REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10249091638
João Wilson Savino Carvalho1
João Ademir Costa Sá2
Resumo
O presente trabalho parte da observação em uma instituição de Longa permanência do município de Macapá – o Abrigo São José que presta serviços de cuidado e ajuda a idosos em vulnerabilidade social e sem vínculos familiares de assistência, que em algum momento solicitam a interferência do estado ou de outra instituição de cuidado concernentes a sua idade e sua situação particularizada de tratamento e as implicações do modo de convivência dentro dessa ILPI. Como o conjunto de regras e normas instituídos dentro dessa instituição total de cuidado moldam e interferem na convivência e na relação desses idosos institucionalizados com seu familiares, amigos, parentes e entes queridos e o quando afetam a vida, o comportamento dos idosos, sua individualidade e o auto entendimento, levando a pequenas concessões de sua liberdade e autonomia; criando uma maneira impar que mescla o individual e o impessoal para lidar com essas pequenas imposições em relação a construção de sua nova maneira de interagir com os outros idosos institucionalizados.
Instituição de cuidado; Ilpi; Institucionalização de idosos; Desconstrução do Eu.
Abstrat
This work is based on the observation of a Long-term care institution in the municipality of Macapá – Abrigo São José, which provides care and assistance services to elderly people in social vulnerability and without family ties of assistance, who at some point request the interference of the state or another care institution concerning their age and their particularized treatment situation and the implications of the mode of coexistence within this ILPI. How the set of rules and norms instituted within this total care institution shape and interfere with the coexistence and relationship of these institutionalized elderly people with their family, friends, relatives, and loved ones and how they affect the life, behavior, individuality, and self-understanding of the elderly, leading to small concessions of their freedom and autonomy; creating a unique way that blends the individual and the impersonal to deal with these small impositions regarding the construction of their new way of interacting with other institutionalized elderly people.
Care institution; ILPI; Institutionalization of the elderly; Deconstruction of the Self.
1 – INTRODUÇÃO
O envelhecimento é um processo natural, faz parte da fisiologia humana. O mundo todo passa por uma reformulação e nova forma de pensar o envelhecimento, esse processo inerente ao ser humano. Diversas são as formas de envelhecimento e suas reações e maneiras de envelhecer. Para alguns é um processo doloroso, doentio e para alguns um processo saudável e devemos pensar num envelhecimento repleto de saúde. Esse processo ou etapa da vida é seguida por alguns com suas particularidades. Alguns nesse processo cortam laços familiares, optam em viver uma vida solitária, outros escolhem não ter filhos e seguem sozinhos nessa etapa de suas vidas, mas com o passar do tempo e avanço tecnológico e de pesquisas de saúde essa faixa etária passou a gozar de uma melhor qualidade de vida, devido uma série de avanços científicos e tecnológicos em saúde e prevenção.
O Brasil avançou muito em relação ao direito dos idosos, impulsionados pelo aumento dessa população que, em 2025, será da ordem de 15 vezes, colocando o país na sexta colocação em todo o mundo em termos de população de idosos.
Faz-se necessário pensar em políticas públicas que contemplem essa população, mas antes de tudo é necessário olhar essa fase da vida com olhar de humanidade e entender a particularidade e especificidade desse processo, em especial a questão da institucionalização.
A Instituição de Longa Permanência para Idosos Abrigo São José, onde foi realizada a pesquisa, foi fundado em 18 de março de 1965 criada por voluntários (Associação de Voluntários da Amapá) hoje tem como mantenedor o Governo do Estado do Amapá e está vinculada à Secretaria de Mobilização Social (SIMS), que atualmente presta existência na modalidade asilar a idoso com vínculos familiares rompidos ou não.
Inúmeras são as causas da institucionalização dos idosos que chegam a Abrigo São José, em Macapá (AP). Casos que vão desde aplicação de medidas judiciais de institucionalização até os mais simples, motivados por vulnerabilidade social, rompimento de laços de familiares, vida erma, nas ruas e outros fatos, mas sempre refletindo histórias e situações que representam alto risco familiar e social, e que por isso justificam uma atuação teoricamente embasada na compreensão desse problema.
O presente texto é resultado de um trabalho de observação dos idosos institucionalizados na Instituição de Longa Permanência (ILPI) Abrigo São José, uma instituição total de cuidado, incidindo sobre a influência do convívio dos idosos em uma vida repartida, coletivizada com outros idosos com os quais nunca tiveram contato e convívio próximo, e também sobre a influência das normas e regras rígidas que precisam ser seguidas e obedecidas pelos idosos para funcionalidade da instituição, no que se inclui a objetificação de metas a serem cumpridas pelos técnicos e corpo técnico de apoio, responsáveis pelo cuidado dos idosos institucionalizados nessa instituição total.
Essas regras rígidas e impessoais, junto com o isolamento do mundo pelos seus grandes muros, abandono familiar e dificuldade em se adequar a esse mundo do institucionalizado, são compreendidos com fatores fundamentais para a perda de autonomia e desconstrução do Eu dos idosos, que para se adaptar a sua nova realidade, se veem obrigados a cumprir essas regras e arranjar maneiras diferentes de agir com intuído inteligente de sobreviver e de adequar as novas formas de viver, conviver e existir nesse espaço reduzido sem privacidade e compartilhamento de sua vida e alguns casos de suas coisas com a coletividade.
A metodologia adotada foi a observação participante porquanto permite a possibilidade de uma visão privilegiada da complexidade dos mais diversos fenômenos sociais estudados, garantindo ao observador uma possibilidade de mergulho dessa complexidade e melhor entendimento e do funcionamento dos fenômenos sociais estudados e das hipóteses levantadas dentro desse processo até sua constatação. Através dessa observância o pesquisador se distancia de prejulgamentos ou apreensões pré-elaboradas, observando no interior e do interior das relações realmente o que importa ao grupo e discernir os acontecimentos relevantes que surgem no meio da pesquisa.
Nesse sentido apresentamos como base principal os estudos de Malinowski (1978) e Whyte (2005) sobre os fundamentos da observação participante, e especial Goffman, que acredita que é justamente essa interação “face a face” que determina e impulsiona a ação coletiva. Assim, compreendendo perfeitamente que a posição de observador não o torna um idoso institucionalizado, cabe enfatizar que a observação participativa tem, dentro da pesquisa qualitativa no campo social, sua prerrogativa e excelência no desvendar da essência do que está a ser observado. Minayo, afirma:
Definimos observação participante como um processo pelo qual um pesquisador se coloca como observador de uma situação social com a finalidade de realizar uma investigação científica. O observador, no caso, fica em relação direta com seus interlocutores no espaço social da pesquisa, na medida do possível, participando da vida social deles, no seu cenário cultural, mas com a finalidade de compreender o contexto da pesquisa. (MINAYO, 2013, p. 70).
1. ORIGEM DO ASILO E ABRIGAMENTO
A origem dos asilos remonta a Grécia. Primeiro convém descrever a origem histórica da palavra asilo que se correlaciona com a palavra abrigo. O termo “asilo” provém do grego “asylon” e do latino “asylum”, ambos significando refúgio, local de amparo, proteção e abrigo contra danos de qualquer natureza. Um lugar que remete a cuidado a inviolabilidade da integridade humana e de garantia de direitos das pessoas vulneráveis. O sentido de proteção é comum da humanidade e remontam a própria origem do homem
Geralmente o asilo era uma prática solicitada por estrangeiros. Os gregos usavam como uma prática política, que os diferenciava da barbárie notória de outros povos. Enobreciam sua hospitalidade e benevolência, pois, julgavam-se superiores a outros povos por de serem humanistas com os “outros” (estrangeiros, não gregos) que necessitavam e procuravam a essa prática por questões de cunho endógeno o estatuto do asylon era muito solicitado por outros povos na Grécia Antiga. Alimentados por uma consciência de hospitalidade Universal, o asilo nasce de dois vetores (hospitalidade e Humanidade), onde os perseguidos suplicavam por Hiketaía nos diversos templos sagrados e diversos locais de refúgio reservados aos estrangeiros para garantia de sua proteção, abrigo e amparo.
