nos apresenta para estudo é: Realmente, o Sistema Prisional manauense, tendo como local de pesquisa o COMPAJ e sua população carcerária?

Assim este tem por objetivo geral analisar o Sistema Prisional de Manaus e as causas de ineficácia bem como avaliar propostas de solução para a problemática atual, viabilizado pelos seguintes objetivos específicos: apresentar o Sistema Prisional e demonstrar as causas de ineficácia, bem como analisar a compatibilidade entre os Direitos Humanos e o Sistema Prisional de Manaus. Além disso, propor soluções, com o fito da ressocialização do apenado. Nessa esteira empregaremos os métodos de procedimentos histórico e monográfico, para tanto, foi feita análise histórica da pena, sua origem e seus objetivos. Na sequência são apresentadas noções acerca do sistema ressocializador e a condição de egresso, expondo, ainda, legislação específica, salientando as que se fazem essenciais ao tema.

A delimitação do universo da pesquisa consiste no Sistema Prisional de Manaus e a análise dos dados DEPEN do COMPAJ/SEJUS, na cidade de Manaus, para discussão e apreciação das respostas, com o fito de reforçar a pesquisa bibliográfica, e ainda, enriquecer o aspecto científico. Além disso, o desenvolvimento operacional e coleta de dados para atingir referido objetivo foi escolhida a análise de dados COMPAJ/Manaus. Já na coleta de dados optou-se pela pesquisa no site do DEPEN, que busca verificar quantitativamente as características de determinada população. O instrumento utilizado para coleta de dados foi a pesquisa online em sites governamentais. Efetuada a pesquisa, os dados foram analisados no segundo capítulo do presente estudo.

E ainda, os meios de investigação foram: bibliográfico objetivando a ampliação do conhecimento acerca da ressocialização e a rejeição social ao egresso. Já os materiais: observação direta extensiva com a utilização dos dados extraídos do DEPEN. Para tanto, no primeiro capítulo, foi feita analise histórica da pena, sua origem e seus objetivos. Na sequência são apresentadas noções acerca do sistema ressocializador e a condição de egresso, expondo, ainda, legislação específica, salientando as que se fazem essenciais ao tema. De bom alvitre destacar a importância do tema nos dias atuais, tendo em vista a descredibilidade no sistema ressocializador, a sociedade apresenta receio em conceder trabalho ao egresso do cárcere, formando um círculo vicioso, causador de marginalidade, desemprego e, conseqüentemente, de criminalidade. Esta situação reflete em toda a sociedade, cuja rejeição ao egresso, além de não resolver o problema da violência, suscitará, ao contrário, qual tiro pela culatra, seu incremento. A caracterização do objeto de estudo deste deve-se a lenta humanização dos processos penais, que se prolongou ao longo de mais de duzentos anos, teve como primeira conseqüência um deslocamento na aplicação da lei. Atualmente, no Brasil, verifica-se que a dignidade da pessoa humana é violada em relação a todos os seus direitos, principalmente no caso do condenado ou apenado brasileiro, o qual está sob a custódia do estado que não está preparado para cumprir seus deveres com este segmento da população.

Este pensamento se dá, hoje, na desprezível condição pessoal em que se acham os detentos brasileiros, que são arremessados e olvidados nos cárceres do desrespeito, fazendo com que eles se esqueçam de que pertencem ao grupo dos seres humanos. Na verdade, os direitos básicos da maioria dos apenados, diferentemente dos criminosos do “colarinho branco”, foram desrespeitados na infância, por condições de miséria e violência familiar, por falta de educação e emprego, e posteriormente na falta de dignidade no cumprimento da pena, cujas condições animalescas lhes retiram brutalmente as chances de recuperação e de voltar ao convívio social.

Excluído da sociedade, e sem possibilidade de se manter, o egresso não vê alternativa a não ser voltar a delinqüir, como forma de subsistência. Sobre a exclusão do egresso da sociedade discorre Silva (2003) que “todos evitam oportunizar ao egresso uma colocação no mercado de trabalho e conseqüentemente acabam contribuindo para que este volte a delinqüir como uma maneira de manter a si e a seus familiares, retornando ao indigesto ventre do Sistema Penitenciário.” É nesse caminho que percorreremos para buscar analisar e interpretar os dados obtidos quando da população carcerária do Complexo Penitenciário Anísio Jobim. Por fim, com base no resultado da pesquisa, foram analisadas as causas da rejeição e ainda sugerimos propostas para a solução do problema, objetivando a genuína aplicação da Lei de Execução Penal.

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA PRISÃO

Perante o cunho dialético dessa pesquisa, é interessante a edificação e contextualização, no caso, a punição e prisão, com o fito de consentir o alargamento lógico e científico do texto. Deste modo, praticaremos uma breve exibição dos precedentes históricos do ergástulo. Neste caminho, uma vez embasado a gênesis da prisão, através da apresentação das causas relacionadas à sua existência, conseguiremos analisar as origens de sua falência. A punição mediante prisão remonta ao termino do período medieval e começo da Idade Moderna. Entretanto, determinados historiadores narram a existência da prisão em períodos bem mais longínquos, como por exemplo, no pico das civilizações gregas e no Império Romano. Além disso, observa-se nas Escrituras Sagradas, que o profeta Ezequiel recebeu a seguinte ordem do Senhor Deus:

Depois veio a palavra do Senhor a mim, dizendo: (…) Faze uma cadeia, porque a terra está cheia de crimes de sangue, e a cidade esta cheia de violência. […] O rei se lamentará, e o príncipe se vestirá de amargura, e as mãos do povo da terra se molestarão. Conforme o seu caminho lhes farei, e com os seus juízos os julgarei; e saberão que eu sou o Senhor. (BÍBLIA SAGRADA, Ezequiel 7:1;23;27)

Já na idade média, passa-se a enfatizar o aspecto aflitivo das penas, em que a punição recaia sobre o corpo do apenado, o que Foucault (1987, p9) descreve muito bem, quando da execução acontecida em 1757:

Damiens fora condenado, a 2 de marco de 1757, a pedir perdão publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris; levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma tocha de cera de duas libras, fora erguido pelos mamilos, braços e coxas; aplicaram-lhe chumbo derretido, óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo foi puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas e, as suas cinzas levadas ao vento. Finalmente foi esquartejado [relata a Gazette d Amsterdam]. Essa ultima operação foi muito longa, porque os cavalos utilizados não estavam afeitos a tração; de modo que, em vez de quatro, foi preciso colocar seis; e como isso não bastasse, foi necessário, desmembrar as coxas do infeliz, cortar-lhe os nervos e retalhar-lhe as juntas. Afirma-se que, embora ele tivesse sido um grande praguejador, nenhuma blasfêmia lhe escapou dos lábios; apenas as dores excessivas faziam-no dar gritos horríveis, e muitas vezes repetia: Meu Deus, tende piedade de mim; Jesus, socorrei-me.

