A RELAÇÃO ENTRE ÉTICA E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8044582


Elizângela de Araújo Farias1
Maeli Rodrigues da Silva1
Érik Serafim da Silva2


RESUMO

A falta de ética gera grandes prejuízos à população, influenciando diretamente muitas vezes no não cumprimento, ou cumprimento ineficiente dos direitos fundamentais aos quais legalmente os cidadãos devem possuir. Mediante a isto o estudo mostra-se de extrema importância pois através do conhecimento é possível que haja cobrança e consequentemente maior pressão para que tais direitos sejam garantidos. Visa-se também reforçar a importância de que os próprios colaboradores participantes do funcionalismo público tenham a ciência da forma correta ao qual devem agir, e dos prejuízos que podem ser causados caso não atuem desta forma. Considerando a grande quantidade de casos aos quais temos sido expostos envolvendo questões com a falta de ética na esfera pública, o presente estudo visa apresentar, através de uma revisão bibliográfica descritiva qualitativa – realizada via pesquisa de autores conceituados e documentos governamentais através de sites relevantes, livros, artigos, teses e monografias – os conceitos de ética e moral e mostrar a relação e importância que os mesmos possuem para com a Administração Pública. E por fim, reiterar o posicionamento, assumindo sobre função que a administração pública assuma e coloque em prática a importância da ética.

Palavras-chave: Princípios. Moralidade. Gerenciamento e Logística.

1. INTRODUÇÃO

Atualmente têm se tornado cada vez mais frequente, ao lermos um jornal impresso ou assistirmos aos noticiários na televisão, tomarmos ciência de relatos que envolvam a falta de ética no meio público. Constantemente temos conhecimento de grandes escândalos relacionados com agentes públicos e a grande proporção que isso tomou faz com que a população e os órgãos reguladores tornem-se mais incisivos nas cobranças dos cumprimentos dos códigos de ética, visto que tais escândalos impactam diretamente no atendimento às necessidades que deveriam ser garantidas à população como direitos fundamentais, como educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, entre outros. (BRASIL, 1988). Visto que temos o Código de Boa Conduta Administrativa, gerado pela comissão Europeia, onde vários países vêm seguindo arduamente, inclusive o Brasil, foi adotado pela Comissão em 13 de setembro de 2000 uma conquista importante para a conduta sobre a corrupção, que juntos a Aprovação do Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal forma cidadãos com ética e responsabilidade.

Os gestores públicos, em particular, são escolhidos democraticamente pela população a fim de administrar e gerenciar os recursos públicos e, portanto, deveriam ter grande zelo e respeito para com tais recursos, porém, apesar de serem muitas vezes os mais visados em escândalos e cobranças, cabe à população saber que a moralidade e ética são de responsabilidade também dos demais servidores públicos, sejam eles temporários, comissionados, concursados, entre outros.

É notório que, quando uma organização pública atua com os princípios de ética e moral há um aperfeiçoamento nos serviços prestados, é proporcionado um maior grau de confiabilidade para com a população e ocorre a destinação correta de recursos, não só financeiros, como também de tempo, mão de obra, entre outros, que geram os benefícios adequados e corretos a todos. Seria correto um gestor público aceitar um presente mesmo sabendo que é propina? São essas e outras maneiras de enxergar a ética como um todo na sociedade, obter igualde de direitos e dignidade. Para Sá (2005, p. 17), uma definição para o termo ética seria de “ciência da conduta humana perante o ser e seus semelhantes”

Compreende-se desta forma a importância de que os agentes públicos tenham conhecimento sobre os princípios éticos que regem a administração, e além de tal conhecimento, externar para a prática estes princípios. É necessário que haja transparência nos atos de gestão, de forma clara e que possa ser entendida por toda a população, independente de sua classe social ou grau de instrução.

Além da Constituição Federal, as entidades da esfera pública possuem seus respectivos códigos de ética, que devem ser usados também pelos órgãos reguladores a fim de que se verifique se as condutas tomadas pela instituição estão acordadas com o que é esperado das mesmas. Tais códigos trazem com clareza a noção de que os aspectos e interesses pessoais jamais devem ser tidos como prioridade quando relacionados aos interesses públicos, devendo-se sempre ser respeitados os princípios fundamentais da Administração Pública sendo eles a Legalidade, a Impessoalidade, a Publicidade, a Eficiência e a Moralidade (BRASIL, 1988).

