AUTISMO: CONCEITO E PROPOSTA DE INTERVENÇÃO LÚDICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8410040


Joana Josiane Andriotte Oliveira Lima Nyland1; Alexandro Ferreira Garcia2; Rejane Bonadimann Minuzzi3; Rodolfo Cláudio da Cruz4; Alex Moura Silva5; Charlene Alves Pacheco6; Gabriel Antonio Ogaya Joerke7; Maria Luciana Constantino8; Rejane Gomes Martins9; Tiago dos Santos Rodrigues10; Victor Hugo de Oliveira Henrique11


Resumo: O presente trabalho tem o propósito de analisar a relação entre o educando e com Autismo e o lúdico, buscando ser uma ferramenta utilizada pelo professor rumo a uma educação mais inclusiva, além de identificar quais atividades lúdicas proporcionam a estimulação necessária para o desempenho do aluno, partindo do seguinte questionamento: como a atividade lúdica contribui para o desenvolvimento da criança autista? Como ocorre a inclusão do aluno autista e consequentemente a sua aprendizagem? Quais os fatores interferem na aprendizagem do sujeito autista? Quais estratégias são necessárias para garantir a aprendizagem significativa desse sujeito? Para a metodologia optou-se pela pesquisa bibliográfica. Esse tema é relevante tendo em vista a possibilidade de preencher a lacuna presente nos estudos sobre o desenvolvimento da aprendizagem de crianças autistas. O papel do educador na aprendizagem através do lúdico na prática pedagógica para educação dessas crianças é fundamental para incluí-los cada vez mais no universo pedagógico da escola.

Palavras-chave: Autismo. Lúdico. Aprendizagem.

SUMMARY: The purpose of this study is to analyze the relationship between the learner and the student, aiming to be a tool used by the teacher a more inclusive education, besides identifying which play activities provide the necessary stimulation for student performance, based on the following question: how does play activity contribute to the development of the autistic child? How does the inclusion of the autistic student and consequently his / her learning take place? What factors interfere in the learning of the autistic subject? What strategies are needed to ensure meaningful learning for this subject? For the methodology we opted for the bibliographic research. This theme is relevant to fill the gap in studies on the development of autistic child learning. The role of the educator in learning through the playful pedagogical practice for the education of these children is fundamental to include them more and more in the pedagogical universe of the school.

Keywords: Autism. Ludic. Learning.

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo tem por objetivo analisar e apresentar uma proposta de intervenção lúdica voltada para os alunos com autismo, defendendo uma educação de qualidade que contribua para o processo da aprendizagem significativa desse sujeito. Tem como metodologia a pesquisa bibliográfica e seus principais objetivos são investigar quais os fatores interferem na aprendizagem do sujeito autista, bem como verificar quais estratégias são necessárias para garantir a aprendizagem significativa desse sujeito e investigar como as atividades lúdicas poderão contribuir para a aprendizagem da pessoa com autismo, além de adicionar uma proposta de intervenção lúdica, com o objetivo de fazer com que o aluno com autismo se sinta mais acolhido na instituição de ensino a qual frequenta.

Serão evidenciadas no decorrer desse estudo, as principais características do autismo, aos olhos de estudiosos como Kanner, Gauderer, Zorzetto e Bossa, logo após no segundo capítulo, será discutido o processo de inclusão e escolarização do aluno autista e a utilização do lúdico em sala de aula, demonstrando como que se faz a adequação do aluno autista, seu aprendizado, suas dificuldades e as do professor ao se trabalhar com ele, dando-lhe como principal ferramenta o lúdico e a utilização de jogos e brincadeiras. 

Uma proposta lúdica de inserção será apresentada a seguir, de maneira a mostrar a importância do lúdico utilizando jogos e brincadeiras no trabalho do professor e como seu uso pode consequentemente dar suporte ao desenvolvimento e o aprendizado do aluno autista. Na conclusão, verificamos que ainda falta muito para que o aluno com autismo seja recebido nas instituições de ensino de maneira mais receptiva e que seu aprendizado seja considerado tão importante e essencial quanto o dos demais. 

