A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL NO BRASIL: IMPLICAÇÕES JURÍDICAS, SOCIAIS E POLÍTICAS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8034752


Ana Gabriela Machado de Sousa1
Israel Andrade Alves2


RESUMO: O presente artigo tem por escopo esclarecer a discussão sobre a redução da maioridade penal no Brasil, questão tão polêmica e atual, tanto no âmbito social, político e jurídico. Esse trabalho faz uma abordagem acerca da possibilidade e conveniência da redução da maioridade penal no Brasil. Realizou-se uma revisão bibliográfica com o intuito de aprofundar os conhecimentos sobre o tema e, dessa forma, obter uma compreensão mais abrangente e aprofundada do assunto. Observou-se que, mesmo entre os doutrinadores que apoiam a redução da maioridade penal, não há consenso em relação à quantidade de crimes que poderiam ser diminuídos por meio da imposição de penas mais severas aos jovens infratores. Não existem dados específicos no cenário mundial que possam comprovar que a redução da maioridade penal também reduz a criminalidade cometida por jovens. Outro aspecto relevante diz respeito ao fato de que o sistema carcerário brasileiro se encontra deteriorado, sendo incapaz de atender de maneira humanitária e digna os indivíduos condenados, tampouco possui capacidade para promover a ressocialização, oferecendo educação e emprego para que esses indivíduos possam se desenvolver e ter novas oportunidades após saírem da prisão. Dessa forma, inserir jovens que ainda estão em processo de formação nesse sistema, além de afastá-los de suas responsabilidades familiares e da possibilidade de concluir seus estudos, pode expô-los a indivíduos cujas condutas são ainda mais criminosas, transformando-se em uma “escola do crime” em vez de uma prática educativa capaz de melhorar seu comportamento para o futuro. Nesse contexto, o presente estudo permitiu compreender que, inicialmente, o encarceramento de jovens por meio da redução da idade penal como forma de diminuir a violência seria uma medida paliativa e teria poucos resultados práticos, sendo necessário, antes disso, uma melhora significativa nas estruturas prisionais e um investimento massivo em educação e programas de desenvolvimento.

Palavras-chave: Maioridade penal, redução, direito.

INTRODUÇÃO

A redução da maioridade penal é um tema polêmico e controverso no Brasil. A discussão gira em torno da possibilidade de diminuir a idade mínima para que uma pessoa seja responsabilizada criminalmente por seus atos, atualmente estabelecida em 18 anos. O tema é complexo e tem consequências jurídicas, políticas e sociais importantes que devem ser consideradas.

Do ponto de vista jurídico, a redução da maioridade penal implicaria em mudanças na legislação brasileira. Atualmente, menores de 18 anos que cometem crimes são considerados inimputáveis, ou seja, não podem ser condenados criminalmente. Se a maioridade penal fosse reduzida, isso significaria que esses menores poderiam ser julgados e condenados como adultos.

Politicamente, a redução da maioridade penal é uma questão que divide opiniões. Há aqueles que defendem a medida como uma forma de combater a criminalidade e garantir mais segurança à população. Por outro lado, há aqueles que argumentam que a redução não é a solução para o problema e que pode trazer mais prejuízos do que benefícios, especialmente para os jovens mais vulneráveis e marginalizados.

Do ponto de vista social, a redução da maioridade penal pode ter diversas consequências. Uma delas é a possibilidade de mais jovens serem encarcerados, o que pode agravar o problema de superlotação das prisões e expor esses jovens a condições desumanas. Além disso, há o risco de que a medida crie um efeito de seleção, em que jovens de baixa renda e minorias étnicas e raciais sejam os mais afetados.

O objetivo deste artigo é realizar uma engenharia jurídica, social e política da questão da redução da maioridade penal no Brasil. Para tanto, será feita uma análise dos argumentos aceitos e contrários à redução da maioridade penal, bem como uma discussão sobre a constitucionalidade da medida. Serão também examinadas como instituições sociais da redução da maioridade penal, incluindo as consequências para os adolescentes em conflito com a lei e para a sociedade em geral, bem como as instruções políticas da medida, sua relação com a segurança pública e a criminalidade.

Além disso, o artigo apresentará exemplos de países que adotaram a redução da maioridade penal e suas consequências, a fim de avaliar a eficácia da medida em outros contextos. Estão ainda propostas alternativas à redução da maioridade penal, como a melhoria do sistema socioeducativo e à prevenção da criminalidade.

