PORNOGRAFIA DE VINGANÇA E EXPLORAÇÃO SEXUAL À LUZ DO DIREITO PENAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8008282


Ellen Geovana Castro Uchôa;
Valéria de Lima Oliveira;
Patrícia Pereira do Nascimento;
Cleisson Nogueira Costa.


RESUMO

O presenteartigo intitulado “Pornografia de vingança e exploração sexual à luz do direito penal” aborda acerca da prática da Pornografia de Vingança e exploração sexual, no âmbito penal, visando a eficiência e a forma de atuação do Direito Penal em situações corriqueiras de combate à pornografia de vingança e exploração sexual. Para o alcance do intento, todo o trabalho se deu por meio de uma pesquisa bibliográfica. A relevância do referido artigo se dá no sentido de que este poderá servir de modelo para outros acadêmicos. Este estudo está direcionado à área do Direito Penal, a qual debruça perspectivas acerca da compreensão da aplicação do Direito Penal em caso de pornografia de vingança e exploração sexual. Para tal análise serão utilizados como arcabouço teórico Bauman (2004); Beauvoir (1967); Bourdieu (2006); Gil (2010); entre outros, bem como a legislação pertinente.

Palavras-Chave: Pornografia de Vingança; Exploração Sexual; Direito Penal.

ABSTRACT

This article entitled “Revenge pornography and sexual exploitation in the light of criminal law” deals with the practice of revenge pornography and sexual exploitation, in the criminal sphere, aiming at the efficiency and the way in which Criminal Law acts in common situations of combating revenge pornography and sexual exploitation. To reach the intent, all the work was done through a bibliographical research. The relevance of that article is given in the sense that it can serve as a model for other academics. This study is directed to the area of ​​Criminal Law, which focuses on perspectives on understanding the application of Criminal Law in cases of revenge pornography and sexual exploitation. For this analysis, Bauman (2004); Beauvoir (1967); Bourdieu (2006); Gil (2010); among others, as well as the relevant legislation.

Keywords: Revenge Porn; Sexual Exploitation; Criminal Law.

1 INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como tema a “Pornografia de Vingança e exploração sexual à luz do Direito Penal”. Logo, faz-se necessário conceituar pornografia de vingança, na qual consiste, conforme BUZZI (2015), na divulgação em redes sociais e sites, de fotos ou vídeos íntimos e/ou nudez da vítima sem o consentimento da mesma; e com isso, o infrator tem como objetivo se vingar da vítima e ferir sua imagem perante a sociedade.

É notório que existe um aumento considerável de casos das vítimas de pornografia de vingança no Brasil, tratando-se de um crime relativamente atual e pouco discutido, que com o avanço tecnológico, a globalização e o uso indiscriminado e expansivo da internet, que vem a ser considerada até mesmo uma “terra sem lei”, pois diversas pessoas acham-se no direito de praticar tal ato.

É inegável os inúmeros benefícios que a internet trouxe em todos os aspectos na vida da sociedade em comum, no entanto, as pessoas utilizam-se para causar malefícios, havendo inclusive uma pesquisa realizada pelo Projeto Vazou¹ (CRIMLAB, 2018), o qual finalizou em dezembro de 2018 e obteve 141 depoimentos que em sua maioria, as respondentes identificaram-se como jovens do gênero feminino, ou seja, 84% de relatos eram dessas vítimas.

Dessa forma, faz-se mister salientar sobre a aplicação do Direito Penal no que diz respeito aos casos de pornografia de vingança e exploração sexual, além de buscar compreender a extrema importância do mesmo no combate a esses dilemas, demonstrando que causam consequências não tão somente jurídicas, mas também sociais.

