REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202411291845
Carlo Henrique Quirino1,
Joelson Barata2,
Orientador: Tony Rinaldi Vargas3,
Coorientadora: Karina Furman4
RESUMO
Este artigo aborda a importância da cadeia de custódia no sistema jurídico brasileiro, com foco na região sudeste do Estado do Pará, e sua relevância para a integridade e admissibilidade das provas nos processos criminais. A Constituição Federal de 1988, assegura o devido processo legal, a ampla defesa e a presunção de inocência e a Lei nº 13.964/2019, conhecida como Lei Anticrime, vem fortalecer a cadeia de custódia nos processos penais que exige rigorosos procedimentos para preservar as provas desde sua coleta até o descarte, incluindo lacres e embalagens adequadas, bem como um registro detalhado das pessoas envolvidas na manipulação das evidências. A violação dessas normas pode invalidar as provas. No Pará, as características territoriais e logísticas dificultam a aplicação eficaz da cadeia de custódia, mas medidas importantes, como a criação da Comissão de Trabalho de Implantação da Cadeia de Custódia e a Central de Custódia de Belém, têm sido implementadas, com capacitações para agentes de segurança e embora a colaboração desses agentes, peritos, promotores e advogados seja essencial, persistem desafios como a falta de capacitação e infraestrutura forense inadequada, o que compromete a integridade das provas. Além disso, tecnologias como drones e GPS têm sido utilizadas para melhorar a coleta de evidências em áreas remotas. A pesquisa enfatiza a importância de investimentos em infraestrutura, capacitação e tecnologias adequadas para fortalecer a cadeia de custódia, assegurando a justiça e a proteção ambiental. A análise é baseada em estudos de caso e revisão de literatura, oferecendo uma visão abrangente sobre as práticas atuais e as soluções propostas.
Palavras-chave: Cadeia de custódia. Sustentabilidade. Impactos socioeconômicos.
ABSTRACT
This article addresses the importance of the chain of custody in the Brazilian legal system, focusing on the southeastern region of the State of Pará, and its relevance for the integrity and admissibility of evidence in criminal proceedings. The Federal Constitution of 1988 ensures due process, full defense and the presumption of innocence, and Law No. 13,964/2019, known as the Anticrime Law, strengthens the chain of custody in criminal proceedings, requiring strict procedures to preserve evidence from its collection to disposal, including seals and adequate packaging, as well as a detailed record of the people involved in handling the evidence. Violation of these rules may invalidate the evidence. In Pará, territorial and logistical characteristics make it difficult to effectively implement the chain of custody, but important measures, such as the creation of the Working Committee for Implementation of the Chain of Custody and the Belém Custody Center, have been implemented, with training for security agents. Although the collaboration of these agents, experts, prosecutors and lawyers is essential, challenges persist, such as the lack of training and inadequate forensic infrastructure, which compromises the integrity of evidence. In addition, technologies such as drones and GPS have been used to improve evidence collection in remote areas. The research emphasizes the importance of investments in infrastructure, training and appropriate technologies to strengthen the chain of custody, ensuring justice and environmental protection. The analysis is based on case studies and literature review, offering a comprehensive overview of current practices and proposed solutions.
Keywords: Chain of custody. Sustainability. Socio-economic impacts.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O processo penal brasileiro, ao longo de sua evolução histórica, tem se estruturado para garantir uma busca eficiente pela verdade, fundamentada em provas obtidas de maneira legítima e respeitando os direitos fundamentais dos envolvidos. A prova, em especial, desempenha um papel essencial no sistema judiciário, constituindo-se como um conjunto de elementos que visam reconstruir os fatos e garantir que as decisões judiciais sejam pautadas em evidências concretas.
No entanto, essa busca pela verdade enfrenta desafios significativos, como a impossibilidade de presenciar os eventos e a complexidade de se obter uma reconstrução completa e precisa dos fatos, como observam autores como Geraldo Prado (2022) e Michele Taruffo (2021).
