A AUTONOMIA DA VONTADE NA ERA DIGITAL: ANÁLISE DO RESP N° 2150278/PR À LUZ DA DOUTRINA DE PONTES DE MIRANDA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202509302355


Nigel Stewart Neves Patriota Malta1


RESUMO

Este artigo analisa a validade jurídica das assinaturas eletrônicas não certificadas pela correspondente infraestrutural governamental à luz da teoria ponteana dos planos do negócio jurídico. Investiga se a ausência de certificação digital emitida por autoridade credenciada compromete a legitimidade dos acordos eletrônicos. O estudo, nesse sentido, adota abordagem qualitativa com viés dogmático, fundamentando-se em levantamento bibliográfico e análise jurisprudencial, com destaque para o julgamento do REsp nº 2150278/PR. A investigação revela que os ensinamentos de Pontes de Miranda sobre os planos da existência, validade e eficácia fornecem base teórica consistente para sustentar a validade das assinaturas eletrônicas não qualificadas no ordenamento jurídico brasileiro. Conclui que a eventual ausência de certificação da assinatura não invalida os negócios jurídicos, afetando apenas seu grau de presunção de autenticidade, desde que preservada a manifestação livre e verificável da vontade, conforme o princípio da liberdade das formas.

PALAVRAS-CHAVE: Assinatura eletrônica; Negócio jurídico digital; Teoria ponteana; Autonomia da vontade; Segurança jurídica.

1 INTRODUÇÃO

No contexto da cultura digital, o crescente desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação tem transformado significativamente as relações jurídicas nos ambientes digitais, tecnológicos, computacionais e eletrônicos. Esta nova realidade impõe reflexões sobre como estabelecemos, compreendemos e cumprimos os negócios jurídicos contemporâneos. À medida que plataformas digitais se popularizam na formalização de acordos, somos convidados a revisitar noções jurídicas tradicionais, particularmente no que tange à exteriorização do consentimento e à relevância – ou prescindibilidade – de certas formalidades para sua expressão.

Em meio a essas mudanças, as diversas modalidades de assinaturas eletrônicas emergiram como elementos centrais nas discussões atuais acerca dos planos da existência, validade e eficácia dos negócios jurídicos concretizados no universo digital. Apesar dos tímidos progressos na legislação, observava-se ainda uma visão excessivamente formalista em determinados tribunais brasileiros, que insistiam na exigência de certificação digital emitida exclusivamente por autoridade credenciada junto à Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil).

Ocorre, contudo, que tal exigência, ao não encontrar respaldo legal expresso e ao desconsiderar a autonomia da vontade como fundamento do negócio jurídico, gera insegurança e restrições indevidas à dinâmica contratual contemporânea. Frente ao cenário apresentado, a questão fundamental examinada neste artigo busca investigar se a inexistência de certificação digital proveniente da ICP-Brasil afeta substancialmente a legitimidade e operacionalidade dos compromissos legais estabelecidos por canais eletrônicos.

Para essa análise, tomamos como pilar conceitual os ensinamentos de Pontes de Miranda, particularmente sua elaboração teórica sobre os planos da existência, validade e eficácia do negócio jurídico, numa abordagem apta a proporcionar interpretação orgânica e pragmática da questão, complementada por um exame abrangente do arcabouço normativo relacionado, contemplando o Código Civil (CC), o Código de Processo Civil (CPC) e a legislação federal pertinente.

Com efeito, o propósito central do presente escorço consiste em evidenciar se a autonomia volitiva, entendida como elemento nevrálgico do negócio jurídico, não deve sofrer restrições baseadas em exigências formais sem sustentação legal expressa, principalmente quando existem alternativas tecnológicas identicamente capazes de garantir a genuinidade e a inviolabilidade documental no meio digital.

Nessa plêiade de ideias, este escrito se propõe a: i) situar a teoria da escada ponteana no ordenamento jurídico nacional; ii) percorrer a evolução normativa e dos entendimentos judiciais relativos às assinaturas eletrônicas; iii) discutir o julgamento do Recurso Especial (REsp) nº 2150278/PR pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) como referência interpretativa decisiva na matéria; e iv) defender, com fundamento na teoria ponteana, a plena existência, validade e eficácia dos contratos formalizados mediante assinatura eletrônica não qualificada.

Combina, a abordagem metodológica, aspectos da pesquisa qualitativa e dogmática, sustentada por levantamento bibliográfico e jurisprudencial, com vistas a apresentar resposta apropriada à digitalização acelerada das relações contratuais – fenômeno que desafia o Direito a adaptar-se sem abandonar seus alicerces fundamentais. Por óbvio que essa dinâmica impõe uma releitura dos institutos tradicionais frente a novos mecanismos de manifestação volitiva, especialmente considerando o significativo volume de negócios firmados, na atualidade, de forma eletrônica, muitos sem certificação ICP-Brasil, mas protegidos por sistemas de autenticação cada vez mais robustos.

O artigo está organizado, para além desde introito, em quatro momentos distintos, porém interrelacionados, e complementares. Inicialmente, foram explorados os fundamentos da teoria do negócio jurídico elaborada por Pontes de Miranda, destacando sua concepção tripartite que distingue os planos da existência, validade e eficácia – estrutura que, décadas após sua formulação, continua a oferecer respostas para questões jurídicas contemporâneas.