O ordenamento brasileiro não tinha um enquadramento legal específico para a pornografia de vingança, por isso se recorriam a outros tipos penais, como por exemplo: o crime de Invasão de dispositivo informático, previsto no art. 154-A e o crime de Extorsão, no art. 158 do Código Penal. Porém, com o advento da Lei nº 13.718, que entrou em vigor no dia 24 de setembro de 2018, inseriu novos crimes no texto do Código Penal, como a “Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia”, com fulcro no art. 218-C da Lei Penal vigente, em que a pornografia de vingança pode ser enquadrada no §1º

¹ Trata-se de uma pesquisa desenvolvida pelo o Grupo de Estudos em Criminologias Contemporâneas (GECC), sediado em Porto Alegre, a qual buscou colher informações a partir das experiências das vítimas dos vazamentos não consentidos, com o objetivo de concentrar informações que podem constituir uma referência para o tema.

Destarte, esse assunto merece ser estudado e analisado, refletindo sobre as principais consequências sofridas por vítimas de pornografia de vingança e exploração sexual.

Logo, é de grande valia para combater a pornografia de vingança e a exploração sexual, visto que mesmo tendo uma legislação vasta que trata sobre a temática, ainda é de pouco conhecimento, principalmente das mulheres que são vítimas desse crime, o que dificulta a procura pela solução do problema nas delegacias especializadas, e consequentemente, não há aplicação da Lei Penal e da Lei Processual Penal.

Nesse sentido, faz-se necessário atrair uma maior atenção na aplicação da Lei Penal diante desse problema, tendo em vista que em decorrência dessa barreira que é o conhecimento dos direitos que as vítimas deste crime têm, pode acarretar diversos outros dilemas, afetando as vítimas não só fisicamente, como também psicologicamente, além de causar a desestrutura familiar. Logo, o trabalho então decorrerá sobre esse obstáculo, em que se tece de forma breve alguns dos dispositivos nos capítulos abaixo.

Por fim, tais buscas por informações servem para que não tenham a sensação de que o abusador ficará impune e a vítima, culpada, podendo assim se manifestarem a respeito de tamanha atrocidade e gerar mais visibilidade a todas as outras que permanecem caladas.

  1. REFERENCIAL TEÓRICO

Prefacialmente faz-se necessário analisar toda a conjuntura social com o propósito de esclarecer e informar a respeito do fenômeno da pornografia de vingança, tratando-o como uma forma de exploração sexual, além de abordar acerca da importância da aplicação do Direito Penal dentro dessa adversidade que existe intrinsecamente no nosso meio social.

Mediante outra perspectiva, traz-se também o conceito de exploração, palavra advinda do latim “exploratio” que conforme dispõe no dicionário online de português (2009-2022) retrata “Ato de abusar, de usar ou se aproveitar de algo, alguém.”. Nesse contexto, a exploração sexual pode ser entendida como a prática ilegal da conjunção carnal por meio de violência e coação.

2.1 A criminalização da pornografia de vingança

Conforme a sociedade foi evoluindo, foram surgindo novas tecnologias que trouxeram inúmeros benefícios para o corpo social, ao passo que acarretaram diversas contrariedades. Isto posto, a criminalidade se alterou drasticamente, expressando-se não apenas por questões “mais palpáveis”, mas também por meio de novos dispositivos, utilizando-se principalmente da tecnologia e da internet.

Portanto, a nova era digital trouxe obstáculos cada vez maiores no que diz respeito ao combate dos crimes cibernéticos, tendo em vista que o criminoso agora pode se esconder e agir atrás da tela de um computador e/ou celular, o que demanda um trabalho de extrema complexidade para que este seja descoberto.

Em uma entrevista concedida ao Jornal “El País”, no mês de Janeiro de 2016, Zygmunt Bauman expôs que as redes sociais são muito úteis, oferecem serviços muito prazerosos, mas são uma armadilha, o que se torna extremamente atual, pelo fato de que com o avanço da tecnologia e das mídias sociais, está acontecendo exatamente o que foi explanado por ele.

Levando esses fatores em consideração, pode-se chegar aos casos de Pornografia de Vingança, a qual é uma conduta muito recorrente atualmente e que veio a ser considerado crime recentemente com o advento da Lei nº 13.718, que entrou em vigor no dia 24 de setembro de 2018, inserindo novos crimes no texto do Código Penal, conforme se cita a seguir:

Sobre a divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia, o art. 218-C do Código Penal aduz que:

Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.

Aumento de pena

§ 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação.