Os asilos sempre estiveram associados a praticas religiosas, apesar da quase ausência de fontes escritas que descrevam de forma contumaz e fidedigna tal pratica, acredita-se que já existiam lugares para proteção de perseguição na Antiga África e na Ásia, não havendo precedentes deste nos textos do Código de Hamurabi que nos levasse a pensar que associação a praticas religiosas tenha sido universalizada. Indicações mencionadas que se correlacionam com o sentido da palavra como conhecemos atualmente se encontram em textos egípcios a partir do século XIII, e quando em ‘Gênesis’ se faz referência a asilo de delinquentes comuns no Egito, após o Êxodo e o Pentateuco bíblico, encontramos várias referências bíblicas sobre esse respeito no Antigo Testamento sobre acolhimento aos que necessitam desse tipo de ajuda, pois, o deus dos hebreus Jeová dita a Moisés que depois da instalação do povo israelita, deveriam ser construídas cidades com a finalidade de asilar os estrangeiros inocentes que sofressem perseguição, cuja finalidade dessas cidades era a proteção desses inocentes para evitar seu assassínio e morte prematura,
Mas, sem sombra de dúvida, foi na Antiga Grécia que o termo asilo se desenvolveu e criou notoriedade, pois, os que fugiam de perseguições tratavam de se refugiar nos templos dedicados aos deuses e a procurar proteção divina, essa proteção era incondicional e depois de um certo tempo essas imunidades foram divididas. Asilo, propriamente dito, era privilégio de poucos templos e significava a imunidade total daqueles que fossem acolhidos, independentemente se fossem culpados ou inocentes. Em outros templos, que eram a grande maioria, as pessoas acolhidas esperavam ali para serem processadas. Sendo inocentes seriam protegidas incondicionalmente. Com a formação política das Cidades-estados gregas, surge a figura do protegido, associado geralmente a figura do estrangeiro o “novo protegido” que passa ser tratado como exilado e a proteção correlacionada a pena de exílio criada por crimes associados a política cometido muitas vezes em nome dos deuses e sua divindade.
Seguindo nesse pensamento, lembrarmos da lenda de Rômulo e Remo e da construção da grande Roma, e o que diz a lenda a respeito do templo erguido em nome do deus do Asilo, onde pessoas que o procurassem e fossem vítimas de perseguição seriam acolhidas e nunca seriam expulsos do templo, porém, anos depois a ideia de asilo político foi rechaçada em Roma e começa a ser enxergada como uma ameaça ao poder central do império.
O cristianismo foi pioneiro no amparo a idosos, acredita-se que o papa Pelágio II (520-590 dC), transformou sua casa em hospital para hospedar idosos em vulnerabilidade. Como se percebe, a ideia de abrigo está associada a ideia de guarita, proteção, cuidado físico e mental dos seus acolhidos. Muitos nomes foram dados de maneira aleatória a esses lugares como, por exemplo, Asilo, Abrigo, casa de descanso, casas de repouso, clínica geriátrica, enfim, apesar das diversas nomenclaturas procurou-se padronizar a denominação para instituições de longa permanência (ILPI), definindo-as como instituições de atendimento integral ao idosos, dependente fisicamente e psicologicamente ou não, sem condições de manter laços familiares ou com sua comunidade de origem.
Somente a partir do século XX, vemos o surgimento do asilo sociopolítico-econômico, voltado a assistência atrelado e extremamente relacionada às práticas religiosas a que Sanches denomina de prática Universal (Sanches, 2013). Em particular no Brasil voltada a uma prática assistencialista e voluntária e nunca correlacionada a uma lei ou um serviço prestado pelo estado embasado em lei, s em contar com os inúmeros casos e ao histórico brasileiro de que as instituições de cuidado sempre estarem voltados a essas práticas de cuidado aos mais pobres e vulneráveis, relacionado aos extremamente desfavorecidos pela sociedade, por esse motivo os abrigos sempre carregaram esse estigma e invisibilidade da construção positivista e moderna de Brasil.
2. A LEI E O IDOSO NO BRASIL
A História dos Direitos Especiais aos Idosos no Brasil começou praticamente a partir da Lei nº 10.741/03, conhecida popularmente como Estatuto do Idoso, entrou em vigor em janeiro de 2004. Vale salientar que muito mais abrangente do que a chamada Política Nacional do Idoso que foi implantada através da Lei nº 8.842/94, pois, o novo estatuto determina inúmeros benefícios e garantias à terceira idade, além de instituir penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadãos idosos, sejam masculinos ou femininos.
Os principais pontos do Estatuto do Idoso Brasileiro, historicamente garantem são o acesso ao lazer, cultura, esporte a todos os idosos, pois, assegura desconto de pelo menos 50% (cinquenta por cento) nas atividades culturais (teatro, cinemas…), de lazer e esportivas (jogos de futebol e outros do gênero). Determina ainda que os meios de comunicação: rádio, TV, jornais e outros meios deverão manter espaços (ou horários especiais) de programação de caráter educativo, informativo, artístico e cultural sobre o processo de envelhecimento do ser humano; em uma realidade a gratuidade nos transportes coletivos públicos para as pessoas maiores de 65 (sessenta e cinco) anos. A legislação Estadual e Municipal, em cada localidade por este Brasil afora, poderá dispor sobre a gratuidade também para as pessoas na faixa etária de 60 a 65 anos. No caso de transporte coletivo intermunicipal e interestadual, ficam reservadas duas vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a dois salários-mínimos nacionais, e garantido desconto de 50% (cinquenta por cento) para os idosos de mesma renda que excedam essa reserva em cada coletivo/horários
O Estatuto do Idoso proclamado pela Lei nº 10.741/03, descreve detalhadamente e criminaliza as condutas que não poderão ser praticados com os idosos. Os principais dispositivos legais que asseguram benefícios diversos aos nossos anciãos são: I) A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988; II) A Lei nº 8.842/94; III) A Lei nº 10.048/00; IV) O Decreto Federal nº 1.744/95; V) Decreto Federal nº 2.170/97; VI) Lei nº 8.926/94; VII) lei nº 4.737/65; VIII) Decreto Federal nº 1.948/96; IX) Lei nº 8.842/94; X) Portaria nº 280/99 do Ministério da Saúde; XI) Decreto nº 1.948/96; XII) Lei nº 9.656/98; XIII) Lei nº 5.478/68, e demais legislação complementar federal, estadual e municipal.
Finalmente, a Constituição Federal Brasileira endossa e determina textualmente em seu artigo 203, V, estabelece: “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei” e, no artigo 230, afirma que: “A família, a sociedade e o estado tem o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem estar e garantindo-lhe o direito à vida” porém nada se referindo ao seu direito de trabalho como base e condição de sustentação da vida. Ao contrário, no seu artigo 40, proíbe o idoso de trabalhar, impondo-lhe uma aposentadoria compulsória, letárgica e mortal. A inatividade para o idoso e algo penoso. E injusto e cruel associar o idoso a algo improdutivo, ou alguém sem vitalidade em estado parasitário e estagnação. O idoso não e isso, o idoso e alguém que atingiu a plenitude da maturidade, a plena capacidade de pensar, discernir, de interagir, de inventar, de criar algo e agir. Associar o envelhecimento ao não-produtivo e depreciar uma etapa de desenvolvimento humana importante e significativa.
