REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202412061021
Inaê Gabriele C. Nascimento1
RESUMO
O artigo analisa a concessão da pensão por morte para indivíduos maiores de 21 anos, com enfoque na legislação brasileira e nas políticas públicas que limitam esse direito ao critério etário, excluindo jovens que ainda estão em processo de conclusão do ensino superior. O trabalho tem como objetivo principal avaliar a necessidade de revisão dos parâmetros legais que cessam o benefício quando o dependente atinge a maioridade, desconsiderando a dependência econômica e as dificuldades enfrentadas por esses indivíduos para concluir sua formação acadêmica. Utilizando uma metodologia de análise documental e legislativa, a pesquisa explora a evolução das normas previdenciárias e a adequação das políticas públicas frente à realidade social e econômica dos jovens. A pesquisa conclui que a limitação etária para a concessão da pensão por morte é prejudicial, especialmente em casos de dependentes que ainda necessitam de apoio financeiro para concluir seus estudos, propondo, assim, uma revisão legislativa que amplie a cobertura até a finalização do curso superior.
Palavras-chave: Pensão por morte. Legislação previdenciária. Dependência econômica. Políticas públicas.
ABSTRACT
The article analyzes the granting of the death pension to individuals over 21 years of age, focusing on Brazilian legislation and public policies that limit this right to age criteria, excluding young people who are still in the process of completing higher education. The main objective of the work is to evaluate the need to review the legal parameters that cease the benefit when the dependent reaches the age of majority, disregarding economic dependence and the difficulties faced by these individuals in completing their academic training. Using a documentary and legislative analysis methodology, the research explores the evolution of social security standards and the adequacy of public policies in light of the social and economic reality of young people. The research concludes that the age limitation for granting the death pension is harmful, especially in cases of dependents who still require financial support to complete their studies, thus proposing a legislative review that expands coverage until the completion of higher education .
Keywords: Death pension. Social security legislation. Economic dependence. Public policies.
1. INTRODUÇÃO
A concessão de pensão por morte no Brasil é um direito social previsto pela legislação previdenciária, sendo tradicionalmente oferecido a dependentes de segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Entretanto, a legislação impõe limites específicos quanto à idade dos dependentes, estipulando que o benefício se encerra aos 21 anos, salvo exceções em casos de invalidez ou deficiência pré-existentes. No entanto, essa norma não contempla uma realidade vivida por muitos jovens, que, ao atingir essa idade, ainda se encontram dependentes economicamente e em processo de conclusão de sua formação educacional, especialmente no ensino superior.
Este trabalho tem como delimitação a análise da legislação brasileira e das políticas públicas relacionadas à concessão da pensão por morte para indivíduos maiores de 21 anos, com foco específico na conclusão de cursos de graduação. A legislação vigente, ao limitar a idade dos beneficiários, desconsidera o impacto que a perda de um ente responsável pode ter na trajetória acadêmica de jovens adultos, muitas vezes impossibilitando-os de concluir sua formação em razão de dificuldades financeiras.
O problema central da pesquisa busca compreender por que é necessária uma análise crítica da legislação e das políticas públicas referentes à pensão por morte no caso de indivíduos que completam 21 anos e estão finalizando a graduação. A legislação atual não contempla plenamente as necessidades daqueles que, mesmo atingindo a maioridade, ainda dependem do auxílio financeiro familiar para garantir sua formação acadêmica.
A hipótese levantada é de que a cessação do benefício aos 21 anos de idade, salvo as exceções já previstas, se revela prejudicial ao limitar a avaliação das necessidades dos jovens a critérios etários, sem considerar o contexto educacional e econômico em que muitos se encontram. A legislação poderia ser revista, ampliando a proteção social a esses indivíduos até a conclusão do ensino superior, de modo a garantir que o falecimento de um ente responsável não interfira diretamente na continuidade de seus estudos.
A reflexão proposta por este trabalho justifica-se pela necessidade de revisão das políticas públicas e da legislação em vigor, tendo em vista que a perda do direito à pensão por morte aos 21 anos afeta diretamente a viabilidade da conclusão do ensino superior por muitos jovens. A dependência econômica prolongada, combinada com a falta de uma proteção social adequada, pode agravar a situação desses indivíduos, colocando em risco seu futuro educacional e profissional.
