A CONSTITUIÇÃO DO “EU” E O ESPAÇO PEDAGÓGICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL DAS INSTITUIÇÕES ESCOLARES DE NOVA XAVANTINA-MT.

THE CONSTITUTION OF THE “I” AND THE PEDAGOGICAL SPACE IN EARLY CHILDHOOD EDUCATION IN SCHOOLS IN NOVA XAVANTINA-MT

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11665505


Juliana Severina Barbosa Rodrigues, Victoria Rocha Alves, Deusilete Peres Santana, Adarlene Ferreira da Rocha, Iquelini Silva Moreira, Renata Perez, Suelaine Pires Ribeiro Moura, Inodi Dias dos Passos Barbosa, Patricia dos Santos Alves


RESUMO

Este trabalho apresenta uma pesquisa exploratória e descritiva com abordagem qualitativa que teve como objetivo conhecer e analisar a organização do espaço pedagógico ocupado pela criança de 0 a 5 anos de idade nas instituições públicas municipais e particulares que oferecem Educação Infantil em Nova Xavantina – MT. O espaço onde se dá a ação educativa é de fundamental importância, pois pode se caracterizar como fator facilitador ou limitador dela. Um espaço funcional confortável, limpo, claro, bem conservado e adequado à faixa etária atendida propicia o desenvolvimento de ações mais efetivas e eficazes. Para discutir este tema, foi desenvolvida uma pesquisa bibliográfica sobre a organização do espaço na educação infantil através da análise dos seguintes documentos oficiais: Subsídios para Credenciamento e Funcionamento das Instituições de Educação Infantil (SCFIEI), na sequência com o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (RCNEI) e finalizando com os Parâmetros Nacionais de Qualidade e Parâmetros Básicos de Infraestrutura para as instituições de Educação Infantil. A construção do referencial teórico sobre o desenvolvimento infantil foi feita em uma perspectiva interacionista pautado em Wallon e Vygotsky. Os dados primários foram coletados nas escolas públicas municipais: Deus é Amor, Monteiro Lobato, José Rodrigues Silqueira e no Centro de Educação Infantil do município; e nas escolas particulares: Centro Educacional Geração 2000 e Billy Gancho, por meio de uma observação das instalações destes estabelecimentos, registros fotográficos e observação do planejamento pedagógico. A análise dos dados se deu pela confrontação com o que estabelecem os documentos supracitados. O estudo concluiu que a instituições analisadas encontram-se, em quase todos os quesitos, conforme o estabelecido pelos documentos e que a infraestrutura funciona como fator propiciador de um atendimento com qualidade e eficiência.

Palavras-chave: Educação Infantil. Instituições escolares. Espaço Pedagógico. Planejamento; Documentos oficiais da Educação Infantil.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo discutir a importância do espaço pedagógico no processo de ensino- aprendizagem das crianças, as quais partem do princípio de que a LDB tomou por base a Constituição de 1988 e reconheceu o direito da criança ao acesso à Educação Infantil em creches e pré-escolas (CERISARA, 2002), embora, ter acesso não é o suficiente, é preciso ter qualidade. Desde então, no processo de reconhecimento da Educação Infantil como direito da criança e da família, inúmeros documentos têm sido criados no intuito de orientar ações e práticas nessa etapa da educação básica.

O interesse por esse tema surgiu devido a experiência em sala de aula na Educação Infantil. A forma como algumas escolas observadas, principalmente as que pertencem à rede pública de Nova Xavantina-MT, organizam seus espaços e ainda a pobreza extrema frequentemente encontradas nas salas de aula, em relação aos materiais, à decoração, às possibilidades de interações entre as crianças, à falta de desafios corporais e cognitivos, e o mau uso dos espaços, foram questões que sempre chamaram à atenção.

Desde então, no processo de reconhecimento da Educação Infantil como direito da criança e da família, inúmeros documentos vêm sendo produzidos na direção de orientar ações e práticas nessa etapa da educação básica. Outrossim, três documentos produzidos no contexto do aparelho de Estado, tomando como base uma questão específica, porém demasiadamente importante para as instituições de educação infantil, qual seja: a organização do espaço pedagógico. De início o documento, denominado Subsídios para Credenciamento e Funcionamento das Instituições de Educação Infantil (SCFIEI) foi analisado.  E na sequência também o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) e finalizando com os Parâmetros Nacionais de Qualidade e Parâmetros Básicos de Infraestrutura para as instituições de Educação Infantil. Portanto, a concretização de uma proposta de trabalho que considere a criança pequena como sujeito de direitos e que, almeje uma educação infantil de qualidade, significa, para este estudo, identificar elementos presentes no espaço-ambiente, o qual, segundo (HORN, 2004) “não é algo dado, natural, mas sim construído” e que assume função determinante no processo de desenvolvimento infantil. Segundo essa perspectiva interacionista, acredita-se que o espaço-ambiente é organizado intencionalmente para favorecer a constituição da criança enquanto sujeito na relação com o outro.