3. DEFININDO INSTITUIÇÕES DE LONGA PERMANÊNCIA (ILPI)
Historicamente os registros existentes no que se refere a criação das primeiras instituições voltadas para amparo e proteção da pessoa idosa, eram cristãs e surgiram por volta do século V d.C. E eram conhecidas como asilos, abrigos ou lares e atualmente ainda são conhecidas por essa nomenclatura negativa, pois estava ligada fortemente a um aspecto de rejeição familiar, descaso ou fracasso existencial.
A definição usada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) define as Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI) como instituições governamentais ou não governamentais, de caráter residencial, destinadas ao domicílio coletivo de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, que tenham ou não suporte da família, e ofereçam esses serviços cumprindo normas sanitárias de liberdade e digna da pessoa humana em sua condição de desenvolvimento.
As normas de regulamentação são elaboradas segundo o Regulamento Técnico aprovado pela Resolução da Diretoria Colegiada- RDC/ANVISA Nº 283 de 26 de setembro de 2005, que define as normas de funcionamento para as Instituições de Longa Permanência para idoso. Assim, a instituição deve manter um padrão mínimo de infraestrutura física exigida pelo órgão a fim de oferecer o que garante o Estatuto do idoso e as normas de seguridade, higiene e de tratamento de que dispõe a lei. Segundo o Decreto n° 1948/96 regulamentada a Política Nacional de Idoso, a assistência na modalidade asilar ocorre no caso da inexistência do grupo familiar, abandono, carência de recursos financeiros próprios ou da própria família. E o idoso terá assegurada a assistência asilar pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, na forma da lei. Podendo nesse sentido oferecer mais de uma modalidade de serviço.
As Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI’s) são instituições governamentais ou não governamentais de caráter residencial, e domicílios coletivos de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, com ou sem suporte familiar, em condição de liberdade, dignidade e cidadania. Onde experiências individuais, histórias e experiências são vividas coletivas. Nesse contexto de institucionalização o idoso passa a interagir num espaço restrito com diversos outros e convivem e habitam muitas vezes um ambiente a eles estranho. Apesar do sentindo aparentemente negativo desta situação e o caráter preconceituoso dessas instituições, em muitos casos talvez sejam a única e melhor alternativa para s idosos e seus familiares, nesse sentido e bom conhecer o funcionamento dessas instituições e desenevoar a ideia que se tem sobre elas e incentivar num investimento que nelas transforme em moradas com dignidade e não apenas em depósitos de gente desvalida e (inúteis sociais).
4. HISTÓRICO DA ILPI ABRIGO SÃO JOSÉ
Em janeiro de 1965, com o Amapá ainda Território Federal, surge a ideia de construir uma casa para abrigar idosos, pela iniciativa da senhora Inah Mendes da Silva, primeira-dama do Território Federal do Amapá, esposa do então governador Luiz Mendes da Silva, que na época conseguiu reunir um grupo de senhores(as) voluntários(as), clubes de serviços e comerciantes locais para lhe ajudar a levar a frente o projeto de construção de uma casa de idosos em vulnerabilidade social, preocupando-se apenas com a visão filantrópica.
Em 30 de Janeiro do mesmo ano, foi criada a Associação de Voluntários do Amapá – AVA, para ser mantenedora do Abrigo de idosos. Em 18 de Marco de 1965, aconteceu a inauguração da casa de repouso denominada Abrigo São Jose, em homenagem ao padroeiro do município de Macapá, o qual e festejado no dia 18 de maio. No dia 24 de março de 1968 inaugura-se a Cúpula da Igreja Santa Rita de Cássia criada o pelo Bispo prelado de Macapá Dom José Marinho, os padres carmelitanos passam a administrar a assistência aos idosos que contava naquela época em suas instalações com 28 idosos. Em 20 de Marco de 1980 foi inaugurado o prédio de alvenaria. Era uma instituição não governamental, que se mantinha com recursos de convênios celebrados entre AVA, ONGs, comunidade e promotoria da Cidadania.
Em 20 de Outubro de 2005, a ILPI – Abrigo São José, passou ater como mantenedor o Governo do Estado do Amapá, através de Secretaria da inclusão e Mobilização Social – SIMS, conforme disposto no decreto Executivo n 4765/2005, no qual institui a gerencia do projeto implementação das Ações de Atendimento ao Idoso-Modalidade Asilar, com o objetivo de coordenar o atendimento aos idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, em situação de vulnerabilidade social, através da modalidade de longa permanência, centro Dia e Grupo de Convivências do Abrigo São José.
Em 13 de Julho de 2013, conforme disposto no Decreto do Executivo n 3618/2013, cria-se a Unidade de Execução Instituição de Longa permanência para Idosos-Abrigo São José, na estrutura organizacional da Secretaria de Estado da Inclusão e Mobilidade Social – SIMS, vinculada a Coordenadoria de proteção Social- CPS/SIMS por meio do estado com algumas parcerias como os do Serviço Social do Comércio (SESC), Ministério Público do Estado do Amapá (MP/AP), Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP), Serviço Nacional de Aprendizagem ao Comércio (SENAC), e Serviço Brasileiro de Apoio a Pequenas às Micro e Pequenas empresas (SEBRAE) dentre outros. Sua destinação e acolher idosos a partir de 60(sessenta) anos, em situação de abandono familiar ou vínculos familiares rompidos, na modalidade asilar, sendo a única instituição de Longa Permanência para Idosos no Estado do Amapá, contabilizando hoje com 56 abrigados, sendo 12 mulheres e 44 homens.
5. O ABRIGO SÃO JOSÉ E SUA REALIDADE ENQUANTO ILPI
O Abrigo São José enquanto uma Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI) foi criada para atender idosos em vulnerabilidade social e com frágeis laços familiares, que se encontram vivendo sozinhos, situações de vulnerabilidade e débeis condições de manter-se, devido em muitos casos a problemas correlacionados a sua saúde física e/ou mental, que necessitam de cuidados especificamente médicos, sendo a única Instituição Pública que presta serviços de alta complexidade dentro da Proteção Especial, a qual é disposta a LOAS/ lei nº 8.742/93 e Resolução nº 109/2009.
Consequentemente com o aumento da taxa populacional no estado e nosso município de Macapá, a demanda do Abrigo São José aumentou significativamente o que acarretou superlotação e muitos casos alguns idosos são aceitos para institucionalização mediante ordem judicial levando em consideração os deveres do estado com a pessoa idoso em respeito ao estatuto do Idoso que é lei nacional e constitucionalista. Além disto, o acesso à instituição tem-se dado por requisição de serviços de políticas setoriais, CREAS, demais serviços sócio assistenciais, Ministério Público e Poder judiciário.
Existem um número cada vez crescente de idosos que são atendidos pelo abrigo que necessitam de cuidados e remédios especiais e, assim como tratamentos que dispendem recursos robustos que precisam do auxílio de ONGs e da sociedade civil e de instituições privadas parta serem realizadas no que despende o tratamento dos referidos idosos mencionados. Ademais, devido ao abrigo de idosos em fase terminal, os quais são ocasionados por medidas judiciais, se torna recorrente o falecimento de idosos dentro da instituição, e percebesse o aumento da estatística do número de idosos que adentram precisando desses referidos cuidados e em relação ao número de óbitos por falta de um lugar adequado para essas práticas específicas, entretanto, a falta de um local adequado para resguardar o corpo é inexistente no local.