No Gênesis da Idade Moderna, convida-se a expor o embaraçado cenário social da fase de transição em meio à era medieval e a Idade Moderna; por um lado, temos uma deterioração da população inferiormente abastada, após séculos de opressão. Igualmente, a burguesia aproveita dos espaços dentre os feudos e cidades, para preencher um papel típico: o comércio fundamentado na troca de produtos e, em seguida, na moeda. Além disso, seu poderio econômico faltava-lhe a qualidade de categoria política dirigente – e essa procura intensa pelo poder materializaria a Revolução Francesa. Já a manutenção da direção política do Estado constitui o grande motivo para o aperfeiçoamento dos estabelecimentos prisionais.

Em síntese, as questões aqui debatidas compõem como as mais expressivas a concepção do momento histórico que contribuem para o nascimento e aperfeiçoamento das instituições prisionais, assim como se serviam nas Idades Antiga e Medieval, no começo da Era Contemporânea, e da forma com que conhecemos hoje sem muitas modificações. Abreviando, averiguamos que o Brasil recebeu, no começo da colonização, uma vasta legislação distorcida. À época, a prisão tinha a pose de mero instrumento de amparo ao punido, que esperava a pena principal. Além disso, com a Independência em 1822, no período imperial surgiu uma nova ordem jurídica, em benefício da preparação do Código Criminal do Império. Aludido diploma legal acarretou a privação da liberdade como pena principal, ao revés das Ordenações que vigoraram até ali para com o apenado.

1.2 O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Com o advento da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210 de 12 de setembro de 1984) ficou instituído que, as diversas categorias de estabelecimentos fiquem distribuídos a abrigar tipos específicos de presos, através da identificação por características específicas. Além disso, propõe um tratamento individualizado, respeitoso e saudável aos direitos humanos dos detentos.

Necessário torna-se frisar que a pena de prisão encontra-se em colapso por não alcançar a meta de conter a criminalidade e ainda, reabilitar o delituoso, visto que a aplicação de modalidades alternativas a prisão já se encontram postuladas na esfera nacional e internacional. Conforme Beccaria (2008), que mostrou em sua obra uma inspiração de vital importância para o florescer da reforma penal nos últimos séculos; A idéia de pena era utilitarista, ou seja, assinava a opinião de que a pena justa precisaria encontrar-se submissa a penalidade necessária, tornando manifesta a certeza de que a pena consistiria em um exemplo para o futuro e não uma vingança pelo passado. Assim sendo, suas idéias deram ensejo a sua máxima: “melhor prevenir delitos a castigá-los”.

Dessa forma, o sistema prisional brasileiro continua levando em consideração que a prisão modifica os detentos, mas transformando-os em sujeitos absolutamente passivos, carentes de qualquer encargo ou iniciativa, despersonalizando-os e lhes ocasionando, profanação do ego e conservando-os em um ambiente avesso a vida social. Neste sentido os registros ilustram que o ambiente do sistema prisional brasileiro é tenso e violento, estimulando a criminalidade. Há certo tempo, os governantes referenciaram a necessidade de construir uma casa de detenção digna para os presos, contudo foi em 1905 a disposição do edifício que veio a ser por muito tempo na Avenida 7 de setembro a Vidal Pessoa.

Figura 01 – A Casa de Detenção
Fonte: FERREIRA (2006)

Outrora pouco antes de receber a denominação de Complexo Penitenciário “Anísio Jobim”, em 1982 foi fundada a Colônia Agrícola Anísio Jobim com espaço necessário para que futuramente, no mesmo local, também existisse uma penitenciária de regime fechado, o que só ocorreu em 1999. Então a antiga CAIAJ tornou-se o recente COMPAJ, o qual também veio a receber a Penitenciária Feminina em 2001, instituições que embora permaneçam no mesmo complexo, tem administração e corpo operacional independentes, funcionando a penitenciária feminina como cadeia também, ainda que este não tenha sido o plano inicial.

Figura 02 – Regime Fechado do COMPAJ
Fonte: FERREIRA (2006)

1.3 A EFICÁCIA DA PENA DE PRISÃO NO SISTEMA PRISIONAL

O Estado no momento em que condena uma pessoa que perpetrou um crime para com a sociedade e por efeito executa a esse uma pena restritiva da liberdade, em principio, espera que depois do cumprimento da sentença expedida pelo juiz a esse infrator conseguirá recuperá-lo, em harmonia, ao convívio social. O que se costuma chamar reeducação social, uma espécie de aprestamento transitório pela qual necessita suportar todo delinqüente condenado.

No sistema penitenciário a carência do estado de saúde deve-se entre diversas razões as superlotações dos alojamentos, tornando os presídios um ambiente propício à propagação de surtos epidêmicos e o contágio de doenças. Ressalta-se além disso à má nutrição dos presos aliado ao sedentarismo, utilização de drogas ilícitas, a deficiência de asseio corporal e limpeza do recinto e toda escuridão do presídio, contribui para que um detento que entrou nele sadio, seja afetado por uma patologia ou tenha seu bem-estar físico afetado. As rebeliões são as parcelas de incalculáveis fatores negativos. Elas constituem em levantes organizados pelos presos de forma violenta em busca de seus direitos e como forma de chamar a atenção das autoridades para a situação subumana na qual eles são submetidos dentro das prisões. Segundo Ferreira (2006, p168), mencionando Michele Perrot atesta que as rebeliões e fugas nasceram juntamente com a prisão, relata ainda que os presos da França em 1854 já provocavam diversos delitos e incendiavam o interior do cárcere, no afã de escapar do isolamento celular do Presídio Central, pois para eles tal atitude provocaria a condenação ao trabalho forçado e a conseqüente deportação colonial, que era bem melhor a permanecer recluso e naquele ambiente hostil.

Conforme Bitencourt (2004), a detenção, ao invés de diminuir a delinqüência, estimula o preso, contribuindo para que ele cometa toda espécie de crueldade, não beneficiando o detento, ao contrário, ocasiona completa degradação e corrupção. E quando da sua saída do presídio ocorre de imediato, o estereótipo de ex-detento com que é tratado o faz restabelecer ponte com o seu passado, soma-se ainda a falta de mercado de trabalho que recepcione o egresso, assim condicionando-o novamente ao crime organizado, agora ainda mais especializado em cometer delitos, servindo apenas para reforçar os valores negativos do condenado.