2. AUTISMO INFANTIL: PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS 

O termo “Autismo” foi criado em 1911, pelo psiquiatra Paul Eugen Bleuler, como objetivo de indicar um sintoma da esquizofrenia, porém em uma área dirigida para o retraimento do indivíduo. Contudo, esse transtorno foi descrito pela primeira vez, em 1943, pelo médico Leo Kanner, ele descreveu o autismo como fuga da realidade e o retraimento para o mundo interior perda de lucidez, capacidade de julgamento e escolha, características de idades mais avançadas e o fenômeno psicótico que geralmente acometia pessoas mais jovens. (BELISÁRIO FILHO, 2010). Para GAUDERER, (1993):

[…] um grupo de crianças gravemente lesadas que tinham certas características comuns. A mais notável era a incapacidade de se relacionar com pessoas. (1993, p. 09).

Podem-se acrescentar as principais características da pessoa autista em três aspectos, segundo KANNER (apud. RIVIÈRE, 2004): 

As relações sociais (sociabilidade seletiva, dificuldade na interação social, padrões restritos e repetitivos de comportamentos, recusa colo ou afagos, não estabelece contos com os olhos); a comunicação e linguagem (atrasos ou ausência do desenvolvimento da linguagem, dificuldades em expressar necessidades, dificuldades acentuadas no comportamento não-verbal, ausência de resposta aos métodos normais de ensino); e a insistência em não variar o ambiente (assume formas inflexíveis de rotinas, preocupação insistente com partes de objetos, em vez do todo). (2004, p. 235).

 Os estudos sobre o autismo ainda não chegaram a um consenso sobre a sua principal causa. Em relação às possíveis causas do transtorno, Zozetto (2011, p. 23) afirma que, atualmente, as pesquisas mais recentes têm associado o autismo a causas genéticas e que, “até o momento, alterações em mais de 200 genes, distribuídos por quase todos os cromossomos humanos, já foram associados ao autismo”. Bosa (2002, p.22), nos esclarece que o autismo é encontrado como: 

[…] síndrome comportamental, síndrome neuropsiquiatra/ neuropsicológica, como transtorno invasivo do desenvolvimento, transtorno global do desenvolvimento, transtorno abrangente do desenvolvimento, transtorno pervasivo do desenvolvimento (essa palavra não consta no Aurélio!), psicose infantil, precoce, simbiótica, etc. Ouve-se falar em pré-autismo, pseudoautismo e pós-autismo. E está instaurada a confusão! Essa confusão na tentativa de conceituar o autismo deixou na história “uma grande controvérsia com relação à distinção entre autismo, psicose e esquizofrenia. (BOSA, 2002 p28).

Atualmente, ele está enquadrado nos Transtornos Globais do Desenvolvimento e é utilizado para o seu diagnóstico o agrupamento de alguns critérios estabelecidos pelo Manual Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM-V) e a Classificação Internacional de Doenças (CID-10) que revelem comprometimento em três áreas principais: alterações qualitativas das interações sociais recíprocas; modalidades de comunicação; interesses e atividades restritos, de estereótipos e repetitivos. Essas hipóteses sobre a causam do autismo trouxeram um grande impacto na relação dos pais com seus filhos e na transformação e adequação das escolas para o atendimento às crianças autistas.

 Além de discutir sua causa é importante e urgente sabermos como estão organizados os momentos de escolarização desses sujeitos, já que estão sendo incluídos nas escolas de maneira muitas vezes inadequadas, observando sempre que estão atualmente desencadeando um processo crescente e vivenciando momentos de luta, principalmente das famílias, saindo da escola especial para finalmente chegar a uma educação na perspectiva inclusiva.

