A CULTURA DE INOVAÇÃO COMO FATOR CHAVE PARA A SOBREVIVÊNCIA DE EMPRESAS TRADICIONALISTAS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8274481


Marcelo Bomfim Guedes[1]


RESUMO

Acompanhar as mudanças tecnológicas e sociais, frutos das diversas revoluções (industrial e digital), cria um desafio para as empresas tradicionais sobreviverem nestes ambientes em constante evolução. Este trabalho teve por objetivo identificar a arquitetura destas empresas tradicionalistas e situá-las em um universo, quase que, completamente diferente do qual se originou. Procurou, também, ressaltar a relevância que a cultura organizacional exerce nestas empresas e o porquê dela se torna ponto focal e essencial para a mudança de uma estrutura organizacional tradicional e rígida para um modelo receptivo a inovação. Somado a uma apresentação teórica, o texto, também objetivou demonstrar a inovação ou um ambiente com DNA de inovação aumenta, consideravelmente, as chances de sobrevivência destas empresas em meio às inúmeras mudanças em seu ambiente social. A partir de conceitos revisitados o texto conclui sobre a importância da inovação para a sobrevivência das empresas, ressaltando não se tratar do resultado de uma mudança na estrutura do negócio e sim em raízes mais profundas, sendo elas: suas crenças, valores e comportamento, ou seja, sua cultura organizacional.

Palavras-chave: Revolução Digital. Cultura Organizacional. Inovação. Sobrevivência. Mudança. Estrutura Organizacional. Modelo de Negócios.

ABSTRACT  

Keeping up with technological and social changes, the result of different revolutions (industrial and digital), creates a challenge for traditional companies to survive in these constantly evolving environments. This work aimed to identify the architecture of these traditionalist companies and place them in a universe, almost completely different from the one in which they originated. It also sought to highlight the relevance that organizational culture plays in these companies and why it becomes a focal and essential point for the change from a traditional and rigid organizational structure to a model receptive to innovation. In addition to a theoretical presentation, the text also aimed to demonstrate innovation or an environment with innovation DNA considerably increases the chances of survival of these companies in the midst of numerous changes in their social environment. From revisited concepts, the text concludes on the importance of innovation for the survival of companies, emphasizing that it is not the result of a change in the structure of the business, but in deeper roots, namely: their beliefs, values and behavior, or that is, its organizational culture.

Keywords: Digital Revolution. Organizational Culture. Innovation. Survival. Change. Organizational Structure. Business Model. 

1. Introdução 

Quando se pensa em empresas tradicionais, logo infere-se tratar-se de empresas com estrutura organizacional rígida, bastante departamentalizada, altamente hierarquizada, com processos baseados na análise dos tempos e movimentos das tarefas e extremamente mecanicista. Cury (2009) ressalta o fato de que estas empresas eram egressas da Revolução

Industrial, por isso seu caráter mecanicista, e se valiam das contribuições de Adam Smith, F. Taylor, H. Fayol e seus seguidores que enfatizavam na gestão destas empresas: atividades, normas, estrutura organizacional, divisão de trabalho e coisas afins.

No cenário atual, outra revolução dita o surgimento e o comportamento das organizações, a revolução digital. Quimarães (2018) ressalta, ainda, tratar-se da terceira revolução digital, com maior capacidade real de alterar a forma de se fazer as coisas e das empresas fazerem negócios, consequentemente evoluindo a sociedade de forma mais profunda e rápida.  Estas organizações, então, são mais ágeis, menos burocráticas, mais adaptativas, possuem menos níveis hierárquicos com equipes autogeridas e, à primeira vista, se diferem em muitos graus das organizações tradicionais.

Tanto as empresas no modelo tradicional, quantos as empresas dessa nova revolução buscam a geração de valor, seja para acionistas, empregados, clientes, sociedade, enfim para os componentes do ambiente onde elas se encontram. Além disso, uma empresa, qualquer que seja, almeja permanecer viva, prosperar. As diferenças culturais, tecnológicas e ou comportamentais das diferentes gerações, requerem das empresas tradicionais uma mudança de cultura organizacional, cujo elemento inovação faz-se peça central para estabilização e o subterfúgio necessário para suas sobrevivências.