1.4 MOTIVOS DA INEFICIÊNCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

Nas palavras de Oliveira et al (2002), isso significa que:

O sentido imanente da reinserção social, conforme o estabelecido na Lei de Execução, compreende a assistência e ajuda na obtenção dos meios capazes de permitir o retorno do apenado e do internado ao meio social em condições favoráveis para a sua integração.

Esse espírito esperançoso e otimista da LEP é conseqüência de uma expectativa de obter a recuperação do apenado que se congregou aos sistemas normativos pelo meio de manifestações retóricas.

Perante isso, convém a indagação: porque a pena privativa de liberdade, no sistema prisional brasileiro, não desempenha a sua finalidade de restaurar o preso? O objetivo deste tópico é responder a essa questão, avaliando as razões consideradas mais complacentes para o desvirtuamento da função ressocializadora da pena de prisão e, porque não, para a degradação do detento.

A prisão, ao isolar fisicamente os detentos do mundo exterior, favorece a perda de contato e contribui para a ruptura dos relacionamentos e dos laços familiares e de amizades. Além da sequela que esse isolamento exerce sobre a saúde física, mental e social do detento, também lesa a sua readaptação em sociedade. Comumente, as autoridades carcerárias e policiais se aproveitam da vontade dos presos de estar próximo de suas famílias para se adaptar à disciplina, advertindo os detentos rebeldes, transferindo-os para presídios mais distantes. Temos, por exemplo, as delegacias de São Paulo, onde esse é um dos principais meios de controle sobre os detentos. A maior parte dos estabelecimentos penais tem um ou mais dias por semana, na qual os visitantes podem ficar no local por várias horas. Geralmente, as políticas de visitação tendem a ser mais liberais nos presídios onde a instalação possa acomodar os visitantes do que nos isolamentos dos distritos policiais. Nos estabelecimentos penais onde são concedidos dois dias de visitação por semana, alguns destinam um dia na semana às visitas conjugais, e um dia do final de semana às visitas de outros familiares e amigos. Comumente os filhos visitam seus pais uma vez por mês, em um dia específico para visita.

São raras as instituições penais que tomam nota dos visitantes e tentam evitar a entrada de prostitutas; alguns permitem a entrada de qualquer pessoa; e outros restringem as visitas conjugais à mulher do preso. A LEP diz que os detentos devem ser mantidos em celas individuais de pelo menos seis metros quadrados. Muitos dos presídios brasileiros possuem celas em toda ou a grande parte de suas áreas de reclusão. Sendo assim, a grande população carcerária extrapolou os planos originais: onde devia haver um preso por cela, há dois ou mais presos. Mesmo com celas individuais, a maioria dos presídios possui celas de grande porte ou dormitórios que foram arquitetados particularmente para a convivência em grupo.

Em muitas instituições penais brasileiras, como é notado pela sociedade, mostra-nos o retrato da ineficácia do sistema prisional evidenciado por dormitórios e celas com o dobro ou até o quintuplo de sua capacidade normal. Por esta senda, em nosso país, é notório observar apenados reincidentes violentos e réus primários presos por crimes menores dividindo o mesmo espaço nas celas, situação esta que aliada a péssimas condições de vida, supervisão efetiva não eficaz, um forte aparato bélico e a falta de atividades contribuem para situações de abuso entre os presos. Em alguns presídios de segurança máxima, os presos de alto grau de periculosidade matam os companheiros de cela impunemente, no mesmo instante em que prisões de segurança relativa, extorsão e mais formas brandas de violência são comuns. Sem contar os casos de atentados violentos ao pudor contra crimes de estupro seja por indiciamento ou apenado.

A repressão do instituto sexual propicia a perversão da esfera sexual e da personalidade do indivíduo. Enfim, é impossível falar de ressocialização em um meio carcerário que deforma, denigre e desnatura um dos instintos fundamentais do homem. É bom salientar que os presos provisórios deveriam ficar em um lugar a parte dos demais para não ter o seu princípio de inocência divergido, devendo ser preservados do ambiente prisional. As possíveis soluções e mais conservadoras para o problema sexual partem da concepção de que tal problema não existe. Sugerem que o Estado, executando medidas como uma boa política de higiene, trabalho e exercício físico, impedirá o surgimento de qualquer ansiedade do tipo sexual ou de práticas sexuais desviadas. Evidentemente que todas essas medidas são importantes, mas são insuficientes para extinguir o problema sexual, podendo, no máximo, reduzí-lo. É o que Bitencourt (2004) destaca:

Aqueles que consideram que o instinto sexual pode ser contornado com um regime penitenciário adequado, com trabalhos, exercícios, esportes, etc, partem de um conceito equivocado sobre as necessidades humanas. Em vez de contribuir para a solução do problema, agravam-no, fomentando o ódio nos reclusos e a inconformidade com o pessoal da vigilância. O instinto sexual e a necessidade de expressá-lo são diferentes das atividades físicas, intelectuais, culturais e esportivas.

Os presos brasileiros sofrem uma violência crônica e muitas vezes extrema, isso ocorre no momento em que são detidos até serem liberados. Completamente mal remunerados e sem um treinamento devido os agentes penitenciários frequentemente fazem uso dos espancamentos ao invés das punições autorizadas e previstas na LEP. Há casos de execuções sumárias de prisioneiros cometidas por policiais civis e militares. A chacina que ocorreu na casa de detenção do Carandiru, em 1992, um dos mais sangrentos episódios da história brasileira cometida por membros da Polícia Militar. Os agentes penitenciários admitidos e treinados pelas Secretarias de Justiça em muitos Estados, fornecem pessoal às prisões, no tempo em que policiais civis realizam estes trabalhos nas carceragens das delegacias de polícia. Em síntese, uma vez transferido o preso para o Sistema RIO, ele deveria ficar bem longe do jugo da polícia.

A principal atribuição da polícia militar é assegurar a segurança externa das penitenciárias através da constante vigilância nas guaritas e outros pontos de observação que circundam as instalações. A Lei de Execuções Penais diz que os quardas devem receber tantocursos de sua formação como a reciclagem diária dos servidores em exercício. Mesmo assim, a falta de treinamento adeguado prejudica e muito os guardas das prisões brasileiras.

Conforme menciona Coelho (2005), uma antiga máxima popular diz que “mente vazia é a oficina do diabo”, esse provérbio não poderia ser mais adequado quando se trata da vida carcerária. O indivíduo privado de sua liberdade e que não encontra ocupação, entra num estado mental onde sua única perspectiva é fugir. O homem nasceu para ser livre, não faz parte de sua natureza permanecer enjaulado.