3. O PROCESSO DE INCLUSÃO E ESCOLARIZAÇÃO DO ALUNO AUTISTA E A UTILIZAÇÃO DO LÚDICO EM SALA DE AULA

Existe por parte das políticas e leis uma intencionalidade para a inclusão dos alunos com autismo no ensino comum e isso tem ganhado gradativamente forças nos dias atuais. Essas leis preveem o acesso pela matrícula, à permanência e a qualidade do ensino buscando assim práticas pedagógicas diferenciadas. É o que está posto pela Secretaria de Educação Especial (SEESP) quando desenvolve programas, projetos e ações a fim de implementar no país a Política Nacional de Educação Especial.

Os estudos apontam que o aluno com autismo começou a frequentar o ensino comum nas últimas décadas e “até há pouco tempo, essas crianças tinham destino bem diferente de seus pares e vivenciavam apenas os atendimentos clínicos e, quando muito, instituições de ensino exclusivamente para pessoas com tais transtornos. (BELISÁRIO JÚNIOR, 2010 P.44) 

As constantes transformações nas práticas pedagógicas com relação às crianças com autismo foram possíveis a partir da problematização do próprio conceito de autismo empreendido pela abordagem interacionista de desenvolvimento e aprendizagem. Essa problematização não se centrava na deficiência em si, mas nos contextos sociais de produção, manutenção e de reforçamento das inabilidades dos sujeitos com autismo, basicamente: não saber falar, não conseguir se comunicar, não interagir. Isso significa que, “embora se tenha recorrido ao campo da psiquiatria para melhor compreender as manifestações do transtorno no cotidiano do aluno na escola, o empenho é contextualizá-lo no âmbito educacional” (BELISÁRIO JÚNIOR, 2010 p.7). 

Apesar dessa nova proposta, não foi possível resolver completamente o processo educacional, porém acadêmicos, pais, professores e profissionais em geral acabaram ficando em alerta sobre alternativas nas mediações pedagógicas com autistas que, especificamente se centravam em rotinas duramente estabelecidas a ponto de haver casos em que professores ministravam os mesmos conteúdos em todas as aulas da semana. Ao contrário dessa massificação de conteúdos e rotinas, entendemos que a escolarização dos alunos com autismo perpassa experiências significativas de aprendizagem, que precisam ser descobertas e tecidas na interação professor e aluno, professor e alunos e alunos e aluno.

Suplino (2005) aponta que: a pessoa com autismo deve ser tratada como qualquer outra pessoa, que todos podem aprender e que a família deve participar do processo de aprendizagem. O educador deve ensinar com entusiasmo, o tom de voz e a linguagem usada com o aluno devem ser o mais natural possível, as habilidades do aluno devem ser mais enfatizadas que suas fraquezas, a atenção do aluno deve ser garantida antes de ser dada uma ordem ou fazer um pedido, as ordens dadas devem ser claras e indispensáveis, as ordens não devem ser repetidas mais de duas vezes antes que o aluno processe a informação recebida, deve ser dado tempo suficiente para a resposta do aluno, o educador deve manter-se calmo e interagir como um amigo com seu aluno, elogios devem ser descritivos, ajudas físicas devem ser evitadas de forma a dar ao aluno oportunidade de fazer sozinho, os interesses do aluno devem ser aproveitados para ensino de novas habilidades.

Riviéri, (1995) ressalta que, para cada uma das atividades educativas, há objetivos, incluindo conteúdos específicos que devem ser trabalhados com alunos que apresentam autismo. Afirma, ainda, que o aluno com autismo é capaz de realizar as mesmas atividades educativas que os outros alunos, as quais tenham os mesmos objetivos gerais. Assim, fundamentando-se no enfoque evolutivo, os conteúdos a serem trabalhados com alunos com autismo devem envolver uma sequência baseada nos dados existentes sobre o desenvolvimento normal da criança, percorrendo o passo a passo, o mais semelhante possível ao que ocorre na evolução normal.