Na sequência, traçou-se panorama histórico sobre o desenvolvimento normativo e as oscilações jurisprudenciais relativas às assinaturas eletrônicas no contexto brasileiro, identificando tensões e avanços nesse percurso. O terceiro momento dedica-se ao exame minucioso do paradigmático julgamento do REsp nº 2150278/PR, estabelecendo correlações com o pensamento ponteano e suas implicações para o atual estágio, na perspectiva digital, do Direito brasileiro.

Por fim, foram apontadas reflexões sobre a surpreendente atualidade e aplicabilidade das construções teóricas clássicas frente aos desafios contratuais impostos pela revolução digital, no sentido de se demonstrar como o pensamento jurídico tradicional, quando adequadamente interpretado, oferece soluções coerentes mesmo para fenômenos que seu autor jamais poderia ter antecipado.

2 PONTES DE MIRANDA E A TEORIA GERAL DO NEGÓCIO JURÍDICO

Pontes de Miranda fez uma contribuição sistemática e profundamente estrutural ao sistema jurídico brasileiro. De sua prolífica produção, particularmente nos tomos relacionados à Teoria do Fato Jurídico e ao Tratado de Direito Privado, “em 60 extensos volumes”, o autor delineou com precisão os elementos dos negócios jurídicos, organizando-os em três níveis (planos): existência, validade e eficácia.2 Esse modelo, designado doutrinariamente como teoria da escada ponteana, concebe uma das lindes mais perduráveis da dogmática jurídica nacional.3

A escada de admissibilidade concebida pelo autor considera como relevantes os fenômenos jurídicos que demandam expressão de vontade apenas quando satisfazem, de forma consecutiva e cumulativa, as três mencionadas etapas. Vistos sob o prisma da existência, integram a estrutura elementar de um negócio jurídico a vontade, as pessoas que agem (agentes), o objeto (“a coisa”) e, quando exigida, a forma. Na abstenção de quaisquer dessas bases integrantes, sequer há negócio jurídico, porquanto inexistente.4

A partir desse ponto, passa-se ao plano da validade, no qual o que já existe deve se conformar ao ordenamento jurídico por meio da verificação da capacidade dos sujeitos, da licitude/possibilidade/determinação do objeto, da ausência de vícios de vontade e da observância da forma prescrita ou não proscrita em lei, se exigida ou prevista eventual vedação. Como efeito da inocorrência de algum dos componentes em verificação, “o negócio jurídico (o contrato) existirá, mas será fulminado de nulidade, por ser reputado inválido.5

No plano da eficácia, questiona-se se o negócio jurídico, embora existente e válido, está apto a produzir seus efeitos, sendo nesse âmbito que se inserem, conforme ensina Flávio Tartuce, a condição (evento futuro e incerto), o termo (evento futuro e certo), o encargo/modo (ônus em ato de liberalidade), a resolução por inadimplemento com suas consequências (juros, cláusula penal e perdas e danos), a resilição (extinção por vontade das partes), o regime de bens matrimonial (que regula efeitos patrimoniais) e o registro imobiliário (como requisito de oponibilidade dos atos translativos de propriedade).6 Destaca-se que, conquanto os referidos institutos não comprometam a existência ou validade do negócio jurídico, podem obstaculizar a sua produção de efeitos até venham a se verificar.

Em linhas gerais, as elucidativas lições do mentor demonstram, com precisão lógica, a distinção entre os planos brevemente estudados, ao tempo em que indicam a centralidade do plano da existência. Veja-se:

[…] existir, valer e ser eficaz são conceitos tão inconfundíveis que o fato jurídico pode ser, valer e não ser eficaz, ou ser, não valer e ser eficaz. As próprias normas jurídicas podem ser, valer e não ter eficácia (H. Kelsen, Hauptprobleme, 14). O que se não pode dar é valer e ser eficaz, ou valer, ou ser eficaz, sem ser; porque não há validade, ou eficácia do que não é […] (sem grifos no original).7

A par do excerto acima destacado, depreende-se que especialmente a vontade constitui o núcleo teleológico do ato jurídico. No ponto, a manifestação da vontade, elemento central do negócio jurídico, pode se dar por diversos meios – inclusive verbais ou comportamentais –, sem que, em regra, dependa de forma especial para sua perfectibilização. Em verdade, mostra-se indispensável a defensabilidade de que a manifestação de vontade seja, sobretudo, livre, consciente e incondicionada.8

No entanto, decerto que se privilegia, na práxis jurídica, em muitos casos, a presença da assinatura como ato solene de exteriorização e autenticação da vontade declarada, de modo a conferir segurança e força probatória ao ato. Há hipóteses, ademais, em que a assinatura não é apenas recomendável, mas indispensável, sendo exigida para a própria existência do negócio, como ocorre quando a lei impõe a forma escrita como requisito essencial.

É o que se verifica, pois, em contratos como o de fiança (art. 819 do CC), cuja formalização escrita é indispensável, com exigência jurisprudencial de anuência do cônjuge – outorga uxória – em regimes de comunhão (vide Súmula 332 do STJ); na compra e venda de imóveis com valor superior a trinta salários mínimos (art. 108 do CC), em que a escritura pública, assinada pelas partes e pelo tabelião, é condição de validade; no pacto antenupcial (art. 1.653 do CC), cuja ausência de assinatura invalida o regime pactuado; na doação com encargo envolvendo imóveis de alto valor (art. 541, parágrafo único, do CC), a qual também necessita de escritura pública devidamente subscrita.