Segundo Oliveira (2002), a visão acerca do criminoso é que, a partir do delito, ele se torna um indivíduo imprestável perante a sociedade, é que seu isolamento dentro de uma prisão significa a perda de toda a sua dignidade humana.

Além disso, ignora-se que os direitos humanos valem para todos. A saída é relacionar-se com os detentos companheiros e intercambiar com eles suas aspirações, valores e visões do mundo, quase sempre distorcidas. Dessa forma, passam a adquirir novos hábitos, que antes não tinha, enfim, transforma-se em um indivíduo pior do que quando entrou.

1.5 A INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS DIREITOS HUMANOS E O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Os brasileiros não devem e não podem mais tolerar a situação dramática que vive o País em matéria de dignidade da pessoa humana, e naquilo que diz respeito à situação perversa vivenciada pelos detentos na execução da pena, que continua a ser omitido pelo sistema prisional brasileiro.

Tudo isso vai conduzir a uma intensa dialética ou luta dos contrários entre Estado, Poder Judiciário, cidadania, dignidade da pessoa humana, Direitos Humanos, segurança pública, Direito Penal, Sistema Penitenciário, dentre outros; a síntese dessa formidável dialética, porém, é indispensável, urgente, inadiável, já que ainda está em estado primitivo no Brasil. O primeiro dos direitos e o direito à vida e dele decorrem todos outros. O direito à vida e prioridade absoluta e mais do que garantia de “vir ao mundo”, se atribui a família, a comunidade, a sociedade em geral e ao poder público a responsabilidade pelo crescimento e desenvolvimento da população. Assim nos ensina o mestre Junqueira (2005): “o direito à vida e o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito a existência e exercício de todos os demais direitos”.

A legislação internacional e a nossa Carta Magna de 1988, protege o direito a vida, que deve ser interpretado em sua dupla acepção: o direito de continuar vivo e de viver com dignidade.

Art. 3º da declaração dos Direitos Humanos – todo individuo tem direito a vida, a liberdade e a segurança pessoal e a nossa CF/88, no art. 5º, caput – todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no pais a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade, nos seguintes termos […]

A nossa Carta Magna inseriu taxativamente determinados limites penais e processuais de segurança individual, tais como: inadmissibilidade de penas de morte, menos em ocorrência de guerra, de prisão perpetua, de banimento, penas cruéis e penas de trabalhos forçados. O Código Penal Brasileiro, em seu art. 18, normatiza que o preso mantém todos os direitos não alcançados pela perda da liberdade, conferindo a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral do detento. A Lei de Execuções Penais também, no Art. 40, disciplina tal matéria aduzindo que impõe-se a todas as autoridades o respeito a integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios.

LEP art. 41. Constituem direitos do preso: I – Alimentaçao suficiente e vestuario; II – Atribuiçao de trabalho e sua remuneraçao; III – Previdencia social; IV – Constituiçao de peculio; V – Proporcionalidade na distribuiçao do tempo para o trabalho, o descanso e a recreaçao; VI – exercicio das atividades profissionais, intelectuais, artisticas e desportivas anteriores, desde que compativeis com a execuçao da pena; VII – assistencia, a saude, juridica, educacional, social e religiosa; VII – proteçao contra qualquer tipo de sensacionalismo; IX – entrevista pessoal e reservado com o advogado; X – visita do conjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI – chamamento nominal; XII – igualdade de tratamento, salvo quando as exigencias da individualizacao da pena; XIII – audiencia especial com o diretor do estabelecimento; XIV – representaçao e petiçao a qualquer autoridade em defesa de direito; XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondencia escrita, de leitura e de outros meios de informaçao que nao comprometam a moral e os bons costumes; XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena de responsabilidade da autoridade judiciaria competente.

Para Silva (2009) a prática da tortura que percorre a história foi durante séculos utilizada e existe desde os tempos de seu descobrimento pelos portugueses, como obtenção de meio de provas através da confissão e como forma de castigo a prisioneiros, tendo os índios que aqui habitavam, sofrido com os novos tratamentos trazidos do velho continente, e como um exercício de vingança, sobre os corpos daqueles que se insurgiram contra o poder e a força do Rei; daí, os suplícios serem públicos.

A verdade é que o fato do ser humano sofrer de forma deliberada de tratamento desumano, degradante e cruel, com a finalidade de produzir sofrimentos físicos ou morais, é tão antigo quando a história da própria Humanidade. Houve uma época, não tão distante em que a Igreja e o Estado usavam a tortura como formas legais de expiação de culpa ou como forma legal de pena. Haja vista a Inquisição, os regimes totalitários e a doutrina de Segurança Nacional não foram diferentes em seus métodos e objetivos (SILVA, 2009, p. 29).

Observa-se que uma das causas do crescimento da violência urbana no Brasil é a aceitação social da ruptura constante das normas jurídicas e o desrespeito à noção de cidadania, que muito foi esquecida nos bancos da escola. A sociedade admite passivamente tanto a violência dos alunos contra professores e vice-versa, bem como dos agentes do estado contra as pessoas mais pobres. A impotência e ou a falta de vontade política dos poderes da República, infestados pela corrupção e invadidos pela incompetência, para combater a tortura e os maus-tratos da parte dos policiais contra os suspeitos, prisioneiros etc., voltou seu poder de fogo para vigiar e punir a sociedade civil, principalmente no âmbito familiar (SILVA, 2009).

Desta forma, a tortura passou a ser empregada como um meio de obter-se a confissão dos chamados criminosos pela Igreja, que assim teriam condições de salvar suas almas, já que com esta atitude estaria suposto o arrependimento do crime. Nos processos da Inquisição a tortura ao mesmo tempo se caracterizava pela publicidade, o que facilitou, por meio da intimidação, garantindo o poder dos governantes.

A Constituição Federal vigente determina, em seu art. 5º, XLIII, que: “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem” (SILVA, 2009, p. 29).

Depois de citar o artigo 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal brasileira, o autor comenta que a tortura estava condicionada à feitura de uma lei ordinária federal que a regulamentasse, entretanto, continua o autor “passaram-se quase dez anos para que o legislador elaborasse a aludida lei” (p.29). Tal fato, mencionado por Silva (2009), demonstra a incompetência e o desleixo dos poderes constituídos e ou da classe política brasileira, principalmente o legislativo, de resolver problemas gravíssimos da sociedade brasileira.