 De acordo com Bridi (2006) “incluir o aluno autista no ensino regular suscita uma série de adaptações e recursos para viabilizar o processo, devendo ser realizado de forma criteriosa e bem orientada, variando de acordo com as possibilidades do sujeito”. Para Baptista (2002) essas adaptações e recursos se caracterizam enquanto dispositivos que delimitam e viabilizam a experiência, constituindo-se como garantia para efetivação do processo inclusivo.

Vasquez (2008) indica que é preciso superar a concepção da escola como lugar voltado para a socialização e adaptação das atividades com o acesso ao currículo. Assuas pesquisas pautadas na perspectiva da educação inclusiva indicam:

[…] a necessidade da construção de espaços colaborativos; refletir sobre o ensinar/aprender desses sujeitos e sobre os saberes/fazeres implicados nesse complexo e multideterminado processo. (VASQUES 2008, p.9). 

Vasques, (2003), destaca o papel constitutivo do educador e da instituição escolar para os sujeitos autistas e com psicose infantil a partir da aposta no sujeito e na educação como agente humanizador. Ressalta também a importância da experiência escolar como um fator diferencial no desenvolvimento global dos sujeitos, e que a escola é um lugar no qual não se aprende apenas conhecimentos das áreas específicas, mas também conhecimentos que são constituintes do humano, relacionados à história e cultura, de modo a estabelecer vínculos entre os sujeitos. 

Este estudo ao indicar a escolarização, vivências escolares como fundamentais para o desenvolvimento global de crianças autistas e com psicose infantil, aponta ainda pistas sobre o resultado positivo da ação educativa no desenvolvimento do sujeito em questão. Quando consideramos a perspectiva histórico-cultural percebemos um caminho diferente sobre este assunto. Essa perspectiva propõe trocas e relações que potencializam o sujeito, num processo de significação da sua presença no mundo a partir dessa relação estabelecida com o outro. 

Partindo desse pressuposto o estudo Martins (2009), que tomou a perspectiva histórico-cultural como um aporte teórico para se pensar novas apropriações e compreensões sobre o autismo, contribui para o nosso entendimento sobre esse processo de desenvolvimento humano situando o indivíduo no meio social, nas relações estabelecidas/mediadas pelos outros, uma vez que este se encontra imerso no mundo social desde sua concepção. Sem negar os comprometimentos relacionados à interação com o outro e a linguagem, considerou que a tese sobre o papel do outro na constituição do sujeito no processo de mediação das relações sociais, torna-se um desafio, quando a base de formação é o encontro com o outro, para se compreender o autismo, visto que uma das características apontadas no autismo é justamente o evitar/ ignorar o outro. 

Apontou que a formação dos sujeitos autistas é afetada por esse outro, então é preciso ressignificar os modos como os outros percebem o autista, inicialmente desgarrando dos diagnósticos meramente clínicos. Ainda, destacou a importância de valorizar as experiências significativas, sem fixar limites, apostar no sujeito, como possibilidade de mudanças significativas nas condições de participação da vida social e no desenvolvimento geral. A autora analisou a situação de brincadeira, considerando o papel do brincar no desenvolvimento infantil como atividade principal.

Em seu estudo Martins (2009), constatou que há ainda pouco investimento nas interações em situações de brincadeira devido à falta de retorno da criança com autismo no processo interativo. Buscou também evidenciar outras possibilidades de interação com estes sujeitos e destacou a importância deter sensibilidade para observar outros comportamentos provenientes das crianças autistas, com outros a sua volta, proporcionando interações ampliadas, tentando interagir com esses sujeitos na busca de dar significado às suas vivências e sua inserção na cultura. De acordo com o autor é preciso possibilitar novos encontros com a realidade que os cercam, uma aproximação que volte a atenção para as possibilidades, rompendo com o isolamento. É importante questionar não somente como o autista se relaciona, mas como outras pessoas se relacionam com o autista para buscar inovações nas práticas sociais voltadas ao tratamento e à educação dessas crianças.