Além disso, o trabalho busca chamar a atenção para os critérios utilizados na concessão ou cessação do benefício, sugerindo a necessidade de uma abordagem mais ampla que considere as dificuldades financeiras e o impacto do luto na vida de jovens que perdem seus responsáveis. Nesse contexto, torna-se crucial avaliar a possibilidade de modificações na legislação, de forma a torná-la mais justa e realista, considerando as condições econômicas e acadêmicas dos indivíduos maiores de 21 anos que dependem da conclusão de seu curso superior para alcançar independência financeira.
O objetivo geral deste trabalho é analisar a legislação e as políticas públicas brasileiras referentes à concessão de pensão por morte para indivíduos maiores de 21 anos, especialmente no contexto de conclusão de cursos de graduação.
Os objetivos específicos incluem: (i) demonstrar a necessidade de revisão dos parâmetros que limitam a concessão da pensão por morte aos maiores de 21 anos em razão da conclusão do ensino superior; (ii) levantar a relevância de fatores como dependência econômica e falta de proteção social adequada no contexto atual; e (iii) propor sugestões de modificações legais que possam ser aplicadas de maneira realista, com o objetivo de ampliar a proteção aos jovens que ainda se encontram em formação acadêmica.
2. PREVIDÊNCIA SOCIAL NO BRASIL
A Previdência Social está prevista no artigo 194 da Constituição Federal como um dos subsistemas de proteção social que compõem o sistema de seguridade social brasileiro. O referido artigo dispõe que:
Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a garantir os direitos relacionados à saúde, previdência e assistência social (BRASIL, 1988).
No artigo 201, a Constituição atribui à previdência social a função primordial de proteger a classe trabalhadora contra riscos e necessidades sociais, prevendo a cobertura de eventos como incapacidade temporária ou permanente para o trabalho, idade avançada, e outras situações que necessitem de proteção previdenciária (BRASIL, 1988).
Da mesma forma, a Lei 8.213/91, que regulamenta o plano de benefícios da previdência social, estabelece, em seu artigo 1º, que a previdência social tem como objetivo “assegurar aos seus beneficiários os meios indispensáveis de manutenção, em razão de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares, prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente” (BRASIL, 1991).
Segundo Castro e Lazzari (2020, p. 76), a previdência social representa uma intervenção estatal voltada à promoção do bem-estar social, justificando-se pela necessidade de prevenir que trabalhadores, ao enfrentarem incapacidade laboral temporária ou permanente, sejam excluídos da sociedade. Dessa forma, a previdência se configura como um instrumento de efetivação da proteção social dos trabalhadores.
Como parte integrante do sistema de seguridade social, a previdência social atua em conjunto com a saúde e a assistência social, visando à proteção das necessidades da população. No entanto, a previdência se diferencia dos outros dois pilares da seguridade social por duas características essenciais: a contributividade, ou seja, o financiamento por meio de contribuições dos segurados, e a filiação compulsória, que impõe a obrigatoriedade de participação dos trabalhadores.
2.1 SEGURADOS
O segurado é a pessoa que estabelece um vínculo com a Previdência Social, de onde derivam direitos e obrigações para ambas as partes. Esse vínculo é também conhecido como filiação, conforme descrito na Instrução Normativa 77/2015:
Art. 3º Filiação é o vínculo que se estabelece entre as pessoas que contribuem para a Previdência Social e esta, gerando direitos e obrigações.
O beneficiário, por sua vez, é o indivíduo que depende do segurado quando este, devido a alguma contingência, não pode mais prover sustento ao dependente. A Lei 8.213/1991, no artigo 10, classifica os beneficiários em segurados e dependentes:
Art. 10. Os beneficiários do Regime Geral de Previdência Social classificam-se como segurados e dependentes, conforme disposto nas Seções I e II deste capítulo.
Os segurados da Previdência Social são subdivididos em: empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso, contribuinte individual, segurado facultativo e segurado especial. Os dependentes dos segurados estão definidos no artigo 16 da Lei 8.213/1991:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I – o cônjuge, a companheira, o companheiro, e o filho não emancipado de qualquer condição, menor de 21 anos, inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave;
II – os pais;
III – o irmão não emancipado de qualquer condição, menor de 21 anos, inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave.