Diante dessas considerações, este artigo tem como objetivo apresentar uma análise crítica e fundamentada da questão da redução da maioridade penal no Brasil, a fim de contribuir para um debate mais informado e fundamentado sobre o assunto.

A pesquisa adotou uma metodologia qualitativa. Na elaboração desta pesquisa se darão pelo estudo qualitativo, buscando na legislação e referenciais bibliográficos, trazendo conceitos históricos, como entrevistas com especialistas jurídicos, sociais e políticos, além de análise de documentos legais e debates públicos. A metodologia foi escolhida devido à natureza complexa e contextualizada do objeto de estudo, bem como à necessidade de explorar as interações e relações entre variáveis. Essa metodologia proporcionou um maior nível de profundidade e riqueza aos resultados da pesquisa, permitindo uma análise holística e uma compreensão mais abrangente do fenômeno investigado.

1 REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL NO BRASIL

Os principais argumentos favoráveis à redução da maioridade penal estão relacionados à ideia de que jovens com 16 anos já têm maturidade suficiente para entender a gravidade de seus atos e, portanto, deveriam ser punidos de acordo com a lei. Argumenta-se também que a redução da maioridade penal seria uma forma de inibir a criminalidade, especialmente aquela praticada por jovens, e aumentar a sensação de segurança da população.

Por outro lado, os principais argumentos contrários à redução da maioridade penal se baseiam no entendimento de que adolescentes de 16 anos ainda estão em fase de desenvolvimento e, portanto, não têm capacidade plena de discernimento. Além disso, argumenta-se que a medida não resolveria o problema da criminalidade, já que a maioria dos crimes cometidos por jovens está relacionada a questões sociais, como a falta de acesso à educação, saúde e emprego.

Há ainda outras questões envolvidas no debate, como o possível impacto da medida sobre o sistema prisional, já sobrecarregado, e a necessidade de investimentos em políticas públicas para prevenção da criminalidade juvenil.

De um lado e de outro, há argumentos e evidências que respaldam suas posições. No entanto, é importante que o debate seja conduzido com seriedade e baseado em dados empíricos, a fim de se avaliar a eficácia e as consequências da redução da maioridade penal para a sociedade como um todo.

Para compreender melhor o assunto, é importante analisar e considerar os argumentos favoráveis e contrários à medida.

1.1 POSICIONAMENTOS FAVORÁVEIS ​​​​A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

A diminuição da idade penal é um assunto que gera controvérsias e divisões de opinião, sendo objeto de discussão há muitos anos em diversos países. No Brasil, a discussão sobre a redução da maioridade penal voltou à tona nos últimos anos, especialmente após casos de crimes graves envolvendo menores de idade.

Há posições que se posicionam à redução da maioridade penal que argumentam que os jovens infratores devem ser responsabilizados por seus atos e que a redução da maioridade penal é uma medida necessária para combater a violência e a impunidade. Um exemplo de posicionamento favorável, Diego Luiz Victório Pureza trás o entendimento que:

[…] a política criminal que influenciou o legislador em 1984 e o legislador constituinte originário de 1988 já não é mais a mesma, especialmente pelo aumento do índice de ilícitos penais praticados por menores e pelo avanço dos meios de comunicação que proporcionaram precoce alcance de entendimento e maturidade daqueles que ainda não atingiram a maioridade. (PUREZA, 2015, p. 1).

Outro argumento a favor da redução da maioridade penal é que a impunidade estimula a criminalidade e que a medida pode ser um fator de dissuasão para os jovens que consideram cometer crimes. Assim leciona Camila Cipola Pereira:

E mesmo que considerarmos que o legislador brasileiro tenha adotado o caráter biológico, no qual os menores de 18 anos são inimputáveis e tenha o consagrado como um direito fundamental, cujo desenvolvimento ficaria a cargo do Estado, mediante políticas públicas e programas sociais, não estaria ele consagrado na norma do artigo 5º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, da forma como veiculam os idealizadores de uma inconstitucionalidade na redução da maioridade penal, pois o direito ali consagrado como uma cláusula pétrea seria referente à segurança do menor e não a faixa etária. (PEREIRA, 2012, p. 19)

Existem diversos argumentos que defendem a redução da maioridade penal, muitos dos quais alegam que essa medida pode contribuir para a diminuição da criminalidade, pois poderiam desencorajar os adolescentes a cometerem atos ilegais Fábio José Bueno trás o entendimento que:

Eu sou favorável à redução da maioridade penal em relação a todos os crimes. Em 1940, o Brasil estipulou a maioridade em 18 anos. Antes disso, já foi 9 anos, já foi 14. Naquela época, os menores eram adolescentes abandonados que praticavam pequenos delitos. Não convinha punir esses menores como um adulto. Passaram-se 70 anos e hoje os menores não são mais os abandonados. O menor infrator, na sua maioria, é o adolescente que vem de família pobre, porém, não miserável. Tem casa, comida, educação, mas vai em busca de bens que deem reconhecimento a ele. As medidas do Estatuto da Criança e do Adolescente não intimidam. Eles praticam os atos infracionais, porque não são punidos na medida. A pena tem a função de intimidação, que a medida socioeducativa não tem. É importante saber que o crime não compensa, que haverá uma pena, uma punição. (PORTAL G1, 2015)

Dentre os vários pontos de vista levantados pelos defensores da redução da maioridade penal, destaca-se a perspectiva da justiça como um dos principais argumentos. Para esses defensores, o que importa não é necessariamente se a redução será eficaz na redução da criminalidade no país, mas sim a ideia de que a sociedade deve sentir que a justiça foi feita ao penalizar um adolescente que cometeu um ato ilícito. Eles não levam em consideração se o adolescente tinha capacidade de entendimento e discernimento na hora de cometer o crime, mas sim a idade que ele tinha no momento em que o ato foi cometido.

1.2 POSICIONAMENTOS NEGATIVOS A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

No entanto, há também posicionamentos contrários à redução da maioridade penal que argumentam que a medida é ineficaz, injusta e prejudicial ainda mais os jovens em situação de vulnerabilidade social. Um exemplo de posicionamento contrário é a do jurista Dalmo Dallari:

Não há nenhuma dúvida de que é um direito fundamental, expressamente consagrado na Constituição, e pronto. Então, dentro dessa perspectiva, é cláusula pétrea. Isso faz parte da essência da Constituição. Ao meu ver, ela é inconstitucional, porque afeta uma cláusula pétrea, uma norma constitucional, que proclama e garante direitos fundamentais da pessoa humana. Isso não pode ser objeto de uma simples mudança por emenda constitucional (REVISTA FÓRUM, 2015, p.1).

Dentre os posicionamentos negativos em relação à redução da maioridade penal, um dos argumentos mais fortes é que a medida não irá solucionar o problema da criminalidade, e que há outras soluções mais eficazes a serem adotadas. Destaque para o juiz da vara da infância e da juventude do Distrito Federal Renato Rodovalho Scussel:

Sou contra. O que, a princípio, parece justo pode acarretar injustiça por não se tratar de um critério objetivo. A primeira avaliação da ocorrência ou não do dolo [intenção de cometer o crime] é da autoridade policial. Se a conduta for considerada crime, o jovem poderá ir para a prisão. Com a apuração dos fatos, é possível que o juiz criminal entenda se tratar de ato infracional e não de crime e decline da sua competência ao juiz infanto-juvenil. Situações como essa geram insegurança jurídica e trazem consequências graves, até irreversíveis, para a ressocialização do jovem. O ECA acaba de completar 25 anos e talvez seja este o momento de repensar dispositivos a fim de aperfeiçoar e adequar o sistema de atendimento socioeducativo. Aumentar o prazo de internação para atos mais gravosos torna mais claro o processo socioeducativo para o adolescente. Ele compreende que sua liberdade será restringida por mais tempo, porque praticou um ato mais grave. (PORTAL G1, 2015)

Além disso, a redução da maioridade penal pode trazer conseqüências negativas para os adolescentes que cometem crimes. Como aponta o Diego Luiz Victório Pureza:

[…] A redução da maioridade penal não será a solução para a diminuição do índice de criminalidade em nosso país. Entendem se tratar de instrumento de manobra para desviar a atenção da população dos verdadeiros problemas que assolam a sociedade. […] os crimes praticados por menores de 18 anos representam porcentagem inferior a 1% (um por cento) se comparado aos crimes praticados por adultos. (PUREZA, 2015, p.2)

Para finalizar os argumentos contra a redução da maioridade penal, a forma mais certa de reduzir a criminalidade, é com a educação, investir mais nesse âmbito, e na aplicação efetiva do Estatuto da criança e do adolescente. Pois ao contrário do que a sociedade pensa, os jovens que cometem algum ato infracional são punidos sim, mas de uma forma educacional, ressocializadora, aos olhos do ECA.