No estudo realizado por Lago (2007), encontramos uma análise das ações pedagógicas desenvolvidas por profissionais da educação no intuito da inclusão de crianças com autismo no ensino regular, favorecendo sua aprendizagem e interação com outras crianças consideradas normais. Lago indica que as professoras constituem suas estratégias de trabalho a partir da relação que têm com os alunos, caracterizando-se principalmente pela flexibilidade no planejamento e na execução das atividades, que são pautadas segundo os interesses e facilidades da criança com necessidades especiais, visando incentivar sua participação e interação com os colegas. 

3.1 Uma Proposta Lúdica de Inserção

O estudo de Cruz (2009) nos auxilia no debate sobre as práticas educativas que, na maioria das vezes, infantiliza as atividades propostas aos alunos com deficiência, não consideram suas potencialidades e muito menos valoriza o que já dominam de conhecimento. A escola continua sendo um momento unicamente de socialização, mas a socialização dita, já que às vezes os alunos com autismo ficam de lado em todos os momentos oportunos para que essa socialização aconteça. Para o autor, a formação da consciência e o desenvolvimento cognitivo ocorrem de fora para dentro do indivíduo, seguindo um processo de internalização, não de forma mecânica, mas também impregnada de atitude por parte do sujeito. Esse processo de transformação possibilita a construção do conhecimento e da cultura e está relacionado a uma atividade mental que responde pelo domínio dos instrumentos de mediação do homem com o mundo. Portanto, o pensamento e a linguagem são a chave para a construção da natureza da consciência humana. (VIGOTSKI, 2000)

 De acordo com Vygotsky, a aprendizagem sempre inclui relações entre pessoas. Conforme já discutido, ele defende a ideia de que não há uma orientação para o desenvolvimento estabelecida a priori, que vai se atualizando conforme o tempo passa. O desenvolvimento é pensado como um processo, onde estão presentes a maturação do organismo, o contato com a cultura produzida pela humanidade e as relações sociais que permitem o aprendizado. Como já discutimos as pesquisas de Vygotsky (2007) e alguns percussores sobre aquisição de linguagem como fator histórico e social, enfatizam a importância da interação e da informação linguística para a construção do conhecimento. O centro do trabalho passa a ser, então, o uso e a funcionalidade da linguagem, o discurso e as condições de produção.

 O papel do professor é o de mediador, e facilitador, que interage com os alunos através da linguagem num processo dialógico. Em relação às contribuições da perspectiva histórico-social e dos estudos de Vygotsky para a apropriação do conhecimento no contexto escolar podemos mencionar então: a valorização da interação entre os indivíduos; o reconhecimento do homem constituído a partir de uma história e cultura; a mediação a partir das relações sociais está impregnada de subjetividades; reconhecimento da Zona de Desenvolvimento Proximal como responsável pela identificação do aprendizado real do aluno e o seu potencial vivenciado por meio das propostas de mediação em grupo. 

Piaget (1996) enfatiza que a partir das diversas formas de aquisição do conhecimento é que ocorre a aprendizagem. Destaca ainda o lúdico como essencial ao desenvolvimento infantil harmonioso, por proporcionar a expressão do imaginário, a aquisição de regras e a apropriação do conhecimento. “Para o autor, ao manifestar a conduta lúdica, a criança demonstra o nível de seus estágios cognitivos e constrói conhecimentos” (KISHIMOTO, 2008, p.32). O nosso desenvolvimento não acontece de forma estanque, e conforme nos esclarece:

[…] aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento que, de outra forma seriam impossíveis de acontecer. Assim o aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas. (Vygotsky 2007, p. 103).