No contexto do direito processual penal, a cadeia de custódia emerge como um mecanismo crucial para a integridade das provas e surge estabelecida pela Lei nº 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime, buscando regular todos os procedimentos necessários para assegurar que as provas coletadas sejam preservadas desde sua coleta até o seu descarte, prevenindo sua contaminação ou manipulação indevida.
Este conceito se tornou um pilar para garantir que a integridade das evidências seja mantida, fundamental para que o processo judicial seja transparente, justo e fundamentado em provas legítimas, conforme destacam estudiosos como Renato Brasileiro de Lima (2020) e Lopes Jr. (2021).
No Estado do Pará, um dos maiores territórios do Brasil, a aplicação da cadeia de custódia encontra desafios logísticos e territoriais, que exigem soluções adaptadas à realidade local. A vastidão do território e a presença de atividades ilegais, como o desmatamento e a extração ilegal de recursos naturais, complicam a preservação das provas, tornando o trabalho de coleta, armazenamento e análise de evidências uma tarefa complexa.
Em resposta a essas dificuldades, o Pará tem implementado medidas como a criação da Comissão de Trabalho de Implantação da Cadeia de Custódia e a capacitação de agentes de segurança, com a instalação da Central de Custódia em Belém, em 2022, que visam fortalecer as práticas de preservação e rastreabilidade das provas.
Ademais, a perspectiva socioambiental se torna fundamental, considerando que o Pará abriga uma parte significativa da Floresta Amazônica e é palco de frequentes crimes ambientais e a aplicação da cadeia de custódia em crimes ambientais, como a contaminação de solo e água, é essencial para assegurar a responsabilização dos infratores e para promover a justiça socioambiental. A colaboração entre diferentes instituições, como a Polícia Federal, o IBAMA e o Ministério Público, é crucial para garantir a eficácia desse processo e para minimizar os impactos negativos das atividades ilegais.
Diante desse cenário, o presente estudo busca analisar a importância da cadeia de custódia no processo penal brasileiro, com ênfase nos desafios e avanços no Estado do Pará, considerando as dimensões jurídicas, logísticas e socioambientais que envolvem a aplicação dessa ferramenta crucial para a justiça e a preservação dos direitos fundamentais.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1. DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO
Com o avanço do processo judicial ao longo dos séculos, especialmente a partir do século XVIII, a busca pela verdade passou a depender de uma análise racional das provas, que deve estar sujeita ao contraditório e ao confronto dos interesses envolvidos. Segundo Geraldo Prado (2022), essa mudança reflete uma compreensão mais refinada da atividade probatória no Estado de direito. Contudo, apesar da necessidade de reconstruir a prática delituosa, é desafiador recuperar todos os detalhes e circunstâncias dos eventos, já que as partes do processo (juiz, acusação e defesa) não estavam presentes no momento do crime e, portanto, não podem observar os fatos em sua totalidade ou compreender completamente a infração penal.
A verdade perseguida no processo penal não possui uma “natureza ontológica”, nem pode ser acessada como se fosse possível fazer uma viagem no tempo para perceber os fatos exatamente como ocorreram. Michele Taruffo (2021) argumenta que o processo é um ambiente jurídico, que se distingue de outros tipos de investigação, uma vez que os fatos são determinados dentro de um contexto legal, baseado em normas que visam resolver uma disputa específica.
No processo penal brasileiro, a prova é fundamental para a formação da convicção do juiz e a garantia de um julgamento justo. A prova é entendida como o conjunto de elementos que busca reconstruir os fatos, fornecendo subsídios para avaliar a responsabilidade penal do acusado. De acordo com Tourinho Filho (2022), a prova deve sustentar a veracidade dos fatos alegados, proporcionando uma base para a decisão judicial. O autor também destaca a importância de assegurar que as provas sejam obtidas legalmente, pois as provas ilícitas são inadmissíveis, conforme o princípio nemo tenetur se detegere, que protege o acusado contra a autoincriminação.
