REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8013807
Anderson Marques Dimari; Cid André Garcia Pereira; Cristiano Duarte Barcelos; Diego Conceição Monteiro; Douglas Rodrigues Corvalão; Leonardo Athayde de Albuquerque; Matheus Quedi Bergoli; Rogério Eduardo Leivas de Castro; Suelen Caroline Jablonski Cruz; Juliano Tonin; William Roger da Silva Almeida; Sisnando Leiria Júnior
RESUMO
O presente trabalho versa sobre a análise jurisprudencial na visão do Supremo Tribunal Federal no que tange à amplitude do princípio do interesse local presente no art. 30, I, da CRFB/88, sob a nova concepção do Município como ente autônomo da Federação Brasileira. Desta forma, buscamos verificar quais são os parâmetros para delimitar a competência legislativa dos Municípios, bem como para garantir-lhes autonomia para legislar sobre assuntos locais, com base na perspectiva do Princípio da Subsidiariedade no Direito Público. Assim, analisar-se-á, no âmbito do controle de constitucionalidade, se o Supremo Tribunal Federal tem se aproximado da essência do Federalismo, enquanto ideal de descentralização político-administrativa do poder, de modo a conferir ao ente Municipal poderes legislativos para melhor atender às peculiaridades locais.
Palavras-chaves: Princípio do Interesse Local; Princípio da Subsidiariedade; Descentralização Administrativa.
ABSTRACT
The present work deals with the jurisprudential analysis in the view of the Federal Supreme Court regarding the breadth of the principle of local interest present in art. 30, I, of CRFB/88, under the new conception of the Municipality as an autonomous entity of the Brazilian Federation. In this way, we seek to verify which are the parameters to delimit the legislative competence of the Municipalities, as well as to guarantee them autonomy to legislate on local matters, based on the perspective of the Principle of Subsidiarity in Public Law. Thus, it will be analyzed, within the scope of constitutionality control, if the Federal Supreme Court has approached the essence of Federalism, as an ideal of political-administrative decentralization of power, in order to give the Municipal entity legislative powers to better serve to local peculiarities.
Keywords: Principle of Local Interest; Principle of Subsidiarity; Administrative Decentralization.
1. INTRODUÇÃO
O trabalho de conclusão do curso lato sensu em Direito Constitucional busca analisar e construir entendimento acerca da amplitude do conceito de interesse local no contexto da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Temos como objeto A pesquisa versando sobre a análise jurisprudencial na visão do Supremo Tribunal Federal no que tange à amplitude do princípio do interesse local presente no art. 30, I, da CRFB/88, sob a nova concepção do Município como ente autônomo da Federação Brasileira.
No que tange os objetivos da pesquisa, verificar-se-á quais são os parâmetros para delimitar a competência legislativa dos Municípios, bem como para garantir-lhes autonomia para legislar sobre assuntos locais, com base na perspectiva do Princípio da Subsidiariedade no Direito Público. Assim, analisar-se-á, no âmbito do controle de constitucionalidade, se o Supremo Tribunal Federal tem se aproximado da essência do Federalismo, enquanto ideal de descentralização político-administrativa do poder, de modo a conferir ao ente Municipal poderes legislativos para melhor atender às peculiaridades locais.
No método de pesquisa, utilizamos os parâmetros indutivo e qualitativo, abordando e buscando na jurisprudência do STF acórdãos e súmulas com análise do princípio do interesse local na legislação dos municípios. Já em relação a técnica de pesquisa, foi utilizada a documental, com coleta de dados baseados na doutrina, constituição e jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Nossa fonte de pesquisa se baseou em artigos científicos, livros, Constituição Federal e jurisprudência específica do Supremo Tribunal Federal. Com isso foi possível construir conclusões e alcançar objetivos acerca da importância do tema como poderá ser verificado durante a análise e leitura do presente artigo.