Pensando no funcionamento humano não podemos deixar que a deficiência seja considerada como determinante do futuro desenvolvimento e aprendizado do sujeito. Assim, o funcionamento humano vinculado a alguma deficiência depende das condições concretas oferecidas pelo grupo social, que podem ser adequadas ou empobrecidas. Não é o déficit em si que traça o destino da criança. Segundo Góes, é constituído pelo modo como a deficiência é significada, pelas formas de cuidado e educação recebidas pela criança, enfim, pelas experiências que lhe são propiciadas. 

Em relação ao sujeito com deficiência precisamos desmistificar o que está posto em relação ao seu desenvolvimento. Não é incomum observarmos práticas pedagógicas que infantilizam e subestimam o potencial do aluno, traçando o percurso final do aprendizado sem possibilitar avanços reais para os alunos.

É enorme a influência do brinquedo no desenvolvimento de uma criança. É no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, ao invés de agir numa esfera visual externa, dependendo das motivações e tendências internas, e não por incentivos fornecidos por objetos externos. (VYGOTSKY, 1989, p.109)

Segundo Oliveira (1994), ao brincar a criança desenvolve seu processo de adaptação à realidade aprendendo a lidar de forma cada vez mais intencional com seu corpo, situando-o em um contexto que é reconhecível. O professor utiliza as brincadeiras como ferramenta para a ampliação da aprendizagem do aluno autista fazendo a intercessão na sua prática pedagógica consequentemente inserindo-o cada vez mais no mundo real. Kishimoto (2008), acrescenta que ao atender as necessidades infantis, o jogo infantil torna-se forma adequada para a aprendizagem dos conteúdos escolares.

Sendo assim, o portal da criança para o conhecimento de si mesma e do mundo acontece através do lúdico e do imaginário. Ao reinventar a experiência brincando, ela dá significado e valor a confusão estonteante da vida. Os brinquedos são peças fundamentais nesse tratamento, onde elas podem se expressar nas brincadeiras com espaço para usar sua imaginação, descobrir o que gostam de fazer sem medo, tendo o tempo que precisam para demonstrar seus sentimentos. Desse modo, passa a conhecer os limites de sugar e a natureza dos objetos.

Através das atividades lúdicas a criança assimila valores, adquire comportamentos, desenvolve diversas áreas de conhecimento, exercita-se fisicamente e aprimora habilidades motoras. No convívio com outras crianças aprende a dar e receber ordens, a esperar sua vez de brincar, a emprestar e tomar como empréstimo o seu brinquedo, a compartilhar momentos bons e ruins, a fazer amigos, a ter tolerância e respeito, enfim, a criança desenvolve a sociabilidade. (SANTOS, 2008, p. 56).

Pela imitação de papeis adultos no jogo dramático, a criança descobre novos potenciais e capacidades humanas. A criança transforma objetos lúdicos como peças de jogo de damas ou xadrez e bolas de futebol em ferramentas valiosas de intercâmbio social. Todas essas reivindicações contribuem para que ela amplie sua compreensão da realidade social e pessoal. Sendo assim, a brincadeira também atua como parceira da educação dessas crianças com autismo, pois contribui muito para a concentração, confiança, colaboração, aceitação, autoestima. No do brincar a criança tem a oportunidade de demonstrar suas vontades que lhe fazem feliz, ou seja, o brinca é indispensável no cotidiano dessas crianças, onde também tem a oportunidade de se relacionarem com outras e com sua própria família, pois devem estar sempre presentes. O trabalho desenvolvido com os autistas pode ser em grupo com outras crianças, e individual com o terapeuta.

4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da realidade em que nos encontramos, percebemos que acima de tudo não podemos sentar e esperar que as transformações ocorram sem um mínimo de esforço de nossa parte. O autismo traz alguns obstáculos para a inclusão escolar, bem como, para a inclusão social. Por isso, é necessário um trabalho sistematizado em que a ludicidade deva ser aplicada constantemente ajudando os alunos autistas a reconhecerem o mundo ao seu redor, interagindo com outros colegas, tornando-os ativos, participativos, que perceba suas potencialidades, apesar de suas limitações. 