Em suas pesquisas WALLON (1975) afirma que o papel do “outro” na constituição do “eu” é uma determinação geneticamente social, sendo o “eu” fruto das relações que o sujeito estabelece com os elementos presentes nos ambientes em que está inserido. Assim, o princípio Walloniano prevê a interação com o meio como o diferencial no processo de desenvolvimento do “eu”. A criança-sujeito se constitui na e pela interação com outras crianças, com os adultos, com o meio físico, social e ideológico. E nessa interação com o meio físico são importantes as brincadeiras, principalmente as tradicionais, também, atividades didáticas ou dirigidas, atividades livres, momentos de roda, conto de histórias e passeios externos.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O espaço pedagógico da educação infantil e a constituição do eu numa perspectiva interacionista

Em suas pesquisas WALLON (1975) afirma que: o sujeito é uma síntese da carga biológica e das relações sociais que estabelece ao longo da vida e prevê a interação com o meio como o diferencial no seu processo de desenvolvimento, diferentes contextos socioculturais suscitam, portanto, modos diferenciados de inserção e apropriação do mundo.

Com base na teoria de Wallon, o espaço da educação infantil pode proporcionar situações para o desenvolvimento da criança, facilitando sua relação com o ambiente, e/ou com outros sujeitos que são pares, e com os adultos que as cuidam, tornando possível que o espaço faça parte dessa dinâmica na construção do sujeito (CAMPOS-DE-CARVALHO, RUBIANO; 2000). Pois as características físicas do ambiente comunicam mensagens simbólicas sobre a intenção e valores das pessoas que o controlam (CAMPOS-DE-CARVALHO, RUBIANO; 2000).

Portanto, é dever das instituições de educação infantil manifestar responsabilidade e preocupação com o desenvolvimento e aprendizagem das crianças de 0 a 4 anos. Assim os profissionais dessa área precisam elaborar ações de forma intencional, com qualidade e pertinência a essa etapa da educação básica. Para tanto, as propostas de trabalho devem configurar a intencionalidade expressa em intervenções no espaço condizentes com as necessidades e possibilidades das crianças em cada faixa etária.

É preciso oferecer espaços com propostas diferenciadas, situações diversificadas, que ampliem as possibilidades de exploração e ‘pesquisa’ infantis. As crianças realmente ampliam suas possibilidades de exercitar a autonomia, a liberdade, a iniciativa, a livre escolha, quando o espaço está adequadamente organizado (THIAGO, 2006).

Em contribuição com os educadores no momento de pensar em um   espaço que ofereçam às crianças em creches e pré-escolas, a educadora Mara Campos de Carvalho faz  análises dos ambientes infantis e conclui que eles devem estar organizados de modo a promover o desenvolvimento da identidade pessoal de cada criança, o desenvolvimento de diversas competências como, por exemplo, poder tomar água sozinha e alcançar o interruptor de luz, oportunidades para movimentos corporais diversos, a estimulação dos sentidos, a sensação de segurança e confiança e, finalmente, oportunidades para contato social e privacidade (ROSSETTI-FERREIRA et al, 2007 ).

Além das possibilidades de interação entre crianças e adultos o espaço exige cuidados e especificidades que podem promover a interação da criança com o mundo externo, permitindo a visualização do que se passa lá fora: olhar a chuva, o sol, a neblina, os transeuntes, os animais; isto e muito mais pode ser considerado parte da organização, da rotina e processo educativo que se desencadeia na educação infantil.

A adequação do mobiliário é outro fator extremamente relevância e, ao contrário da percepção que muitas escolas desenvolvem, é necessário planejá-lo considerando tanto as necessidades das crianças quanto as dos professores. Os móveis “grandes” e “pequenos” devem conviver no mesmo espaço, uma vez que a criança não terá, no convívio social mais amplo e familiar, uma estrutura sempre adaptada às suas necessidades. O documento revela um avanço na preocupação com essa organização:

[…] as instituições de educação infantil deverão ser espaços que garantam o imprevisto (e não a improvisação) e possibilitem o convívio das mais variadas diferenças, apontando para a arbitrariedade das regras (daí o jogo e a brincadeira serem essenciais nesta fase da vida), permitindo o exercício da contradição, da provisoriedade e da necessidade de transformações. (BRASIL, 1998a). 

Embora o termo seja bastante citado no documento, não há uma definição precisa para ele, já que se observam conceitos que enfatizam aspectos da organização, em uma dimensão mais alargada.

A organização do tempo pedagógico apresenta uma dinâmica multifacetada, por isso o professor deve perceber as diversas relações sociais entre as crianças e os gostos e necessidades individuais e coletivas. A rotina deve ser planejada, porém flexível, devendo envolver o cuidado, o ensino e as especificidades imaginativas da criança. Segundo o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (RCNEI):

A rotina representa, também, a estrutura sobre a qual será organizado o tempo didático, ou seja, o tempo de trabalho educativo realizado com as crianças. A rotina deve envolver os cuidados, as brincadeiras e a situações de aprendizagens orientadas. (BRASIL, 1998a). 