2 ANÁLISE CONSTITUCIONAL DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

A questão polêmica e amplamente debatida sobre a redução da maioridade penal revela uma complexidade extrema. A proposta tem sido amplamente divulgada e discutida nos meios de comunicação de massa, com o objetivo de avaliar se é conveniente ou não adotar essa medida para a sociedade e como essa mudança na legislação penal, que atribui a imputabilidade do agente infrator a partir dos 16 anos, poderia afetar os índices de criminalidade.

No entanto, essas discussões têm negligenciado um fator relevante e determinante, que é tão complexo quanto o mérito da questão. Esse fator refere-se à constitucionalidade da proposta de redução da maioridade penal. A questão é saber se, em uma análise jurídica rigorosa, seria possível propor um projeto de lei que reformule a legislação supramencionada sem afetar as chamadas cláusulas pétreas.

A grande controvérsia em torno da constitucionalidade do assunto está na interpretação do artigo 228 da Constituição Federal de 1988, que estabelece a idade mínima penal em 18 anos e prevê que os menores de idade se sujeitam a uma legislação especial, ou seja, o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Portanto, diferentes interpretações são dadas a esse dispositivo constitucional em relação à sua natureza jurídica real. Alguns argumentam que é uma das cláusulas fundamentais de direitos e garantias e, portanto, deve ser classificada como cláusula pétrea, enquanto outros afirmam que é apenas um dispositivo constitucional comum, que pode ser alterado pelo Poder Constituinte Reformador.

Para aprofundar ainda mais a discussão sobre o tema, é necessário entender o conceito de cláusulas pétreas. Segundo o portal do Senado Federal, elas são disposições constitucionais que não podem ser alteradas por meio de emendas constitucionais, pois têm caráter fundamental e asseguram a proteção dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos:

Dispositivo constitucional que não pode ser alterado nem mesmo por Proposta de Emenda à Constituição (PEC). As cláusulas pétreas inseridas na Constituição do Brasil de 1988 estão dispostas em seu artigo 60, § 4. São elas: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais. (SENADO FEDERAL, 2015, p. 1).

O examinar a escrita do mencionado artigo, é possível constatar que todos os pontos destacados nele são claros e objetivos, sem deixar espaço para interpretações subjetivas controversas. A única exceção é o tópico intitulado “direitos e garantias individuais”, que em sua maioria são listados no artigo 5º e seus setenta e oito incisos e parágrafos na Constituição. Entretanto, na doutrina constitucionalista nacional, esse dispositivo é considerado como um exemplo não exaustivo, o que significa que deve ser interpretado de forma expansiva, incluindo outros direitos e garantias não expressamente previstos e que devem ser tratados de maneira similar.

O consagrado constitucionalista Pedro Lenza, aborda o conteúdo do art. 5°, CF/88 da seguinte maneira:

Trata-se de um rol meramente exemplificativo, na medida em que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (§ 2°). (LENZA, 2014, p.28).

Nesse sentido, aduz Rodrigo César Rebello Pinho:

A relação extensa de direitos individuais prevista no art. 5º da Constituição Federal (77 incisos) não é taxativa, exaustiva. Eles existem em outras normas previstas na própria Constituição (p. ex., art. 150, contendo garantias de ordem tributária). A própria Constituição deixa claro o caráter meramente enunciativo desse enunciado, ao salientar que são tutelados outros direitos decorrentes dos princípios por ela adotados (p. ex., direito de reunião sem restrições em locais fechados, uma vez que o Texto Constitucional só prevê o direito de reunião em locais abertos, obedecidos certos requisitos – art. 5º, XVI), bem como dos tratados internacionais dos quais o Brasil faça parte (p. ex., Pacto de San Jose da Costa Rica). (PINTO, 2002, p. 73).

De acordo com as posições defendidas, a Proposta de Emenda à Constituição Federal que visa reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos, é inviável, pois desrespeita os direitos e garantias constitucionais, além de contrariar uma cláusula pétrea. Ademais, não é a melhor abordagem para lidar com a criminalidade, já que os adolescentes respondem por somente 1% dos crimes praticados no país. (Narloch, Leandro).