A escola é um lugar potencializador onde o sujeito se desenvolve em plenitude, pois, segundo Vasques, (2008) é preciso superar a concepção da escola como lugar voltado apenas para a socialização e adaptação das atividades com o acesso ao currículo. O autor ainda acrescenta que as pesquisas pautadas na perspectiva da educação inclusiva indicam:

“[…] a necessidade da construção de espaços colaborativos; refletir sobre o ensinar/aprender desses sujeitos e sobre os saberes/fazeres implicados nesse complexo e multideterminado processo” (2008, p.9).

 Segundo Martins (2009), é importante questionar não somente como o autista se relaciona com o outro, mas também como o outro se relaciona com o autista e, desse modo, buscar inovações nas práticas sociais voltadas ao tratamento e à educação dessas crianças. Não cabe apenas dizer que o aluno com autismo apenas quer observar tudo passivamente, é importante darmos significado e sentido às relações existentes na escola. E para isso precisamos ter sensibilidade para as pistas de interesse que o sujeito com autismo nos dá diante das circunstâncias expostas.

A interação entre pais e professores é muito importante para o processo de aprendizagem da criança com autismo, pois juntas irão achar formas de atuação a fim de favorecer o processo educativo eficaz e significativo, na superação das dificuldades de uma criança com TGD (autismo). Uma via importante para alcançar novos patamares na aprendizagem destas crianças autistas é a utilização adequada dos jogos, desenvolvendo uma atividade lúdica prazerosa e eficiente que motive e ative a aprendizagem.

O que se sabe é que essa é uma árdua tarefa, como desenvolver a sensibilidade, mas é essencial e de suma importância para o desenvolvimento do trabalho pedagógico significativo dentro de salas de aulas em que se encontram alunos autistas. A participação do outro no desenvolvimento da pessoa com autismo é fundamental e primordial. No trabalho com crianças autistas, o que se faz necessário é que o educador possua a sensibilidade para observar as minúcias e indícios de seus comportamentos, proporcionando interações ampliadas com os demais, provocando um movimento contrário ao que se encontra cristalizado, livre de preconceitos e que ele tente interagir com esses sujeitos na busca de dar significado às suas vivências e de propiciar sua inserção na cultura, no ensino e consequentemente na sociedade. 

Muitos são os esforços para vencermos as barreiras, eliminar preconceitos e garantir o direito de todos a uma educação de qualidade e reconhecimento das diferenças. A intenção desta pesquisa foi a de contribuir para os estudos sobre o desenvolvimento da criança autista, um campo ainda pouco investigado, mas que se configura um espaço de ampla discussão nas escolas e nos centros acadêmicos na perspectiva de superar os desafios, instigar e investir em novos estudos e projetos de pesquisa que auxiliem a explanar as complexidades que envolvem a aprendizagem desse sujeito.

REFERÊNCIAS

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Mestranda em Sistemas e Processos Agroindustriais – Universidade Federal do Rio Grande/RS1

Mestrado em Ensino de Ciências Exatas – UNIVATES/RS2

Mestrado em Diversidade Cultural e Inclusão Social – FEEVALLE/RS3

Mestrado em Educação – Universidade do Estado de Mato Grosso/MT4

Mestrando em Educação – Universidade Ibirapuera/SP5

Graduação em Pedagogia – ULBRA/RS6

Doutorando em Sociologia – IUPERJ/UCAM/RJ7

Graduação em Artes – Fundação Brasileira de Teatro/DF8

Graduação em Pedagogia – Universidade do Estado de Mato Grosso/MT9

Graduação em Pedagogia – Universidade Federal de Rondônia/RO10

Doutorado em Ciências Ambientais – Universidade do Estado de Mato Grosso/MT11