O educador deve refletir sobre a construção e organização do tempo no espaço educacional entendendo que este espaço está inerentemente ligado às atividades que são propostas para o seu desenvolvimento, além do suprimento das necessidades básicas da criança. E ainda, quais momentos as atividades permanentes são viáveis e necessárias, sempre considerando o contexto sociocultural da proposta pedagógica da instituição, pois as atividades permanentes promovem o desenvolvimento da autonomia e construção da identidade das crianças, e cada atividade propõe diversas situações seja de cuidado, higiene ou prazer.

3 METODOLOGIA

Este trabalho apresenta uma pesquisa exploratória e descritiva com abordagem qualitativa que teve como objetivo conhecer e analisar a organização do espaço pedagógico ocupado pela criança de 0 a 5 anos de idade nas instituições públicas municipais e particulares que oferecem Educação Infantil em Nova Xavantina – MT. Mediante os documentos oficiais que delimita a compreensão do conceito de espaço-ambiente e segundo a perspectiva Walloniana do desenvolvimento infantil, propôs-se como procedimento metodológico de pesquisa a observação das escolas públicas e particulares do município, com a devida autorização prévia da direção do estabelecimento, durante o mês de agosto de 2013. buscou- se enfatizar os elementos que caracterizam as peculiaridades das instituições quanto ao objeto de estudo espaço-ambiente, e às recorrências das especificidades da Educação Infantil e, ainda, quando autorizada foi possível complementar com registros fotográficos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para que esse estudo acontece, foi importante ter conhecimento dos documentos oficiais que especificam a concepção e a organização dos espaços pedagógicos, e principalmente os Parâmetros Curriculares de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006), pois o espaço físico é fator determinante para a qualidade do atendimento oferecido. Por essa razão acredito ser fundamental o entendimento da diferenciação entre as denominações “ambiente” e “espaço”, objeto deste trabalho. Essa diferenciação possibilita aprofundar compreensões que podem resultar na adequação dos espaços pedagógicos na educação infantil. Nos documentos os conceitos não estão definidos de forma clara. A acepção dos termos mostra que ambos são tratados como sinônimos. Isso implica um empobrecimento conceitual, que deixa de contribuir para a ampliação das discussões e aprimoramentos do espaço pedagógico e das práticas educativas. Os documentos serviram como paradigma para a análise dos dados levantados pela pesquisa nas instituições públicas e particulares de educação infantil do município de Nova Xavantina-MT. Constatou-se que as escolas construíram salas de aula com a finalidade de atender crianças de 0 a 5 anos de idade e de modo geral, atenderam os requisitos exigidos para tal, pois é importante lembrar que as escolas foram construídas antes do documento ser publicado em 2006. Assim, pode-se afirmar que o conhecimento das necessidades desse público embasou a construção das escolas, mesmo sem ainda existir um parâmetro para tal iniciativa e que as escolas foram realizando reformas a fim de solucionar as poucas deficiências existentes nos prédios. É claro que existem algumas deficiências que precisam ser solucionadas o mais rápido possível, como: o piso emborrachado nas salas do Centro de Educação Infantil- Creche, pois o piso como está pode propiciar a ocorrência de queda, as adaptações que permitam a acessibilidade por todas as crianças e a climatização das salas. É evidente, porém, que, apesar destas limitações, o espaço atende, com qualidade, as necessidades que envolvem as ações ali desenvolvidas, ou seja, o espaço dessa instituição é fator facilitador do processo de ensino/cuidado/aprendizagem.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Básicos de infraestrutura para instituições de educação infantil. Brasília: MEC/SEB, 2006a.

BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros nacionais de qualidade para a educação infantil. Brasília: MEC/SEB, 2006b. 2 v.

BRASIL. Ministério da Educação. Referencial Curricular Nacional para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998b. 3 v.

CERISARA, Ana Beatriz. A produção acadêmica na área da educação infantil a partir da análise de pareceres sobre o Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil: primeiras aproximações. In: FARIA Ana Lúcia Goulart de; PALHARES, Marina Silveira (Org.). Educação Infantil pós-LDB. Campinas: Autores Associados F E/ Unicamp, 2003. p. 19-49.

HORN, Maria da Graça Souza. Sabores, cores, sons, aromas: A organização dos espaços na Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.16; 215.

ROSSETTI-FERREIRA, M. C. et al. (Org.). Os fazeres na Educação Infantil. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2007. p.147; 150;151.

THIAGO, Lilian Pacheco S. Espaço que dê espaço. Encontros e encantamentos na Educação Infantil. Campinas: Papirus, p. 51-62, 2000.

WALLON, Henri. Psicologia da Infância. Lisboa: Editorial Estampa. 1975.p.159