2. DESENVOLVIMENTO E FUNDAMENTAÇÃO:
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 contempla em seu texto uma gama de competências político-administrativas e legislativas. No que tange ao objeto desta pesquisa, tem-se como eixo a observância das competências para legislar dos Municípios, estabelecidas pelo constituinte em 1988.
Dentro de um sistema de repartição de competências, considerando as dimensões continentais do território do Brasil, visou-se a distribuir atribuições legislativas e administrativas entre todos os entes, sendo a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal, a fim de assegurar-lhes a hegemonia de seus interesses e integrar a Federação brasileira.
Embora ainda persista a ideia da existência de uma ‘hierarquia’ entre os entes, numa visão de que os poderes da União se sobrepõem aos Estados-membros, e, este último, aos Municípios, esta não mais subsiste constitucionalmente desde 1988. Assim, ressaltamos que cada ente possui sua importância e suas competências estabelecidas, que concorrem para a concretização dos princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.
Numa outra visão voltada à realidade concreta, percebe-se que a União, os Estados-membros e o Distrito Federal, são ficções jurídicas bem distantes da população. Ninguém reside no Estado-membro ou na União Federal, mas, sim, efetivamente em algum Município, devendo este ente ser valorado, pois é o mais próximo das pessoas.
Não obstante, partindo de uma visão constitucional histórica, lembra-se fundamentalmente que as constituições republicanas brasileiras de 1891, 1934 e 1967, previam o respeito aos municípios no tocante ao seu “peculiar interesse”, conforme presentes nos arts. 68, da CRFB/1891, art. 13, da CRFB/1934 e no art. 16, inciso II, da CRFB/1967.
Nessa linha, as cartas políticas anteriores a 1988 preservavam uma ideia de observância ao ‘peculiar interesse’, uma vez que os Municípios sequer eram vistos como entes da Federação. A atuação dos municípios dependia de previa legislação da União ou dos Estados-membros, sem muita amplitude na sua atuação legislativa.
Com a promulgação da CRFB/88, o município ganhou forte importância como membro da Federação, evidenciando-se, dentre outros, seus poderes de autonomia por meio da organização local, assim como dos poderes executivo e legislativo por Lei Orgânica, que é previsão exclusiva aos Municípios.
Em referência a organização Municipal, Alexandre de Moraes leciona:
Dessa forma, o município ‘auto-organiza-se’ através de sua Lei Orgânica Municipal e, posteriormente, por meio da edição de leis municipais; ‘autogoverna-se mediante a eleição direta de seu prefeito, Vice-prefeito e vereadores, sem qualquer ingerência dos Governos Federal e Estadual; e, finalmente, ‘autoadministra-se’, no exercício de suas competências administrativas, tributárias e legislativas, diretamente conferidas pela Constituição Federal.[1]
O poder constituinte descreveu de forma genérica as competências dos municípios, prevendo no art. 30, inciso I, o “interesse local” como fonte para legislar. Assim, mudou-se a ideia do “peculiar interesse” para o “interesse local”, objetivando a amplitude da competência por assuntos de predominância local, os quais também deverão ser reflexos aos interesses da União e dos Estados-membros.
A respeito do interesse local, parte-se da interpretação ampla estabelecida pela Constituição Federal, que ao conferir poderes aos entes menores (Municípios) para legislar sobre os assuntos de predominância local, visou-se a descentralização dos poderes, com o propósito de aproximar-se da essência do federalismo.
Nessa perspectiva, é que o princípio da subsidiariedade no direito público se comunica com o interesse local do município, em razão de que tudo aquilo que o ente menor pode fazer e bem-feito, não deve ser posto ao ente maior, ou seja, a ação do ente maior deve ser sempre subsidiária, descentralizando o poder para concretizar o princípio do federalismo posto na CRFB/88.