Exclusão de ilicitude

§ 2º Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos.”

Logo, a pornografia de vingança enquadra-se no texto da causa de aumento da pena previsto no artigo supracitado, tendo em vista a sua conceituação. Todavia, mesmo sendo necessária, a criminalização da pornografia de vingança, por si só, não é suficiente para enfrentar as mazelas proporcionadas pela violência de gênero.

Sendo certo, portanto, que a incessante e progressiva busca pela resposta penal não pode ofuscar a discussão acerca das causas que levam o responsável a utilizar-se da sexualidade feminina para humilhar a vítima. Simone de Beauvoir (1967, p. 9) aponta que “ninguém nasce mulher, torna-se mulher”, trazendo toda essa discussão à tona, visto que objetiva demonstrar que a identidade feminina não é algo inerente à mulher, mas algo que foi e é estereotipado historicamente.

Deste modo, criaram-se rótulos a respeito do que seria ou não permitido a cada um dos gêneros no âmbito social, e, como resultado, essas diferenças foram base para acarretar a violência de gênero ao longo das gerações.

2.2 As principais consequências sofridas pelas vítimas de pornografia de vingança

É sabido, que a pornografia de vingança traz inúmeras consequências às vítimas, que mesmo após terem passado por todos os transtornos psicológicos e morais causados pós-violência, continuam sofrendo ainda mais com os pré-julgamentos de pessoas que deviam ajuda-las de alguma forma, seja apoiando-as ou as protegendo. Os abalos, principalmente psicológicos, sofridos pelas vítimas são diversos, tendo em vista que na maioria das vezes, a divulgação de conteúdos íntimos é feita por ex-namorados ou ex-companheiros, pessoas que a vítima já teve algum sentimento, principalmente a confiança.

Parafraseando Zygmunt Bauman, no trecho do seu livro “‘AMOR LÍQUIDO – Sobre a fragilidade dos laços humanos”. No líquido cenário da vida moderna, os relacionamentos talvez sejam os representantes mais comuns, agudos, perturbadores e profundamente sentidos da ambivalência (BAUMAN, 2004, p. 6).

Diante o aspecto filosófico, narrado pelo escritor francês Guy Debord em sua obra “A sociedade do espetáculo” (1967), suscita o poder da influência midiática (notadamente a audiovisual) em nossa sociedade atual ao criticar o impacto da interferência das “imagens” nas relações interpessoais. Assim escreve:

O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediada por imagens. O espetáculo não pode ser compreendido como o abuso de um mundo da visão, o produto das técnicas de difusão maciça das imagens. Ele é uma Weltanschauung que se tornou efetiva, materialmente traduzida. É uma visão cristalizada do mundo (DEBORD, 2003, p. 14, grifo dele).

Ante o exposto, estas serão observadas quando da análise de recentes casos envolvendo jovens vítimas da pornografia de vingança, os quais tiveram uma maior repercussão na mídia, exemplificando como ocorre um típico episódio de pornografia de vingança, as suas causas e as consequências.

De acordo com o Projeto Vazou (CRIMLAB, 2018), após uma pesquisa finalizada no ano de 2018 e segundo as respostas obtidas, concluiu-se que o vazamento não consentido de imagens íntimas no Brasil resultou em 63% dos casos de ansiedade, em 58% isolamento do contato social, 56% a depressão, dentre outros. E aproximadamente 58% das pessoas que responderam a esta pesquisa, afirmaram que suas famílias souberam dos vazamentos das imagens, e das famílias que souberam 43% delas reagiram negativamente.

A partir dessa exposição, a vítima passa a sofrer diversas consequências, como os julgamentos de desconhecidos que têm acesso ao conteúdo, pessoas que não conhecem a sua índole e tiram conclusões erradas acerca da vítima, julgamentos por parte dos seus familiares, que acaba por afastar a vítima de sua família, além do mais, pode acarretar doenças graves na vítima, como depressão, ansiedade, crise de pânico, etc.

São diversas e severas as consequências sofridas por vítimas dessas exposições não autorizadas, em casos extremos, pode acontecer até de a vítima tirar a sua própria vida, por não aguentar, principalmente, os julgamentos do meio social em que vive.