Segundo o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal, estabelecido no Decreto nº 1.171, de 22 de junho de 1994:

O servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas principalmente entre o honesto e o desonesto, consoante as regras contidas no art. 37, caput, e § 4°, da Constituição Federal. (BRASIL, 1994).

Com o grande desenvolvimento tecnológico que temos vivenciado atualmente, estratégias como portais da transparência ou demais fontes de acesso prático à população devem ser considerados, aumentando assim a credibilidade da instituição em questão e gerando maior envolvimento populacional com a democracia.

A importância do estudo em questão mostra-se pois é necessário que todos, não só servidores públicos, como também os cidadãos tenham ciência da relação que a ética tem dentro do cenário de administração pública, para que assim possa cobrar seus direitos com consciência, atuando assim como um agente de informação e ganho de conhecimento.

A escolha do tema ocorreu justamente pela quantidade de notícias relacionadas à falta de ética que temos acesso na mídia, como desvio de verbas públicas, enriquecimento ilícito, assédios, corrupção, entre outros e objetiva-se através dele que haja a disseminação do conhecimento de forma a fomentar cobranças à esfera pública, tendo assim extrema relevância pois a partir da cobrança será possível o alcance cada vez maior de retornos positivos à população e trazendo a redução destes casos onde há falta de ética e moralidade.

2. METODOLOGIA 

A metodologia aplicada ao desenvolvimento do tema é a metodologia descritiva qualitativa de Pesquisa Bibliográfica, com consulta a autores de grande relevância para o tema com publicações em artigos, livros e teses e também documentos governamentais que abordam o tema escolhido.

Os passos seguidos foram baseados em Lima e Mioto (2007), a saber:

  1. Leitura de reconhecimento do material bibliográfico: consiste em uma leitura rápida que objetiva localizar o material que pode apresentar informações relevantes ao tema de estudo;
  2.  Leitura exploratória: também consiste em uma leitura rápida, com o objetivo de verificar se as informações selecionadas interessam de fato ao estudo;
  3. Leitura seletiva: procura delimitar o material que de fato interessa, relacionando-o com os objetivos da pesquisa. Momento em que se retém as informações relevantes e descarta as não relevantes
  4. Leitura reflexiva ou crítica: consiste no estudo crítico do material, têm como finalidade ordenar e sumarizar as informações contidas ali. 
  5. Leitura interpretativa: é o momento mais complexo, cujo objetivo é de relacionar as ideias expressas na obra com o problema para o qual se busca resposta. Requer o exercício de associação de ideias, transferência de situações, comparação de propósitos, liberdade de pensar e criar. 

3. A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Administrar é um conceito concernente a sociedade como um geral. Muitas vezes associado apenas empresas ou organizações, a administração pode ser vista de forma muito mais ampla. Diariamente temos que administrar nosso tempo, finanças, prioridades, relações, entre tantos outros aspectos do nosso dia. Quando esta administração não ocorre a tendência é que haja desordem, que tarefas importâncias deixem de ser efetuadas e que haja prejuízo a nossa rotina e os fatores relacionados a esta tarefa. Assim como é de extrema importância nas atividades corriqueiras, ocorre também na Administração Pública. Apesar de parecer um exemplo simples, torna-se bem prático de entendermos a importância de que se exista uma Administração Pública eficiente, pois é através dela que a sociedade possa ser gerida da melhor forma possível. Para Chiavenato (2007)

O sucesso de uma organização não é fruto exclusivo da sorte, mas de uma série infindável e articulada de decisões, aglutinação de recursos, competências, estratégias e uma busca permanente de objetivos para alcançar resultados cada vez melhores (CHIAVENATO, p. 3, 2007).