Categoricamente, José Alfredo de Oliveira Baracho define:
O princípio da subsidiariedade pode ser aplicável nas relações entre órgãos centrais e locais, verificando-se, também, o grau de descentralização. A descentralização é um domínio predileto de aplicação do princípio de subsidiariedade, sendo que a doutrina menciona as relações possíveis entre o centro e a periferia. A descentralização é um modelo de organização do Estado, pelo que o princípio da subsidiariedade pode ser aí invocado. A descentralização é um problema de poderes, seja financeiro ou qualquer outro que proponha efetivá-la, bem como de competências.[2]
Posto isto, diante de uma superficial visão do princípio do interesse local, é que considerar-se-á a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, vez que é o órgão competente guardião da Carta Magna Brasileira, verificando situações que tangem a constitucionalidade de normas que objetivam interesses dos municípios, em suas legislações próprias, demonstrando os limites e a amplitude do seu reconhecimento sob a égide da CRFB/88.
DO PRINCÍPIO DO INTERESSE LOCAL
Ainda, o Princípio do Interesse Local encontra fundamento Constitucional no art. 30, inciso I, que garante a prerrogativa aos municípios para legislarem em consonância com assuntos baseados nos interesses de sua localidade. Desta forma, o constituinte elevou a importância dos municípios na Federação, conferindo-lhes autonomia legislativa.
Numa concepção atual, Gilmar Ferreira Mendes preleciona:
As competências implícitas decorrem da cláusula do art. 30, I, da CF, que atribui aos Municípios “legislar sobre assuntos de interesse local”, significando interesse predominantemente municipal, já que não há fato local que não repercuta, de alguma forma, igualmente, sobre as demais esferas da Federação. [3]
Todavia, a permissão Constitucional direcionada aos municípios para legislar sobre interesses locais está atrelada a observâncias aos interesses dos outros entes, de modo que sejam convergentes com os interesses da União e dos Estados-membros. Assim, concebemos que um dos limites do interesse local na legislação dos municípios, se dá pelo não conflito com os interesses dos outros entes que integram a Federação.
Os municípios, então, terão liberalidade para dispor de lei sobre a defesa de seus interesses, já que a CRFB/88 lhes conferiu autonomia, de modo que a competência legislativa é exclusiva, só podendo ser exercida pelo legislador municipal, que irá considerar as situações de fato para fundamentar a legitimidade pelo art. 30, inciso I, do diploma Constitucional.
Nesse sentido, ao lecionar sobre a relevância da autonomia Municipal, Nelson Nery Costa ensina:
A organização dos serviços públicos locais está direcionada para aqueles que dizem respeito à vida urbana, em especial naquilo que é relativo ao transporte, instrução primária, saúde, água, saneamento, pronto-socorro, sinalização das vias públicas, logradouros de uso comum do povo, assistência social e muitos outros que atendam às necessidades comuns e ao bem-estar dos munícipes.[4]
Há de se observar que o princípio do interesse local traz um conceito muito amplo, indeterminado, abrangendo uma área muito extensa de matérias. E, por ser amplo, em muitos casos dependerá da análise do poder judiciário, em juízo de compatibilidade de determinada lei em face da Constituição Federal.
DOS RESULTADOS:
Parte significativa dos conflitos examinados pelo STF no que diz respeito ao interesse local, se dá pela equivocada percepção de tal princípio, que na medida em que é mal interpretado, acabando por restringir consideravelmente a essência do federalismo, quando há a restrição de uma competência constitucionalmente estabelecida aos municípios.
Sendo assim, o controle de constitucionalidade de lei com base no interesse local será exercido tanto pela via incidental, como pela via direta, tendo por última análise a apreciação pelo Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição, conforme poderes conferidos pelo art. 102, da CRFB/88. Por conseguinte, o STF irá analisar no caso concreto se a lei municipal não extrapolou a competência de outro ente federativo, bem como se existe a predominância dos interesses do município em face dos Estados-membros ou da União.