Nossa Carta Magna de 1988, adiantada em muitíssimos aspectos de garantias fundamentais da liberdade do cidadão, disse menos que essas garantias históricas, limitou-se a afirmar que “a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada” (art. 5º, inc. LXII). É verdade que a Constituição almejou que essa prisão fosse imediatamente submetida ao controle de legalidade pelo poder judiciário. Tanto é que no inciso LXV desse mesmo artigo proclama: “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”. Ao dissertar sobre crime de tortura, o professor Uélton Santos Silva (2009) afirma que a tipificação desse crime de tortura diferenciou-se da ideologia seguida pela ONU e pela OEA de considerar tortura apenas quando há relação com agentes do Estado. A lei brasileira 9.455/97, diferentemente das Convenções supracitadas, definiu de forma mais completa a tortura e trouxe, com isso, a punição da tortura doméstica, atualmente muito combatida no Brasil, e amplamente divulgada pela mídia, embora, como já foi dito, tortura e maus-tratos por parte dos agentes policiais do Estado raramente são punidos.

Art. 1º Constitui crime de tortura:

I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:

a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;

b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;

c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

II – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Pena – reclusão, de dois a oito anos.

§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita à medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

A sociedade brasileira está ainda muito marcada pela arrogância e prepotência das classes sociais mais elevadas em detrimento das mais baixas, prevalecendo uma espécie de hierarquia entre os cidadãos. Os valores da igualdade são apenas teóricos e propagandistas, já que o governo e seus ministérios gastam fortunas na mídia para tentarem provar que a democracia no Brasil existe de fato e de direito. Com relação ao agente da tortura, a lei brasileira determina aumento de pena para o crime cometido por agente público (lei 9.455/97, artigo 1º, §4º, I), entretanto, para caracterizar o crime, não é necessário que o agente seja público. Essa concepção transcende a da Convenção da Organização das Nações Unidas, que demanda, necessariamente, para a configuração do crime de tortura, a qualidade de agente público. Em 2007 a Organização das Nações Unidas lançou um relatório sobre a tortura no Brasil, denunciando que essa prática é “sistemática” e “generalizada”, especialmente em suas carceragens e penitenciárias.

O último dos crimes previstos no capítulo III do Código Penal brasileiro estabelece:

Art. 136 – Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina:
Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano, ou multa.
§ 1º – Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 2º – Se resulta a morte:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.
§ 3º – Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos.

Segundo o texto legal acima, a tipificação penal visa proteger o objeto jurídico da incolumidade da pessoa, reprimindo os abusos correcionais e disciplinares que a expõe a perigo. Trata-se de um crime próprio, diferente da lesão corporal, que é um crime de dano e ainda não exige relação jurídica entre vítima e agressor, onde o sujeito ativo desse crime se conecta a vítima. De tal modo, temos como pressuposto a existência de uma relação jurídica, seja pública ou privada, preexistente entre o sujeito passivo e o sujeito ativo do crime (SILVA, 2009).

Dessa forma, a utilização da tortura no Brasil tem origem, na maioria dos casos, na esfera das autoridades públicas policiais e contando ainda com a corroboração do Poder Judiciário, que perdeu totalmente o controle da situação de presos que embora tenham cumprido sua pena continuam encarcerados em condições periclitantes. O sistema prisional brasileiro, além de dispendioso para a nação, é ineficiente, ineficaz, justamente porque é moroso e antiquado.

A atividade das organizações de Direitos Humanos no Brasil ainda é tímida, justamente devido à violência e a impunidade reinantes no País. A morte de defensores de Direitos no Brasil é mais comum onde há maior atuação, como, por exemplo, no âmbito agrário e ou rural. Por isso, talvez, as atividades a favor dos direitos humanos dos suspeitos e presidiários sejam muito brandas no Brasil, pois ninguém quer morrer por uma causa aparentemente perdida. Em 28 de setembro de 1984, a Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes foi alvo de proposta pela ONU e ainda foi ratificada por 124 países. O elevado número de adesões expõe o alcance do consenso internacional sobre o tema, bem como a necessidade de os Estados-membros adotarem medidas capazes de prevenir, punir e erradicar essa prática, que afronta a consciência ética contemporânea do ser humano. O caos na ressocialização pode ser observado claramente no sistema prisional brasileiro, visto que os estabelecimentos prisionais se encontram sempre superlotados, estimulando a violência e em nada tem contribuído para a reabilitação eficaz do detento, o que possibilitaria o seu reingresso a sociedade. O Brasil não possui um sistema prisional e sim muitos.

O ordenamento jurídico brasileiro apresenta no artigo 26, II, da Lei de Execução Penal, a definição de egresso, referindo-se a egresso o liberado definitivo durante o tempo determinado de um ano, iniciando a contagem do prazo a partir da liberação ou saída do estabelecimento penal, e ainda, o liberado condicional, durante o período de prova. Segundo Mirabete (2003) assim leciona sobre o egresso:

O liberado definitivo é aquele que cumpriu a pena privativa de liberdade integralmente ou foi beneficiado por qualquer causa extintiva da punibilidade após ter cumprido parte da sanção imposta. […] Também é considerado egresso o liberado condicional enquanto durar o período de prova, que poderá ser inferior, igual ou superior a um ano, dependendo, evidentemente, das condições particulares do beneficiário.

Abarca-se, também, na definição de egresso aquele que é desinternado, ou aquele que foi concedido à medida de segurança. Assegurado pela citada Lei, o egresso disponibilizará da assistência pós-penitenciária pelo limite de um ano, a contar da data em que foi posto em liberdade. No entanto, acabado o prazo, que não pode prorrogar, ele perderá a qualificação jurídica de egresso, necessitando ser conduzido, se necessário, ao serviço social comum.

As condições que o egresso encara ao sair da cadeia é das piores, sem contar com o agravante que leva consigo de ex-condenado. Deste modo, o egresso deve resistir aos preconceitos, humilhações, discriminações, onde as oportunidades se tornam nulas e as portas se fecham e todas as condições de sobrevivência digna se tornam improváveis. Por um lado, a reinserção está sobretudo sujeita ao próprio delinquente, a adaptação ou reajuntamento social fica dependente também do grupo ao qual retorna, pois a sociedade recusa o egresso atribuindo uma condenação além da punição ao infrigir a norma jurídica penal. Portanto, a sociedade ao invés de acolher o egresso que procura se reinserir, o rejeita. Logo o empenho que podem ser realizados para o processo de reajuntamento social é inevitável, pois o egresso encontrará comumente uma sociedade fechada, individualista que o incentive a cometer novos delitos.