Ainda, o testamento particular (art. 1.876, § 1°, do CC) exige a assinatura do testador e de três testemunhas para sua validade. Já na cessão de crédito (art. 288 do CC), embora a assinatura não seja formalmente exigida, sua presença é prática essencial para assegurar a eficácia e a prova do negócio. Por derradeiro quanto às hipóteses elencadas, sem pretensão de esgotamento, imperioso se faz destacar o papel essencial da assinatura na consubstanciação de um título executivo extrajudicial, especialmente à luz do art. 784 do CPC, uma vez que representa um dos elementos que atestam a autenticidade e a certeza do documento, conferindo-lhe força executiva.

Com efeito, a regra ordinariamente prevista no art. 107 do CC – cuja disposição legal indica que “a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir” – encontra plena aplicação. Pontes de Miranda se demonstrou inclinado à liberdade formal, entendendo que o Direito deve preocupar-se mais com o conteúdo da vontade do que com os rituais que a revestem.9

Nessa intelecção, a ordem jurídica acolhe a autonomia dos particulares como fonte criadora, desde que em consonância com a legalidade, razão pela qual as transações e os pactos de natureza jurídica não se reduzem a um simples ajuste a um modelo formal-normativo preexistente, mas representam a exteriorização de uma vontade dotada de relevância jurídica, mormente porque “a funcionalidade básica do contrato é servir de instrumento aos particulares para autorregulamentar sua vida privada, podendo com ele regular as suas relações patrimoniais segundo os deveres que foram determinados pelo ato voluntário que lhe dá origem”.10

A vontade, como fundamento de todo o “vir a ser” no universo dos negócios jurídicos, deve ser analisada com maior profundidade e rigor do que o sugerido por um tratamento meramente formalista, alinhando-se à visão de que o Direito deve preocupar-se mais com o conteúdo volitivo do que com os rituais que o envolvem. A forma, nesse contexto, constitui instrumento, não finalidade, máxima trivialmente consabida no âmbito processual, porque o processo, como meio ao exercício da função jurisdicional, jamais deve ser “um fim em si mesmo”.11

Por ocasião da compulsoriedade pelo ordenamento jurídico, a forma pode se posicionar no plano da existência (se for constitutiva) ou da validade (se for requisito formal), consoante os termos da admissibilidade ponteana. De todo modo, em consonância com o princípio da liberdade das formas previsto no já citado art. 107 do CC, essas devem ser compreendidas como meios válidos de expressão da vontade e não como obstáculo à eficácia dos negócios jurídicos, vindo a reforçar a concepção de que a materialização do conteúdo volitivo deve prevalecer sobre o formalismo excessivo.12

E, nessa perspectiva, exsurgem as discussões contemporâneas permeadas pelo avanço de novas tecnologias e que indiscutivelmente apresentam acentuados reflexos no campo das ciências jurídicas, notadamente quando permitem a facilitação da manifestação da vontade em negócios jurídicos no âmbito da internet e de uma gama diversificada de dispositivos eletrônicos que habilitam os agentes ao fornecimento de sua assinatura por meio de um simples clique ou toque em telas.13

Nesse trilhar de ideias, a digitalização das relações humanas e contratuais impõe uma releitura dos institutos jurídicos tradicionais, exigindo que os juristas estejam atentos e sensíveis à superação de paradigmas consolidados, especialmente com o desenvolvimento de habilidades no sentido de promover as adaptações teóricas e jurisdicionais necessárias às necessidades sociais nupérrimas, situação que se apresenta idêntica aos legisladores, pois se espera que alcancem a capacidade de formular adaptações normativas compatíveis com as novas dinâmicas sociais.14

No cenário descortinado na atualidade do Brasil e do mundo, a despeito de eventuais discussões atinentes, de modo geral, à segurança na utilização de novas tecnologias, evidencia-se que as assinaturas eletrônicas e digitais se afeiçoam como fenômenos críveis e irredutíveis. Contudo, ao viabilizar a exteriorização da vontade por meios alternativos aos tradicionais, desafia-se o formalismo clássico ao mesmo tempo em que resta reafirmada a centralidade do elemento volitivo na formação dos negócios jurídicos.15

Logo, a forma jurídica adquire novas expressões na era digital. As assinaturas eletrônicas e digitais, em seus variados formatos, representam distintas maneiras tecnológicas de manifestar a vontade – em suas complexas nomenclaturas representativas da engenharia por trás da temática: PAdES, CAdES, PAdES, PKCS#7, S/MINE, entre outras –, com a substituição da caneta por pen drives, cartões magnéticos ou dispositivos similares e as respectivas senhas de autenticação para a formação da criptografia do código hash.16

Entrementes, a despeito dos progressos científico-tecnológicos, a dogmática estruturada por Pontes de Miranda oferece forte base teórica para compreender que esses novos formatos não descaracterizam a existência nem a eficácia do negócio jurídico, desde que reflitam, de modo fidedigno, a vontade do agente.17

Dessarte, mesmo diante do notável avançamento tecnológico e da ampla adoção das novéis formatações, permanece nevrálgico, para a caracterização de um negócio jurídico, o conteúdo da intenção e o acordo de vontades entre as partes. Essa perspectiva, alinhada às linhas teóricas em enfoque, permite uma hermenêutica mais flexível, capaz de reconhecer a realidade digital como espaço legítimo para a manifestação da vontade e à produção de efeitos, sem comprometer a segurança jurídica.