Assim é a análise qualitativa de teses firmadas pelo STF:
a) Da constitucionalidade de lei municipal pelo interesse local:
a.1) Comércio:
Os Municípios têm autonomia para regular o horário do comércio local, desde que não infrinjam leis estaduais ou federais válidas, pois a Constituição lhes confere competência para legislar sobre assuntos de interesse local. (AI 622.405-AgR, rel. min. Eros Grau, julgamento em 22-5-2007, Segunda Turma, DJ de 15-6-2007.) No mesmo sentido: AI 729.307-ED, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 27-10-2009, Primeira Turma, DJE de 4-12-2009. Vide: ADI 3.731-MC, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 29-8-2007, Plenário, DJ de 11-10-2007. (grifo nosso)
Súmula 645
É competente o Município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial. Data de Aprovação. Sessão Plenária de 24/09/2003.
Foi convertida em:
Súmula Vinculante 38
É competente o Município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial. Data de Aprovação. Sessão Plenária de 11/03/2015. (grifo nosso)
(…) o acórdão recorrido está em harmonia com a pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmada no sentido de que o Município tem competência para legislar sobre a distância mínima entre postos de revenda de combustíveis. (RE 566.836-ED, voto da rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 30-6-2009, Primeira Turma, DJE de 14-8-2009.) Vide: RE 235.736, rel. min. Ilmar Galvão, julgamento em 21-3-2000, Primeira Turma, DJ de 26-5-2000. (grifo nosso)
a.2) Consumidor:
Competência do município para legislar em matéria de segurança em estabelecimentos financeiros. Terminais de autoatendimento. (ARE 784.981-AgR, rel. min. Rosa Weber, julgamento em 17-3-2015, Primeira Turma, DJE de 7-4-2015.) (grifo nosso)
Distrito Federal: competência legislativa para fixação de tempo razoável de espera dos usuários dos serviços de cartórios. A imposição legal de um limite ao tempo de espera em fila dos usuários dos serviços prestados pelos cartórios não constitui matéria relativa à disciplina dos registros públicos, mas assunto de interesse local, cuja competência legislativa a Constituição atribui aos Municípios (…). (RE 397.094, rel. min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 29-8-2006, Primeira Turma, DJ de 27-10-2006.) (grifo nosso)
Os Municípios são competentes para legislar sobre questões que respeitem a edificações ou construções realizadas no seu território, assim como sobre assuntos relacionados à exigência de equipamentos de segurança, em imóveis destinados a atendimento ao público. (AI 491.420-AgR, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 21-2-2006, Primeira Turma, DJ de 24-3-2006.) No mesmo sentido: RE 795.804-AgR, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 29-4-2014, Segunda Turma, DJE de 16-5-2014. (grifo nosso)
Atendimento ao público e tempo máximo de espera na fila. Matéria que não se confunde com a atinente às atividades fim das instituições bancárias. Matéria de interesse local e de proteção ao consumidor. Competência legislativa do Município. (RE 432.789, rel. min. Eros Grau, julgamento em 14-6-2005, Primeira Turma DJ de 7-10-2005.) No mesmo sentido: RE 285.492-AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 26-6-2012, Segunda Turma, DJE de 28-8-2012; RE 610.221-RG, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 29-4-2010, Plenário, DJE de 20-8-2010, com repercussão geral. (grifo nosso)
a.3) Meio ambiente:
Interpretação da Lei municipal paulista 14.223/2006. Competência municipal para legislar sobre assuntos de interesse local. (…) O acórdão recorrido assentou que a Lei municipal 14.223/2006 – denominada Lei Cidade Limpa – trata de assuntos de interesse local, entre os quais, a ordenação dos elementos que compõem a paisagem urbana, com vistas a evitar a poluição visual e bem cuidar do meio ambiente e do patrimônio da cidade. (AI 799.690-AgR, rel. min. Rosa Weber, julgamento em 10-12-2013, Primeira Turma, DJE de 3-2-2014.) (grifo nosso)
O Município é competente para legislar sobre meio ambiente com União e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI c/c 30, I e II da CRFB). (RE 586.224, rel. min. Luiz Fux, julgamento em 5-3-2015, Plenário, DJE de 8-5-2015, com repercussão geral.) (grifo nosso)