Recluso da vida social e sem condições de subsistência, o egresso fica sem alternativa e retornar a delinquir para sobreviver. A sociedade não concede oportunidade ao egresso para atuar no mercado de trabalho, logo acabam por contribuir que este volte a cometer delitos de modo a manter a si e a sua família, voltando ao obscuro sistema penitenciário. A ONU dispõe as Regras Mínimas no artigo 81, e como deveriam ser oferecidos os serviços direcionados ao assistir o egresso:

Serviços ou organizações, governamentais ou não, que prestam assistência a presos libertados, ajudando-os a reingressarem na sociedade, assegurarão, na medida do possível e do necessário, que sejam fornecidos aos presos libertados documentos de identificação apropriados, casas adequadas e trabalho, que estejam conveniente e adequadamente vestidos, tendo em conta o clima e a estação do ano, e que tenham meios materiais suficientes para chegar ao seu destino e para se manter no período imediatamente seguinte ao da sua libertação.

Diante a revelação é legível a inquietação que o legislador evidencia acerca da realidade do egresso, especialmente no que tange ao estigma aplicado pela sociedade, capaz de rejeitar decisivamente o sujeito. Ante a carência de políticas públicas, advindas ao estigma de ex-detentos, é agravado pelo desinteresse de grupos econômicos e administradores do governo em propagar programas e soluções objetivando garantir ao egresso do cárcere, uma profissionalização para uma provável admissão no mercado de trabalho. O objetivo central da lei de execução penal é recuperar o detento para reinserí-lo ao convívio social. Não obstante o conceito de ressocialização alcance de maneira formal o sistema normativo. Para Bitencourt (2004):

As prisões, que deveriam revestir-se de um caráter de estágio, para preparar e ressocializar os sentenciados, visando à sua volta ou o seu reingresso à vida em liberdade no seio da sociedade, pela falta de estrutura física e organizacional adequada, fogem completamente, a qualquer padrão mínimo a ensejar dita regeneração.

Contudo na prática, essa reeducação não existe. Atualmente, a principal preocupação do Estado não é reeducar o indivíduo, e sim privá-lo de sua liberdade. Deste modo, Cerqueira (2008) comenta:

O paradigma da recuperação não obstante legitimar perante a sociedade a pena de prisão, conciliando-se com a ideologia e a lógica jurídico-formal do Estado Moderno liberal, não consegue concretamente compatibilizar as contradições e conflitos lógicos, estruturais e práticos das finalidades que concilia no plano teórico e legal.

Considera-se que a pena de reclusão não acata o seu emprego ressocializador, ficando comprovado a falha no sistema. Sobre esse tema disserta Coelho (2005):

Tem-se, então, que a principal expectativa depositada pela sociedade na pena de reclusão no sistema carcerário é a recuperação do apenado com a sua reinserção adaptada ao meio social, porém, apesar desta expectativa, a chamada crise na prisão se encontra vinculada ao não cumprimento efetivo dessa finalidade ressocializadora, o chamado fracasso da prisão em recuperar o indivíduo nela internado.

Perante tais verificações, o sistema carcerário ao invés de impedir a delinqüência, demonstra incitá-la e isso advém porque, nelas, os alojamentos não possuem condições favoráveis, a falsidade impera, convertendo o transgressor em um indivíduo humilhado e submisso, dificultando sua readaptação e reinserção na sociedade. Wacquant (2001) instrui acerca da ressocialização do apenado, do sistema falho e da probabilidade de regenerar o indivíduo:

A recuperação do criminoso, portanto, visando a sua não reincidência na prática delituosa; entre nós, é um mero sonho de verão, um sonho vazio, uma quimera grotesca, um mero devaneio romântico. E ainda existem aqueles que, erroneamente, pensam que a redenção dos criminosos é algo absolutamente impossível! Ora, por pior que seja o delinqüente, sempre resta dentro dele uma partícula, por mais pequena que seja, no entanto,com o condão de a qualquer momento, poder propiciar-lhe a recuperação. O delinqüente, mesmo que se mostre um ser humano de comportamento violento, contraditório, místico, misterioso, incoerente, paradoxal, frio e calculista, é perfeitamente passível de emenda se submetido a um adequado tratamento moral, intelectual, psicosomático, profissionalizante, etc., disso não se tem dúvida, mesmo em sabendo que a personalidade humana, muitas vezes, é o mais estranho polígono de forças físicas e psíquicas ou morais que, não raro se chocam violentamente entre si.

O homem espera e imagina concernente à ressocialização, uma sociedade em que sobressaia a norma posta como realizadora do benefício comum, onde a lei é igualitária a todos e o egresso seja resguardado das garantias que lhe são legitimamente asseguradas. O conceito de reabilitação foi totalmente desmistificado, nos anos 80, e as teorias que assumiam a punição como forma de tratamento e ressocialização foram desmascaradas diante de argumentos ambíguos sobre a execução penal, que deveria ser um dos pilares para a construção de um Estado Democrático de Direito, mas que se mostra muitas vezes ilegítima e irracional.

Conforme Favaro (2008), duas teorias procuram explicar o porquê de o homem carregar dentro de si o espírito vingativo. A primeira é que o desejo de vingança é um tipo de toxina existente na mente apenas das pessoas rancorosas. Isso pode ser atribuído a perturbações mentais ou morais, a pais ausentes na infância, a fatores culturais. A outra possibilidade é que se trata de um sentimento tão natural no ser humano quanto o amor, o ódio e o medo. Com o passar do tempo a vingança deixou de ser algo privado e passou a ser um assunto de Estado associada à organização do sistema judicial, que ficou responsável por um complexo sistema de leis e práticas judiciais, legitimando o uso da violência na aplicação da lei. Michel Foucault (1987) aborda de forma incansável a problemática do crime e do castigo. Sua principal preocupação em seu ensaio “Vigiar e Punir” não é tanto a narração de atos violentos (suplícios e outros), praticados no passado com o objetivo de fazer justiça, mas o modo como a violência foi enquadrada e legitimada pelo sistema judicial.

O processo judicial, baseado até então quase exclusivamente na acusação, passa a admitir a defesa do criminoso; exige a exibição da prova, atenuantes e a possibilidade de perdão ou comutação da pena, entre outras disposições legais que visam humanizar o sistema judicial. De acordo com Junqueira (2005), a tradição, sabiamente, nos diz o seguinte: as transformações tem que passar pela educação. Não se muda um pais sem educar as pessoas. E aqui, é preciso entender o novo paradigma educacional.

Antigamente, quando se falava no educador, pensava-se apenas no professor. Hoje, quando se fala em educador, temos que pensar no empresário, no medico, no sociólogo, no funcionário público, na polícia. Todas as profissões que trabalham diretamente, em circunstâncias influentes, com gente, tem uma dimensão que antecede o seu específico profissional, que alcança dimensões pedagógicas.