A propósito, a distinção entre existência, validade e eficácia assume papel imprescindível, na medida em que a confusão acerca desses planos leva ao equívoco de tratar como inválido, inexistente ou ineficaz atos plenamente adequados – como ocorreu, por exemplo, com as assinaturas eletrônicas e/ou digitais fora do padrão ICP-Brasil, cuja ausência de certificação impactou, durante certo tempo, sua força probatória, nos moldes visualizados na jurisprudência de alguns tribunais pátrios, conforme julgado ilustrativo a seguir colacionado:

APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. PROCURAÇÃO ASSINADA ELETRONICAMENTE POR MEIO DE ENTIDADE NÃO RECONHECIDA PELO ICP-BRASIL. INVALIDADE DO DOCUMENTO. PRECEDENTE DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. – Instrumento procuratório assinado digitalmente por meio de sistema eletrônico de empresa que não consta da Lista de Autoridades Certificadoras […] A assinatura eletrônica deve ser aprovada por entidade cadastrada junto ao ICP-Brasil, conforme precedente do Col. STJ no AgRg no AREsp n. 496.204/RJ, de relatoria do Ministro Nefi Cordeiro […] Recurso conhecido e desprovido (sem grifos no original).18

Esse modo de interpretação sofreu relevante e recente alteração com o julgamento do REsp 2.150.278/PR pelo STJ, que promoveu a uniformização jurisprudencial no sentido da inexistência de exclusividade nos modelos de assinatura certificados pela ICP-Brasil, vindo a reconhecer a plena validade de transações jurídicas formalizadas mediante plataformas não credenciadas, afastando-se a exigência de formalismos excessivos em favor da análise substancial da manifestação de vontade.19

Embora não mencionada expressamente no julgado em questão, infere-se que a teoria ponteana fundamenta e antecipa essa concepção, pois entende que a norma jurídica deve acompanhar a realidade social e tecnológica sem abandonar seu fundamento essencial: a vontade livre, soberana e juridicamente relevante.

3 ASSINATURAS ELETRÔNICAS E O NEGÓCIO JURÍDICO DIGITAL

A contextualização da atual realidade fática nos conduz involuntariamente à crescente tendência de digitalização das transações legais. Como amostras dos fatores que impulsionaram – e continuam a impulsionar – a confrontação do sistema jurídico com a necessária tarefa adaptativa, têm-se as facilidades ofertadas pelos meios de comunicação computacional e, em especial, o grande avanço do comércio eletrônico (e-commerce), os quais demandam demasiada atenção do ponto de vista jurídico, em particular no que diz respeito à expressão da vontade das partes.20

Embora a difusão da internet e a gênese do comércio digital no Brasil tenham ocorrido na década de 199021, notou-se mora considerável em seus aspectos regulamentadores, sobretudo quando da avaliação de que, a partir do âmbito do arcabouço normativo estudado pelo convencionado Direito Cibernético (Digital/Eletrônico), apenas em 2001 houve o estabelecimento de um estatuto sobre as assinaturas eletrônicas. Acerca disso, indispensável se faz traçar breves linhas na objetivação de se compreender a evolução normativa e a posição jurisprudencial da matéria.

Nessa esteira, por meio da Medida Provisória n° 2.200-2, de 24 de agosto de 2001, foi instituída a ICP-Brasil, com o estabelecimento da estrutura normativa para o uso da assinatura eletrônica no país. A norma em questão estabelece, em seu art. 10, que documentos em formato eletrônico, assinados digitalmente, com o uso de uma autoridade certificadora terceirizada – devidamente autorizada – seriam presumidos como legalmente válidos e legítimos.22

Contudo, o § 2° do dispositivo retro citado permitiu a produção de provas de autoria e integridade por outros métodos se aceitos pelas partes, ou se a alegação de que não são eficazes não fosse contestada pela outra parte, in verbis:

Art. 10.  Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória. § 1° As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916 – Código Civil.

§ 2° O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICPBrasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento. (sem grifos no original).

Em seguida, a Lei Federal nº 11.419/2006 (dispõe sobre a informatização do processo judicial), que foi editada para disciplinar o processo eletrônico, deu uma visão limitada à assinatura eletrônica, condicionando, para efeitos processuais, a obtenção de certificação digital emitida por uma autoridade certificadora credenciada ou o registro do usuário no sistema eletrônico do judiciário (art. 1°, § 2°, inciso III, alíneas “a” e “b”), consubstanciando-se em verdadeira regra de natureza processual.23

Por sua vez, a Lei Federal nº 14.063/2020 (que dispõe sobre o governo digital) realizou importante sistematização com a classificação das assinaturas eletrônicas em três níveis diferentes de segurança: i) assinatura simples: identifica o signatário e possui mecanismos de segurança que garantem sua autenticidade (art. 4º, inciso I, alíneas “a” e “b”); ii) assinatura avançada: identifica o signatário e proporciona controle exclusivo do processo de assinatura, além da comprovação de quaisquer alterações ocorridas nos dados assinados (art. 4º, § 1º, inciso II, alíneas “a”, “b” e “c”); e iii) assinatura qualificada: a assinatura é realizada utilizando um certificado digital emitido sob a regulamentação da ICP-Brasil e tem presunção de validade (art. 4º, inciso III).24

Além disso, a legislação em comento, ao inserir o § 4° ao art. 784 do CPC, sistematizou uma perspectiva já consolidada na jurisprudência: nele, abre-se claramente a possibilidade de documentos extrajudiciais serem tratados de modo executório mesmo que exclusivamente digitais desde que a sua integridade seja testável por algum autenticador livremente escolhido pelas partes.25 Confira-se o seu teor:

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:
[…]
§ 4º Nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei, dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura. (sem grifos no original).