Esse artigo estabelece uma ordem preferencial de dependentes. Assim, a existência de dependentes da primeira categoria (inciso I) exclui os da segunda (inciso II) do direito de pleitear benefícios, e a existência de dependentes da segunda categoria exclui os da terceira (inciso III).
Os dependentes da primeira categoria estão isentos de comprovar dependência econômica, o que não é exigido nas demais categorias. A doutrina e a jurisprudência ampliam essa primeira categoria, incluindo o enteado, o menor tutelado, o cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato que recebia pensão alimentícia. Entretanto, todos esses casos exigem a comprovação de dependência econômica.
Há uma controvérsia quanto ao enquadramento do menor sob guarda como dependente. A Lei 9.528/1997 o excluiu dessa condição, o que foi confirmado pela Emenda Constitucional 103/2019. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão repetitiva, decidiu que o menor sob guarda tem direito à pensão por morte, equiparando-o a um dependente.
Esse entendimento baseia-se no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê que os menores sob guarda mantêm “todos os direitos, inclusive previdenciários”. No campo do direito, quando há conflito entre normas, aplica-se o critério da especialidade, ou seja, a norma especial prevalece sobre a geral. Nesse caso, o ECA é a lei específica por tratar diretamente dos interesses de crianças e adolescentes, enquanto a Lei 8.213 é uma norma geral, que regula o direito previdenciário. O Tema 732 do STJ estabelece que:
O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, desde que comprovada a dependência econômica, nos termos do art. 33, § 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, mesmo que o óbito do instituidor da pensão tenha ocorrido após a vigência da Medida Provisória 1.523/96, convertida na Lei 9.528/97. Esse entendimento baseia-se no caráter especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) em relação à legislação previdenciária.
A discussão chegou ao Supremo Tribunal Federal, que decidiu que, até a Emenda Constitucional 103/2019, os menores sob guarda estariam classificados como dependentes, desde que fosse comprovada a dependência econômica em relação ao guardião.
2.1.2 DEPENDENTES
Os dependentes são pessoas previstas em lei que possuem uma relação familiar ou de dependência econômica com o segurado, o que lhes confere o direito de receber certos benefícios previdenciários nessa condição.
É relevante destacar o texto constitucional, especificamente o artigo 201, incisos IV e V, que estabelece a possibilidade de um indivíduo receber benefícios previdenciários como dependente, como no caso do salário-família, auxílio-reclusão e pensão por morte:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)
IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998).
A Lei 8.213/91, em seu artigo 16, define quem são os dependentes, organizando-os em classes com base em critérios de prioridade na relação com o segurado. As classes de dependentes são as seguintes:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos, inválido, ou com deficiência intelectual, mental ou grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
II – os pais;
III – o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos, inválido, ou com deficiência intelectual, mental ou grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015).
Importante observar que a existência de um dependente de uma classe exclui o direito dos dependentes das classes subsequentes. Além disso, enteados e menores tutelados são equiparados a filhos, desde que declarados pelo segurado e comprovada a dependência econômica, conforme o regulamento (GOV, 2021).
Para os dependentes mencionados no inciso I, a dependência é presumida. No entanto, aqueles das demais classes precisam comprovar a dependência econômica. (GOV, 2021).
Outro ponto importante é que, para comprovar união estável ou dependência econômica, é necessário apresentar início de prova material contemporânea aos fatos, produzida até 24 meses antes da data do óbito ou da prisão do segurado. Nessas situações, a prova exclusivamente testemunhal não será aceita, salvo em casos de força maior ou caso fortuito, conforme o regulamento. (GOV, 2021).
Por fim, se uma pessoa que seria considerada dependente for condenada por crime contra o segurado, com decisão transitada em julgado, será definitivamente excluída do rol de dependentes, exceto nos casos de absolutamente incapazes ou inimputáveis (GOV, 2021).
2.2 PENSÃO POR MORTE E SEUS TIPOS
A pensão por morte é um benefício previdenciário previsto no artigo 74 daVLei 8.213, de 24 de julho de 1991, que trata dos planos de benefícios da Previdência Social. O texto legal estabelece que a “pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, desde que mantenha a qualidade de segurado.”