A palavra Administração é proveniente do Latim, onde ‘ad’ indica direção ou tendência para determinado sentido, e ‘minister’ significa menos que, relacionado com subordinação ou ainda obediência, ou seja, segundo sua origem, Administração significa realizar uma função sob a supervisão de outrem. Porém Chiavenato (1997) nos traz uma observação interessante sobre esta abordagem:

No entanto, a palavra administração sofre uma radical transformação no seu significado original. A tarefa da administração é a de interpretar os objetivos propostos pela organização e transformá-los em ação organizacional por meio de planejamento, organização, direção e controle de todos os esforços realizados em todas as áreas e em todos os níveis da organização, a fim de alcançar tais objetivos da maneira mais adequada à situação. Assim, a administração é o processo de planejar, organizar, dirigir e controlar o uso de recursos a fim de alcançar objetivos (CHIAVENATO, 1997, p. 87).

Conceituada a Administração de forma geral, torna-se importante que passemos a entender também o conceito da Administração Pública, que é uma das vertentes da Administração, porém ligada às esferas governamentais

Segundo Santos (2005), a Administração Pública consiste na gestão dos bens e interesses qualificados da comunidade, nos âmbitos federal, estadual ou municipal, segundo os preceitos do direito e da moral, visando ao bem comum.

De forma sucinta, a Administração Pública pode ser entendida como a administração estratégica dos bens patrimoniais, financeiros, humanos e tecnológicos e interesses públicos, desenvolvida pelo Estado como organização e pelos funcionários administrativos que o compõe. Alguns autores na literatura ainda afirmam que a Administração Pública é uma ramificação da ciência política e uma das ciências sociais. Assim podemos dizer que a Administração pública consiste na aplicabilidade dos conceitos administrativos ao setor público, ou seja, com foco em políticas de interesse coletivo.

Assim como na Administração de forma Geral, a Administração Pública também envolve os conceitos de Planejar, Organizar, Dirigir e Coordenar, essenciais para o atingimento das metas dentro das organizações privadas.

Com relação ao seu surgimento, podemos dizer que a administração pública começou a apresentar uma organização mais bem estruturada entre os séculos XVIII e XIX, porém ainda era algo bem inicial. Com o decorrer dos anos, criação de uma Constituição Nacional e aperfeiçoamento do Direito e, consequentemente das normativas jurídicas, foi se tornando mais efetiva, passando a ser cada vez mais reconhecida e necessária.

É importante compreendermos, para entender a estrutura da Administração pública, que atualmente nosso país possui três poderes distintos, porém complementares.

 O Poder Legislativo tem a função de legislar, ou seja, de criar as leis e fiscalizar o poder executivo.

O poder Executivo trata-se do poder responsável por praticar as legislações definidas pelo legislativo, além de administrar os recursos de forma que a população seja beneficiada e os objetivos cumpridos. 

Já o poder Judiciário consiste no poder responsável pelo julgamento de conflitos e aplicação da lei, devendo sempre agir de forma justa, isenta, sem preferências ou parcialidade.

Aprofundando-se no conceito de Administração Pública é importante conhecermos os conceitos de Administração Direta e Indireta. A Administração Direta ou Centralizada consiste naquela em que as funções e tarefas são realizadas pelos próprios órgãos governamentais, ou seja, realizadas por órgãos estatais da união, estado ou municípios. Já a Administração Indireta, também conhecida por descentralizada se dá quando tais atividades provêm de outros órgãos, externos ao governo em si, como fundações, autarquias, empresas públicas, entre outras.

Pinto (2008) nos afirma que:

A Administração Pública detém prerrogativas e sujeições, com o fito de suprir as necessidades decorrentes do interesse coletivo, o que permite, muitas vezes, em virtude da supremacia do interesse público sobre o particular, o condicionamento ou limitação do exercício de direitos e liberdades individuais (PINTO, p. 131, 2008).

A Administração Pública é regida por cinco princípios fundamentais, presentes na Constituição Federal Brasileira, sendo eles apresentados no artigo 37, conforme segue:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência […] (BRASIL, 1988).

Por sua grande relevância é necessário que entendamos cada um destes princípios, visto que uma Administração Pública efetiva dependerá do cumprimento destes.