Acredita-se que punições mais severas não são eficazes no combate à criminalidade. É fundamental que nos atentemos aos problemas fundamentais da sociedade, tais como a educação, a segurança e a corrupção que permeiam todo o país.

3 IMPLICAÇÕES SOCIAIS DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

A proposta de redução da maioridade penal tem como objetivo punir adolescentes envolvidos em crimes graves, como homicídio, estupro e roubo qualificado. No entanto, a análise das implicações sociais dessa medida deve ser realizada de forma a considerar as consequências para os adolescentes em conflito com a lei e para a sociedade em geral.

Uma das principais implicações sociais da redução da maioridade penal é o impacto na vida dos adolescentes envolvidos em crimes.

Em primeiro lugar, a redução da maioridade penal pode ter implicações negativas para os adolescentes envolvidos em crimes. Esses jovens podem ser submetidos a um sistema carcerário inadequado para a sua idade, com altos índices de violência e pouco acesso à educação e saúde. Além disso, a convivência com criminosos adultos pode aumentar o risco de reincidência e agravar o envolvimento com o mundo do crime.

Outra implicação social relevante da redução da maioridade penal é o efeito na sociedade em geral.

Em segundo lugar, a redução da maioridade penal também pode ter consequências para a sociedade em geral. A punição mais severa para adolescentes envolvidos em crimes graves pode transmitir uma mensagem de impunidade para os adultos que cometem crimes semelhantes. Isso pode levar a uma sensação de insegurança e a um aumento da criminalidade.

Portanto, é importante considerar a dimensão racial e socioeconômica no debate sobre a redução da maioridade penal.

Em conclusão, a análise das implicações sociais da redução da maioridade penal deve levar em conta não apenas as consequências para os adolescentes em conflito com a lei, mas também para a sociedade em geral. A punição mais severa para adolescentes não resolve o problema da criminalidade juvenil e pode agravar ainda mais as desigualdades sociais e a violência urbana. É fundamental investir em políticas públicas que previnam o envolvimento de adolescentes com o crime, garantindo o acesso à educação, saúde e cultura, além de medidas socioeducativas efetivas.

4 DAS CONSEQUENCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE

O tema sobre a diminuição da maioridade penal no Brasil exige cuidado e ponderação. Não é sensato pensar que a simples alteração da idade de responsabilização criminal de 18 para 16 anos resolverá instantaneamente todos os problemas relacionados à violência envolvendo jovens. Além disso, é preciso considerar os riscos de tomar decisões legislativas baseadas em apelos midiáticos e pressão popular. Há uma tendência preocupante de políticos agirem impulsivamente para atender às demandas da sociedade, sem levar em conta o impacto que isso pode ter no conjunto de leis de uma nação. O objetivo do direito penal é proteger os bens jurídicos, e não atender às vontades ignorantes das massas que desconhecem as leis do país em que vivem.

Reduzir a idade de responsabilização criminal, que já é estabelecida pela Constituição, quando já existe uma legislação específica para lidar com jovens infratores, é uma medida imatura. Tratar crianças e adolescentes como adultos reflete a intolerância social e só servirá para torná-los ainda mais perigosos, já que podem sentir-se marginalizados e abandonados. É preocupante ver a discussão sobre a redução da maioridade penal ressurgir sempre que há casos de violência envolvendo jovens, pois isso pode levar a um retrocesso nos avanços conquistados em relação ao entendimento da adolescência como uma fase de formação.

Por fim, é importante lembrar que a redução da maioridade penal não é uma solução única para a criminalidade juvenil. Políticas que priorizam a prevenção e a intervenção precoce, como programas de educação, formação profissional, assistência social e psicológica, podem ser mais eficazes em abordar as causas subjacentes da criminalidade e na promoção da segurança pública.

Em conclusão, a redução da maioridade penal é um tema complexo que envolve questões políticas, sociais e jurídicas. Embora possa parecer uma solução rápida para a criminalidade juvenil, é importante considerar cuidadosamente suas implicações políticas e os efeitos potencialmente negativos que pode ter para a segurança pública e os direitos humanos.

5 REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL NO DIREITO COMPARADO E ALGUMAS DE SUAS CONSEQUÊNCIAS

Nossa legislação atualmente responsabiliza indivíduos acima de 12 anos por atos ilegais, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, que estabelece medidas socioeducativas para menores infratores, como advertência, obrigação de reparação do dano, prestação de serviço comunitário, liberdade assistida, semiliberdade e internação, conforme a gravidade do delito.