Nucci (2022) reforça que as provas devem fornecer uma base sólida para a decisão judicial, sendo necessárias para garantir que a sentença seja fundamentada em elementos concretos e verificados, sempre de acordo com os princípios constitucionais da ampla defesa, contraditório e devido processo legal.
Michele Taruffo (2021) salienta que a prova judicial tem a finalidade de demonstrar a veracidade ou falsidade dos fatos relevantes, com um foco epistemológico sobre as possibilidades e limites do conhecimento empírico.
A produção e valoração das provas no processo penal são regidas por princípios constitucionais que visam garantir a legitimidade do procedimento e proteger os direitos fundamentais dos envolvidos. O princípio da legalidade das provas, estabelecido no artigo 5º, inciso LVI, da Constituição Federal, determina que as provas devem ser produzidas conforme a legislação, sendo inadmissíveis as provas obtidas por meios ilícitos.
O princípio do contraditório e da ampla defesa, previstos nos incisos LIV e LV do artigo 5º da Constituição, asseguram que o réu tenha a possibilidade de utilizar todos os meios de prova lícitos em sua defesa e que qualquer prova apresentada pela acusação possa ser contestada pela defesa, conforme afirma Lopes Jr. (2022).
O princípio da presunção de inocência, previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição, estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Este princípio exige que as provas apresentadas pela acusação sejam robustas o suficiente para dissipar qualquer dúvida razoável sobre a responsabilidade penal do acusado, visto que o ônus da prova recai sobre quem acusa.
Por fim, o princípio do livre convencimento motivado garante ao juiz a liberdade para valorar as provas de acordo com seu entendimento, desde que sua decisão seja devidamente fundamentada de maneira objetiva e lógica. Isso assegura que a convicção do juiz seja formada com base em provas concretas, além de proporcionar transparência na decisão judicial.
No processo penal brasileiro, a utilização de provas ilícitas é proibida, e a teoria dos frutos da árvore envenenada impede que provas derivadas de fontes ilícitas sejam admitidas. De acordo com Greco (2022), essa teoria visa proteger a legitimidade do processo e preservar os direitos fundamentais dos envolvidos. No entanto, o Supremo Tribunal Federal (2020) admite exceções, como nos casos em que as provas derivadas de uma fonte independente ou inevitável possam ser aceitas, desde que não estejam diretamente relacionadas à ilicitude original.
Portanto, frisa-se a importância da promulgação da Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime) que tem como objetivo garantir a integridade das evidências coletadas, prevenindo sua contaminação ou manipulação indevida, sendo essa preservação essencial para que as provas sejam consideradas confiáveis e válidas perante os Tribunais.
2. DA CADEIA DE CUSTÓDIA
A cadeia de custódia das provas, regulamentada pela Lei nº 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime, introduziu o artigo 158-A no Código de Processo Penal, definindo a cadeia de custódia como o conjunto de procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou vítimas de crimes, rastreando sua posse e manuseio desde o reconhecimento até o descarte.
Esse procedimento é fundamental no direito processual penal, uma vez que visa assegurar a integridade e a autenticidade das provas coletadas durante uma investigação criminal e envolve uma série de etapas críticas, que incluem a coleta, armazenamento, transporte, exame e apresentação das provas em juízo.
A preservação da integridade das evidências exige a aplicação rigorosa de procedimentos, como o uso de lacres e embalagens apropriadas, além do registro detalhado de todas as pessoas que tiveram contato com as provas, devidamente documentado e assinado por profissionais qualificados, como peritos e agentes de segurança. Esse controle minucioso garante que as evidências permaneçam intactas e que sua origem e integridade não sejam questionadas.
Renato Brasileiro de Lima (2020) destaca que a cadeia de custódia é essencial para garantir a validade legal e a credibilidade das provas no tribunal, pois qualquer violação nesse processo pode resultar na nulidade da prova. Nucci (2022) reforça que o controle rigoroso da rastreabilidade das evidências assegura que as provas tenham sido preservadas em suas condições originais, minimizando o risco de contaminação ou adulteração.