Observa-se, de pronto, que a sua estrutura se encontra defasada quanto aos alojamentos, que são 11 apenas, em relação ao grande fluxo de procura, e que promete inflar ainda mais essa quantidade, o que não é recomendado pela ANVISA.
O acolhimento de idosos por parte do Abrigo São José está tipificado nos serviços sócios assistenciais já mencionados. O atendimento se destina a idosos que necessitam de longa permanência, em que sua estrutura está articulada em espaços para moradia, com endereço de referência, com condições de repouso, espaço de estar e convívio, guarda pertences, lavagem e secagem de roupas, banho e higiene pessoal, vestuário e com acessibilidade se limitando a rampas e barras de segurança, as quais não estão dispostas em todas as áreas de sociabilidade dos idosos.
6. O ABRIGO SÃO JOSÉ E SEU SENTIDO DE FECHAMENTO ENQUANTO INSTITUIÇÃO TOTAL
As observações feitas no interior do Abrigo São José de Macapá foram muito preciosas para podermos entender não apenas seu funcionamento e sua parte estrutural, mas para compreendê-la a partir do pensamento sociológico de Goffman como instituição total, pois para ele, instituição total tem encerrado em si uma ideia de fechamento. A primeira coisa a ser observada, após entrarmos no abrigo é que em sua volta a existência de um muro com mais de 2 (dois) metros de altura, sendo que a parte frontal do abrigo possui vigias e recepcionistas que não permitem a entrada de qualquer pessoa que não seja previamente informada e liberada pela direção ou pelo corpo dirigente. Apenas a parte frontal como supradito possui elementos em ferro que possibilitam aos idosos observarem, mas, não a se comunicarem com os transeuntes e as pessoas que passam pelas suas calçadas. Nesse sentido Goffman afirma:
Toda instituição tem tendências de “fechamento”. Quando resenhamos as diferentes instituições de nossa sociedade ocidental, verificamos que algumas são muito mais “fechadas” do que outras, se “fechamento” ou seu caráter total é simbolizado pela barreira a relação social com o mundo externo e por proibições a saída que muitas vezes estão incuídas no esquema físico. Por exemplo, portas fechadas, paredes altas, arame farpado, fossos, água, florestas ou pântanos. A tais estabelecimentos dou o nome de instituições totais, e desejo explorar suas características gerais (Goffman, 1987, pg.16)
O Abrigo São José de Macapá se encaixa no que diria Goffman uma instituição de cuidados “há instituições criadas para cuidar de pessoas que, segundo se pensa, são incapazes e inofensivas; nesse caso estão as casas para cegos, velhos, órfãos e indigentes.” (Goffman, 1987 pg 23,). Os idosos ao no abrigo São José são institucionalizadas e passam a ficar sobre a tutela do Estado. A maioria acaba por receber benefício do estado federal, poucos são os que recebem aposentadoria ou contribuíram com receita federal durante sua vida e por esse motivo acabam por aceitarem ou ser a única opção em ser possível para elas a institucionalização no Abrigo.
Nesse sentido o Abrigo são José possui hoje um público-alvo (os idosos) e é insuficiente para essa parcela da população que cresce a cada dia em nosso país e estado. Aumenta não apenas o índice numérico desta população, mas também em vulnerabilidade, e se torna muito difícil dispensar tratamento adequado devido ao alto custo para ser mantido e para a atenção adequada necessária nessa instituição. Preenchendo nesse sentido não apenas de isolamento, mas devido os institucionalizados que lá se encontram entender o abrigo e sua situação de institucionalizado, de compreender a instituição abrigo São José como seu novo lar, onde ele terá quer interagir como diversas pessoas com quem nunca conviveu e repartir espaço, matérias e conviver, respeitando normas e regras gerais para toda comunidade existente na instituição. Nesse sentido Goffman afirma:
Uma instituição total pode ser definida como um local de residência e trabalho ande um grande número de indivíduos com situação semelhante, separados da sociedade mais ampla por considerável período de tempo, levam uma vida fechada e formalmente administrada (Goffman,1987;pg. 16)
Essa falta de contato espontâneo com as pessoas que vivem extra muro e os contatos pré-estabelecidos com o mundo externo é caracterizado por Goffman que explicita melhor essa ideia de fechamento contida nas instituições totais:
Seu ‘fechamento’ ou seu caráter total é simbolizado pela barreira a relação social com o mundo externo e por proibições a saída que muitas vezes estão inc1uídas no esquema físico- por exemplo, podas fechadas, paredes altas, arame farpado, fossos, água, florestas ou pântanos. (Goffman, 1987, pg.17)
Nesse aspecto do abrigo e da convivência comum dos institucionalizados, todos cumprem rigorosamente as normas e regras rígidas da instituição como horário do banho, das refeições, do lanche do, do almoço, do lanche da tarde, do jantar, dos momentos de lazer, passeios, assistir filmes, participar dos jogos, consultas médicas, consultas psicológicas, com assistentes sociais… enfim uma gama de profissionais que se desdobram para atender sua clientela de institucionalizados e conferir a eles e dispensar um bom tratamento e estadia. Goffman assevera que:
Cada fase da atividade diária do participante é realizada na companhia imediata de um rupo relativamente grande de outras pessoas, todas elas tratadas da mesma forma e abrigadas a fazer as mesmas coisas em conjunto. (Goffman, 19987, pg.17)
Esse conjunto de atividades fixas partem de um corpo técnico superior que supervisiona e fiscaliza o cumprimento das mesmas pelos idosos. Horários e regras impostas que devem ser seguidas por todos os idosos sem reclamação ou levar em considerações suas demandas, pois essas regras devem ser iguais para todos e o corpo técnico responsável por essas atividades precisa zelar para que sejam cumpridas pelos institucionalizados. Goffman afirma sobre isso o seguinte:
Todas as atividades diárias são rigorosamente estabelecidas em horários, pois uma atividade leva, em tempo predeterminado, a seguinte, e toda a sequência de atividades é imposta de cima, por um sistema de regras formais explícitas e uso grupo de funcionários (Goffman, 1987, pg. 18).
O abrigo também tem que se adequar ao critério de instituição total pelo fato de possuir um corpo técnico que trabalha 8 (oito) horas por dia, sendo dividido entre o corpo técnico e burocrático, que é composto pelos assistentes administrativos que providenciam e convencionam documentos, assistentes sociais em relação aos direitos e deveres do estado para com os idosos, diretora. Assim como os profissionais do cuidado como enfermeiros, técnicos em enfermagem, cuidadores de idosos, lavadeiras, cozinheiras, higienizadores, nutricionistas, técnicos em nutrição, recepcionistas, vigilantes, fiscais. Nesse sentido Goffman afirma:
Nas instituições totais, existe urna divisão básica entre um grande grupo controlado, que podemos denominar o grupo dos internados, e urna pequena equipe de supervisão… Geralmente, os internados vivem na instituição e tem contato restrito com o mundo existente fora de suas paredes; a equipe dirigente muitas vezes trabalha num sistema de oito horas por dia e está integrada no mundo externo. (Goffman, 1987, pg. 18,19)
7. INSTITUIÇÃO TOTAL COMO PRINCÍPIO
Cabe aqui nesse capítulo conceituar usando as asserções de Ervening Goffman para compreender o conceito de instituição total, referência através da qual é possível compreender o funcionamento das várias instituições fechadas, entre elas o Abrigo São José. Faz-se necessário os fundamentos dos estudos de sua obra que discute sobre o funcionamento de manicômios, prisões e conventos e Foucault (2010).