A par do trajeto acima elencado, principalmente no âmbito da Lei Federal nº 14.063/2020, é possível aferir que a assinatura eletrônica é classificada não de acordo com sua validade legal, mas segundo o nível de segurança e força de prova. De fato, alcança-se que a reforma legislativa buscou efetivamente relativizar a exclusividade da certificação digital ICPBrasil, quando outra forma de autenticação acordada, realizada diretamente entre as partes, é admitida aos propósitos a que se destinam.

Entretanto, apesar das previsões normativas, a jurisprudência brasileira apresentou dissensos durante certo período, consoante julgado ilustrativo anteriormente apresentado, sendo as decisões contrárias à admissibilidade de documentos com assinaturas eletrônicas fora dos padrões da ICP-Brasil calcadas na suposta necessidade, extraída da exegese do art. 1º, § 2º, III, “a” da Lei Federal nº 11.419/2006, de certificado digital emitido por autoridade credenciada.

Sobre o tema, importante colacionar ementa de julgado que deixam claras as razões de decidir da respectiva Corte Estadual:

APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA E APREENSÃO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. CONTRATO COM ASSINATURA ELETRÔNICA ATRAVÉS DE PLATAFORMA DIGITAL IGREE QUE NÃO ESTÁ

CADASTRADA PERANTE A INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA – ICP-BRASIL. IMPOSSIBILIDADE DE CONFERÊNCIA DA AUTENTICIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1 – Nos termos do artigo 1º, § 2º, inciso III, da Lei Federal n.º 11 .419/2006, a autenticidade de assinatura eletrônica demanda a identificação inequívoca do signatário, o que se dá mediante a utilização de certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada (ICP-Brasil). 2 – Portanto, somente é admitida a assinatura eletrônica de contratos quando seja possível conferir a autenticidade por plataforma digital cadastrada perante à ICP-Brasil. 2– Recurso conhecido e não provido. (sem grifos no original).26

Nesse sentido, a leitura do panorama normativo e dos exemplos jurisdicionais evidencia, por um lado, uma clara evolução legislativa rumo à flexibilização do modelo de autenticação digital, permitindo o reconhecimento da validade e da eficácia de documentos eletrônicos mesmo fora do escopo da certificação ICP-Brasil e, por outro, a persistente resistência de alguns tribunais, cuja postura revela apego a aspectos excessivamente formalistas.

Ocorre que, conforme descrito na seção anterior, recente alteração jurisprudencial foi deflagrada a partir do julgamento do REsp nº 2150278/PR, em que o Tribunal da Cidadania reinterpretou as exigências legais à luz da autonomia da vontade e da adequação tecnológica. A seguir, destacam-se os principais fundamentos dessa decisão paradigmática, à luz de uma leitura material do Direito Civil, em consonância com a doutrina de Pontes de Miranda.

Na decisão do REsp nº 2150278/PR, a Terceira Turma do STJ, sob relatoria da Ministra Nancy Andrighi, reformou o entendimento do juízo primevo e do acórdão da segunda instância que haviam recusado reconhecer a força executiva de uma cédula de crédito bancário firmada por meio de plataforma eletrônica não vinculada à ICP-Brasil. A relatora do caso destacou fundamentos importantes que marcaram um avanço interpretativo em consonância com o desenvolvimento tecnológico e jurídico.27

A Corte Especial afastou o formalismo excessivo, ao reconhecer que a exigência exclusiva da certificação ICP-Brasil não encontra respaldo legal quando a forma especial não é prevista expressamente, afastando a ideia de que a ausência de certificado emitido por autoridade credenciada comprometeria, por si só, a validade do título executivo.

Para além, o Tribunal de Superposição admitiu a possibilidade de comprovação da autoria e integridade do documento por outros meios confiáveis, como registros de autenticação em duas etapas, logs de acesso, tokens, reconhecimento facial, geolocalização e demais mecanismos auditáveis, uma vez que, desde que as partes tenham acordado previamente sobre a forma de assinatura e não haja contestação fundamentada, tais meios são juridicamente eficazes.

O julgamento em referência expressa o reconhecimento de que a certificação pelo ICP-Brasil constitui presunção de autenticidade, mas não condição essencial de validade. A formalização do negócio jurídico por via digital, ainda que por meio diverso, não compromete sua existência ou validade, podendo afetar, no máximo, o grau de presunção de autenticidade – que pode ser suprido por outros elementos probatórios.

Ressalta-se que o ponto central da decisão está em sintonia com a distinção formulada por Pontes de Miranda entre validade e eficácia do ato jurídico. A validade de um contrato decorre do cumprimento de seus requisitos legais – vontade, forma (quando exigida), causa lícita e capacidade –, independentemente da tecnologia empregada para sua assinatura. A eficácia, por sua vez, está relacionada à produção dos efeitos jurídicos e à possibilidade de prova desses requisitos, não à adoção de uma forma ritualística. Desse modo, a assinatura eletrônica, fora dos moldes da ICP-Brasil, não invalida o contrato, tampouco impede a sua eficácia, desde que haja elementos suficientes para demonstrar a autoria e a integridade do documento.

Portanto, a decisão reafirma a força normativa da autonomia privada, em consenso com o art. 107 do CC, e reforça que, salvo exigência legal expressa, não se exige forma especial para a validade do contrato entre particulares. Com isso, ao privilegiar o conteúdo sobre a forma e a realidade sobre a aparência, o julgado projeta um Direito Civil contemporâneo, mais funcional e aderente à realidade digital.