Antes da Reforma da Previdência, os dependentes recebiam o valor equivalente à aposentadoria que o segurado falecido recebia. No caso de o segurado não estar aposentado, o benefício era calculado com base nos últimos salários que ele recebia. Contudo, com a Reforma da Previdência, introduzida pela Emenda Constitucional 103/2019, a forma de cálculo desse benefício foi alterada. Agora, todas as contribuições do segurado são consideradas, e o valor da pensão é calculado com base em 60% do valor, acrescido de 2% para cada ano de contribuição que ultrapassar 20 anos. Essa nova regra está prevista no artigo 23 da EC 103/2019 (Almeida, 2022).
A distribuição dos valores da pensão segue a seguinte lógica: 60% do valor é destinado ao cônjuge, com um acréscimo de 10% para cada dependente adicional, até o limite de quatro dependentes, o que totaliza 100% do benefício. Conforme o parágrafo 1º, as cotas destinadas aos dependentes menores cessam quando atingem a maioridade, estabelecida aos 21 anos (Rodrigues David, 2023).
Não é permitida a inclusão de novos dependentes, salvo nos casos previstos na regra das cotas. De acordo com o § 2º do artigo 23 e seus incisos, um dependente inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave terá direito a 100% do benefício. Além disso, se o valor da aposentadoria for maior do que o valor da pensão por morte, o benefício maior será reduzido, sempre preservando o menor valor. Entretanto, a pensão por morte nunca poderá ser inferior a um salário mínimo, conforme disposto no § 2º do artigo 24 da EC 103/2019.
As pensões oferecidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) são importantes benefícios previdenciários destinados a amparar dependentes de segurados que falecem, garantindo-lhes proteção econômica. Entre os principais tipos de pensão existentes, destacam-se a pensão por morte urbana, a pensão por morte rural e a pensão de ex-combatente. Cada uma dessas modalidades atende a diferentes categorias de segurados e se submete a requisitos específicos estabelecidos pela legislação previdenciária.
A pensão por morte urbana é destinada aos dependentes do segurado que exercia atividades na área urbana. De acordo com a Lei 8.213/1991, o benefício é devido ao conjunto dos dependentes do segurado falecido, aposentado ou não, desde que ele possuísse qualidade de segurado na data do óbito. Essa modalidade abrange trabalhadores com vínculo formal, contribuinte individual, facultativo e trabalhadores avulsos. O cálculo do valor da pensão, após a Reforma da Previdência (EC 103/2019), leva em consideração 60% do valor que o segurado teria direito caso se aposentasse, mais 2% para cada ano de contribuição superior a 20 anos (SAVARIS, 2020).
A pensão por morte rural, por sua vez, é voltada aos dependentes do segurado que exercia atividade rural. Essa categoria inclui agricultores, pescadores artesanais e outros trabalhadores rurais, que, em regra, contribuem de forma diferenciada para o INSS. Segundo Carvalho (2020), a pensão por morte rural, assim como a urbana, exige que o segurado possuísse a qualidade de segurado no momento do falecimento. Contudo, no meio rural, há particularidades, como o tratamento diferenciado para o segurado especial, que pode comprovar o exercício de atividade rural por meio de documentos que evidenciem sua condição de trabalhador agrícola.
Outro tipo de pensão oferecida pelo INSS é a pensão de ex-combatente. Esse benefício é concedido aos dependentes de militares que participaram da Segunda Guerra Mundial, integrando a Força Expedicionária Brasileira (FEB) ou outras missões militares internacionais em que o Brasil esteve envolvido. Esse benefício é regido pela Lei 4.242/1963 e segue critérios específicos, sendo que a pensão de ex-combatente possui algumas vantagens, como o valor correspondente ao soldo integral do militar na ativa, sem as reduções aplicadas nas pensões civis (FARIA, 2019).
Cada tipo de pensão atende a uma categoria de segurados com particularidades próprias, o que torna fundamental a observância das regras aplicáveis a cada caso. Na pensão por morte urbana, o segurado precisa ter contribuído regularmente, enquanto na pensão rural, a comprovação do trabalho no campo é essencial. Já no caso da pensão de ex-combatente, além da participação em combate, o militar precisa atender aos critérios específicos da legislação militar (SAVARIS, 2020).