Este trabalho, então, utilizar-se-á como base metodológica a revisão bibliográfica com abordagem qualitativa, buscando identificar caminhos necessários a serem percorridos por empresas cujo modelo de gestão e estruturas são tradicionais em direção à mudança para uma cultura inovadora como forma de obtenção de uma vantagem competitiva e perenidade da organização.

2. Feitas para durar, mas sobreviverão? 

A ideia conceitual de Administração no início do século XX, segundo Cury (2009), era pautada na racionalização do processo produtivo com o objetivo de aumentar a produção, suportando seu crescimento em redução de custos. Basicamente, máquinas e processos produtivos eram os pontos centrais de qualquer modelo de negócio à época, sendo seus esforços direcionados para o controle de qualidade e entrega de resultados. Quimarães (2018) interpreta que esta qualidade é resultado da obediência de padrões, resultado da operação de processos e procedimentos, frutos de uma estrutura altamente hierarquizada e pouco flexível.

Ao analisarmos a estrutura organizacional de uma empresa tradicional, podemos utilizar, como balizadores, os indicadores apontados por Cury (2009), como: Enfoque básico; Ambiência da empresa; Essência da administração; Visão do mundo; Estruturas organizacionais; e Tomada de decisão.

Em estreito resumo, Cury (2009) destaca que o enfoque básico destas organizações estava foco voltado totalmente para as tarefas, a ênfase das empresas tradicionais recai sobre normas, estrutura, departamentalização, divisão do trabalho, hierarquia e especialização por exemplos. O tradicionalismo destas organizações é uma herança da revolução industrial e seu modelo mecanicista, seguindo os princípios de estruturas rígidas tendo como norteadores a igreja e o exército. Neste ambiente pós-revolução industrial a filosofia era a de imposição de autoridade.

Quanto a essência e visão de mundo, Cury (2009), ainda ressalta que o alicerce conceitual era planejado sob sistemas autoritários e benevolentes com predominância de fatores higiênicos, segundo as teorias de Maslow e Herzberg, e possuía visão de um mundo fechado e independente do mundo externo a ela. Era um sistema mecânico e simples. O autor ressalta que as tomadas de decisão eram baseadas no indivíduo e centralizada exclusivamente na figura de sua liderança hierárquica. Observa, ainda, a predominância de estruturas organizacionais como linear ou militarizada, funcional, colegiada e staff-and-line. Não é objeto deste trabalho aprofundar sobre a arquitetura organizacional, apenas demonstrar a composição do DNA destas empresas, seu núcleo formador.

As mudanças culturais e tecnológicas foram, ao longo do tempo, um grande desafio à sobrevivência destas organizações. Seu modelo de negócio baseados em tarefas, sua estrutura hiper hierarquizada, pouco flexível e, sobretudo, sua cultura empresarial baseada no ordenamento formal e departamentalizado frente a mudanças e inovações, requereram esforços, muitas vezes, causadores de instabilidade no seu modelo de negócio resultando em improdutividade e baixa qualidade, objetivos principais destas organizações, levando-as ao eminente risco de perecimento.

Embora o conceito de inovação não seja, necessariamente, novo no ambiente empresarial, estas organizações estavam construídas em bases que não permitiam agilidade ou mesmo flexibilidade para identificação e aproveitamento de oportunidades que a elas eram apresentadas. Neto et al. (2014) observa que para a teoria econômica clássica a inovação era um objeto externo ao ambiente das empresas tradicionalistas e que, portanto, não deveriam fazer parte dos esforços destas organizações. Em sentido contrário, para Schumpeter (1997) a inovação não seria uma simples opção ou um objeto alheio da ambiência da empresa e sim uma necessidade quase evolutiva para sobrevivência em um contexto ampliado de ambiente em transformação e reinvenção contínuas que, em estando ausente a inovação em seu core business, a organização estaria fadada a defender apenas o seu passado.