O princípio da Legalidade serve como proteção aos cidadãos, de forma que concede a esta liberdade para que possam fazer o que lhes for conveniente, desde que este feito não entre em contradição com a legislação vigente, ou seja, desde que não seja um ato proibido por lei. Tal conceito é oriundo do Estado de Direito e visa se opor ao poder autoritário e antidemocrático. Dentro da Administração Pública ele é aplicado de forma que a Administração só poderá fazer aquilo que esteja determinado pela Lei. Quando a Administração Pública deixa de cumprir este princípio, ou seja, se desvia da legalidade, ela poderá ser responsabilizada nas esferas civil ou até mesmo criminal, conforme o julgamento da situação em questão.

O segundo princípio trata-se do princípio da Impessoalidade, onde há premissa é a de que não devem existir vontades ou satisfações de cunho pessoal, apenas em prol dos interesses coletivos. Isso significa que a Administração Pública e os atos por ela tomados devem estar sempre em paralelo, alinhados aos interesses sociais, não gerando benefício próprio ou a terceiros a nenhum membro da administração. É interessante analisarmos que o princípio da impessoalidade pode ser muito relacionado às questões éticas, pois sua não observância e prática podem acabar levando a casos de corrupção, improbidade, entre outros, e em contrapartida, seu cumprimento leva ao combate destes males, agindo assim em prol dos anseios da população. Através deste princípio subentende-se também que os atos realizados pelos agentes públicos são acometidos ou imputados aos órgãos de pertencimento destes agentes, ou seja, o ato de um agente público passa a tornar-se o ato do próprio órgão público.

O próximo princípio trata-se do Princípio da Publicidade. Como o próprio nome sugere, sua base vem do conceito de tornar público, ou seja, todos as tomadas de atitudes e ações relacionadas aos agentes públicos devem ser de conhecimento público, gerando assim a proibição de atitudes sigilosas ou secretas. Também muito relacionada com a questão ética, hoje em dia temos em diversos órgãos os Portais da Transparência, onde a população pode ter fácil acesso aos aspectos da administração, ou seja, permite maior participação e controle legal da sociedade.

O princípio da Eficiência trata-se do mais moderno dos princípios fundamentais, sendo incluído através da Emenda Constitucional n° 19/1998 e consiste basicamente no dever da boa prestação de serviço, ou ainda, bom desempenho na administração pública. É fundamental que dentro da gestão pública este princípio seja cumprido, apesar de muitas vezes não ser tão mencionado, pois é através dele que o agente público irá não apenas cumprir suas funções formais e legais, mas atenderá de forma satisfatória aos interesses coletivos. Segundo Di Pietro (2002, p. 83)

[…] o princípio apresenta-se sob dois aspectos, podendo tanto ser considerado em relação à forma de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atuações e atribuições, para lograr os melhores resultados, como também em relação ao modo racional de se organizar, estruturar, disciplinar a administração pública, e também com o intuito de alcance de resultados na prestação do serviço público […] (DI PIETRO, 2002, p. 83). 

O último princípio fundamental trata-se do princípio da Moralidade. Este princípio também está amplamente relacionado com a questão ética, no qual a premissa é a de que os agentes públicos devem agir com probidade, lealdade, fé e honestidade, buscando também afastar-se de ações que gerem redução dos direitos dos cidadãos, ou seja, os atos devem sempre estar em conformidade com a Legislação, mas também com o interesse coletivo. Sua forma de controle pode se dar de forma interna, através da autotutela ou de forma externa, como por exemplo, através da Lei da Improbidade, Leis Anticorrupção, Ação Popular ou ainda Ação Civil Pública.

Além de conhecer os princípios da Administração Pública é importante que também tenhamos a ciência de quem são os agentes públicos que compõe esta administração.

A Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu Artigo 37, nos traz em seus parágrafos I e II que:

I – os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (BRASIL, 1988).

Assim, o entendimento constitucional nos informa que todo cidadão que preencha os requisitos legais pode pleitear os cargos, empregos e funções públicas, mediante aprovação em concurso público, que também deve possuir um prévio regimento legal e acessível. 