a.4) Transporte público local:
Não vislumbro, no texto da Carta Política, a existência de obstáculo constitucional que possa inibir o exercício, pelo Município, da típica atribuição institucional que lhe pertence, fundada em título jurídico específico (CF, art. 30, I), para legislar, por autoridade própria, sobre a extensão da gratuidade do transporte público coletivo urbano às pessoas compreendidas na faixa etária entre sessenta e sessenta e cinco anos. Na realidade, o Município, ao assim legislar, apoia-se em competência material — que lhe reservou a própria CR — cuja prática autoriza essa mesma pessoa política a dispor, em sede legal, sobre tema que reflete assunto de interesse eminentemente local. Cabe assinalar, neste ponto, que a autonomia municipal se erige à condição de princípio estruturante da organização institucional do Estado brasileiro, qualificando-se como prerrogativa política, que, outorgada ao Município pela própria CR, somente por esta pode ser validamente limitada. (RE 702.848, rel. min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 29-4-2013, DJE de 14-5-2013.) (grifo nosso)
a.5) Limitação territorial:
É bastante plausível a alegada violação da regra constitucional que assegura autonomia aos municípios para dispor sobre assuntos de interesse local, causada por limitação territorial constante em dispositivo de constituição estadual. (ADI 2.077-MC, rel. p/ o ac. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 6-3-2013, Plenário, DJE de 9-10-2014.) (grifo nosso)
b) Da inconstitucionalidade de lei municipal que extrapolou competência Constitucional:
b.1) Trânsito:
É incompatível com a Constituição lei municipal que impõe sanção mais gravosa que a prevista no Código de Trânsito Brasileiro, por extrapolar a competência legislativa do Município. (ARE 639.496-RG, rel. min. presidente Cezar Peluso, julgamento em 16-6-2011, Plenário, DJE de 31-8-2011, com repercussão geral.) (grifo nosso)
b.2) Seguros:
A competência constitucional dos Municípios de legislar sobre interesse local não tem o alcance de estabelecer normas que a própria Constituição, na repartição das competências, atribui à União ou aos Estados. O legislador constituinte, em matéria de legislação sobre seguros, sequer conferiu competência comum ou concorrente aos Estados ou aos Municípios. (RE 313.060, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 29-11-2005, Segunda Turma, DJ de 24-2-2006.) (grifo nosso)
b.3) Limitação do comércio:
Lei municipal de Joinville, que proíbe a instalação de nova farmácia a menos de 500 metros de estabelecimento da mesma natureza. Extremo a que não pode levar a competência municipal para o zoneamento da cidade, por redundar em reserva de mercado, ainda que relativa, e, consequentemente, em afronta aos princípios da livre concorrência, da defesa do consumidor e da liberdade do exercício das atividades econômicas, que informam o modelo de ordem econômica consagrado pela Carta da República (art. 170 e parágrafo, da CF). (RE 203.909, rel. min. Ilmar Galvão, julgamento em 14-10-1997, Primeira Turma, DJ de 6-2-1998.) (grifo nosso)
c) Da inconstitucionalidade de norma estadual que infringiu competência municipal:
c.1) Pagamento de servidores municipais:
(…) a presente ação direta objetiva ver declarada a inconstitucionalidade do § 5º do art. 28 da Constituição do Estado do Rio Grande do Norte, que estabelece data-limite para o pagamento dos vencimentos ‘dos servidores públicos estaduais e municipais, da administração direta, indireta, autárquica, fundacional, de empresa pública e de sociedade de economia mista’, corrigindo-se monetariamente os seus valores se pagos em atraso. Sobre o tema, a jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido de que a fixação, pelas Constituições dos Estados, de data para o pagamento dos vencimentos dos servidores estaduais e a previsão de correção monetária em caso de atraso não afrontam a CF. (…) No entanto, como bem apontado no acórdão que julgou a medida liminar, a Constituição do Rio Grande do Norte estende a obrigação aos servidores municipais e aos empregados celetistas de empresas públicas e sociedades de economia mista. Nesse ponto, a discussão transfere-se para a preservação de dois importantes valores constitucionais: a autonomia municipal e a competência da União para legislar em matéria de direito do trabalho. Especificamente quanto à imposição aos servidores municipais, caracteriza-se disposição de flagrante violação à autonomia administrativa e financeira municipal, disposta nos arts. 29; 30, I; e 34, VII, c, da CF. (ADI 144, voto do rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 19-2-2014, Plenário, DJE de 3-4-2014.) (grifo nosso)