2. 1 A revolução digital e os caminhos para a sobrevivência

Com o avanço, quase que frenético das tecnologias digitais, as regras e modelos de negócios tradicionais se alteraram e novas ameaças e oportunidades surgem em cada momento. Para Rogers (2017, p.10), “ empresas constituídas antes do surgimento da internet enfrentam um grande desafio: muitas das regras e pressupostos fundamentais que governavam e orientavam a atuação e o progresso dos negócios na era pré-digital não mais se aplicam.”. Mas, isso não condena em definitivo as organizações tradicionalistas, requer esforço, mas há saída.

A revolução digital é um período de mudanças tecnológicas e, sobretudo, sociais observadas desde a metade do século XX. Ela é caracterizada pelo desenvolvimento e disseminação de tecnologias digitais, como a inteligência artificial, IoT entre outros. Tanto em seu aspecto social, quanto tecnológico, têm afetado significativamente o ambiente organizacional das empresas tradicionalistas, transformando a forma como elas operam e interagem com seus clientes.

Em sentido contrário, as empresas modernas possuem uma estrutura organizacional propícia a inovação. São horizontalizadas, ágeis, flexíveis, com processos e tarefas com alto grau de colaboração, as decisões são compartilhadas, há uma tolerância maior ao risco e uma boa receptividade às mudanças. Um olhar menos atento apontara que o caminho, então, para as empresas tradicionais seria, simplesmente, transformar o seu modelo organizacional. Mas não é tão simples. Cury (2009) ressalta que para que haja uma mudança completa de seu modelo estrutural a mudança dever ter profundidade e só tornar-se-á efetiva e permanente se atingir a cultura da organização. Neto at al. (2014), conceitua cultura organizacional como um sistema de valores, crença e comportamentos, reflexo de sua liderança impostos aos demais empregados. Quando uma empresa supervaloriza essa obediência inquestionável ela impede o surgimento de inovações. Cury (2009), complementa que a cultura vai além das normas escritas, que existe, também, um conjunto de regras não escritas que igualmente guiam as atitudes e decisões dentro da organização. Observa, ainda, que não deve haver esforços para mudar as pessoas e sim as restrições organizacionais a elas impostas.

2. 2 Cultura de inovação como fator de sobrevivência

Podemos inferir que que o processo ou ato de inovar tem relação direta com a cultura organizacional. Para uma empresa desenvolver essa (ou melhor, a sua) cultura de inovação, não basta apenas ela se enxergar como inovadora, ela deve promover um ambiente, um conjunto de hábitos e práticas que estimulem a criatividade e a geração de novas ideias em todos os setores. Deve promover, ou incentivar, a “insatisfação” constante de como as coisas são feitas, questionar o modelo de negócio sob o olhar da criação de valor para os clientes, colaboradores, parceiros etc.

Conceitualmente, é fácil enxergar os benefícios da inovação, é fácil, inclusive, traçar os caminhos e identificar as ações para se tornar uma organização inovadora porém, na prática, as coisas não são bem assim. Criar uma cultura de inovação, e cultura dentro das organizações pode ser entendida como comportamentos, valores, práticas, hábitos que uma empresa adota afim de criar maior aderência ao seu planejamento estratégico por parte de todo o seu sistema (colaboradores, parceiros, clientes etc.), exige tempo, comprometimento, recursos e sobre tudo dedicação constante.

Para ser inovadora, a organização, deve contar com as pessoas certas, com as características certas para fomentar e promover a “circulação” da criatividade e inovação em sua corrente sanguínea. Deve praticar a inovação (se de forma inconsciente, melhor) no seu dia a dia, focar nas ideias das pessoas e equipes se permitindo ouvir e estimular. Para Neto at al. (2014), é de suma importância que todos na organização esteja alinhados à captar ideias, desenvolvê-las e leva-las a implementação e que a velocidade com que ocorre o processo de inovação  é diretamente proporcional a velocidade com que esse ambiente gera novas ideias. Ainda segundo os autores, a cultura é o coração catalizador desse comportamento inovador.