A Lei Nº 8112 de 1990 também nos traz em seu título I, algumas informações sobre o Servidor Público e Cargo Público.

Art. 1o  Esta Lei institui o Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das autarquias, inclusive as em regime especial, e das fundações públicas federais.

Art. 2o  Para os efeitos desta Lei, servidor é a pessoa legalmente investida em cargo público.

Art. 3o  Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor.

Parágrafo único.  Os cargos públicos, acessíveis a todos os brasileiros, são criados por lei, com denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em caráter efetivo ou em comissão.

Art. 4o  É proibida a prestação de serviços gratuitos, salvo os casos previstos em lei  (BRASIL, 1990).

Além dos Servidores Públicos é importante entendermos que a Legislação nos traz o conceito de Agente Público, um conceito mais abrangente, apresentado na Lei Nº 8429, de 2 de junho de 1992.

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se agente público o agente político, o servidor público e todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas no art. 1º desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)” (BRASIL, 1992).

2.1 ÉTICA

Atualmente as questões relacionadas a ética vêm sendo amplamente discutidas, sejam relacionadas à ética pessoal, profissional, ou qualquer outra de suas vertentes, a população tem adquirido cada vez mais conhecimento e cobrado de seus agentes públicos que tenham um comportamento dentro dos padrões éticos daquela sociedade. Torna-se assim extremamente necessário que entendamos no que consiste a ética e como ela pode ter relação com as esferas públicas.

A ética pode ser definida como a teoria, o conhecimento ou a ciência do comportamento moral, que busca explicar, compreender, justificar e criticar a moral ou as morais de uma sociedade. A ética é filosófica e científica

A origem da palavra Ética vem do grego ethos que significa “caráter”, “modo de ser”, ou seja, a ética está associada aos costumes e padrões de comportamento considerados positivos que são adquiridos por uma sociedade. 

Um aspecto muito interessante é que a palavra ethos foi traduzida pelos romanos para o latim como mos, ou mores no plural, que significa costume e é a origem da palavra moral.

Uma outra definição de ética é trazida por Nalini (2014, p.30), onde a ética é conceituada como sendo a “ciência do comportamento moral dos homens, em sociedade”, de forma que quando ocorre a perda destes valores morais, há impacto negativo na dignidade humana e em sua integridade.

A ética profissional consiste em um conjunto de valores e normas comportamentais adotados no ambiente de trabalho ou no exercício de qualquer tarefa e que compõe a consciência de um profissional, sendo o que guiará sua conduta. 

Entende-se assim que há grande importância que os colaboradores que compõe os quadros do funcionalismo público atuem sempre com ética profissional, dado que qualquer atitude tomada por órgãos públicos pode gerar um impacto em milhares de cidadãos, assim, tomando sempre ações padronizadas, de forma a proceder com honestidade e sem gerar prejuízo a qualquer outro indivíduo, exercendo em suas atitudes o cumprimento dos valores estabelecidos pela sociedade em que está inserido.

2.1.1 CÓDIGO DE ÉTICA

É notório que, independentemente da natureza dos serviços prestados, a fim de que se cumpram os princípios básicos da administração, que haja transparência nos serviços prestados e que haja um bom retorno à população, é necessário que haja mecanismos capazes de instruir e regular tais serviços.

Segundo Gomes Filho (2005)

A transparência não deve ser uma missão apenas de alguns gestores públicos, mas sim de uma política, por isso devemos considerar a transparência como uma regra, dando margem para as informações, sendo que a transparência se conecta com o conhecimento, com o saber, portanto, dá margem à informação sendo um método para o sucesso […].

                            (GOMES FILHO, 2005, p. 30)

Assim, dada a importância dos aspectos acima mencionados, surgem os Códigos Profissionais ou ainda Códigos de Ética.

Os códigos de Ética são documentos que visam direcionar o comportamento dos membros de determinado grupo através do estabelecimento de princípios e normas. Tal código além de gerar um alinhamento das posturas dos indivíduos componentes do grupo, tem caráter instrutivo, mas o mais importante, assegura ao público que dentro daquele grupo os papéis exigidos ou serviços prestados serão feitos com responsabilidade.