Dessa forma, para que haja a ressocialização do preso é preciso saber preparar o recuperando convenientemente e depois devolvê-lo à fonte que o gerou, sem transformá-la, com certeza vai dificultar a reinserção social daquele que cumpriu a pena. É necessário, pois, mudar também o ambiente do qual ele emergiu: sua família, assistindo-a e orientando-a, com o fito de capacitá-la ao reencontro. Diante desse sério problema apresentado nos tópicos anteriores, serão apontados meios como possíveis soluções para o assunto aqui tratado. Primeiramente há de se abordar a Privatização do sistema carcerário. Existe os que consideram a privatização como sendo uma provável solução para caótica realidade nas casas prisionais.

A superlotação dos presídios e das cadeias públicas, motins, rebeliões, tentativas de evasão juntamente com o custeamento dos presos, tornam-se os fundamentais argumentos daqueles que amparam a privatização do sistema carcerário. Os autores defendem que um sistema prisional arruinado pode vir a ser restaurado pela iniciativa privada, com um efeito maior na execução da pena de prisão e com uma despesa menor aos cofres públicos. Nesse modelo a empresa privada se responsabiliza pela edificação do presídio e pela sua administração, recebendo uma quantia pré-estabelecida do Estado pela atividade dessa função. Assim a privatização decidiria de uma maneira eficiente a problemática da superlotação dos presídios, com uma despesa menor ao Estado, o que Minhoto (2000), diz:

As empresas privadas, estimuladas pelo lucro, teriam melhores condições de gerenciar a situação carcerária nacional do que o próprio Estado, uma vez que este, há muito tempo, não investe com seriedade na melhoria do sistema penitenciário. Mas como confiar a uma iniciativa privada, onde a finalidade é unicamente o lucro, a manutenção de um sistema que lida com a  punição da corrupção e do enriquecimento ilícito, bem como inúmeros outros casos onde a finalidade lucrativa leva a pessoa humana a delinqüir. Seria no mínimo, muito perigoso, mesmo sobre a vigilância do Estado.

Conforme a Constituição Federal Brasileira, em seus artigos 2° e 144°, que abordam a autonomia do Estado sobre a pretensão e, efetivação das medidas punitivas, e sendo esta, a execução penal expansão da atividade jurisdicional interessando à segurança da comunidade, os estabelecimentos penais, onde ocorre a execução da pena, não podem ser privatizados. Além disso, as funções de guarda de presos, gerência e chefia do estabelecimento são de alçada exclusiva, e, por isso, indelegáveis aos particulares, cargo que procedem da soberania do Estado, bem como o julgamento dos ilícitos penais, o bom emprego das sanções e todo o acompanhamento do cumprimento da pena.

A secundária e provável solução a ser combinada é o trabalho aplicado ao apenado, com o intuito de custear as suas despesas carcerárias. O trabalho como forma de ressocialização é atribuído como solução, no mundo e na vida em sociedade, desde os primórdios. No Brasil, o trabalho para o apenado, surge desde o Código do Império, onde se estipulava dois tipos de pena, que era a prisão com trabalho e a prisão sem trabalho (prisão simples). No século XX, o trabalho na execução da pena, deixa de apresentar-se apenas como conceito ressocializador e transpõem outros desígnios como ganhos salariais, dependendo do grupo pertencente do preso. Um excelente exemplo, na oposição de um sistema falido, vem por meio da educação e da arte. Um grupo de 40 detentas do Centro de Reeducação Feminino Maria Júlia Maranhão (Bom Pastor), em João Pessoa, participa de um projeto que tem transformado a conduta delas em todos os aspectos, seja na disciplina, no trato com suas parceiras de cela, seja no campo emocional e psicológico, que as conduz a motivação e esperança de um futuro melhor.

As presas estudam e bordam artefatos em algodão colorido. Além de contribuir na ressocialização e a diminuir a pena, está garantindo uma renda para as famílias. Por volta de 3 mil peças já foram bordadas e o trabalho das detentas paraibanas está sendo exportado inclusive para o exterior (Madri e Paris) e lá tem sido aprovado e despertado o interesse em importá-los cada vez mais; motivando não só as detentas como também aqueles que investem no projeto. A cada três dias trabalhados, é diminuído um dia da pena”, informou a diretora da unidade, Vitória Régia de Oliveira Gonçalves, adicionando que o presídio está com 184 detentas e a capacidade é para apenas 80.

As penas restritivas de direitos, apontadas penas alternativas que, além de impedir que o condenado passe um processo de prisionização (que o tornará impossibilitado ao convívio na comunidade livre), proporciona uma real probabilidade de reeducá-lo para a convivência social, além de propiciar uma reparação à sociedade especialmente por meio das penas de prestação de serviços à comunidade. A realização dessas ações e o aumento considerável no número de cursos oferecidos é fruto de uma rede de parcerias firmadas entre esta Secretaria de Estado de Justiça e as demais Instituições e colaboradores como: SENAC, SENAI, SETRAB, SEBRAE, Consulado da Mulher, CETAM, Instituto Amazônia, que unem seus esforços para proporcionar a nossa população carcerária a preparação profissional necessária para a futura reinserção no mercado de trabalho, e assim retribuir a sociedade através de seu trabalho, com o fito de compensar os danos causados.

Aí sim, tornando-o produtivo econômico e socialmente poder-se-á refletir na melhor forma de compensação do prejuízo causado à comunidade além de, sem sombra de dúvida, ser a melhor satisfação que os órgãos públicos poderiam proporcionar à sociedade com relação aos recursos investidos; caro sim, mas a longo prazo muito barato.

2 DISCUSSÃO DOS DADOS

Sendo nosso objetivo, apresentado nesta pesquisa, o de Analisar a Eficácia do Sistema Prisional, a partir do COMPAJ em Manaus, neste capítulo faremos a sistematização da tabulação e análise dos resultados, conforme definido em nosso objetivo geral, o levantamento dos dados procuram identificar e traçar o perfil do detento.

2.1 ANÁLISES DOS DADOS DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA

Para atingir os objetivos específicos partimos da análise dos dados da população carcerária no site do DEPEN, do Complexo Penitenciário Anísio Jobim – COMPAJ, situado na Rodovia BR 174 – Km 8 s/n, cuja capacidade é de 556 vagas, contudo há 1012 o que constata-se 456 em situação excedente, ou seja, um percentual de 82,02% de lotação.