c.2) Organização de cargos do município:
O poder constituinte dos Estados-membros está limitado pelos princípios da Constituição da República, que lhes assegura autonomia com condicionantes, entre as quais se tem o respeito à organização autônoma dos Municípios, também assegurada constitucionalmente. O art. 30, I, da Constituição da República outorga aos Municípios a atribuição de legislar sobre assuntos de interesse local. A vocação sucessória dos cargos de prefeito e vice-prefeito põe-se no âmbito da autonomia política local, em caso de dupla vacância. Ao disciplinar matéria, cuja competência é exclusiva dos Municípios, o art. 75, § 2º, da Constituição de Goiás fere a autonomia desses entes, mitigando-lhes a capacidade de auto-organização e de autogoverno e limitando a sua autonomia política assegurada pela Constituição brasileira. (ADI 3.549, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 17-9-2007, Plenário, DJ de 31-10-2007.) (grifo nosso)
c.3) Funcionamento do comércio:
Aparenta inconstitucionalidade a resolução de autoridade estadual que, sob pretexto do exercício do poder de polícia, discipline horário de funcionamento de estabelecimentos comerciais, matéria de consumo e assuntos análogos. (ADI 3.731-MC, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 29-8-2007, Plenário, DJ de 11-10-2007.) No mesmo sentido: ADI 3.691, rel. min. Gilmar Mendes, julgamento em 29-8-2007, Plenário, DJE de 9-5-2008. (grifo nosso)
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS:
O Princípio da Subsidiariedade no direito público se comunica com o interesse local do município, em razão de que tudo aquilo que o ente menor pode fazer e bem-feito, não deve ser posto ao ente maior, ou seja, a ação do ente maior deve ser sempre subsidiária, descentralizando o poder para concretizar o princípio do federalismo.
No entanto, em determinados casos é visto que o STF tem mantido posição conservadora (ex.: RE 586224/SP), privilegiando tão somente os entes maiores, de modo que o Tribunal Constitucional continua a defender uma força centrípeta, deslocando os Municípios para as periferias, sem considerar que é nas localidades em que ocorre a vida, onde se produz a riqueza, e onde devem ser observadas suas peculiaridades locais, em consonância com a CRFB/88.
Por fim, o trabalho em tela objetivou trazer informações e questionamentos acerca do tema e importância da prevalência do interesse local dos municípios perante a Constituição Federal como melhor forma de gerir e atender os interesses de nossa sociedade. Iremos buscar em uma formação strictu sensu a continuidade desta pesquisa, a fim de melhor contribuir para o tema nos meios acadêmicos e como base de orientação dentro do direito brasileiro.
REFERÊNCIAS
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio de subsidiariedade: conceito e evolução. Rio de Janeiro, Forense, 2000.
COSTA, Nelson Nery. Curso de Direito Municipal Brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 39 ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
Revista da Procuradoria-Geral do Município de Porto Alegre / Prefeitura Municipal de Porto Alegre. – Porto Alegre: CEDIM, n. 20, nov. 2006.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Pesquisa de jurisprudência. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp> Acesso em: 29 de junho de 2021.
[1] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 277.
[2] BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio de subsidiariedade: conceito e evolução. Rio de Janeiro, Forense, 2000, p. 37.
[3] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p.854.
[4] COSTA, Nelson Nery. Curso de Direito Municipal Brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p.103.
1Bacharel em Direito
sisnandoljr@hotmail.com