Os códigos de ética devem existir não apenas para empresas e organizações privadas, muito pelo contrário. É não apenas essencial como também imprescindível que os órgãos públicos possuam e cumpram um código de ética, garantindo o retorno devido à sociedade. 

Através do cumprimento destes códigos o governo inspira confiança e por consequência legitimam suas ações e tomadas de decisões. Assim, por serem os responsáveis pelo uso de recursos públicos, tanto materiais como de pessoal, é necessário que os agentes e servidores públicos atuem de maneira em conformidade a estes códigos éticos, devendo levar os princípios éticos acima de quaisquer tipos de vantagens de benefício próprio, como vantagens financeiras, crescimento profissional, entre outras.

É válido mencionarmos que, quando não cumpridos, os códigos de ética, como instrumentos reguladores, possuem mecanismos legais capazes de agir em contrapartida a estas atitudes, ou seja, quando há atitudes em contrário aos princípios ético, os responsáveis por estes atos serão responsabilizados legalmente.

2.1.2 O CÓDIGO DE ÉTICA DOS SERVIDORES DA UNIÃO

Conforme mencionado anteriormente, não só os servidores privados como também os servidores públicos necessitam de um código de ética vigente e efetivo.

Assim, no ano de 1994 foi criado através de decreto Nº 1171/1994 o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal, ao qual abordaremos alguns aspectos relevantes a seguir.

O Código de Ética em questão foi criado com base no artigo 37 da Constituição Federal Brasileira de 1988, onde temos expressos os cinco princípios fundamentais da administração, sendo eles legalidade, impessoalidade, publicidade, eficiência e moralidade, abordados anteriormente.

O decreto de inicia com alguns incisos denominados de regras deontológicas, que consiste em valores que se esperam do servidor público, qual o padrão ético ele deve seguir. Assim, podemos ver mais especificamente que os três primeiros incisos do decreto Nº 1171/1994 (BRASIL, 1994) nos trazem quais devem ser os norteadores do serviço público, reafirmando a premissa de que o servidor deve agir sempre com ética e honestidade. 

I – A dignidade, o decoro, o zelo, a eficácia e a consciência dos princípios morais são primados maiores que devem nortear o servidor público, seja no exercício do cargo ou função, ou fora dele, já que refletirá o exercício da vocação do próprio poder estatal. Seus atos, comportamentos e atitudes serão direcionados para a preservação da honra e da tradição dos serviços públicos. 

II – O servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas principalmente entre o honesto e o desonesto, consoante as regras contidas no art. 37, caput, e § 4°, da Constituição Federal. 

III – A moralidade da Administração Pública não se limita à distinção entre o bem e o mal, devendo ser acrescida da ideia de que o fim é sempre o bem comum. O equilíbrio entre a legalidade e a finalidade, na conduta do servidor público, é que poderá consolidar a moralidade do ato administrativo (BRASIL, 1994).

No inciso IV podemos notar que é apresentada a questão da remuneração recebida pelo servidor público, que é proveniente de tributos públicos, e que o mesmo servidor, como cidadão, não se isenta de pagar tais tributos, reforçando também que a ética e a moral são exigidas como como contrapartida em seu comportamento profissional

IV – A remuneração do servidor público é custeada pelos tributos pagos direta ou indiretamente por todos, até por ele próprio, e por isso se exige, como contrapartida, que a moralidade administrativa se integre no Direito, como elemento indissociável de sua aplicação e de sua finalidade, erigindo-se, como consequência, em fator de legalidade (BRASIL, 1994). 

Um aspecto interessante mencionado no inciso V é o de que o trabalho que o servidor público desenvolve acresce ao seu bem estar, pois além de servidor ele também é um cidadão, portanto deve cumprir com seus deveres, mas também usufruir de seus direitos, sendo o êxito obtido em seu trabalho o maior patrimônio que possa possuir como cidadão.