Apesar de 54 países terem reduzido a maioridade penal, a violência não diminuiu nesses lugares. A Espanha e a Alemanha até voltaram atrás na decisão de criminalizar menores de 18 anos, enquanto que atualmente 70% dos países adotam 18 anos como idade penal mínima. (FREI BETTO, 2014, p. 1)

O índice de reincidência em nossas prisões é de 70%, e infelizmente não há no Brasil uma política penitenciária com o intuito de reabilitar os detentos. Uma reforma prisional seria tão importante e urgente quanto a reforma política, visto que delegacias, prisões e penitenciárias acabam sendo locais de aprendizado para o crime. (FREI BETTO, 2014, P. 2)

Se jovens infratores ingressarem no sistema carcerário, a tendência é que aumente o número de criminosos, já que muitos ficariam distantes de medidas socioeducativas e sujeitos à violência e abuso sexual praticados pelas facções que dominam nossas prisões. Em contrapartida, no sistema socioeducativo, o índice de reincidência é de 20%, indicando que 80% dos menores infratores são recuperados. (FREI BETTO, 2014, P. 1)

Atualmente, o sistema prisional brasileiro não tem capacidade para abrigar todos os presos, já que temos a quarta maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,6 milhão) e Rússia (740 mil). (FREI BETTO, 2014, P. 1)

Reduzir a maioridade penal seria tratar o sintoma e não a causa. Ninguém nasce criminoso ou delinquente, mas muitos jovens acabam entrando no crime devido à falta de educação, apoio familiar e influência consumista que os leva a crer que apenas possuindo produtos de marcas renomadas terão valor social.

Em última análise, menores infratores são um reflexo do descaso do Estado em não oferecer creches e educação de qualidade, bem como áreas de esporte, arte e lazer para crianças, e emprego digno ou renda mínima para seus pais em casos de desemprego. Segundo o PNAD, adolescentes que optam pelo ensino médio em conjunto com cursos técnicos ganham em média 12,5% a mais do que aqueles que apenas concluem o ensino médio, porém ainda são poucos os cursos técnicos disponíveis no Brasil. (FREI BETTO, 2014, P. 1)

É importante notar que a redução da maioridade penal não é a única maneira de lidar com a criminalidade juvenil. Muitos especialistas argumentam que é necessário abordar as causas subjacentes da criminalidade, como a pobreza, a falta de educação e o acesso limitado a oportunidades econômicas. Além disso, é fundamental garantir que os jovens tenham acesso a serviços de saúde mental e outros tipos de suporte que possam ajudá-los a evitar o crime e se recuperar do trauma.

6 PROPOSTAS DE ALTERNATIVAS À REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

A redução da maioridade penal no Brasil é um tema complexo e que gera muitas divergências. É preciso analisar as consequências jurídicas, sociais e políticas que a medida pode causar, antes de tomar uma decisão. A melhoria do sistema socioeducativo e a prevenção da criminalidade são medidas que podem ser adotadas para reduzir a violência entre os jovens e garantir a segurança da sociedade em geral.

É possível observar que, desde a criação do ECA, pouco tem sido realizado em termos de políticas públicas com o objetivo de diminuir as disparidades sociais e, consequentemente, reduzir os níveis de delinquência entre os jovens. É importante compreender que a luta contra esses problemas sociais é a principal medida preventiva para evitar que esses indivíduos cometam crimes.

No entanto, se um adolescente comete um ato infracional, é importante saber que ele pode sofrer sanções de acordo com as normas estabelecidas no Estatuto da Criança e do Adolescente. Muitas vezes, os adolescentes infratores não recebem as condições mínimas necessárias para sua reeducação durante a execução das chamadas medidas socioeducativas.