4 A AUTONOMIA DA VONTADE NA ERA DIGITAL

Como se deflui das explanações acerca da decisão colegiada em estudo (REsp 2.150.278/PR), desborda-se verdadeira oportunidade para refletir, à luz da doutrina clássica de Pontes de Miranda, sobre o desenho jurídico dos contratos celebrados no ambiente digital. Isso porque a decisão transcende a mera aplicação normativa, alinhando-se estruturalmente aos fundamentos da teoria geral do negócio jurídico – em especial, ao primado da vontade e à ausência de exigência de forma especial como condição de validade do acordo.

De fato, o preceito da liberdade das formas consagra, de forma normativa, a noção já imanente à dogmática ponteana: a autodeterminação nos aspectos formais como corolário da autonomia da vontade. Nessa perspectiva, o STJ, ao afastar exigências que pretensamente limitariam o reconhecimento de assinaturas eletrônicas fora do sistema ICP-Brasil, adota posicionamento coerente com essa tradição, mormente ao não entender a ausência de certificação formal como vício de formalidade, mas como simples variação da forma de manifestação da vontade, a qual, salvo exigência legal expressa em sentido contrário, não compromete a validade do ato jurídico.28

A decisão fundamenta-se, pois, não apenas em constatação jurídica, mas também ontológica, na medida em que uma assinatura eletrônica que não seja qualificada não é, de per si, nula ou destituída de efeitos. Repisa-se que, no pertinente ao raciocínio jurídico empregado, a própria legislação brasileira admite outros meios de prova da autoria e integridade, desde que possam ser demonstrados pelas partes ou aceitos tacitamente por quem os contesta (art. 10, § 2º, da MP nº 2.200-2/2001).29

Segundo se denota dos escólios do autor em cerne, o Direito não pode se confundir com rotulações, devendo adaptar-se às formas pelas quais a vontade se manifesta de modo reconhecível e vinculante. Por isso, não há óbices doutrinários ou materiais à incorporação de novas tecnologias na formação dos negócios jurídicos, desde que atendidos os requisitos essenciais à expressão da vontade.30

Assim, a formulação teórica atinente aos planos do negócio jurídico, desenvolvida por Pontes de Miranda, oferece embasamento à compreensão da controvérsia enfrentada pelo STJ, porquanto a ausência de certificação autorizada por infraestrutura nacionalmente estabelecida não interfere na existência do negócio – identificada pelo exercício da vontade – nem em sua validade, que exige objeto lícito, capacidade das partes e ausência de vícios.31

Essa distinção é fundamental, já que, embora não se reconheça presunção legal de autenticidade à assinatura eletrônica não certificada, o sistema jurídico não a invalida, porém apenas transfere à parte que a apresenta o ônus de comprovar sua autenticidade, nos moldes, inclusive, do disposto nos arts. 428, 429 e 434 e ss. do CPC. Sendo assim, tal manifestação da vontade ainda constitui fato jurídico existente, válido e eficaz, cuja veracidade pode ser demonstrada por outros meios de prova.32

O entendimento atualmente adotado aponta para um viés jurisprudencial de valorização do conteúdo sobre a forma, em consonância com o desenvolvimento das tecnologias da informação e da comunicação e com o propósito de alertar ao papel instrumental do Direito, uma vez que formas alternativas de expressão da vontade são válidas, desde que dotadas de mecanismos minimamente auditáveis e rastreáveis.33

Em outras palavras, há o reconhecimento da necessidade de distanciamento do formalismo que, por vezes, obscurece a realidade por meio de exigências excessivamente rígidas. Em vez de exigir conformidade absoluta a um modelo único e centralizado, o Tribunal Superior validou padrões diversos de manifestação de vontade, desde que expressassem, de modo fiel, o consentimento das partes — exatamente como concebido por Pontes de Miranda ao tratar o negócio jurídico como fato volitivo e não meramente ritualístico.34

Os ensinamentos de Pontes de Miranda, ainda que formulados em período anterior à revolução digital, permanecem vivos, atuais e indispensáveis para a compreensão dos desafios do Direito contemporâneo. Suas teorizações fornecem estrutura lógica para a análise sistemática dos efeitos dos atos jurídicos eletrônicos — distinguindo entre validade formal e eficácia probatória — e legitima a inovação normativa. Além disso, sua ênfase na vontade como núcleo da juridicidade do negócio oferece um modelo teórico apto a justificar as novas formas de contratação emergentes na era digital, com a ratificação da primazia da autonomia privada sobre a rigidez formal.35

Dessa forma, a decisão proferida no REsp 2.150.278/PR revela, ainda que indiretamente, uma leitura contemporânea dos ensinamentos de Pontes de Miranda, assentada na liberdade contratual e na efetiva demonstração da vontade, bem como na adaptação do Direito à realidade tecnológica atual. Trata-se de um julgamento que se harmoniza com a tradição jurídica, sem desprezar a inovação. E, por fim, fortalece a confiança de que o Direito Civil – como moldado por Pontes de Miranda – mantém-se apto a acolher o novo, sem abdicar de seus fundamentos essenciais.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise empreendida neste escrito permitiu demonstrar que a doutrina de Pontes de Miranda, notadamente por meio da teoria dos planos da existência, validade e eficácia do negócio jurídico, permanece como instrumento dogmático apto a orientar a compreensão dos novos contornos das relações contratuais na era digital. Partindo do julgamento paradigmático do REsp nº 2150278/PR, verificou-se que o STJ estabeleceu a centralidade da vontade na formação dos negócios jurídicos, afastando o formalismo que por anos, em alguns tribunais, comprometeu o reconhecimento de assinaturas eletrônicas não certificadas pela ICP-Brasil.