Além disso, a documentação adequada de cada fase da cadeia de custódia desempenha um papel crucial, proporcionando uma narrativa detalhada e contínua sobre o percurso da prova, o que fortalece o princípio do contraditório e assegura à defesa a possibilidade de contestar a preservação das evidências, conforme aponta Lopes Jr. (2021).
A cadeia de custódia pode ser compreendida em diversas fases, sendo cada uma delas responsável por garantir a preservação, integridade e rastreabilidade das provas, desde a coleta no local do crime até sua apresentação final no julgamento. Durante a coleta, é essencial preservar as características originais do vestígio, evitando sua contaminação ou alteração.
Após a coleta, o transporte e o armazenamento das provas também devem ser realizados com rigor, assegurando que as condições de segurança, temperatura e umidade sejam mantidas, conforme observa Nucci (2022), que destaca o impacto de um armazenamento inadequado na conservação da prova.
A análise das provas é realizada por peritos técnicos, que documentam detalhadamente os métodos e conclusões obtidas, incluindo os registros de todas as pessoas que tiveram contato com as provas. A documentação, que cria um histórico cronológico da prova, é a base da cadeia de custódia e essencial para garantir a sua legitimidade.
Já nos Tribunais, a cadeia de custódia assegura que a prova apresentada seja autêntica, e a documentação completa permite que o juiz e as partes verifiquem sua integridade e rastreabilidade, assegurando que a evidência seja confiável para a formação do convencimento judicial e após o uso em julgamento, as provas podem ser arquivadas ou descartadas, sempre seguindo normas específicas para garantir a preservação dos registros e permitir consultas futuras, caso necessário.
A violação das normas da cadeia de custódia pode acarretar a inadmissibilidade das provas, comprometendo a busca pela verdade material e, em muitos casos, resultando em decisões judiciais equivocadas. Geraldo Prado (2022) argumenta que a alteração ou destruição das provas compromete a veracidade dos fatos, gerando incerteza e prejudicando as partes envolvidas.
Em síntese, a cadeia de custódia é um pilar essencial para a manutenção da legalidade no processo penal brasileiro, garantindo que as provas sejam apresentadas de forma confiável e que a busca pela verdade material se dê dentro dos limites constitucionais e legais. A conformidade com os procedimentos da cadeia de custódia assegura a integridade das provas e reforça os direitos fundamentais, como o contraditório e a ampla defesa, permitindo um julgamento justo e a preservação da justiça no sistema penal.
3. A CADEIA DE CUSTÓDIA NO ESTADO DO PARÁ
A cadeia de custódia no Estado do Pará segue os procedimentos estabelecidos pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime) e tem como objetivo garantir a integridade das provas coletadas durante a investigação criminal, assegurando que estas possam ser apresentadas como evidência válida em processos judiciais. No entanto, o Estado enfrenta desafios específicos que demandam uma abordagem estratégica e adaptada às suas particularidades regionais, a fim de assegurar a responsabilização efetiva pelos crimes cometidos.
O Estado do Pará, com sua vasta extensão territorial e infraestrutura ainda em desenvolvimento, apresenta obstáculos significativos para a manutenção de uma cadeia de custódia eficiente, onde a escassez de recursos e a presença de atividades ilegais, como o desmatamento clandestino e a exploração não autorizada de recursos naturais, dificultam o processo de coleta, armazenamento e análise das provas. Nesse cenário, as evidências podem ser comprometidas ou até destruídas durante a investigação, caso não sejam manejadas de forma adequada.
Para enfrentar essas dificuldades, o Estado do Pará iniciou um processo de implementação da cadeia de custódia que envolveu a criação de uma Comissão de Trabalho, estabelecida em novembro de 2021. A comissão, composta por peritos e representantes da Polícia Científica do Estado do Pará (PCEPA), iniciou ações de capacitação e treinamentos contínuos para as forças de segurança locais.
A Polícia Científica organizou workshops e desenvolveu materiais didáticos, como uma cartilha, destinada a orientar os agentes de segurança sobre as fases da cadeia de custódia, desde a coleta até o armazenamento e remessa das evidências para análise.