Nesse contexto, é possível notar uma pesquisa divulgada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que se destaca:

Ao analisar a distribuição das instituições pelos estados brasileiros, observa–se relevante disparidade em termos quantitativos no país, visto que alguns estados possuem número muito superior de instituições de internação do que outros. Estes dados indicam a necessidade de se ampliar o sistema e rever os critérios de criação de novas estruturas, porque a demanda não corresponde ao número de estruturas. Enquanto São Paulo (112), Santa Catarina (19) e Paraná (18) são os estados com maior número absoluto de estabelecimentos, os estados com maior concentração de adolescentes por estabelecimento são Distrito Federal (com média de 163 adolescentes por estabelecimento), Bahia (126) e Rio de Janeiro (125). Quando analisada a sobrecarga do sistema, percebe-se que, na totalidade dos estabelecimentos brasileiros, não restam vagas, considerando-se que a taxa de ocupação das unidades é de 102%. Os estados federativos com maior sobrecarga estão todos no Nordeste, considerando que o Ceará tem taxa de ocupação de 221%, Pernambuco, 178% e Bahia, 160%. Ainda no Nordeste os estados de Sergipe (108%), Paraíba (104%) e Alagoas (103%) possuem superlotação em suas unidades. Neste quesito, Distrito Federal (129%) e o Mato Grosso do Sul 36 (103%) merecem destaque no Centro-Oeste; enquanto no Sudeste, Minas Gerais possui 101% de ocupação. Por fim, na Região Sul, Paraná (111%) e Rio Grande do Sul (108%) apresentam ocupação superior à capacidade. (CNJ, 2012, p.1).

O que é evidente é a ineficácia do poder público em desenvolver políticas efetivas, tanto para prevenir quanto para recuperar jovens, devido principalmente à forte cultura de corrupção que permeia a história do nosso país. A proposta de redução da maioridade penal seria uma tentativa equivocada de desviar a atenção dos verdadeiros motivos por trás desse problema, que é a falta de assistência estatal para as camadas mais desfavorecidas da sociedade. Essas pessoas são abandonadas por aqueles que deveriam minimizar os efeitos das cruéis adversidades socias.

CONCLUSÃO

A proposta de diminuição da idade penal no Brasil revela-se como um dos mais controversos temas discutidos, quer seja no âmbito político, jurídico ou social. Sua complexidade é evidente na medida e forma em que as discussões são conduzidas e aprofundadas, visto que os diversos grupos com diferentes posicionamentos acerca desse assunto estão longe de alcançarem um consenso.

A criminalidade é uma ocorrência comum a todos os países do mundo, embora a incidência varie entre eles. No entanto, é importante ressaltar que em todas as nações ocorrem crimes graves, muitas vezes repugnantes, cometidos por indivíduos menores de 18 anos e, no Brasil, a realidade não é diferente. Nesse sentido, há estudiosos que afirmam que a diminuição da maioridade penal poderia ser uma solução para reduzir a criminalidade entre jovens que, cada vez mais cedo, envolvem-se em práticas ilegais, pois acreditam que pouco ou nada lhes acontecerá enquanto são menores. Essa sensação de impunidade disseminou-se pela sociedade e muitos cidadãos defendem essa diminuição como uma alternativa viável e positiva para o país.

No entanto, existem posicionamentos contrários, que enfatizam que esses indivíduos não necessitam de encarceramento, mas sim de uma avaliação de sua realidade, do contexto em que estão inseridos, da falta de estrutura familiar, do acesso limitado à educação, da escassez de programas que envolvam esses indivíduos e os mantenham ocupados com atividades que possam, de fato, contribuir para seu desenvolvimento como seres humanos, acadêmicos, profissionais e cidadãos. Além disso, caso optem por praticar ações criminosas violentas, não deveriam ser colocados em uma cela juntamente com criminosos habituais maiores de idade.

Diante das implicações jurídicas, sociais e políticas apresentadas, conclui-se que a diminuição da maioridade penal não é uma solução eficaz para a criminalidade juvenil no Brasil. Em vez disso, é necessário investir em políticas públicas que aprimorem a educação, a saúde e a qualidade de vida dos adolescentes, assim como fortalecer o sistema socioeducativo, para que eles tenham uma oportunidade real de reintegração à sociedade e evitem a reincidência criminal.

REFERÊNCIAS

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SENADO FEDERAL. Cláusula Pétrea. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/glossario-legislativo/clausula-petrea. Acesso em: 15 de fevereiro de 2023.


1Graduanda em Direito pela Faculdade Serra do Carmo – FASEC. Email: anagabrielama025@hotmail.com

2Mestrando em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins e Escola Superior da Magistratura Tocantinense. Pós-graduado em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor de Direito Penal, Processo Penal e Prática Criminal no curso de Direito na Faculdade Serra do Carmo – FASEC. Delegado de Polícia Civil do Estado do Tocantins. Email: prof.israelalves@fasec.edu.br