Para Goffman (1987), a instituição total é um estabelecimento fechado funcionando em regime de internação, tendo moradia, lazer e atividades formativas, a exemplo de quartéis, hospitais psiquiátricos, casas corretivas, seminários e prisões. Partindo de tal pressupostos esses espaços concentram um número significativo de pessoas que passam durante o período de internação a obedecer e submeter algumas vezes até mesmo contra sua própria vontade a certas regras, as quais não pode opinar e sim obedecê-las. Levando uma vida administrada formalmente pela instituição. A partir disso om autor passa a discutir sobre a mortificação do eu. Esse processo de disciplinamento do seu corpo, dualizando o sujeito passa a ser medido, a perceber e ser percebido pelo outro por meio desse meio de domesticação, docilização e disciplinarização de seus corpos. Outro termo que também passa a ser muito usado por Goffman é o de arregimentação ou infantilização social.
Entre os fatores que contribuem para a docilidade desses corpos e desse sujeito em relação a essas instituições e de suas regras perpassa a perda de sua intimidade, de sua maneira de ser, entender e compreender-se em relação ao meio em que vive, convive e se relaciona. Muitas vezes no momento de sua internação, tem seus pertences: roupas, bens pessoais serem confiscados, tem sua intimidade invadida, sua existência anulada através de práticas coletivas que fragilizam e comprometem sua individuação e particularidades dentro dessas instituições. Têm sua aparência modificada, conforme explica Neves:
[…] simultaneamente, os seus pertences vão para o inventário, deixa de poder utilizar a sua roupa pessoal e só lhe é permitido levar objeto pessoal para o quarto (normalmente uma fotografia familiar, quando a possui). (NEVES, 2007, p.1030).
Nessas instituições obrigadas apenas a replicarem ordens e regras coletivas os indivíduos acabam por perder sua autonomia, estringindo drasticamente sua maneira de agir e capacidade de decidir obrigando-o a executar ações e conduta uniforme e regular, um conjunto que de normas que regem a coletividade da instituição em que estão internados, arregimentando-os acordo com Neves (2007), para amenizar a escassez de recursos em detrimento à administração de um índice elevado de internos. O processo de mortificação se dá em consequência desse movimento, de desconstruir as possibilidades desse indivíduo construir sua emancipação e se submeter a essas práticas e regras sólidas e indissolúveis no interior das instituições totais.
Nas instituições totais acaba por se estabelecer um critério de privilégios, de micro gratificações e microeconomia que se baseiam na maneira de como o indivíduo se relaciona com as normas instáveis da instituição o que abona, gratifica ou castiga o sujeito internado, comportamento contabilizado, fiscalizando pela equipe dirigente que age a partir desse padrão de respostas do interno. Essa análise de respostas e cauterização do que é bom ou mal em relação ao parâmetro normativo estabelecerá limites, diferenças, criará fronteiras de normalidade ou do que se considerará um padrão não normal ou satisfatório e coagirá os outros a seguir esses padrões. Esses padrões funcionam como categorias que em vez de homogeneizar determinam as práticas e ações aceitáveis, produz diferenciação e classifica o que robustece desvios e condutas e determina níveis de resposta as regras e padrões interno o que destrói a individualidade do sujeito e a gradação das diferenciações das respostas a se atingir, o que faz gerar a arregimentação.
O sistema de normas e regras rígidas dentro de uma instituição total preza pela (re) educação de comportamentos dos internos sujeitos submetidos ali por diversas razões. Assim o que se percebe por meio dessa organização institucional fechada e respeito a suas regras nada mais é, do que disciplinarização do corpo dos indivíduos, promoção de valores ascéticos e controle social de suas atividades e ações. Segundo Foucault a tecnologia disciplinar seria:
[…] espaço que realiza a fixação e permite a circulação; recortam segmentos individuais e estabelecem ligações operatórias; marcam lugares e indicam valores; garantem a obediência dos indivíduos, mas também uma melhor economia do tempo e dos gestos (FOUCAULT, 2010, p. 127).
Existe no interior das instituições totais um controle minucioso em relação não apenas as atividades, mas a resposta e ações dos sujeitos em relação ao que se deseja e espera deles pelo administrador, que vigia e fiscaliza todos os horários e tarefas, O tempo é usado e estritamente definido em uma rotina as vezes exaustiva que garanta a regularidade das ações e obediência as regras obedecidas com disciplina, obediência e total silêncio e respeito a ordem institucional. Um mecanismo estratégico criado para manter a ordem e aniquila focos de resistência.
As instituições totais desse modo sistematizam comportamentos criam e desenvolvem mecanismos de manutenção da ordem de seus internos e os considera como potências fontes de instabilidade ao que já está constituído cabe ao corpo dirigente a fiscalização, vigilância e cumprimento das ordens e das regras pré-estabelecidas, disciplinado cada gesto, ação, atitude. Desenvolvendo um padrão aceitável em relação ao sujeito internado e promove a capacitação de seus profissionais para continuidade desses padrões. Agindo sobre a subjetividade desses corpos ao destacar a análise do entendimento das instituições totais em particular do Abrigo São José seu funcionamento, essa lógica de funcionamento ainda permeia grande parte das instituições totais no Brasil o contribui para práticas de controle e mapeamento de seus indivíduos, mas também de certa forma contribui também com práticas assistências e garantia de direitos dessa população apesar das relações de poder pré-estabelecidas existentes em seus meandros.
8. O PROCESSO DE ADMISSÃO E A FRATURA DO MUNDO EXTERNO
O idoso ao ser institucionalizado no Abrigo São José passa por um processo de admissão, mas, torna mister entender o termo aqui usado idoso “institucionalizado”; institucionalização significa, em língua portuguesa, ato ou efeito de institucionalizar pessoas com mais de sessenta anos que procuram vivência e tratamento numa instituição especializada e recebendo cuidados pertinentes às suas particularidades etárias. Assim, o idoso institucionalizado é aquele que vive em uma instituição para receber os cuidados devidos, por isso, os idosos que vivem no Abrigo São José recebem legalmente o nome de institucionalizados.
Muitos são os motivos para a chegada e vivência dos idosos no Abrigo São José. Devido à mudança social e do mercado de trabalho, muitas mulheres atualmente “abrem mão” (trabalham fora para ajudar na manutenção dos mantimentos e pagamento das contas) de sua vida familial, a procura de carreira profissional e estabilidade financeira. As mulheres que eram responsáveis pelas tarefas de cuidado. A vulnerabilidade social de muitas famílias em manter os castos e cuidados especiais que requer a pessoa idosa. As doenças, problemas de saúde, a vida solitária, as ações extrajudiciais a garantia dos direitos asseverados no Estatuto do idoso, na Constituição Federal são alguns dos motivos que leva o idoso ao processo de institucionalização. Muitas vezes avesso a sua própria vontade.