Assumindo que os comportamentos necessários perpassam por “características endógenas” como autoconfiança, curiosidade, criatividade, persistência entre outras, e somamse as capacidades de ouvir, de compartilhar conhecimento e de ser e ter uma visão multicultural. Mas, por si só, não basta se criar ilhas de pessoas inovadoras.

A organização deve estimular a prática de geração de ideias, da colaboração intersetores promovendo ambiente leve que possibilite abertura para que todos falem, todos sejam ouvidos, que as ideias geradas possam ser exploradas, usadas, testadas. Estas práticas, ou para aproveitar a analogia feita, a construção dessas pontes entre as ilhas, se constantes, podem tornar-se hábitos poderosos. Hábitos estes, que nada mais são as práticas que se repetem com frequência e regularidade e, em uma cultura de inovação, tornam-se um conceito só, com dificuldade de se reconhecer o que é prática e o que é hábito.

Nas mais variadas organizações, cria-se o hábito quando, inconscientemente, um conjunto bem azeitado de pessoas e práticas levam a organização, recorrentemente, a manter investimentos constantes em inovação, quando a alta liderança estratégica participa de forma integrada das ações colaborativas, incentivam o envolvimento de parceiros, colaboradores etc. Uma cultura de inovação bem estabelecida gera benefícios e aumenta consideravelmente as chances de alcançar a perseguida perpetuidade, o legado.

3. Considerações Finais 

Com base no que foi descrito, podemos observar que um dos principais entraves para as organizações tradicionais em adaptarem-se às constantes mudanças tecnológicas e sociais promovidas pela revolução digital é a sua estrutura organizacional, herança da revolução industrial. Este modelo estrutural, não só impede que as empresas tenham agilidade para acompanhar novas tendencias, como as direciona ao precipício da mortalidade. Pudemos perceber que, embora conhecido, o caminho para sobrevivência envolve mudanças muito além da estrutura, que é necessária uma mudança radical e profunda em todo o seu sistema de crenças, valores e comportamentos.

Vimos que para se tornar tangível a possibilidade de sobrevivência, uma cultura organizacional voltada para a inovação é a chave. Vimos também que não se trata de uma simples mudança de chave, querer atitudes e comportamentos capazes de propiciar um ambiente receptivo às oportunidades e que toda a organização deve estar envolvida nesse objetivo. Os ganhos são palpáveis e a geração de valor torna-se mais consistente. A Cultura de inovação, ainda que não torne a sobrevivência uma garantia, permite que as organizações naveguem com mais tranquilidade em meio às constantes mudanças sociais, comportamentais e tecnológica das futuras revoluções. 

4. Referências Bibliográficas

Cury, A. (2009). Organização e métodos: Uma visão holística. São Paulo, SP: Editora Atlas S.A.

Neto, J.S., Santos, D.L.N., Orlandi, T.R.C. (2014). Inovação: Estratégia, gestão e cultura. Local de publicação, abreviatura do estado ou nome do país: [eBook Kindle]. www.amazon.com.br /Inovação-Estratégia-João-Souza-Neto-ebook/dp/B00PUUJMEU#detailBullets_feature_div

Quimarães, L. (2018). Inove ou morra: Conheça os passos simples e poderosos para salvar o seu negócio. São Paulo, SP: Literare Books International.

Rogers, D.L. (2017). Transformação digital: repensando o seu negócio para a era digital. São Paulo, SP: Autêntica Business.

Schumpeter, J.A. (1997). Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. São Paulo, SP: Editora Nova Cultural.(Coleção Os Economistas)


[1] Graduado em Administração de Empresas pela UNIFACS. Especialista em Contabilidade Gerencial com ênfase em Controladoria pela UFBA e em Desenvolvimento Gerencial com Ênfase em Recursos Humanos pela UNIJORGE. Mestrando em Administração de Empresas pela Must University. marcelobguedes@gmail.com.