Com esse mote, a questão central debatida – se a ausência de certificação digital emitida por autoridade credenciada torna inexistente, inválido ou ineficaz o negócio jurídico – encontra, à luz da teoria ponteana, resposta negativa. Isso porque, conforme exposto, a existência e a validade do negócio jurídico dependem da presença da vontade, da licitude do objeto, da capacidade das partes e, apenas quando legalmente exigida, da forma prescrita. Em não havendo exigência legal expressa quanto ao uso exclusivo da certificação ICP-Brasil, não há fundamento jurídico para se reputar inválido um contrato celebrado por outros meios digitais idôneos.

Diante disso, o julgamento apreciado implica, portanto, não apenas uma evolução jurisprudencial, mas a adoção de uma leitura material e funcional do Direito, na qual a autenticidade e a integridade do documento eletrônico podem ser demonstradas por outros mecanismos confiáveis, preservando-se a segurança jurídica sem desconsiderar as transformações tecnológicas. Confirma-se, assim, que o Direito não deve se encerrar em rigores formais que destoem da realidade social, sob pena de obstar a efetividade da autonomia privada.

Consigna-se que, sustentar o entendimento anteriormente adotado por alguns tribunais brasileiros, que exigiam exclusivamente assinaturas eletrônicas certificadas pela ICPBrasil, seria equivalente a impor que as assinaturas físicas convencionais só pudessem ser realizadas mediante o uso de determinadas marcas ou tipos de canetas previamente autorizadas pelo governo, ignorando por completo que o aspecto fundamental do negócio jurídico reside na manifestação inequívoca da vontade, e não no instrumento utilizado para expressá-la.

É nesse viés que tal rigidez formal estabelecia uma barreira artificial ao reconhecimento de negócios jurídicos perfeitamente constituídos, em clara contradição ao princípio da liberdade das formas previsto no art. 107 do CC, e desconsiderava a evolução tecnológica que permitiu o desenvolvimento de sistemas alternativos de verificação de autenticidade igualmente confiáveis.

O entendimento fixado no julgado do STJ analisado garante que as assinaturas eletrônicas, independentemente da plataforma ou tecnologia aplicada, são, no mínimo, existentes, diferenciando-se apenas quanto aos graus de autenticidade, o que pode ser visualizado, de modo similar, com a assinatura física tradicional que também assume graus de autenticidade especialmente quando temos as possibilidades de reconhecimento de firma em cartórios extrajudiciais, as quais podem se dar por semelhança ou autenticidade, por exemplo.

Assim como no mundo físico não se exige que toda assinatura seja reconhecida em cartório para ter validade, mas apenas se atribui uma presunção diferenciada a esse reconhecimento, no universo digital a certificação ICP-Brasil confere uma presunção de veracidade qualificada, sem que isso implique na inexistência ou invalidade de outras formas de manifestação da vontade, desde que possam ser auditáveis e rastreáveis por meios tecnológicos idôneos que atestem a autoria e a integridade do documento, como tem sido visualizado, a título exemplificativo, em procedimentos dessa jaez, os quais adotam, para além de critérios mais básicos de segurança, a captura de biometria facial e o registro de geolocalização no momento da subscrição digital.

À guisa de conclusão, expõe-se que a teoria geral do negócio jurídico, conforme delineada por Pontes de Miranda, permanece não só atual, mas imprescindível para a adequada compreensão da contratualidade contemporânea, nomeadamente em razão da distinção entre os planos fornecer os critérios necessários para reconhecer a validade e a eficácia de manifestações de vontade realizadas por meio eletrônico, desde que dotadas de elementos que assegurem sua autenticidade. 

Destarte, a resposta ao problema investigado é, assim, no sentido da possibilidade de se reconhecer a existência, a validade e a eficácia de negócios jurídicos firmados por assinatura eletrônica fora do padrão ICP-Brasil, desde que resguardada a manifestação livre, consciente e verificável da vontade, a demonstrar a força jurídica da liberdade contratual e, consequentemente, da adaptabilidade do Direito, em consonância com os desafios da sociedade digital.


2 FERREIRA, Pinto. Pontes de Miranda. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 18, n. 69, jan./mar. 1981, p. 213.

3 AQUINO, Leonardo Gomes de. Teoria geral dos contratos. Belo Horizonte: Editora Expert, 2021.

4 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2022; TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.

5 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil. v. 4, 2. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 70; MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da validade. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2022.

6 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da eficácia. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2022; TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. v. 3, 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019.

7 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. São Paulo: RT, 1974. T. III, p. 15.

8 HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; TARTUCE, Flávio. O princípio da autonomia privada e o direito contratual brasileiro. Direito contratual: temas atuais. São Paulo: Método, 2009.

9 BARROS, Humberto Gomes de. Pontes de Miranda – o direito como ciência positiva. Encerramento da Semana de Estudos Jurídicos em Comemoração do Centenário de Pontes de Miranda – Maceió, 23-04-92. Informativo Jurídico da Biblioteca Min. Oscar Saraiva, v. 4, o. 1 p. 1-67, jan./jul. 1992.

10 BRASIL. Conselho da Justiça Federal. V Jornada de Direito Civil. Organização Ministro Ruy Rosado de Aguiar Jr. Brasília: CJF, 2012, p. 144.