O inciso XIX do decreto Nº 1171/1994 (BRASIL, 1994) nos apresenta a lista de deveres fundamentais a serem exercidos pelo servidos público, onde podemos destacar os deveres a seguir:

c) ser probo, reto, leal e justo, demonstrando toda a integridade do seu caráter, escolhendo sempre, quando estiver diante de duas opções, a melhor e a mais vantajosa para o bem comum; […]

f) ter consciência de que seu trabalho é regido por princípios éticos que se materializam na adequada prestação dos serviços públicos; […]

i) resistir a todas as pressões de superiores hierárquicos, de contratantes, interessados e outros que visem obter quaisquer favores, benesses ou vantagens indevidas em decorrência de ações morais, ilegais ou aéticas e denunciá-las; […]

v) divulgar e informar a todos os integrantes da sua classe sobre a existência deste Código de Ética, estimulando o seu integral cumprimento. ”  (BRASIL, 1994).

Como é notório nos artigos apresentados, é dever do servidor público agir com ética, resistir às tentativas que se relacionem com a falta dela e propagar o código em questão ao máximo de servidores possível.

Além dos deveres apresentados o código de ética em questão também nos traz a relação de condutas vedadas, ou seja, condutas proibidas em função de legislatura penais, legislaturas que vedam atos de improbidade ou ainda de disciplina. 

No inciso V temos explicitamente abordadas essas vedações. Podemos relacionar assim algumas vedações apresentadas e as configurações de crimes que podem ser vinculadas ao descumprimento das mesmas por parte do servidor público.

Segundo o Inciso V (Brasil, 1994) é vedado ao servidor público utilizar-se de influência para si ou para terceiro, podendo configuras por exemplo crime de prevaricação. O próximo aspecto é que é vedado prejudicar a reputação de outros servidores, podendo configurar-se como crime contra a honra e levar a ação de caráter indenizatório. Em seguida temos a vedação em ser conivente com erro ou conivente com infrações ao código de ética, podendo configurar crime de condescendência criminosa (artigo 320 do código Penal Brasileiro). 

As demais vedações apresentadas no inciso serão expressas abaixo, de forma que mesmo não expressos diretamente os crimes relacionados, nas legislações penais temos associações diretas a cada uma delas.

d) usar de artifícios para procrastinar ou dificultar o exercício regular de direito por qualquer pessoa, causando-lhe dano moral ou material;

e) deixar de utilizar os avanços técnicos e científicos ao seu alcance ou do seu conhecimento para atendimento do seu mister;

f) permitir que perseguições, simpatias, antipatias, caprichos, paixões ou interesses de ordem pessoal interfiram no trato com o público, com os jurisdicionados administrativos ou com colegas hierarquicamente superiores ou inferiores; 

g) pleitear, solicitar, provocar, sugerir ou receber qualquer tipo de ajuda financeira, gratificação, prêmio, comissão, doação ou vantagem de qualquer espécie, para si, familiares ou qualquer pessoa, para o cumprimento da sua missão ou para influenciar outro servidor para o mesmo fim; 

h) alterar ou deturpar o teor de documentos que deva encaminhar para providências;

i) iludir ou tentar iludir qualquer pessoa que necessite do atendimento em serviços públicos;

j) desviar servidor público para atendimento a interesse particular; 

l) retirar da repartição pública, sem estar legalmente autorizado, qualquer documento, livro ou bem pertencente ao patrimônio público; 

m) fazer uso de informações privilegiadas obtidas no âmbito interno de seu serviço, em benefício próprio, de parentes, de amigos ou de terceiros; 

n) apresentar-se embriagado no serviço ou fora dele habitualmente; 

o) dar o seu concurso a qualquer instituição que atente contra a moral, a honestidade ou a dignidade da pessoa humana; 

p) exercer atividade profissional aética ou ligar o seu nome a empreendimentos de cunho duvidoso (BRASIL, 1994).

Com as vedações apresentadas reforça-se o fato de que a ética está fortemente associada ao desempenho esperado para o servidor público e consequentemente aos órgãos públicos como entidades. Podemos assim reafirmar que o interesse que o servidor deve buscar é sempre o interesse comum, o bem maior para a população, nunca seu benefício próprio.

2.1.3 COMISSÃO DE ÉTICA

Além do Código de Ética, um outro instrumento utilizado para auxiliar na boa aplicação na Ética Pública são as Comissões de Ética.