Figura 06 – Complexo Penitenciário: COMPAJ
Fonte: FERREIRA (2006)

Dessa forma, após tabulados as perguntas feitas e que se apresentam adiante, verificamos o que se segue:

OPÇÕESQUANTIDADE%
18 a 24 anos13613,44%
25 a 29 anos40640,12%
30 a 34 anos25124,8%
35 a 45 anos17817,59%
46 a 60 anos403,95%
Mais de 60 anos10,1%
TOTAL1012100,0
Tabela 01 – Demonstra a Faixa Etária do detento.
Fonte: DEPEN (Período de Janeiro a Junho de 2021)

Gráfico 01 – Representativo dos dados observados
Fonte: DEPEN (Período de Janeiro a Junho de 2021)

O estado do Sistema carcerário brasileiro não é satisfatório, muito pelo contrário, o sistema é preocupante e decadente, considerando que o ambiente carcerário no estado a qual se encontra, não permite realizar nenhum trabalho reabilitador sobre o recluso. E ainda que, as condições materiais, por muitas vezes, são cruéis e desumanas.

Diante desta precariedade, que buscam-se soluções alternativas coerentes e concatenadas para o sistema atual, tendo fomentado as discussões em torno desse problema social, cuja causa muito se discute e pouco se faz para solucionar; as idéias e projetos existem, contudo apoio e suporte governamental com políticas públicas efetivas ainda são escassas. A falta de infra-estrutura e o total descaso dos nossos governantes tem contribuído de forma significativa para a transformação das penitenciárias brasileiras em verdadeiras “escolas do crime” (grifo meu). Se por um lado, os maus tratos, as celas lotadas, as condições precárias, a falta de alimentação adequada e o meio insalubre trazem o arrependimento do preso pelo crime cometido, por outro, também trazem a revolta.

Além disso, a falta de um acompanhamento psiquiátrico e a não utilização de atividades intelectuais e esportiva acabam por arruinar a integridade física e moral do apenado, propiciando dessa forma ao cultivo de pensamentos perversos e banais, não contribuindo de forma alguma a sua reabilitação, pelo contrário, prejudicando-o ainda mais, e escondendo-se um problema que virá à tona cedo ou tarde. Como se não bastasse, quando o delinquente readquire a liberdade, depara-se com os obstáculos impostos por uma sociedade preconceituosa e excludente que não consegue enxergá-lo como um indivíduo normal (isso no caso de ele ter sido realmente recuperado), aplicando-lhe outras sanções igualmente severas, que é a falta de oportunidade no mercado de trabalho, o desemprego, a falta de cidadania básica, etc. Acerca da ressocialização do condenado, do sistema falho e da possibilidade de regeneração do indivíduo Falconi (1998) leciona:

A recuperação do criminoso, portanto, visando a sua não reincidência na prática delituosa; entre nós, é um mero sonho de verão, um sonho vazio, uma quimera grotesca, um mero devaneio romântico. E ainda existem aqueles que, erroneamente, pensam que a redenção dos criminosos é algo absolutamente impossível! Ora, por pior que seja o delinqüente, sempre resta dentro dele uma partícula, por mais pequena que seja, no entanto,com o condão de a qualquer momento, poder propiciar-lhe a recuperação. O delinqüente, mesmo que se mostre um ser humano de comportamento violento, contraditório, místico, misterioso, incoerente, paradoxal, frio e calculista, é perfeitamente passível de emenda se submetido a um adequado tratamento moral, intelectual, psicosomático, profissionalizante, etc., disso não se tem dúvida, mesmo em sabendo que a personalidade humana, muitas vezes, é o mais estranho polígono de forças físicas e psíquicas ou morais que, não raro se chocam violentamente entre si.

No que se refere à eficácia da ressocialização no Sistema Prisional, o homem acredita e idealiza uma sociedade em que prevaleça a norma posta como realizadora do bem comum, cuja legislação seja abrangente e igual para com todos e na qual o egresso possa ter o amparo dos direitos e garantias que lhe são legalmente asseguradas na Lei de Execução Penal.

Diante do exposto, a única alternativa é voltar a cometer os mesmos crimes, a fim de que possa sobreviver, o que concretiza e embasa a teoria criminogenea e ainda, mantêm o ciclo recorrente do vício: Liberdade, Inadaptação, Novo delito e Regresso a Prisão.

CONCLUSÃO

O direito de punir iniciou-se em um período no qual não havia sociedade politicamente organizada e as penas eram impostas por meio das vítimas, o que constituía a vingança privada, prevalecendo exclusivamente seu caráter retributivo. Posteriormente, no período da vingança divina passou a ter dois objetivos: punir e intimidar. Atualmente, a pena possui três objetivos fundamentais: a retribuição, a prevenção e, principalmente, a reeducação.

Sabe-se que as penitenciárias brasileiras passam longe das descrições da lei, demonstrando as falhas de um sistema corrupto, não confiável e que sofre com a falta de infra-estrutura necessária para garantir o devido cumprimento da lei. Em face disso, a sociedade se apresenta descrente na ressocialização do preso, continuando a vê-lo como um preso, o qual, apenas, tem direito a permanecer extramuros, rejeitando-o. O próprio Estado não cumpre as leis, como exemplo tem a Lei de Execução Penal. Nas prisões, o condenado não perde somente sua liberdade, mas todo seu direito enquanto ser humano; as celas abrigam homens, sãos e doentes, primários e reincidentes, provisórios e condenados, de maior e menor potencial ofensivo, considerando todos em igualdade, sem a devida individualização do delito e da pena. Conseqüência disso: superlotação, rebeliões, óbitos, fugas, reincidência, embrutecimento. Aqui fora tratado do problema e apontado algumas hipóteses de solução, limitando-se até onde foi pesquisado, para assim obter uma maior aplicação das penas nas restritivas de direito, um melhor planejamento e aplicação do trabalho dentro das penitenciarias, dentre outras, sendo de forma mais plausível possível. Idéias concatenadas que convergem a um único ponto, a busca de soluções para o estado que nos encontramos, não só no Brasil como no Amazonas.

Concluí-se, que o sistema prisional ideal é aquele que conta com trabalho para o detento, que lhe retire da inércia que tanto incentiva a prática delituosa, pois o trabalho dignifica o homem. O sistema deve ser custeado pelo próprio preso e não pela sociedade, pois basta o ilícito que cometera e que a sociedade pagara com sua vitimização. O sistema deve ser bem estruturado a garantir uma vida saudável ao preso, pois só assim terá este condições físicas e psicológicas de se recuperar. E por último, o sistema deve ter a participação da comunidade na ressocialização do preso. Pois, quando essa tarefa fica somente nas mãos do Estado, não se consegue obter a mesma eficiência que se teria com a participação da sociedade.

REFERÊNCIAS

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1 Especialista em Direito Militar pela Universidade Cruzeiro do Sul – SP, Possui graduação em Segurança Pública pela Universidade do Estado do Amazonas – UEA. Oficial da Polícia Militar do Estado do Amazonas.