2.3 A importância da atuação do direito penal no combate a pornografia de vingança e a exploração sexual

   É evidente que o Direito Penal tem uma grande importância para o combate da pornografia de vingança e exploração sexual, tendo em consideração que este é regido de leis e normas que se aplicadas de maneira sólida, não deixarão crimes como estes impunes e nem vítimas desprotegidas. Este traz grandes benefícios, no entanto, é de se observar que há brechas nas leis existentes, o que traz consigo pontos negativos no que concerne a eficácia desse Direito Penal dentro desse embate.

Por conseguinte, há tempos vem gerando inúmeros debates jurídicos acerca do tema, onde existia no Brasil uma revisão dos dispositivos legais de cunho penal para que incluíssem expressamente a tipificação desta conduta, conforme já citado, na Lei nº 13.718/2018. Não obstante, faz-se necessário observar que existem autores que discordam dessa linha de raciocínio, possuindo opiniões divergentes, acerca desta, em seu artigo, a autora Silva (2015, cap. 2), possui um ponto de vista seriamente salutar:

[…] sua punição não corresponde com os danos irreparáveis causados à vítima. No Brasil, encontramos uma forte tendência pela normatização punitiva, o que, no entanto, não vislumbra melhorias na tutela dos direitos da personalidade. A penalização não cumprirá sua função social de reconstrução de valores morais nos infratores, muito menos reconstituirá o status quo ante do direito lesionado à vítima. Defendo, porém, que a lei seja dotada de uma pena maior, a título de multa, com o intuito de assim prevenir que o ato ilícito seja cometido. Sustento que uma pena de multa maior conteria as ocorrências do delito, com efeito impeditivo e preventivo, além de chamar a atenção para a gravidade da conduta.

Para ela, é um mero reflexo da cultura punitivista que caracteriza o país, e que ignora o aspecto socioeducativo que deveria apresentar, com finalidade de não tão somente punir o responsável pelo ato da violação da intimidade/privacidade de terceiros, mas também reeducá-lo em uma nova maneira de respeito à dignidade da pessoa humana da mulher, bem como da prevenção para coibir o surgimento de novos casos.

Todavia, é perceptível que esse dilema se torna a cada dia que passa mais grave. São incontáveis os casos que acontecem por dia e que apenas crescem com o decorrer do tempo, o que se faz necessário uma resposta do Poder Público em relação à essa situação. Pitta e Nishimori (2014, p. 6) são enfáticos ao expor a importância do bem jurídico a ser tutelado:

O bem jurídico em jogo é de extrema relevância, o que impõe a emergente atuação estatal para o combate proporcional e adequado de conduta perniciosa não apenas para as vítimas, mas toda a sociedade. A inércia estatal contribui para a consolidação de atroz violação à personalidade da vítima da pornografia de revanche.

Consequentemente, é imprescindível uma iniciativa, não somente de caráter punitivo-legalista, mas também na esfera da reeducação, da informação e da conscientização, para que assim possa reverter essa realidade impiedosa que assola nosso meio social e que é resultado do patriarcalismo ainda enraizado em nossa sociedade.

2.3.1 Lei n° 12.737/2012

A Lei Nº 12.737/2012, conhecida como Lei Carolina Dieckmann, que recebe o nome da atriz em maio do ano de 2011, um hacker (criminoso virtual) invadiu o computador pessoal da atriz, possibilitando que ele tivesse acesso a 36 fotos pessoais de cunho íntimo.

De acordo com a denúncia, o invasor exigiu R$10 mil para não publicar as fotos. Como a atriz recusou a exigência, acabou tendo suas fotos divulgadas na internet, esta Lei é uma alteração no Código Penal Brasileiro que dispõe acerca da tipificação criminal de delitos informáticos e crimes virtuais, e esse foi o primeiro texto que tipificou os crimes cibernéticos, tendo foco nas invasões a dispositivos que acontecem sem a permissão do proprietário.