Em agosto de 2022, uma importante etapa desse processo foi a inauguração da Central de Custódia em Belém, a quinta do Brasil a ser implantada, o que representa um avanço significativo na estruturação de um sistema de preservação de provas no Pará que tem como objetivo garantir que os vestígios coletados durante as investigações sejam armazenados de maneira segura, documentada e rastreável, assegurando sua integridade até o momento de sua apresentação em juízo.
A PCEPA tem desempenhado um papel central na coordenação da cadeia de custódia, tanto na Central de Custódia em Belém quanto em núcleos avançados espalhados pelo Estado. Em julho de 2023, a Polícia Científica iniciou um curso voltado para os delegados e outros agentes da Polícia Civil do Estado do Pará (PCPA), com base na cartilha da Comissão de Custódia, visando capacitar os profissionais para a correta aplicação das práticas de armazenamento e preservação das provas.
Entretanto, o processo de implementação enfrenta desafios logísticos e territoriais, especialmente no Sudeste do Pará, onde as distâncias geográficas e a diversidade de áreas de atuação das forças de segurança dificultam a aplicação uniforme das normas da cadeia de custódia. A integração das diversas forças de segurança estaduais, municipais e federais, bem como a continuidade da capacitação dos profissionais, são fundamentais para superar essas dificuldades.
Além disso, a implementação de uma cadeia de custódia eficaz no Pará exige investimentos contínuos em infraestrutura e tecnologias adequadas para garantir o armazenamento e transporte seguro das evidências. A falta de infraestrutura adequada em algumas regiões do Estado pode comprometer a integridade das provas, tornando a atuação das forças de segurança e a capacitação dos profissionais ainda mais essenciais.
A criação e implementação da cadeia de custódia no Pará são um reflexo do comprometimento do Estado com a melhoria da investigação criminal e com a garantia de um sistema de justiça mais seguro e confiável e ao enfrentar desafios logísticos, econômicos e territoriais, o Estado do Pará está dando passos significativos para garantir que as evidências coletadas durante as investigações criminais sejam preservadas de forma adequada, com a máxima segurança e confiabilidade, permitindo que os infratores sejam responsabilizados de forma justa e eficaz.
O sucesso da implementação da cadeia de custódia no Pará não apenas reforça a credibilidade das investigações no Estado, mas também serve como modelo para outros estados que enfrentam desafios semelhantes.
4. A PERSPECTIVA SÓCIO AMBIENTAL DA CADEIA DE CUSTÓDIA NO ESTADO DO PARÁ
O Estado do Pará, situado na região Norte do Brasil, é um dos maiores em termos de extensão territorial e biodiversidade e parte significativa da Floresta Amazônica está localizada em seu território, o que o torna um ponto crucial para a preservação ambiental, mas também um foco de intensas atividades econômicas que frequentemente impactam negativamente o meio ambiente e entre essas atividades, destaca-se a mineração, a agropecuária e o desmatamento ilegal, que geram grandes danos ecológicos e contribuem para o aquecimento global e a perda irreparável da biodiversidade.
A cadeia de custódia no contexto ambiental refere-se ao processo sistemático de rastrear e preservar as provas coletadas durante investigações de crimes ambientais, como aqueles relacionados à degradação da Floresta Amazônica e aos impactos das atividades ilegais. Manter a integridade dessas provas é essencial para que elas sejam aceitas em tribunais e possam fundamentar ações judiciais eficazes para responsabilizar os infratores, onde provas mal documentadas ou adulteradas podem comprometer não apenas o processo judicial, mas também a credibilidade das ações de fiscalização e da luta contra os crimes ambientais.
O processo de cadeia de custódia envolve desde a coleta das amostras até sua apresentação no tribunal, e deve ser rigorosamente documentado, garantindo que nenhuma etapa seja negligenciada e o acompanhamento de cada vestígio, desde a coleta no local de crime até a análise final, é vital para assegurar que as evidências não sejam contaminadas ou manipuladas, contribuindo para a formação de um processo judicial confiável e transparente.