Umas das primeiras ações impetraras e realizada pelo corpo burocrático da instituição é a posse legal de todos os documentos do idoso institucionalizado que passa a fazer parte do quadro de internos do Abrigo São José´. O Abrigo toma tutela legal do indivíduo e passa a representar o idoso institucionalizado em juízo, respondendo e vindo a responder na esfera legal por ele. Sua liberdade legal fica condicionada a instituição que não apenas institui a partir desse momento o que o idoso deve ou não fazer, mas responde em nome dele e por ele na esfera jurídica. O idoso passa a ser tutelado pelo estado na instituição, e passa residir no abrigo como interno obedecendo suas regras e códigos de vivência. A isso Goffman chama de morte civil. O primeiro ato de mortificação legal do Eu. Onde o indivíduo perde a autônoma dos seus atos e ações, onde tudo que experimenta no cotidiano passa por uma ação coordenada, pensada coletivamente desconsiderando sua identidade e individualidade; onde o que mais importa a funcionalidade das ações instituídas. Goffman, assevera o seguinte:
Um aspecto legal dessa perda permanente pode ser encontrado no conceito de ‘morte civil’; os presos podem enfrentar, não apenas uma perda temporária dos direitos de dispor do dinheiro e assinar cheque, opor-se aos processos de divórcio ou adoção, e votar. (Goffman,1987, pg. 25-26)
Uma observação necessária aqui é concernente a autonomia das ações do sujeito. A responsabilidade das ações que é natural e comum no mundo externo aos muros da instituição passam por uma fragmentação, tento que agir conforme o que é direcionado pelo corpo técnico administrativo. A partir de sua internação ele terá que se sujeitar ao instituído pelas regras do local onde passa a ser internado. O idoso institucionalizado perde a autonomia de suas ações, não pode ser livre para agir, tem que ter horário e prazo demarcado e informado aos técnicos, sobre as mais singelas ações. Nesse caso os cuidadores são responsáveis em repassar essas informações para a Assistente Social e depois para a gerência do Abrigo.
A instituição passa a ter o controle de suas ações, atos e isso causa efeitos negativos em sua autonomia, pois a partir do momento do internado, onde o idoso passa a residir; a instituição também exerce controle legal. O sujeito perde paulatinamente sua independência e de seus atos, atitudes, ações por menores que sejam, ficam tutelados pelo estado e a instituição serve nesse sentido como “guardiã” de seu bem-estar e segurança. O idoso terá quer adequar a vida coletiva. Terá sua vida pessoal e individual invadida e compartilhada, seus horários passarão a ser agendados, horários de visitas programados em dias e horários especiais na semana, sua ida ao médico, sua ida e saída da instituição passa a ser monitorada e controlada, mas, a regra geral é obedecer e cumprir fielmente o que é desejado e programado. Terá que se adaptar as normas estabelecidas, as regras e tarefas. Depois de institucionalizado o idoso passa a ser monitorado, programado, adaptado. A dociabilidade dos corpos como afirma Foucault, onde se vigia os sujeitos construindo corpos dóceis e domesticados.
Nas palavras de Goffman se dá a padronização dom Eu. A barreira imposta pelos murros em relação a vida externa, a modificação do tempo, espaço, ação. O afastamento me seu mundo doméstico, o que ocorre com o indivíduo institucionalizado, as barreiras impostas pela instituição, o fragmento e limitação de suas ações, a definição pré-estabelecida da nova, maneira de agir e interagir com o novo meio, o respeito que precisa demonstrar ao que é instituído e legalizado e que agora faz parte de sua nova vida de institucionalizado e interno, influência não apenas sua vida no internamento, mas na sua individualização. Nesse sentido Goffman, afirma:
A barreira que as instituições totais colocam entre o internado e o mundo externo assinala a primeira mutilação do eu. Na vida civil, a sequência de horários dos papéis do indivíduo, tanto no ciclo vital como nas repetidas rotinas diárias, asseguras um papel que desempenharão impeça sua realização e ligação com o outro. Nas instituições totais ao contrário, a participação automaticamente perturba a sequência de papéis, pois a separação entre o internado e o mundo mais amplo dura o tempo todo e pode continuar por vários anos. Por isso ocorre o despojamento do papel. Em muitas instituições totais, inicialmente se proíbem as visitas vindas de fora e as saídas do estabelecimento, o que assegura uma ruptura inicial profunda com os papéis deteriorasse uma avaliação da perda do papel. (Goffman, 1987, pg. 24)
Essa liberdade de agir, se locomover, ir aonde quiser, falar com quiser, tomar banho na hora que lhe convier passa a ser tolhida. Sua autonomia em relação a certos atos habituais lhe são castrados. Seu modo de ser, perceber e agir no mundo externo deixará de existir dentro da instituição em seu internamento, pois, a vida institucionalizada do idoso passa a ser uma vida vigiada, regrada, observada. Onde o que é mais importante é a funcionalidade e a praticidade e cumprimento da ação institucionalizada e padronizada, pois, existi uma razão para a instituição existir e funcionar e nesse sentido as necessidades, desejos e anseios individualizados serão sacrificados em prol da coletividade e em função maior que é o coletivo.
Essa separação da vida externa e nova adaptação a uma vida coletiva, estratificada e compartilhada. Cria uma barreira entre o m mundo lá fora(externo) e a nova realidade vivida pelo sujeito institucionalizado. O processo de admissão nesse sentido leva à um outro processo de mortificação do Eu do idoso, pois, ao se preparar4em para o processo de adaptação dessa nova realidade, desse novo existir, subordinado a máquina administrativa do Abrigo São José. A afirmação de Goffman é muito poderosa nesse sentido
Geralmente, o processo de admissão leva também leva a outros processos de perda e mortificação. Muitas verificamos que a equipe dirigente emprega o que denominamos processos de admissão: obter uma história de vida, tirar fotografia, pesar, tirar impressão digital, atribuir e enumeras bens pessoais para que sejam guardados, despir, dá banho, desinfetar, cortar os cabelos, distribuir roupas da instituição, dar instruções quanto as regras….Os processos de admissão talvez pudessem ser denominados ‘arrumação’ ou ‘programação’, pois, ao ser enquadrado o novato admite ser conformado e codificado n8um objeto que pode ser colocado na máquina administrativa do estabelecimento, modelado suavemente pelas operações de rotina (Goffman, pg. 25-26)
Todos os eventos e ações impetradas pelo corpo dirigente do Abrigo São José se utiliza da padronização da ação, pois, esse processo é complexo. É necessário perceber e ao idoso entender que para o funcionamento cabal da instituição ele terá que cooperar e obedecer; que as regras precisam ser obedecidas, esse funcionamento terá que ser garantido por ele e os fiscais o monitorarão e farão o possível para o controle de suas ações a fim de garantir esse funcionamento. Nesse sentido de obediência afirma Goffman:
Como uma instituição total lida com muitos aspectos da vida dos internados, com a consequência padronização complexa na admissão, existe uma necessidade especial de conseguir a cooperação inicial do novato. A equipe dirigente muitas vezes pensa que a capacidade do novato para apresentar respeito adequado a seus encontros iniciais face a face é um sinal de que aceitará o papel do internado rotineiramente obediente. (Goffman, 1987, pg.27)
A ruptura as vezes abrupta do seio familiar do idos, do meio dos seu, de sua parentela, do meio social ao que estava envolvido, a uma situação normatizada por ele, enquanto sujeito. A ruptura de sua rotina diária, sua vida ser posta em uma outra relação de vivência e existência, completamente diferente da qual existiu e compartilhou. Ser internado em um lugar onde passará a compartilha sua existência e conviverá com quem nem conhece, compartilhar sua intimidade, convivência diária, socialização de regras, hábitos impostos, dormitório, banheiro, espaço, lugar pré-definido nas mesas para compartilhar refeições com cardápio pré-definido pela técnica nutricionista. Muitas vezes compartilhando mesmo sem sua vontade itens pessoas de sua indumentário, toalhas, pentes, cremes, perfumes, afeta sua existência fortemente, impactando na sua maneira de ser e agir. A função dos técnicos do Abrigo é garantir essa adaptação de forma ordeira e pacífica e monitoram rotineiramente focos de resistência e garantem a manutenção das normas estabelecidas.