11 TEPEDINO, Gustavo. O princípio da função social no direito civil contemporâneo. Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro: MPRJ, n. 54, out./dez. 2014; CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2006; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – vol. I: teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento, procedimento comum. 60. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 93.

12 OLIVEIRA, Carlos Eduardo Elias de. Considerações sobre os planos dos fatos jurídicos e a “substituição do fundamento do ato de vontade”. Textos para discussão – 270. Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa. Brasília, fev. 2020.

13 TOALDO, Adriane Medianeira; MACIEL, Caroline Stéphanie Francis dos Santos; ALVES, Cildo Giolo Junior e Fabrício Germano. (orgs.). Tecnologia e direito. Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2021.

14 SILVA, Gabriela Buarque Pereira. Responsabilidade civil, riscos e inovação tecnológica: os desafios impostos pela inteligência artificial. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Direito de Alagoas. Programa de Pós-Graduação em Direito. Maceió, 2021.

15 BEHRENS, Fabiele. A assinatura eletrônica como requisito de validade dos negócios jurídicos e a inclusão digital na sociedade brasileira. Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Departamento de Direito. Curitiba, 2005.

16 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. SREI – Sistema de Registro Eletrônico Imobiliário: Parte 5 – Documentos auxiliares – F – Alternativas de formatos e estrutura dos atributos de assinatura. 18/01/2012. Disponível em: https://folivm.com.br/wp-content/uploads/2011/04/srei_p5f_alternativasassinaturadigital-v1-1-r3.pdf. Acesso em 08 de maio de 2025; BRASIL. Receita Federal. Leiaute dos certificados digitais da Secretaria da Receita Federal do Brasil. Versão 5.0, anexo I da Portaria RFB/Sucor/Cotec nº 42, de 07 de agosto de 2020. Disponível em https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/senhas-eprocuracoes/senhas/certificados-digitais/leiaute-dos-certificados-digitais-da-ac-rfb-v5-assinado.pdf. Acesso em 08 de maio de 2025; BRASIL. Governo Federal – Plataforma de Assinatura GOV.BR. Roteiro de integracão API assinaturas avançadas gov.br: release 1.0. Lívia, jul 28, 2022. Disponível em https://manual-integracaoassinatura-eletronica.servicos.gov.br/_/downloads/pt-br/3.5/pdf. Acesso em 08 de maio de 2025.

17 LIMA, John Cleison Cabral. Assinaturas eletrônicas e digitais: uma análise do impacto nas relações contratuais e a sua segurança jurídica. Centro Universitário FG – UNIFG. Guanambi, 2022.

18 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJAM). Processo n° 05152087320238040001. Relator: Flávio Humberto Pascarelli Lopes. Data de julgamento: 13/08/2024. Primeira Câmara Cível. Data de Publicação: 13/08/2024.

19 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região. Processo nº 0000731-92.2024.5.23.0000. Relatora: Rosana Caldas. Data do documento: 10/03/2025.

20 PIMENTEL, Alexandre Freire; SILVA, Artur Stamford da; CABRAL, Anne; LIMA, Ana Paula Canto de (org.). Direito digital, tecnologia e sociedade: mapeando temas, práticas e pesquisas. São Paulo: Tirant lo Blanch, 2024.

21 ROMERO, Nathan; SANTOS, Benevenuto dos. O surgimento da internet e do e-commerce no brasil, suas vantagens e desvantagens para o consumidor. Revista Direito & Consciência, v. 01, n. 02, dezembro, 2022.

22 PACIARELLI, Luiz Roberto. Da prova digital no processo judicial. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Direito. Belo Horizonte, 2024.

23 COÊLHO, Marcus Vinicius Furtado; ALLEMAND, Luiz Cláudio. Processo judicial eletrônico. Brasília: OAB, Conselho Federal, Comissão Especial de Direito da Tecnologia e Informação, 2014.

24 TEIXEIRA, Tarcísio. Direito digital e processo eletrônico. 6. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022.

25 SILVA JUNIOR, Maurilio Galvão da. A (in)executividade do contrato eletrônico à luz do § 4º do artigo 784 do Código de Processo Civil. Artigo (Pós-Graduação). Departamento de Ciências Jurídicas – DCJ. Fundação Universidade Federal de Rondônia. Porto Velho, 2024.

26 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR). Processo n° 00158510220228160030. Foz do Iguaçu, Relator: José Américo Penteado de Carvalho. Data de julgamento: 05/06/2023. 19ª Câmara Cível. Data de publicação: 05/06/2023.

27 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processo n° 2150278/PR (2024/0212892-1 – REsp). Relatora: Ministra Nancy Andrighi. Data de julgamento: 24/09/2024. T3 – TERCEIRA TURMA. Data de publicação: 27/09/2024.

28 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.

29 VENOSA, Sílvio de Salvo. Código civil interpretado. São Paulo: Atlas, 2019.

30 AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Negócio jurídico: existência, validade e eficácia. São Paulo: SaraivaJur, 2004.

31 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de direito civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

32 VENOSA, Sílvio de Salvo. Código civil interpretado. São Paulo: Atlas, 2019.

33 PEGHINI, Cesar. Direito civil. Rio de Janeiro: Método, 2022; TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.

34 RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

35 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. São Paulo: RT, 1974.


REFERÊNCIAS

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1Centro Universitário CESMAC, Maceió/AL, Doutor e Mestre pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Analista Judiciário Federal e Professor Universitário, nigel.malta@cesmac.edu.br, http://lattes.cnpq.br/3983490925456375, https://orcid.org/0000-0002-0181-4474