A aplicação eficaz da cadeia de custódia no Pará envolve uma complexa rede de instituições, entre elas a Polícia Federal, o IBAMA, o ICMBio e o Ministério Público Federal. A colaboração interinstitucional é fundamental para garantir a integridade das provas, desde a sua coleta até o armazenamento e análise.
Becker (2010) destaca a necessidade de fortalecer essas instituições com recursos adequados e treinamento contínuo, uma vez que a falta de infraestrutura e as atividades ilegais tornam o cumprimento da cadeia de custódia um grande desafio na região. De fato, a escassez de recursos, aliada à vastidão do território e à presença de atividades criminosas, coloca obstáculos significativos na preservação da cadeia de custódia, especialmente em áreas remotas da Amazônia.
Diegues (1996) aponta que a exploração ilegal dos recursos naturais na Amazônia tem consequências devastadoras para a biodiversidade e para as comunidades que dependem dos ecossistemas locais, como populações indígenas e ribeirinhas.
A degradação ambiental gerada por atividades como o desmatamento ilegal, a mineração sem controle e a caça predatória afeta diretamente os modos de vida dessas populações, tornando a preservação de provas ambientais ainda mais relevante para o futuro sustentável da região. O fortalecimento da cadeia de custódia é, portanto, uma estratégia não apenas para a responsabilização dos infratores, mas também para a proteção dessas comunidades vulneráveis e da biodiversidade local.
Uma das principais inovações que têm facilitado a aplicação da cadeia de custódia no Pará é o uso de tecnologias avançadas para monitorar áreas de difícil acesso e para coletar evidências digitais com precisão.
O uso de drones, GPS e imagens de satélite têm se mostrado uma ferramenta eficaz para mapear e monitorar as áreas mais afetadas pela exploração ilegal de recursos naturais. Essas tecnologias permitem uma coleta de dados precisa e inalterada, garantindo que as evidências não sejam contaminadas durante o processo de investigação.
Cunha et al. (2018) afirmam que as ferramentas tecnológicas não só aumentam a precisão das evidências, mas também reduzem o risco de manipulação, sendo um elemento crucial para o fortalecimento da cadeia de custódia em investigações ambientais.
Além do uso de tecnologias avançadas, é fundamental que o Estado do Pará continue investindo em infraestrutura e na capacitação de profissionais responsáveis pela coleta, armazenamento e transporte das provas ambientais. A capacitação contínua dos agentes de segurança, peritos e profissionais envolvidos na fiscalização é um ponto-chave para garantir que a cadeia de custódia seja efetivamente implementada. O treinamento sobre as técnicas adequadas de preservação de amostras, transporte seguro e documentação rigorosa das evidências aumenta a eficiência do processo de responsabilização dos infratores.
A aplicação adequada da cadeia de custódia em crimes ambientais no Pará não é apenas uma questão de responsabilização de infratores, mas também de proteção do meio ambiente e das comunidades locais contra os impactos negativos das atividades ilegais. O fortalecimento dessa prática, por meio de investimentos em infraestrutura, capacitação de profissionais e utilização de tecnologias inovadoras, é crucial para garantir a justiça ambiental e promover a sustentabilidade na região.
Assim, a colaboração eficaz entre as diferentes instituições envolvidas e o investimento em ferramentas de monitoramento modernas são essenciais para que o Pará possa lidar com os desafios ambientais da Amazônia e garantir que crimes contra a biodiversidade não fiquem impunes.
5. DESAFIOS PARA A APLICAÇÃO DA CADEIA DE CUSTÓDIA NO PARÁ
A preservação adequada das evidências por meio da cadeia de custódia é uma forma de promover a justiça socioambiental, assegurando que os responsáveis por danos ambientais sejam punidos e que as comunidades afetadas recebam reparações.
Um dos maiores desafios para a aplicação eficaz da cadeia de custódia no Pará é a logística, pois as áreas de interesse, muitas vezes, são de difícil acesso, sendo necessário utilizar transporte fluvial ou aéreo, o que pode comprometer o controle e a preservação dos vestígios recolhidos em cenas de crime.