É importante mencionar que, em todas as modalidades de pensão, os dependentes são classificados em diferentes categorias, de acordo com a relação familiar ou de dependência econômica com o segurado. Segundo Costa (2021), as três classes principais de dependentes são: o cônjuge ou companheiro e filhos menores de 21 anos, os pais, e os irmãos menores ou inválidos. Dependentes de primeira classe têm prioridade sobre os de segunda, e estes sobre os de terceira classe, conforme o artigo 16 da Lei 8.213/1991.
A Reforma da Previdência trouxe mudanças significativas no cálculo das pensões, afetando especialmente o valor final do benefício. Antes da reforma, os dependentes recebiam 100% da aposentadoria ou do valor que o segurado teria direito ao se aposentar. Com as novas regras, o valor foi reduzido para 60%, acrescido de 10% por dependente adicional, até o limite de 100% (CARVALHO, 2020). Isso impacta diretamente os beneficiários de pensões por morte urbana e rural, gerando questionamentos sobre a suficiência do benefício para manter o sustento da família.
Assim, a diversidade de tipos de pensão visa atender às especificidades de cada grupo de trabalhadores e seus dependentes. Contudo, as reformas previdenciárias e as regras de cálculo aplicáveis têm sido alvo de debate, uma vez que podem comprometer a eficácia da proteção social oferecida aos dependentes do segurado. A análise dos impactos dessas reformas é essencial para garantir que os direitos previdenciários continuem a cumprir seu papel de amparar as famílias em situações de vulnerabilidade.
2.3 PENSÃO POR MORTE PARA MAIORES DE 21 ANOS DE IDADE ESTUDANTES E NÃO PORTADORES DE NECESSIDADE ESPECIAL
A jurisprudência atual dos Tribunais Superiores no Brasil, especialmente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), adota um entendimento estritamente legalista e biológico no que diz respeito à concessão de pensão por morte. Nesse sentido, não há possibilidade de extensão do benefício para dependentes maiores de 21 anos, ainda que estejam cursando ensino superior, curso técnico ou qualquer outro tipo de educação formal, particularmente no âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Esse posicionamento é reafirmado em diversas decisões judiciais.
Por exemplo, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) decidiu em um julgamento que a Lei 8.213/91 prevê que a pensão por morte seja devida apenas até que o dependente complete 21 anos, salvo em casos de invalidez. Da mesma forma, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) reitera a impossibilidade de extensão da pensão além dos 21 anos, mesmo que o beneficiário seja estudante universitário, devido à ausência de previsão legal (Carvalho, 2022).
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) também seguiu essa linha de raciocínio, destacando que, para a concessão da pensão por morte, os requisitos estabelecidos na legislação vigente à época do óbito devem ser respeitados. A ausência de previsão legal impede a prorrogação do benefício para estudantes maiores de 21 anos, conforme a súmula nº 74 desse tribunal (Silva; Araújo, 2022).
O STJ, em sua jurisprudência consolidada, estabelece que a pensão por morte é devida até os 21 anos de idade, exceto nos casos de invalidez. Não há respaldo legal para estender o benefício até os 24 anos para estudantes universitários, como demonstrado no REsp 742.034/PB. O tribunal também reforça que, em nome do princípio da separação dos Poderes, o Judiciário não pode atuar como legislador positivo (Leite, 2022).
Esse entendimento é novamente destacado no REsp 1.369.832/SP, onde o STJ utilizou o princípio da separação dos Poderes para julgar improcedente a extensão da pensão para estudantes maiores de 21 anos. A decisão reforça a interpretação legal vigente e a impossibilidade de se legislar por meio de decisões judiciais (Mendonça, 2018).
No entanto, há críticas quanto à falta de reflexão jurídica mais aprofundada sobre a questão. Argumenta-se que uma interpretação mais flexível, baseada nos princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88), o direito à educação (art. 205, CRFB/88) e a proteção à juventude (art. 227, CRFB/88), poderia garantir maior proteção social aos estudantes dependentes.
Esse debate continua relevante, especialmente diante da necessidade de compatibilizar os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil com a realidade socioeconômica dos beneficiários.