O nome é o que nos caracteriza como pessoas, apesar de nossas posses físicas e o nome social pelo qual obedecemos, nós identificamos e correlacionamos com a vida social e é o que nós definimos, é sem dúvida a mais importante posse humana para o indivíduo se relacionar e entender e se compreender como sujeito no mundo, o nome de apresenta e define, o apresenta ao mundo, às pessoas, aos outros, à sociedade. O que foi observado é que alguns idosos são conhecidos por epítetos, alcunhas cunhadas entre os outros internos e pelo corpo técnico, que acentua nesses epítetos de algumas caraterísticas do idoso. Esses apelidos são usados não apenas pelos cuidadores (corpo técnico), mas pelos outros idosos internados na Abrigo São José. Uma senhora que se punha a cantar todas as manhãs e a cantar nos eventos no microfone era conhecida como Estrela Cantava boleros, tangos e algumas músicas da década de 50 e 60 das cantoras do rádio. Uma outra conhecida por todos como maninha, pois, era evangélica e a chamava a todos de irmão., mas podiam ocorrer de epítetos desagradáveis como fedorenta (insinuando que a idosa não gostava de tomar banho) etc. Muitos desses epítetos ou alcunhas são usados ressaltando características físicas, de humor, temperamento, como por exemplo: Augusto Mentiroso; Iveto Mão Macia (insinuando que o indivíduo é ladrão). Nesse sentido a afirmação de Goffman é muito poderosa:
O processo de admissão pode ser caracterizado como uma despedida e um começo, e o ponto médio do processo pode ser marcado pela nudez… o que é importante porque as pessoas atribuem sentimentos do eu ao que possuem. Talvez a mais significativa dessas posses não seja a física, pois é nosso nome; qualquer que seja a maneira de ser chamado, a perda de nosso nome é uma grande mutilação do eu. (Goffman, 1987, pg. 27)
Redefinindo os padrões identitários do eu do idoso no interior da instituição e robustecendo aspectos negativos, muitas vezes esses epítetos acabam impactando negativamente sobre o sujeito. Uma outra característica a ser mencionada é a padronização de respostas, a padronização de sinais de deferência, obediência, de demérito o que demonstra sua relação de inferioridade em relação ao corpo técnico do Abrigo, protagonizando uma outra forma de mutilação do indivíduo institucionalizado. O corpo sujeito a essa padronização; domesticação de sua ação, passa por indignidades físicas e verbais em relação ao tratamento dos outros e de si, essas nações simbólicas profanam e distorcem a imagem que o idoso tem de si e danosa concepção do seu Eu. Goffman afirma:
As instituições totais perturbam ou profanam exatamente as ações que na sociedade civil têm papel de atestar, ao ator e aos que estão em sua presença, que tem certa autonomia no seu mundo – que é uma pessoa com decisões ‘adultas’, autonomia e liberdade de ação.A impossibilidade de manter esse tipo de competência executiva adulta, ou, pelo menos, os seus símbolos, pode provocar no interno um horror de sentir-se radicalmente rebaixado ao sistema de graduação de idade. (Goffman, 1987,pg .46)
9. TODOS A MESA É À REGRA DA CASA
Uma das observações são os horários fixos dos banhos, do dejejum, das refeições, lanches, programações, jantar, e atividades diurnas e diuturnas dos idosos. Esses horários são comuns a todos os internos institucionalizados no Abrigo e devem ser rigidamente observados e cumpridos. Todos os dias os banhos acontecem às 6 (seis) da manhã pontualmente. Os cuidadores homens se responsabilizam pelo trato e cuidado dos pacientes da ala masculina; além de realizarem a higienização de todos os idosos acamados (que não se encontram em condições de fazer sua higienização sozinho por motivos de doença ou atrofia de algum músculo, ou por ter sua locomoção limitada) como também auxiliam os idosos que possuem sua locomoção normalizada, como ajudar a se barbearem, raspar as partes íntimas, trocar de roupas e algum outro cuidado solicitado em particular.
Na outra ala as mulheres se responsabilizam em realizarem as tarefas da higiene pessoal dos idosos acamadas e com normalidade de locomoção atendendo a pedidos particulares igualmente. Após o término dessa atividade de higienização todos os idosos são levados para copa para receberem a primeira refeição do dia, apenas não vão ao refeitório, os que não podem se locomover, pois recebem em suas camas o café da manhã. Os que podem realizar essa tarefa de se locomoverem tem a obrigação de obedecer ao que já foi pré-estabelecido em relação ao cumprimento dos horários da instituição. Assim afirma (Goffman, 1987, pg.44).: “tais regras são muitas vezes ligadas a uma obrigação de executar a atividade regulada em uníssono com grupos de outros internos”
O café da manhã é servido às 08 (oito) da manhã; há idosos que não participam da primeira refeição do dia, por diversos fatores, alguns porque reclamam da mesmice que lhes são servidas, outros pedem depois na copa para as cozinheiras, ou lancham antes do almoço, pois as 9:30 é horário do lanche entre café da manhã e almoço. Muitos idosos reclamam do menu dos cardápios das refeições, da forma que são preparados. Reclamam da falta de variedade e vociferam que além de ser o mesmo alimento, ainda é preparado de forma irresponsável, sem técnica, de forma precária ou má cozido e temperado e sem sabor. Muitos acabam por optar em pedir para os cuidadores lhes comprarem em vendedores autônomos, em pequenos restaurantes, frangos assados e comidas de seu gosto particular.
Nas refeições, as mesas são compartilhadas pelos idosos e idosas, sem divisão dos sexos. Ambos podem sentar-se juntos e dividirem do mesmo espaço da Copa e consequentemente dividirem as mesmas mesas. Nos cafés da manhã geralmente é servido pão com manteiga e café preto, bolachas doces e salgadas, raramente o café é acompanhado de leite. Raríssimas vezes é servido frutas ou salgados, ou algum tipo de alimento que difere dessa lógica, após o café da manhã os idosos são levados para realizarem suas atividades médicas dentro do Abrigo, realizam atividades educacional, recreativas e conversam, alguns assistem os programas na televisão, alguns caminham pela área interna do abrigo. A nenhum idoso é permitido sair de dentro da instituição sem breve comunicação anterior, apenas nos casos de consultas médicas externas e salvos casos de resolver problemas de seus respectivos benefícios e aposentadorias, como o fato de sempre irem receber geralmente acompanhado de um assistente social e um cuidador que realizam essa tarefe, pois, são apanhados pelo carro oficial e motorista oficial da Secretaria de Inclusão e Mobilização Social (SIMS), responsável em atender os idosos institucionalizados.
Algumas atividades de pintura bidimensional são realizadas no interior do abrigo por um Educador Social, técnicas de vernissagem, colagem, confecção de estórias, recitação de poesias, jogos educativos, varal de poesia. O Som é colocado (os idosos do abrigo adoram ouvir músicas do seu tempo), mas a grande maioria não gosta de participar dessas ações educativas. Os profissionais encontram resistência de alguns idosos. Alguns dos idosos são levados para realizarem limpeza de feridas, outras para renovarem curativos, alguns assistem jornais na TV, outros ouvem o rádio (prática muito comum no interior da instituição), outros jogam dominó, baralho e outros ficam em seu canto observando e alguns conversam entre si. Alguns selecionados pelo seu dia realizam consultas no fisioterapeuta da instituição, é bom fazer um atento existe apenas um fisioterapeuta para cuidar dos 66 idosos da instituição, o que faz em dias escalonados aos que precisam de cuidados fisioterápicos que são a grande maioria. O profissional agenda uma quantidade possível por dia e só realiza os atendimentos pela manhã, priorizando os que estão com a locomoção mais comprometida, pois a cartela de moléstia dentro do abrigo é vasta.