Além de haver municípios isolados e comunidades ribeirinhas que apresentam limitações na coleta, transporte e armazenamento adequado de provas e carência de laboratórios periciais e de unidades de armazenagem apropriadas em cidades do interior, dificultando o cumprimento de todos os protocolos da cadeia de custódia.
Silva e Santos (2019) discutem a importância de desenvolver protocolos específicos para o contexto amazônico, que levem em conta as particularidades locais e garantam a integridade das provas desde a coleta até a análise.
O Estado do Pará também enfrenta problemas relacionados à corrupção e à pressão de grandes interesses econômicos, como as indústrias madeireira e mineradora. Conforme Porto-Gonçalves (2006) essas pressões podem interferir nas investigações, comprometendo a aplicação da cadeia de custódia e resultando em impunidade para crimes ambientais.
Casos emblemáticos no Estado do Pará, como as operações contra desmatamento na Floresta Nacional de Altamira e o combate ao garimpo ilegal em Itaituba, demonstram a importância da cadeia de custódia para assegurar a integridade das evidências. Em tais operações, a coleta e preservação de amostras de solo, mercúrio em rios e documentos apreendidos são essenciais para a condenação dos responsáveis e a proteção das áreas afetadas.
Porto e Pacheco (2008) enfatizam que a correta aplicação da legislação ambiental e penal, apoiada por uma cadeia de custódia eficiente, pode contribuir para a redução das desigualdades sociais na Amazônia, promovendo um desenvolvimento sustentável.
Assim, a aplicação correta da cadeia de custódia depende do conhecimento e da formação dos agentes que atuam na coleta e preservação de provas, como policiais civis, militares e peritos, além da articulação eficiente entre diferentes órgãos, como a Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Científica, Ministério Público e o Poder Judiciário e investimentos em equipamentos, infraestrutura e pessoal, o que muitas vezes é insuficiente no contexto regional do Pará.
6. CONCLUSÃO
A análise das provas no processo penal brasileiro revela a importância crucial da cadeia de custódia para garantir a integridade e autenticidade das evidências apresentadas em juízo. No contexto do Estado do Pará, desafios específicos, como as dificuldades logísticas, a vastidão territorial e as limitações de infraestrutura, são obstáculos significativos à implementação eficaz desse procedimento.
A preservação das provas, especialmente em casos de crimes ambientais, é essencial não apenas para assegurar a justiça penal, mas também para proteger o patrimônio socioambiental e as comunidades locais. A aplicação da cadeia de custódia na região exige um esforço contínuo de capacitação dos profissionais envolvidos, investimentos em infraestrutura e o uso de tecnologias avançadas para monitoramento e coleta de evidências em áreas de difícil acesso.
A integração e cooperação entre as diversas forças de segurança e órgãos responsáveis, como a Polícia Científica, o Ministério Público e agências de fiscalização ambiental, são vitais para garantir a rastreabilidade e a validade das provas. Apesar dos avanços, como a criação de centrais de custódia e treinamentos especializados, a efetiva implementação da cadeia de custódia no Pará ainda enfrenta desafios decorrentes de pressões econômicas e da falta de recursos.
Portanto, superar esses obstáculos é fundamental para assegurar a aplicação de um sistema de justiça eficiente, contribuindo para a responsabilização de infratores e para a proteção do meio ambiente e da sociedade local. A continuidade dos investimentos e o fortalecimento das instituições são passos essenciais para consolidar a aplicação da cadeia de custódia, garantindo um processo penal mais justo e transparente, em consonância com os princípios constitucionais e a busca pela verdade material.
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1Bacharelando em Direito, Faculdade Carajás, Marabá/PA -carloquirino2011@gmail.com.
2Bacharelando em Direito, Faculdade Carajás, Marabá/PA – joelsonbarata@gmail.com.
3Orientador, Professor Especialista, tony.vargas@carajasedu.com.br
4Coorientador, Professora Especialista, Karina.furman@carajasedu.com.br