Com o avanço da tecnologia e a democratização e o acesso facilitado às redes sociais, o sistema judiciário brasileiro viu a necessidade de tipificar crimes cometidos no ambiente virtual. Em virtude dessa Lei, houve um impacto no Direito Penal, pois ela acrescentou mais dois artigos no Código Penal brasileiro, o 154-A e 154-B.

A Lei dispõe em seu artigo 154-A, a penalidade aplicada a quem incorrer nesses delitos. Aplica-se pena de detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e, multa, a quem “invadir dispositivo informático alheio[…] mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita”.

No §1° do artigo supracitado dispõe que na mesma pena incorre quem “produz, oferece, distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta definida no caput”. De acordo com o §2º, a pena será aumentada de 1/6 a 1/3 caso a invasão resulte em prejuízo econômico.

O §3º, por sua vez, determina que:

§3° – se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido”

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave.

O §4º dispõe que na hipótese do §3º a pena será aumentada de 1 à 2/3 “se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidas”. Logo, vítimas que tiverem suas fotos e/ou vídeos, de cunho íntimo ou não, obtido por terceiros, em virtude de invasão a seu dispositivo informático, poderão acionar a expressa lei.

3 METODOLOGIA

A elaboração deste artigo é de grande valia para a conclusão dos objetivos realizados na pesquisa feita anteriormente, com isso, a metodologia foi o primeiro item a ser definido, pois, de acordo com Eduardo Bittar, a metodologia define o ponto de partida e explica as tomadas de decisões, procedimentos necessários para alcançar conclusões racionais e coerentes com a proposta do tema. A metodologia utilizada para a efetivação deste trabalho foi a pesquisa bibliográfica, a qual contribuiu no entendimento dos apontamentos apresentados acerca da problemática e como também no alcance dos objetivos elucidados no trabalho.

Essa pesquisa bibliográfica, proporcionou suporte teórico acerca da pornografia de vingança e da exploração sexual à luz do direito penal, nesse sentido, autores como Bauman (2004), Beauvoir (1967), Bourdieu (2006), Gil (2010) dentre outros, serviram como base no enriquecimento do trabalho evidenciado, assim como também poderá contribuir com o desenvolvimento dos futuros profissionais, pois por meio da pesquisa pode-se atingir um progresso na vida acadêmica. Dentro desse contexto, Gil (2010) preceitua:

A pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos […] A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente […]

Por consequente, a análise do material destrinchado no trabalho foi feita por meio da leitura de livros que abordam o tema em pauta, bem como trabalhos científicos publicados em sites e revistas de renome jurídico. Para isso, foi realizado um levantamento da literatura e selecionado apenas aqueles que de fato abordavam o tema e que poderiam auxiliar na conclusão dos objetivos deste trabalho.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pornografia por vingança tem sido um problema bastante recorrente no meio jurídico, configurando-se como crime de gênero, no qual as vítimas são em sua extrema maioria mulheres que sofrem com a divulgação sem consentimento de conteúdos íntimos e pornográficos, por meio da Internet.

Observa-se que o avanço tecnológico trouxe consigo pontos negativos no que concerne a falta de limites e barreiras no uso da internet. Destarte, uma vez que praticada a exposição por meio dessa cadeia global, a velocidade com que as informações propagam-se não se demonstra como um ponto positivo para que a ofensa da intimidade e privacidade da vítima seja esquecida, tendo em vista que esse comportamento tem como objetivo causar constrangimento e humilhação à vítima, o que traz um impacto negativo em suas vidas.

Dessa forma, o presente estudo objetivou inicialmente analisar o aparato legal existente para os crimes de pornografia de vingança e exploração sexual, práticas tão recorrentes nos dias atuais, esclarecendo primordialmente do que se trata esses delitos.

Ademais, com relação aos aspectos jurídicos relacionados a pornografia de vingança, entende-se que a Lei nº 13.718/2018 que modificou o Código Penal, veio para ajustar as novas tipificações de crimes de importunação sexual, destacando-se por exemplo o art. 218-C, em seu §1º que traz a causa de aumento de pena quando relacionado aos motivos elencados pela pornografia de vingança.