Os instrumentos e máquinas que ajudariam nesse trabalho são parcos, sendo que o mesmo usa de seus materiais particulares e máquinas, o fisioterapeuta é contratado do estado e não efetivo. As consultas médicas são feitas dentro da instituição por um médico que aparece em dias e horários preestabelecidos para consultas, geralmente, nas quintas e sextas-feiras, ou pode aparecer em caso de algum idoso precisa dessa urgência de ser observado, mas em caso de emergência o SAMU é acionado. Em caso de consultas e médicos especializados e exigência de maior cuidado esses idosos são direcionados a especialistas externos e encaminhados para consultas para efetivarem seus respectivos diagnósticos na rede pública de saúde.
Assim que detectada a moléstia ou o mal de saúde o idoso inicia o tratamento, seus medicamentos específicos são comprados, na maioria das vezes, com dinheiro do seu benefício ou aposentadoria, e se esses existirem na rede pública de saúde, os mesmos são comprados pela instituição através dos proventos ganhos pelos institucionalizados, para poderem manter sua integridade física e gozarem de sua saúde.
Como já mencionado anteriormente as refeições são administradas e responsabilidade da instituição, pois ela recebe recursos estaduais para preparar e servi aos idosos. Os técnicos que trabalham nesse serviço e responsável pelo cardápio são a nutricionista, técnica em nutrição que elaboram e são responsáveis pelo cardápio, as cozinheiras e ajudantes de cozinha que se responsabilizam pelo corte e preparo dos alimentos. Esse cardápio recebe, muitas críticas dos idosos, ainda mais porque fazemos parte de um pedaço do Brasil que tem uma alimentação particularizada. A maioria dos idosos só almoça se tiver o alimento em companhia do açaí e preferem comidas assadas, o açaí no prato do amapaense não é acompanhamento, é o protagonista das refeições do sujeito natural dessas bandas.
Por esse motivo a grande maioria dos idosos solicita seus proventos e aos cuidadores de idosos que comprem açaí com algo assado, que pode ser frango, peixe, carnes, embutidos, os cuidadores de idosos antes solicitam, aos assistentes e se liberados porque alguns tem dieta específica e são privados de alimentarem de certos alimentos e ficam privados dessa liberdade. A autonomia dos idosos é limitada em relação a sair do abrigo, por esse motivo lhes é privado sair do abrigo a qualquer momento ou a seu desejo. Todas as ações precisam e devem ser comunicadas e agendadas com antecedência.
Em relação ao tratamento e curativos realizados no interior da instituição. O abrigo São José conta com a presença de apenas 01 (uma) enfermeira do Contrato Administrativo que trabalha a seis horas por dia e fica de sobreaviso caso acha alguma eventualidade, 06 (seis) técnicos em enfermagem. Os técnicos são responsáveis pela administração e cuidados dos remédios receitados pelos médicos e os técnicos em enfermagem se responsabilizam para que todos aos idosos nas horas marcadas e horários certos tomem suas doses receitadas e realizam outros cuidados se necessário (Importante frisar que dos seis técnicos em enfermagem, apenas dois são efetivos do estado, outros são também contratos administrativos.
O Indivíduo pode ser obrigado a manter o corpo em posição humilhante, pode ser obrigado a dar respostas verbais também humilhantes. Um aspecto importante disso é om padrão de deferência obrigatório das instituições totais; muitas vezes, os internados são obrigados, em sua interação social com a equipe diretora, atos verbais de deferência – por exemplo, dizer ‘senhor’ a todo momento. Outro exemplo é a necessidade de pedir, importunar, ou humildemente pedir algumas coisas são pequenas – por exemplo, fogo para cigarro, um copo d’agua ou permissão para usar o telefone. (Goffman, 1987, pg. 30)
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa pesquisa se pôs a observar e acompanhar não a atuação dos profissionais da referida Instituição de Longa Permanência para idosos Abrigo São José, mas entender melhor a relação e as vivências dos idosos dentro desse mesmo espaço compartilhado e a influência das normas e regras rígidas exercitas e exigência de cumprimento dessas mesmas regras em relação ao seu aspecto psicossocial e interação com os outros idosos que dividem esse espaço e cumprem as mesmas regras dentro de uma instituição de total de tratamento.
Envelhecer não é problema a ser considerado pela sociedade e, muito menos, para o Estado, uma vez que, se a população atinge uma idade mais avançada sem requerer cuidados especiais, com boas condições, bem como com sua capacidade funcional preservada, não há o que se falar em amparo por outrem aos idosos, pois estes então gozam de boa qualidade de vida. Quando, porém, se visualiza o acometimento do processo saúde-doença e a capacidade funcional é afetada, comprometendo a autonomia desses idosos, verifica-se a necessidade de intervenção e aplicação de políticas públicas.
Com o crescente aumento da população idosa no Brasil, faz-se necessário a busca por novas ações e políticas de saúde que priorizem as transformações sociais, urbanas, industriais e familiares necessário se faz compreender melhor a atuação das Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI), suas práticas de atuação dentro do âmbito institucional e compreender o funcionamento da instituição.
Assim torna-se necessário conhecer melhor esses ambientes institucionais, seu funcionamento e contextualizá-la rende ao público alvo de suas ações, aproximando o universo do idoso institucionalizado e compreender o seu significado para os idosos já institucionalizados e o que ainda irão se institucionalizar, tornando esse trabalho uma relevante fonte de informação em relação a essas instituições, que visa melhoramento dos cuidados ofertados pelas Instituição de Longa Permanência para Idosos(ILPI), respeitando a singularidade e imparidade do atendimento dispensado a pessoa idosa. Esperando assim contribuir para melhoramento dos serviços dispensados aos idosos, e ajudar na compreensão do que e uma (ILPI), e não apenas reproduzir a ideia de que serve apenas para amparo de acolhimento de excluídos e desamparados sociais e familiares, mas entendê-la como um lugar que serve para o idoso viver sua velhice com qualidade de vida e dignidade humana.
A observação levou a constatação de que o meio em qual os idosos são submetidos a internação e institucionalização acaba por desconstruir, esmaecer e interferir na sua fruição com mundo, sua interação com mesmo, sendo que os mesmos precisam se adaptar as normas e regras preestabelecidas e intermédio dos funcionários da instituição Abrigo são José que ali trabalham cada um com sua determinada função. O critério de liberdade de escolha e livre arbítrio e condição de sair, entrar e fazer o que quiser não funciona dentro de um ambiente de instituição ao qual o idoso é submetido, desta forma o indivíduo institucionalizado a acatar as regras em comum e vivida e compartilhada com os outros idosos como condição previa para sua estada de cuidado.
O estado especial de sua condição predetermina o acatamento a essas ordens, sendo que a instituição de cuidado é um lugar a parte e separado da ambiência a qual o indivíduo estava acostumado, porém, aceitar o preestabelecido é o que determina e condiciona a ação coletiva da instituição de cuidado em especial do Abrigo São José, já que se configura como uma instituição de cuidado para um público-alvo, em especial o idoso que se institucionaliza e fica sujeito ao tratamento e cuidado a ele dispensado dentro desse ambiente coletivo, que nem sempre é feito sem contestação pelo idoso, como já supradito, mas é condição prévia para sua permanência.
Cabe ressaltar, por fim, que a SARS COVID II prejudicou bastante o prazo e o processo da observação, mas não chegou a torna-lo inviável, como se demonstra ao longo deste texto.
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1 Doutor em Educação pela UFU/MG. Professor na UNIFAP. Orcid.org/0000-0001-5095-4433.
2 Bel. em Serviço Social pela UNIP/AP.