Apesar de haver um amplo conjunto de decisões judiciais que negam a extensão da pensão por morte a dependentes segurados que são estudantes maiores de 21 anos, com base no princípio da legalidade, previsto nos artigos 5º, II, e 37, caput, da Constituição Federal de 1988, também existem decisões favoráveis a esse pedido. Um exemplo é o entendimento do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM), que reconheceu a possibilidade de extensão da pensão por morte no processo nº 0640227-65.2018.8.04.0001, além de outros julgados que seguem a mesma linha. (Carvalho, 2022).
Um desses julgados é a Apelação Cível em Mandado de Segurança, que trata da concessão de pensão por morte a beneficiários universitários até os 24 anos ou até a conclusão do curso superior, com base nas Emendas Constitucionais nº 64/2010 e 65/2010, destacando a proteção à juventude e o direito social à educação e aos alimentos. Nesse contexto, o TJ-AM decidiu em favor da preservação do mínimo existencial e da dignidade dos jovens, conforme o artigo 227 da Constituição, assegurando o pleno desenvolvimento de sua personalidade. (Silva; Araújo, 2022).
Outro caso de destaque envolve a Arguição de Inconstitucionalidade n.º 0005283-94.2015.8.04.0000, em que o TJ-AM declarou a inconstitucionalidade do limite etário de 21 anos previsto no art. 2º, II, b, da Lei Complementar n.º 30/2011, por violar os direitos fundamentais à educação e à dignidade humana. O tribunal entendeu que, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 65/2010, decisões que indeferem a pensão por morte a universitários maiores de 21 anos exclusivamente com base no princípio da legalidade desconsideram a ponderação de princípios de mesma hierarquia, como o direito à educação. (Leite, 2022).
EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL – RECURSO DE AGRAVO DE INTERNO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE CONHECIMENTO – RESTABELECIMENTO DA PENSÃO POR MORTE – SUSPENSÃO DO BENEFÍCIO – FILHA MAIOR DE 21 ANOS – ESTUDANTE – POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO DO PENSIONAMENTO – ATÉ COMPLETAR 24 ANOS – APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO FEDERAL – CONCRETUDE AO DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO – PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – CONCESSÃO DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA NO JUÍZO A QUO – INDEFERIMENTO DO EFEITO SUSPENSIVO RECURSAL – MANUTENÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. Assegura-se o benefício de pensão por morte até os 24 anos, se o dependente for estudante universitário, nos termos das Leis Federais n. 3.765/70 (art. 7o, I, ‘d’ e ‘e’), n. 8.112/1990 (art. 197, parágrafo único, I) e n. 9.250/1995 (art. 35, § 1o), cujas normas emprestam maior concretude ao direito fundamental à educação e ao princípio da dignidade humana. (TJ-MT 10160414720208110000 MT, Relator: MARCIO VIDAL, Data de Julgamento: 07/12/2020, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 21/01/2021).
Além disso, em um julgamento de Apelação Cível, datado de 10/11/2021, o TJ-AM afastou o argumento de falta de fonte de custeio para a extensão do benefício de pensão por morte a estudantes universitários, ressaltando que tal concessão não representa a criação de um novo benefício, mas sim a continuidade daquele já existente. (Mendonça, 2018).
Diante disso, verifica-se um cenário com decisões contrárias à extensão da pensão por morte para estudantes maiores de 21 anos, e outras que permitem a prorrogação do benefício. Para resolver esse impasse previdenciário, será necessária uma análise hermenêutica que busque a interpretação mais coerente com os princípios constitucionais, em especial aqueles que garantem o direito à educação e à dignidade da pessoa humana.
A aplicação da ultratividade ou extensão do benefício de pensão por morte a maiores de 21 anos e estudantes se alinha à necessidade de garantir a integridade do mínimo existencial material e psicológico do dependente legal. Isso ocorre ao se buscar a continuidade do vínculo acadêmico e o desenvolvimento de contribuições intelectuais do indivíduo para a sociedade. A alteridade normativa, inerente ao conceito de dever, exige a integração de fatores que culminem no princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais, em especial o direito à educação, consagrado no artigo 6º da Constituição Federal de 1988.
Nesse sentido, o dever fundamental de sustento se conecta à solidariedade intergeracional, que é um princípio essencial da Previdência Social. Embora, em princípio, as gerações economicamente ativas sejam responsáveis pelo custeio dos benefícios previdenciários, é necessário garantir condições mínimas para que possam exercer essa função de forma adequada. A educação, nesse contexto, é um instrumento crucial para o bem comum e a saúde do sistema previdenciário.