Porém, nem sempre o aparato legal é apenas o necessário para a vítima de tal violência, destacando-se o trecho do livro “O Corpo é o Código: Estratégias Jurídicas de Enfrentamento ao Revenge Porn no Brasil”, para Valente et al. (2016, p. 14) “além dos danos físicos e psicológicos causados pela ameaça, o do ataque sexual passa a operar como uma lembrança do privilégio masculino, com o intuito de restringir o comportamento das mulheres.”

Contudo, o desenvolvimento do estudo restou comprovado a resolução de duas hipóteses. Na primeira hipótese foi evidenciado por todos os estudos analisados que a maioria das vítimas da prática desses delitos são mulheres e estas são julgadas quando utilizam de sua liberdade sexual, pois, de acordo com BOURDIEU (2006):

‘‘a sociedade impõe que o homem deve afirmar sua virilidade, independente da circunstância. No caso das mulheres, existe a responsabilidade de honrar a virgindade e a fidelidade, pois são criadas dentro de limites, ensinando-as o que não podem fazer.’’

Consequentemente, quando ocorre a exposição de suas relações íntimas ou a divulgação de conteúdos íntimos, passam a sofrer de marginalização social, são tidas como culpadas, o que acarreta a desestrutura familiar e consequentes problemas psicológicos.

Foi possível verificar também que as maiorias das pessoas que cometem esse crime são ex-companheiros, ex-namorados, pessoas que a vítima já teve um relacionamento anterior e depositou neles a confiança, e estes, acreditando em um sentimento de propriedade sobre as ex-companheiras acabam por ameaçar as vítimas após o fim do relacionamento, buscando vingança e humilhação por meio da divulgação de cenas de nudez da sua ex-namorada/esposa/companheira.

De acordo com o Projeto Vazou (2018), 81% das vítimas conhecem quem vazou os arquivos e em 82% dos casos, a vítima tinha ou ainda mantém um relacionamento com tal pessoa. Desses casos, 39% são classificados como namoros e 31% “amizade”.

Isso desmonta o mito do criminoso estranho (hacker); e torna aplicáveis as medidas protetivas da Lei Maria da Penha. Além disso, o projeto também evidenciou que 84% das pessoas que vazaram os arquivos são homens e em muitos casos, a gravação das cenas é permitida no ato, entre os dois, mas essa permissão não se estende à sua divulgação.

Por fim, esta pesquisa mostrou-se bastante satisfatória e relevante, pois além de contribuir para a compreensão do aumento dos casos, que era uma das principais perspectivas presentes nos estudos atuais, ainda se espera que esse trabalho sirva como embasamento teórico para estudos futuros que procurem contribuir com o debate sobre esse tema. Além disso, faz-se necessário a intensificação de políticas públicas em relação à aplicação do Direito Penal nos crimes de Pornografia de Vingança, objetivando uma eficácia mais ampla e mais justa.

REFERÊNCIAS

BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido: Sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor Ltda, 2004. Edição digital: julho 2011.

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: experiência vivida. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1967. (exemplar digital).

BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Tradução de Maria Helena Kühner.

CRIMLAB, Grupo de estudos em criminologia contemporânea. Projeto Vazou – Pesquisa sobre o vazamento não consentido de imagens íntimas no brasil (2018). Coord. Leandro Ayres França. Disponível em: <https://www.crimlab.com/projetovazou/resultado.pdf.> Acesso em 18 abr. 2023.

DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Projeto Periferia, 2003. Disponível em: <http://goo.gl/sMllxa>. Acesso em março 2023.

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PITTA, Tatiana; NISHIMORI, Francine Hiromi. Revanche pornográfico: A necessária criminalização. Anais do III Simpósio Gênero e Políticas Públicas, Universidade Estadual de Londrina – PR. mai. 2014. Disponível em: <http://goo.gl/Gjsa41>. Acesso em: abr. 2023.

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VALENTE, Mariana Giorgetti; NERIS, Natália; RUIZ, Juliana Pacetta; BULGARELLI, Lucas. O Corpo é o Código: estratégias jurídicas de enfrentamento ao revenge porn no Brasil. InternetLab: São Paulo, 2016.


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