Gonçalves (2011) diz que 

[o setor público] deve ainda, implementar e aperfeiçoar instrumentos capazes de permitir ao cidadão um acompanhamento de toda a atividade administrativa com possibilidade de denunciar maus gestores da coisa pública e opinar sobre possibilidades de melhoria da coisa pública”. (GONÇALVES, 2011, p. 35). 

As comissões de ética podem ser tidas como uma porta de entrada para o controle da população das questões éticas, seja com relação às consultas informativas ou como forma de contato, como fonte para esclarecimento de dúvidas ou para apresentar insatisfações com relação aos servidores e órgãos públicos.

Sua importância se dá, pois, a existência do código de ética não basta por si só, ou seja, não há eficácia completa em apenas um conjunto de leis e normas escritas sem que haja fiscalização e controle de tais questões. Assim, as comissões de ética tornam-se os órgãos internos responsáveis por fiscalizar o cumprimento do disposto nos códigos de ética.

Instaurada em 26 de maio de 1999 via decreto, a Comissão de Ética Pública, também chamada de CEP surgiu para atuar de forma consultiva ao Presidente da República e seus Ministros nos quesitos relacionados à ética pública, sendo responsável também por auxiliar a sanar dúvidas referentes ao Código de Conduta da Alta Administração Federal e referentes ao código de ética do servidor público abordado nos tópicos anteriores.

A criação da Comissão em questão se deu pois o período precedente a sua criação foi um período em que havia grandes falhas nos sistemas políticos, insatisfação social e questões envolvendo conflitos de interesses entre as esferas pública e provada. Assim, a fim de gerar a prevenção de desvios de recursos públicos e como forma a orientar as autoridades, foi criada a comissão.

Em 2007, através do Decreto Nº 6029/2007, instituiu-se o Sistema de Gestão da Ética do Poder Executivo Federal, assim novas atribuições foram concedidas à Comissão de Ética, entre elas coordenar, avaliar e supervisionar o Sistema de Gestão da Ética Pública do Poder Público Federal.

3. CONSIDERAÇOES FINAIS

Após as análises e debates acerca dos arquivos públicos, legislações e consulta aos autores de grande relevância para o tema podemos afirmar que é de extrema importância para o bom funcionamento da sociedade que a ética esteja enraizada e seja praticada individual e coletivamente, nas esferas públicas e privadas.

Em especial, no que se trata da esfera pública, fica evidente que a Administração Pública precisa caminhar aparelhada, lado a lado com a ética para que possa entregar uma boa gestão, uma gestão honesta, correta, transparente e de acordo com o que é esperado e de direito da população.

É válido reforçarmos que não só a organização como os agentes e servidores públicos devem sempre seguir suas ações com base nos princípios éticos, respeitando sempre os códigos de ética das organizações que fazem parte.

Por mais que por muitas vezes possamos ficar desmotivados com o grande número de manchetes negativas envolvendo escândalos relacionados à falta de ética, precisamos pensar que isso deve ser um motivador para que continuemos a ser incisivos nas cobranças, devemos incentivar que o conhecimento seja disseminado para que a população em geral possa acompanhar e exigir que seus direitos sejam cumpridos.

O ensino da ética deve estar presente na educação desde as fases iniciais da infância, deve estar presente em nossos lares e escolas e ser presente no nosso cotidiano. Só assim, com incentivo à educação e ensino da ética, incutindo-a no nosso cotidiano poderemos buscar melhorias efetivas a gestão do nosso país.

REFERÊNCIAS

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1Discente do Curso Superior de Tecnologia em Gestão Pública do Instituto Federal de Rondônia Campus Porto Velho Zona Norte. E-mail: elizangelaaraujo228@gmail.com, maelyc2@hotmail.com

2Docente do Curso Superior de Tecnologia em Gestão Pública do Instituto Federal de Rondônia Campus Porto Velho Zona Norte. Especialista em Gestão Pública (CENES) Mestre em Ciências Agrárias (UFPB. E-mail: erik.silva@professor.pb.gov.br