Além disso, a qualificação acadêmica tende a proporcionar ganhos financeiros maiores, conforme demonstrado por estudos de mercado de trabalho. A Pesquisa Salarial de 2018 da Catho Educação indicou que profissionais com pós graduação ou mestrado podem aumentar seus salários significativamente. Em cargos de diretoria, a diferença salarial entre aqueles com MBA ou pós-graduação pode chegar a 47,2%.
A correlação entre capacitação acadêmica e incremento salarial destaca a importância de assegurar a continuidade educacional dos dependentes. Segundo Paschoal (2001) e Marras (2000), a aquisição de novas competências resulta em um crescimento exponencial na remuneração, uma constatação alinhada com as regras da experiência comum, conforme o artigo 375 do CPC/15.
Assim, a análise da extensão da pensão por morte a maiores de 21 anos e estudantes deve considerar aspectos filosóficos, éticos, sociais, econômicos e educacionais, buscando garantir a efetivação dos direitos previstos no artigo 3º, incisos I, II e III, da CRFB/88. Esses direitos, que incluem a construção de uma sociedade justa e solidária, não podem ser plenamente garantidos sem uma base educacional sólida que reduza as desigualdades sociais.
A proposta deste estudo é que a Previdência Social, no âmbito do Regime Geral (RGPS), mantenha um diálogo com o dever fundamental de sustento e o direito à educação. Sem essa conexão, o sistema constitucional corre o risco de gerar entropia, já que os direitos fundamentais permeiam todo o ordenamento jurídico. O Direito Previdenciário, embora tenha independência didática e funcional, não deve ser isolado das demais áreas do Direito.
Propõe-se, portanto, que o Direito Previdenciário favoreça um diálogo entre as diversas fontes normativas, buscando realizar o princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais. A extensão do benefício previdenciário para maiores de 21 anos e estudantes, mesmo não portadores de necessidades especiais, apresenta mais benefícios do que malefícios, tanto no aspecto educacional quanto no econômico.
A análise econômica predominante para a concessão de benefícios previdenciários não deve ser desconsiderada, mas é necessário ir além do aspecto econômico, adotando uma visão ampla e prática da questão. A manutenção da educação como parte do pacto intergeracional e a subsistência dos dependentes do segurado devem ser analisadas à luz da hermenêutica constitucional, conforme os artigos 3º e 5º da CRFB/88.
Dado o contexto socioeconômico brasileiro, em que uma parcela significativa da população com 25 anos ou mais não possui ensino fundamental ou superior completo, a vedação da extensão da pensão por morte a maiores de 21 anos e estudantes se mostra insustentável.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A concessão da pensão por morte para maiores de 21 anos, especialmente quando vinculada à condição de estudantes, revela-se uma questão de grande relevância jurídica e social. Ao longo deste artigo, ficou evidenciada a importância de se considerar não apenas o aspecto econômico da dependência previdenciária, mas também as necessidades educacionais e sociais que permeiam a vida dos dependentes.
A manutenção do benefício para maiores de 21 anos que ainda se encontram em processo educacional é uma medida que dialoga diretamente com o princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais, conforme previsto na Constituição Federal de 1988. O direito à educação, classificado como um direito social de terceira geração, reforça a necessidade de proteção a esses indivíduos, garantindo lhes o mínimo existencial e o desenvolvimento pleno de suas potencialidades intelectuais e profissionais.
Além disso, o caráter intergeracional da Previdência Social, que promove a solidariedade entre gerações, deve ser observado com atenção ao permitir que esses jovens possam dar continuidade aos seus estudos e, futuramente, contribuir de forma significativa para a sociedade e o sistema previdenciário.
A tese defendida no presente estudo sustenta que a extensão da pensão por morte para maiores de 21 anos é uma medida de justiça social, que não só assegura o direito ao sustento e à educação, mas também contribui para a redução das desigualdades sociais e a promoção de um futuro mais igualitário. Diante disso, é fundamental que o Direito Previdenciário dialogue com outras áreas do direito e da sociedade, buscando soluções que atendam às demandas dos tempos atuais e garantam a dignidade e os direitos dos dependentes.
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1Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro.