A GESTÃO DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO FRENTE À  DINÂMICA DAS REVITALIZAÇÕES URBANAS: O CASO DO  CENTRO HISTÓRICO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES/RJ.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7781508


Mariane Telles Sá Freire


Resumo: 

O centro de Campos dos Goytacazes foi o núcleo inicial e formador da cidade, dotado de um  patrimônio arquitetônico representativo que se relaciona com a história urbana local, e até  mesmo nacional, dada sua importância desde o período colonial. A estrutura material desse  espaço, tal como se apresenta hoje, é herdada de diversas transformações urbanas, políticas,  culturais e sociais transcorridas durante todos esses séculos. Interessou-nos, nesse contexto, conhecer como a questão do patrimônio é tratada em cidades não metropolitanas,  especialmente em tempos onde a demanda pela revitalização de centros urbanos se faz  crescente junto a novos anseios especulativos. Buscamos então identificar as dimensões da  cidade valorizadas como dignas de se preservar, os meios e dispositivos utilizados, atores  envolvidos, conflitos e efeitos do conjunto de ações sobre o patrimônio deste local.  

Palavras-chave: Política urbana. Centro histórico. Revitalização. Patrimônio arquitetônico. 

Este artigo é resultado de uma dissertação de mestrado que buscou articular três temáticas distintas em torno dos centros históricos: as políticas  urbanas de preservação do patrimônio arquitetônico, as demandas que têm surgido nas  últimas décadas pela revitalização dos centros das cidades e o fato de se propor a análise  de um caso fora do contexto metropolitano, já constantemente abordado pela maioria das  pesquisas da área. 

O recorte espacial se definiu pelo centro histórico da cidade de Campos dos Goytacazes, interior do estado do Rio de Janeiro, que além de reunir um conjunto urbano de grande representatividade arquitetônica e urbanística, tem sido palco,  na última década, de um movimento político em prol da transformação de valores culturais  e econômicos através de programas de revitalização.  

Foi a partir da criação do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural em 2002, o COPPAM, que se tornou possível dizer que a questão do  patrimônio no município foi institucionalizada localmente, visto que nos âmbitos federal  e estadual, nas figuras do IPHAN1e do INEPAC2, já se atuava por meio do tombamento  de alguns bens imóveis da cidade. O Plano Diretor publicado em 2008, por sua vez, redefiniu os instrumentos de proteção ao patrimônio arquitetônico urbano, com a de revitalizar o centro histórico, respaldando as reformas e intervenções iniciadas em 2012. 

Dessa forma vemos que apesar de se situar fora do contexto metropolitano, Campos dos Goytacazes incorpora na agenda pública modelos de políticas  que têm sido constantemente implementadas nas metrópoles. No entanto, as intervenções urbanas em cidades médias ainda são pouco discutidas em comparação às vastas  pesquisas já existentes sobre revitalização em centros urbanos de grandes cidades, levantando o questionamento se caberia a estes os mesmos critérios analíticos. O centro histórico em questão, mesmo com toda sua relevância, demonstra atualmente uma ambiência ameaçada na perspectiva de preservação do  patrimônio arquitetônico urbano e dos aspectos que o caracterizam como lugar de  encontro e paisagem de memória coletiva, tal como conceitua Lefebvre (1968;1974) e  Joseph (1992), respectivamente, ao compreender o lugar como espaço público e a paisagem, não apenas pelos seus aspectos físicos e materiais, mas também pela experiência e representatividade da coletividade, pelos sentimentos relatados.  O objetivo principal da pesquisa, portanto, foi compreender como ocorrem, se constroem, se justificam e se implementam as políticas de revitalização no  centro histórico da cidade de Campos dos Goytacazes, em especial entre os anos de 2008  e 2018, considerando, em particular, os modos como estas tratam e interferem no  patrimônio arquitetônico urbano da cidade, visto que a política de preservação na cidade é também relativamente recente. 

A metodologia desenvolvida para atender esse objetivo envolveu pesquisa bibliográfica e documental com vistas a contextualizar o tema, identificar  referenciais teóricos e empíricos e os regimentos legais que o permeiam. Além disso,  também se fez uso de notícias relacionadas e divulgadas nos principais veículos da mídia  local, pois para identificar os conflitos em torno dos usos do centro e da questão do  patrimônio não bastaria investigar apenas a dimensão dos planos e normas.  

A pesquisa de campo, por sua vez, se baseou na observação da atuação do COPPAM e entrevistas com os atores identificados como mais mobilizados  nas definições de conteúdo e práticas em relação ao patrimônio arquitetônico da cidade e  a revitalização do centro histórico. Envolveu participação nas reuniões, acompanhamento  do blog mantido e gerenciado pelo conselho, e análise das atas disponibilizadas. Dinâmica que permitiu conhecer os atores envolvidos, estabelecer contatos e conversas,  compreender como funciona e se estrutura o conselho, visualizar quais pautas,  deliberações e conflitos se apresentam, e identificar a posição de cada representante nos  momentos mais críticos. 

Caracterização do centro histórico de Campos dos Goytacazes 

O centro de Campos dos Goytacazes foi o núcleo inicial e formador da cidade, se configurando como um centro histórico, visto que é dotado de um  patrimônio arquitetônico representativo que se relaciona com a história urbana local, e  até mesmo estadual e nacional. A estrutura material desse espaço, tal qual como se  apresenta hoje, é herdada de diversas transformações urbanas, políticas, culturais e sociais  transcorridas desde a fundação da cidade.  

Na abordagem da história da cidade de Braudel (1949), decorrida como longa duração, essa materialidade não se resume apenas ao patrimônio edificado,  mas a tudo dessa estrutura que for substrato da memória e da cultura urbana. Nesse  sentido, pode ser tomada pelas gerações posteriores como empecilho ou não, o que  permite que seja constantemente afetada pelas novas imposições da arquitetura e do  urbanismo que surgem de tempos em tempos e vem a transformar a cidade de acordo com  as demandas de modernização. 

De acordo com Faria (2003), Campos dos Goytacazes se consolidou como cidade centro da região Norte e Noroeste Fluminense, área de  urbanização antiga, no que tange ao Brasil, datada do século XVII e importante desde os  primórdios por interligar o sul dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo à metrópole  do Rio de Janeiro, sendo ocupada inicialmente pelos índios das tribos Goitacás,  Guarulhos e Puris, e depois segundo estratégias da colonização portuguesa (LAMEGO,  1945), que de modo geral, costuma se materializar no espaço urbano com a implantação  da casa de câmara e cadeia e de uma igreja matriz em torno de uma praça central  (OLIVEIRA, 2010 apud JORGE, 2015). 

A Figura 01 abaixo é tida como a imagem mais antiga da praça da Villa de São Salvador, de acordo com o levantamento feito por Jorge (2015) no Museu  Histórico de Campos. Vendo a partir da igreja matriz, de frente para o rio Paraíba do Sul, notamos à esquerda a Igreja Mãe dos Homens junto à Santa Casa de Misericórdia, e no  lado direito a casa de Câmara e Cadeia3

Figura 01: Praça São Salvador próximo ao século XVIII 

Fonte: Museu Histórico de Campos; Jorge, 2015. 

Com o aumento da produção açucareira e a instalação do primeiro engenho a vapor, no ano de 1830, Campos vivenciou um grande fortalecimento  econômico, que estimulou o desenvolvimento comercial e o crescimento populacional,  como explica Oliveira (2012). Decorrente desse processo, em 1835, a então vila foi  elevada oficialmente à categoria de cidade. Intitulada apenas por Campos e tendo  registrado, no ano seguinte, uma população urbana de 18.423 habitantes, população rural  de 33.295, além de 30.395 escravos e 21.123 livres (FEYDIT, 1979 apud OLIVEIRA,  2012), estava no caminho de ser uma das maiores produtoras de açúcar do país. 

No entanto, Faria (2003) ressalta que as cidades do período Imperial, caminhavam no sentido de se tornarem principal objeto das novas  representações, iniciando-se pela busca de uma integração nacional que combatesse a  dispersão natural das cidades coloniais e introduzindo como prática social a noção de  planejamento do território. Sendo assim, “durante a primeira metade do século XIX, um  dos campos de reflexão sobre a cidade, e que orienta a intervenção do Estado a nível  urbano, é estimulado pela noção de circulação e progresso, concebida pelos economistas  e posta em prática pelos engenheiros” (FARIA, 2003, p.9). 

É sabido que o centro de Campos dos Goytacazes foi foco de diversos planos urbanísticos4ao longo da história, assim como também foi palco de  demolições representativas que revelaram as disputas em torno dos usos do solo urbano e do patrimônio arquitetônico, tecendo diversas transformações na paisagem urbana. Na  Figura 02 abaixo, é possível perceber as mudanças ocorridas na praça São Salvador e seu  entorno desde a década de 50 até os dias atuais, além de prédios de arquitetura e história  relevantes que foram demolidos, como do prédio do Banco do Brasil, dos Correios e  Telégrafos, da ACIC e do Teatro Trianon, configurando uma paisagem onde de um lado  da praça estão os sobrados do século XIX, e do outro, novos prédios modernos de escala  maior, panos de vidro e pilotis.

 Figura 02: Transformações na Praça São Salvador e seu entorno 

Fonte: Museu Histórico de Campos (Grifo nosso) 

Dentre as demolições mais representativas, vale citar o prédio da Santa Casa de Misericórdia junto a Igreja Mãe dos Homens, que integrava a praça desde  o início do século XVIII. No entanto, esse conjunto não resistiu às disputas de uso que  mais tarde se reiniciaram e acabou sendo demolido após ter seu tombamento revogado na  década de 60. O edifício comercial que se pretendia construir em seu lugar não se  concretizou e a paisagem da praça passou a contar com um vazio que, enquanto uma das  áreas mais valorizadas da cidade, logo foi ocupada por estacionamento de carros e,  atualmente, abriga um shopping com lojas e edifício-garagem. Transformações que  podem ser notadas na sequência de fotos a seguir (Figura 03): 

Figura 03: Transformações na área da Antiga Santa Casa de Misericórdia 

Fonte: Puglia, 2011; Jorge, 2015; Pimentel, 2018 (Grifo nosso)

As transformações urbanas ao longo do século XIX eram estreitamente relacionadas ao contexto econômico local e as demandas das elites  configuradas em cada momento. Primeiro com a aristocracia açucareira, os barões e  donos dos engenhos do açúcar que passaram a construir palacetes como o prédio do Barão  de Piratininga, Visconde de Araruama, código de posturas instituído pela Câmara para  orientar e especificar as construções. Depois com a ascensão de uma elite emergente  formada por usineiros, comerciantes e intelectuais que da mesma forma buscavam  organizar o espaço, e em tempos de pestes se pautaram em preceitos higienistas.  

Conforme afirma Pimentel (2016), a paisagem urbana de Campos da mesma forma se expandiu e se transformou no processo que a fez de vila à cidade moderna.  O centro passou a ser marcado pela presença de comércios, livrarias, bancos, hotéis, cafés,  fábricas e jornais no entorno da praça e da igreja matriz iniciais, porém renovadas, dando  nova vida política e econômica ao lugar, bem como uma nova imagem urbana, contrastando,  inicialmente, com o estilo de vida rural das redondezas onde estavam as fazendas, chácaras e  solares, e depois com os bairros periféricos carentes de ação política e consequência da  expansão urbana.  

Dessa forma vemos que ao longo da história da cidade, junto com a transformação do tecido urbano, as funções urbanas também se diversificaram. Novas  oportunidades nos setores que se desenvolveram e novas possibilidades para a vida social  foram criadas com as mudanças técnicas e as novas instalações do centro, se modificando  também os modos de vida (FARIA, 2008).  

Com a constante busca por modernização, a intensificação dos conflitos em relação aos usos e a recorrência de demolições, o centro histórico passou a  refletir um cenário de desvalorização do patrimônio arquitetônico e descaracterização da  sua ambiência (Figura 04). Tal situação permite pensar a questão da preservação do  patrimônio arquitetônico como problema público5, onde as políticas públicas urbanas, de  um modo geral, configuram-se como instância de problematização, visto que é o espaço  em que se apresentam disputas de interesse, de usos, bem como variadas formas de impor  e interpretar normativas. Para tanto, na próxima seção, buscaremos abordar a construção  da política de preservação do patrimônio arquitetônico e cultural na cidade de Campos  dos Goytacazes. 

Figura 04: Paisagem do centro histórico 

Fonte: Pesquisa de Campo, 2018

Contextualização da questão do patrimônio na política urbana municipal 

A defesa do patrimônio é uma causa ainda em construção, mas que se iniciou a partir dos anos de 1930 com a criação do Serviço do Patrimônio Histórico  e Artístico Nacional (SPHAN), atual Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico  Nacional (IPHAN). Nos primeiros anos de funcionamento do IPHAN foram efetuados  cinco tombamentos no município de Campos: o Solar dos Airizes, o Solar do Colégio, o  Solar de Santo Antônio, a Capela Nossa Senhora do Rosário do Visconde e o Solar do  Visconde, este último destruído pela ação do tempo (VIERA & TEIXEIRA, 2005).  

As escolhas eram pautadas segundo critério que reconhecia o patrimônio diante da sua contribuição à identidade nacional. Desse modo, os bens  tombados eram aqueles considerados essencialmente brasileiros: as construções de  arquitetura colonial, imóveis religiosos e grandes casarões que geralmente se situavam  em áreas rurais e afastadas do centro. Enquanto isso, no centro predominam, de acordo  com Vieira e Teixeira (2005), construções em estilo eclético e Art Déco, característicos  do século XX, substituindo os sobrados coloniais anteriores em meio a busca pela modernização da cidade. Ou seja, é possível dizer que a discussão nacional logo chega  através do IPHAN, mas em uma realidade distinta os poderes locais: 

Existia um certo “movimento” em prol dos melhoramentos e, ao que tudo indica, o início dos trabalhos do IPHAN, em fins do ano, não chamava muita  atenção e nem sequer foram mencionados, assim como qualquer outro assunto a este relacionado – como a preservação do patrimônio e sobre imóveis enquanto tal. Isto, pelo menos, neste primeiro momento e através da imprensa. Do mesmo modo, a opinião expressa nos periódicos consultados revelava o estilo colonial de arquitetura como um sinal a ser apagado. Muito distante, portanto, da consagração deste estilo como autêntica arquitetura nacional, digna de preservação. Como regra, as discussões provavelmente passavam por restrito número de atores e ficava reservada a determinados círculos (VIEIRA & TEIXEIRA, 2005, p.23). 

Vieira e Teixeira (2005) afirmam que nesse momento as questões preservacionistas estavam restritas a atores intelectualizados já ligados a essas discussões  ou capazes de dialogar com o instituto intermediando o contato com os proprietários dos  imóveis de interesse. A preservação como uma forma de intervenção, visto que se trata  de uma prática social que incorpora novos bens e valores à sociedade, não é neutra  culturalmente e frequentemente revela conflitos de interesse (VIEIRA, 2003), como  revelou o caso do tombamento e destombamento da Igreja Nossa Senhora Mãe dos  Homens e da Santa Casa de Misericórdia. 

A discussão sobre preservação do patrimônio histórico só veio a ser oficialmente introduzida na política urbana em escala municipal durante a década de  90, por meio Plano Diretor de 1991, embora não tenha sido institucionalizada a  partir disso. Em seus artigos 28º à 30º, 51º e 52º, constavam as diretrizes para preservação  do patrimônio histórico e cultural. O documento previa a necessidade de definição de  critérios de proteção, elaboração de inventário para cadastramento do patrimônio cultural  do município, edição de normas edilícias especiais e a criação de um grupo executivo  para assegurar a proteção dos bens situados nos logradouros listados e deliberar os  processos que envolvessem o patrimônio cultural do município. 

De acordo com o Plano Diretor aprovado, esse grupo executivo deveria ser nomeado pelo Poder Público Municipal naquele ano, porém, como relata  Vicente Filho (2011) em sua pesquisa, a comissão só veio a ser instituída no ano de 2003,  12 (doze) anos mais tarde, por meio de uma imposição do Ministério Público Estadual.  Um inquérito civil público nº 162/99 foi instaurado após atores locais, dentre intelectuais  das universidades e moradores da vizinhança, se mobilizarem contra a demolição de um casarão eclético do século XIX situado na rua Tenente Coronel Cardoso, nº 636 (Figura  05), que estava sob risco de ser substituído por um prédio. 

Mediante as circunstâncias de insuficiência da lei devido ao não cumprimento daquilo que ela determina, reconheceu-se a ausência de amparo legal para  impedir a demolição do casarão. O Ministério Público, após solicitar os devidos  esclarecimentos técnicos ao IPPUCAM6, resolveu arquivar a ação civil pública e, através  de um Termo de Ajustamento de Conduta determinou a obrigação do poder municipal  em cumprir a lei do Plano Diretor quanto à nomeação do Grupo Executivo para tratar dos  imóveis de interesse de preservação. Em decorrência de toda essa situação, no local do  casarão agora se encontra um prédio de uso misto, com comércio no térreo e 13 (treze)  andares de unidades residenciais (Figura 05). Por outro lado, a prescrição do TAC gerou  a Portaria nº 626/2002, pela qual finalmente se nomeou a comissão que mais tarde  configura o Conselho de Preservação do Patrimônio e Cultural do Município  (COPPAM).  

Figura 05: Casarão da Tenente Coronel Cardoso e prédio posterior 

Fonte: Puglia, 2011 (Grifo nosso); Google Maps, 2018. 

Como competências, ao COPPAM cabia exarar parecer prévio sob os atos de tombamento e destombamento e emitir pronunciamento quanto à  demolição, modificação, transformação, restauração, pintura ou remoção de bens  tombados pelo Município; bem como expedição ou renovação de licença para obra,  fixação de anúncios, cartazes ou letreiros e para instalação de atividade comercial ou  industrial nesses bens, conforme enunciado no artigo 6º da Lei nº 7.527/2003. Vicente  Filho (2011) identificou que as discussões das reuniões dessa época, que ocorriam  semanalmente, estavam pautadas em torno da delimitação de uma APAC (Área de Proteção ao Ambiente Cultural) e da necessidade de um inventário mais satisfatório dos  prédios de interesse de preservação/tombamento.  

Entre os anos de 2008 e 2009, com o fim do mandato destes conselheiros e a mudança de gestão da prefeitura municipal, o COPPAM esteve com suas  atividades paralisadas. No entanto, destaca-se a aprovação do Plano de Diretor de 2008,  elaborado pelo Instituto Brasileiro de Administração, como um marco da gestão do centro  histórico. Isso porque a lei incorporou diretrizes específicas para a proteção do patrimônio  da cidade por meio da definição da Área de Especial Interesse Cultural – AEIC, delimitando onde o conjunto edificado é de relevante interesse histórico e cultural para a  memória da cidade, da forma que consta em seu artigo 230º:  

Art. 230. Os limites para a Área de Especial Interesse Cultural – AEIC do Centro da Cidade, incluindo o traçado urbanístico e os elementos paisagísticos, os conjuntos arquitetônicos e as edificações isoladas, tombadas ou de interesse para a preservação (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2018).  

Em novembro de 2009 com a retomada da agenda, foi organizada a I Conferência de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural, celebrada em  21/11/200 para eleição dos representantes da sociedade civil. Todavia, a primeira  reunião oficial da nova gestão só veio a ocorrer em 21/06/2011, cujo cerne se deu em  torno da polêmica da demolição da Casa Terra, um dos últimos prédios remanescentes da  arquitetura civil colonial do centro da cidade, onde funcionava uma antiga loja de móveis,  situada na Praça do Rosário. 

A situação merece destaque pois mais uma vez se expõe a disputa de interesses intrínseca à prática da preservação do patrimônio arquitetônico urbano, bem  como as alternativas comumente utilizadas para se alcançar meios mais rentáveis de se  fazer uso do centro e as forças que se impõem como dominantes nesse sentido. Após dois  sinistros de incêndio, a demolição do imóvel passou a ser requerida pelos proprietários,  que alegavam não ter condições financeiras de reformá-lo.  

Após interdição pela Secretaria Municipal de Defesa Civil, a demolição da Casa Terra foi deflagrada em fevereiro de 2011, ainda que durante as duas  reuniões do COPPAM os membros da sociedade civil tenham se posicionado contra. A  maioria representante do poder público, local e estadual, em virtude da ação direta da  Defesa Civil, cedeu ao acordo que se estabelecia entre as forças políticas e econômicas e,  como não era difícil prever, no lugar agora se encontra um estacionamento (Figura 06).

Figura 06: Demolição Casa Terra e estacionamento posterior 

Fonte: Pimentel, 2018; Pesquisa de campo, 2018. 

No início de 2013, mais uma demolição na zona de proteção da AEIC se tornou marco na trama da preservação do patrimônio cultural campista. “Na  calada da noite”, como foi noticiado na época em diversos canais locais, do primeiro  sábado daquele ano, o casarão da chácara da família Pinto, também conhecido como  casarão do Chacrinha foi demolido ilegal e arbitrariamente sem autorização  administrativa ou judicial, enquanto o pedido de licença para demolição solicitado pelos  proprietários ainda estava em análise pelo Ministério Público Estadual e já havia sido  recusado pelo COPPAM meses antes. O imóvel, segundo o professor Leonardo  Vasconcelos, era uma construção colonial de alto padrão, exemplar arquitetônico que já  não existe mais no município, remanescente da aristocracia urbana do século XIX.  

Após a publicação da nova lei que reestruturou o COPPAM e suas competências, foi realizada, em dezembro de 2013, a II Conferência de Preservação do  Patrimônio Histórico e Cultural. A gestão nomeada, que perdurou até o ano de 2016,  presidida novamente pelo Orávio de Campos, foi marcada principalmente pela política  de tombamento, sendo responsável pelo registro em Diário Oficial de 373 bens imóveis  no período em que atuou.  

O presidente salienta que a nova lei deu ao conselho poder de selecionar os imóveis destinados a tombamento e que considera que nem todos os que  constam como protegidos pela delimitação da AEIC do Plano Diretor seriam de interesse  para a história da cidade, cabendo ao COPPAM o julgamento de cada caso. O critério,  para tanto, se estabeleceu com base em uma listagem que enumera cerca de 700 imóveis  relevantes para preservação, a maioria situado na área central da cidade e muitos já  descaracterizados. De acordo com a Secretaria de Obras e o próprio conselho, que nela  se apoiam para análise dos processos, a lista consta como Anexo I do Plano Diretor de  2008. Entretanto, é sabido que a referida listagem não foi aprovada pela Câmara  Municipal (VICENTE FILHO, 2011; PUGLIA, 2011), o que explica a dificuldade de acesso público a ela junto ao documento Plano Diretor, sendo disponibilizada apenas  quando solicitada in loco. 

Outra intervenção marcante da política de preservação durante essa gestão foi a reforma promovida pela prefeita Rosinha Garotinho no parque Alzira  Vargas para a construção da Cidade da Criança (Figura 07). Mesmo diante do fato da área  do entorno do Alzira Vargas constar no parágrafo único do artigo 227º do Plano Diretor  para fins de proteção do ambiente cultural, e do prédio ser tombado pelo COPPAM por  meio da Resolução 005/2013 durante a sua própria gestão, a prefeita não hesitou em  inaugurar ali um parque temático infantil, que apesar de ter contribuído para restauração  do prédio que se encontrava abandonado, envolveu a retirada de algumas árvores  centenárias e o cercamento da área com um muro de características medievais e colorido,  que além de restringir a visão, limita também o acesso que agora se faz mediante ao  pagamento de ingresso. 

Figura 07: Parque Alzira Vargas, Cidade da Criança 

Fonte: Pimentel, 2018; Pesquisa de campo, 2018. 

As obras de revitalização do centro histórico também ocorreram durante essa gestão do COPPAM, a partir de 2012, sendo incentivada e acompanhada de  perto pelo conselho através da participação no grupo de trabalho criado pelo escritório do  arquiteto Cláudio Valadares7, coordenador do projeto, para possibilitar um espaço de  apresentação e debate das propostas. Mas sobre este momento, dada a importância para a  pesquisa, dedicaremos a próxima seção.  

Com o fim do mandato da prefeita Rosinha Garotinho, se iniciou uma nova gestão explanando uma ruptura na política local de um modo geral, o que  consequentemente se reflete na continuidade da política de preservação que vinha sendo  desenvolvida através do COPPAM e dificultou as análises relativas a esse momento, visto que o conselho esteve paralisado por todo o ano de 2017 durante o início do governo do  prefeito Rafael Diniz. Essa situação fez pairar uma grande indefinição sobre o  direcionamento a ser dado a esse espaço público, que permaneceu sem nomeação dos  membros representantes do poder público municipal e atrasou, por 1 ano, a III  Conferência do Patrimônio Histórico e Cultural para a eleição dos novos membros  representantes da sociedade civil. 

Tais circunstâncias mobilizaram atores e mídia local que se posicionaram publicamente denunciando a inércia da gestão e suas consequências ao  patrimônio arquitetônico e cultural da cidade. Diante disso, o COPPAM retomou as  atividades quinzenalmente a partir da anunciação da professora Cristina Lima como  presidente em 25/06/2018. Entretanto, nesta mesma data ocorreu o desabamento do Hotel  Flávio, outro fator foi determinante para impulsionar a retomada das atividades e já na primeira reunião com a nova formação do conselho, o caso do Hotel Flávio foi a principal  pauta, compreendendo o risco da instabilidade da estrutura do prédio, que fez encher a  sala onde estiveram presentes, além dos conselheiros, diversos jornalistas e espectadores  da sociedade civil, inclusive o arquiteto representante da família proprietária do prédio. 

Buscamos até aqui descrever a atuação do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural, apresentando os atores que se colocam  em cena a partir desse espaço e das políticas por ele fomentadas, tornando possível identificar a tensão existente entre instrumentos e meios, dificultando que aquilo que  consta nas regulamentações se concretize em ações. Vimos que a configuração  institucional do conselho em prol da preservação do patrimônio local ao ocorrer sem  sistematicidade, acaba resultando em seu oposto. A falta de coesão interna e de legitimidade da preservação do patrimônio, além da descontinuidade da política  municipal, enfraquecem a política e solapam as instituições responsáveis pela fiscalização  e deliberação. Assim sendo, é possível dizer que a questão do patrimônio se torna um  impasse, pois apesar de constar na letra das normas não consegue se refletir em ações  suficientes. 

Diretrizes, conflitos e efeitos da revitalização  

O Plano Diretor de 2008, em seus artigos 82º e 84º, incluiu o patrimônio arquitetônico urbano como um dos elementos importantes da estruturação  urbana, apontando para lhe dar um uso cultural e determinando a retomada da sua função de moradia a partir da revitalização do centro histórico. Dessa forma, o Plano Diretor  vigente, ao mesmo tempo que avança ao abarcar a noção de ambiente urbano com a  consolidação da AEIC, se alinha aos princípios e tendências neoliberais do planejamento  quando incorpora, no repertório urbanístico da cidade, uma concepção de patrimônio e  de usos desse patrimônio que são implementados nos centros urbanos das principais  metrópoles brasileiras, e que se agrega também à gramática reivindicativa dos  comerciantes da cidade, de alguns atores sociais e da própria prefeitura. 

Em 2012, com a inauguração do Museu Histórico de Campos, que envolveu a restauração do Solar do Visconde de Araruama, promovida pelo governo da  prefeita Rosinha Garotinho, o COPPAM solicitou aos proprietários e comerciantes locais,  bem como às concessionárias responsáveis, a despoluição visual da Praça São Salvador  por meio da retirada e/ou adequação dos letreiros e fiações, visto que de acordo com o  Código de Posturas nenhuma propaganda deve prejudicar a representação arquitetônica e  paisagística do patrimônio cultural. De acordo com o presidente do conselho, o processo  de revitalização do centro histórico se iniciaria pela alameda esquerda da praça devido ao  alinhamento com o museu que tão logo se inaugurou, afirmando que “uma vez  organizando a paisagem arquitetônica, as placas de propaganda das lojas serão muito mais  visíveis e aí todos nós vamos ganhar, lojistas, poder público e a comunidade de um modo  geral” (COPPAM, on line). 

No dia 4 de junho de 2012, em uma reunião no auditório da ACIC, prefeita Rosinha Garotinho anunciou o início das obras de revitalização do centro  histórico. Orçada em R$ 65,4 (sessenta e cinco milhões e quatrocentos mil reais), a obra  começaria naquele mesmo ano, pela praça Prudente de Moraes (Chá-Chá-Chá), e teria  prazo para durar quatro anos. A parte urbanística seria planejada pelo escritório  Mayerhofer & Toledo, e a execução da obra pela IMBEG Engenharia, de acordo com o  Edital nº 111/09 e contrato nº 340/2009, que objetivava “apresentar diretrizes e  procedimentos técnicos que atendam a solicitação da sociedade local, associações de  bairro, de comércio e o próprio programa de governo da Prefeitura”, conforme explícito  no memorial justificativo do projeto.  

Denominada “Requalificação, Valorização e Preservação Cultural do Patrimônio Ambiental Urbano do Centro Histórico”, a proposta consiste em  mais uma política de intervenção para a área central, mas especialmente abordada nessa  seção por se tratar de um projeto inserido no recorte temporal da pesquisa. As intervenções foram promovidas e financiadas pelo governo municipal da prefeita Rosinha  Garotinho, mas a mobilização partiu em grande parte dos agentes comerciais locais. O  arquiteto Cláudio Valadares, que antes intermediava o trabalho do escritório carioca,  passou a ser responsável pelo projeto, reconhecendo a importância de existir uma relação  mais estreita com a cidade. 

De acordo com o arquiteto, as medidas adotadas tiveram como referência o projeto de revitalização do comércio do centro do Rio de Janeiro, na área do  SAARA, e as diretrizes implementadas no Corredor Cultural dessa mesma cidade.  Inicialmente, o projeto abrangeu uma parte do ZCH (Zona Centro Histórico) da Lei de  Uso e Ocupação vigente, demarcada na imagem em amarelo claro (Figura 08), sendo  acrescido, posteriormente, por meio de nova licitação, a área do Mercado Municipal e  Shopping Popular Michel Haddad, antigo “camelódromo”. 

Figura 08: Delimitação da intervenção 

Fonte: Escritório Cláudio Valadares – Pesquisa de Campo, 2018. 

A área limitada para intervenção foi dividida em 4 (quatro) etapas de execução, que ao todo incluíam: tratamento de 26 ruas com a adequação, manutenção  e pavimentação de calçadas e vias, instalação de rota acessível por piso tátil e traffic  calming nos cruzamentos, adequação de tráfego com área de embarque e desembarque,  rota de incêndio e pânico prevendo a circulação de ambulância e carro forte nas vias de  pedestre; despoluição visual com conversão de rede elétrica área em subterrânea;  manutenção da infraestrutura de drenagem pluvial, redes de esgoto e de água; 4 praças  de usos distintos e adequados à respectiva localização: reforma da Praça Prudente de  Moraes, criação da Praça Batalhão Tiradentes, criação da Praça São Salvador e criação  da Praça Campos Shopping; reforma do Mercado Municipal e criação do Shopping  Popular Michel Haddad; padronização do mobiliário urbano: bancos de assento, postes de iluminação, placas de indicação das ruas e sinalização, bicicletários, abrigos de ônibus,  bancas de jornais em formato de referência aos bondes antigos, coletores de lixo  subterrâneo; projeto de paisagismo com recomendações de espécies para arborização e  projeto de patrimônio histórico com recomendações de intervenções em fachadas.  

No entanto, o projeto foi executado em cerca de apenas 30% relativos à Etapa 01, demarcado como “Lote 01” na Figura 11 supracitada. Sendo concluída apenas a reforma da praça Prudente de Moraes (Figura 08), a infraestrutura e  tratamento das vias incluídas nesse limite (Figura 09). 

Figura 09: Antes e depois da Praça Prudente de Moraes  

Fonte: Silva & Miranda, 2013; Pesquisa de Campo, 2018.  

As obras da área onde se planejou inserir o Shopping Popular Michel Haddad chegaram a ser iniciadas, porém, permanecem paradas enquanto os  camelôs se alocam temporariamente em boxes instalados no Parque Alberto Sampaio. De acordo com o arquiteto, a paralisação se deu devido à falta de verba para continuidade da obra, agravada atualmente pela mudança de gestão da prefeitura municipal. A não conclusão das obras, entregues em 2016, além de uma imagem urbana mal acabada, gera transtornos até hoje, como a questão dos postes e fios que deveriam ter sido removidos depois da instalação da rede subterrânea. Porém os fios continuam poluindo a paisagem e os postes interrompem as rotas acessíveis  planejadas para possibilitar a circulação deficientes visuais (Figura 10).  

Figura 10: Poluição visual da fiação e poste na rota acessível 

Fonte: Pesquisa de Campo, 2018.

De acordo com o arquiteto, esse impasse se deu por conta de uma indefinição que permanece entre a concessionária de energia elétrica e a prefeitura,  situação também relatada pelos comerciantes. No caso, a ENEL, atual concessionária da  rede elétrica local, estaria cobrando pela retirada dos postes, recorrendo que o projeto foi  executado em desacordo com a estrutura necessária para a conversão. Enquanto a prefeitura  teria se recusado a pagar o valor pedido, visto que, como destaca o arquiteto Cláudio  Valadares, todo o projeto foi elaborado com a participação e colaboração da  concessionária responsável daquela época, a AMPLA. 

Notamos ainda que o projeto não contempla a moradia nas propostas de diversificação de uso do centro, fato que não foi esclarecido durante as  entrevistas, apesar do incentivo ao uso residencial para revitalização do centro histórico  ser uma diretriz explícita no Plano Diretor junto aos usos culturais. Igualmente, também  não observamos uma preocupação clara com os aspectos intangíveis do patrimônio local,  relacionados ao imaterial, ao conteúdo, ao espírito do lugar e aos tecidos sociais que com  ele se identificam ou utilizam. Ao passo que se acompanha a proposta para o Mercado  Municipal, que permeia conflitos entre a retirada dos feirantes e permissionários e a  exaltação do patrimônio edificado, demandando a busca por uma solução que dê conta de  ordenar o espaço físico e adaptá-lo a usos sociais e contemporâneos. 

Nesse sentido, vemos que “o desconhecimento da cidade real facilita a implementação de políticas carregadas de simbologia”, ao mesmo tempo que  “as obras de infraestrutura urbana alimentam a especulação fundiária” (MARICATO,  2000, p.157), fazendo com que sejam almejados os usos mais rentáveis. Portanto, torna-se importante, no atual quadro do planejamento das cidades, envidar esforços no sentido  de uma política mais integrada para os centros históricos, apontando para utilização do  patrimônio como elemento de fortalecimento das identidades locais, e não apenas como  elemento fomentador da indústria e do mercado cultural.  

Considerações Finais 

Como visto, a prática da preservação do patrimônio cultural engloba um histórico de conflitos. O início da atuação do IPHAN como instituição de  preservação do patrimônio da nação, se refletiu em Campos dos Goytacazes introduzindo  a questão como um elemento da política nacional, porém, isso se deu anterior à própria  noção de patrimônio na cidade, que desde esse período foi restrita a atores intelectualizados em um cenário de resistência das demais forças locais devido sua  incompatibilidade com a realidade urbana daquele momento, onde prevaleciam no centro  os interesses de modernização e aqueles de fator econômico.  

Ao articular as temáticas sobre o patrimônio arquitetônico existente no centro histórico de Campos dos Goytacazes atualmente, vimos que as intervenções  urbanas voltadas para a revitalização de centros históricos buscam resolver o esvaziamento  e a degradação dessas áreas centrais através da valorização do patrimônio arquitetônico,  seu fator histórico, simbólico e cultural.  

Contraditoriamente, observamos que isso se dá com a imposição de novos usos que desconsideram as práticas sociais do espaço urbano e não hesitam em  interferir nos sentidos, nos modos de vida e na memória coletiva. Esse modelo, como  sabemos, se replica de forma quase que padronizada a partir das experiências das  metrópoles. Chegando à Campos dos Goytacazes, que abriga um centro histórico  expressivo no que se refere ao patrimônio arquitetônico urbano.  

Através do desenvolvimento da pesquisa, foi possível notificar uma evidente distorção entre planos e práticas, demarcando a tensão entre instrumentos  e meios que gera um distanciamento entre o conteúdo e a função sociológica da política  urbana (LOJKINE, 1997). Dessa forma, entendemos que a coerência da política  urbana se encontra nos efeitos da relação entre os planos (leis) e as operações de  urbanismo (práticas) sobre o conjunto da organização social do espaço.  

Toma-se por certo que o COPPAM institucionalizou a questão do patrimônio no âmbito municipal, mas atua, reduzidamente, através dos tombamentos, que  ainda que necessários, não são suficientes para uma salvaguarda efetiva dos bens. Vemos  que políticas locais, mesmo regulamentadas, não se estruturam através do conselho e nem  se consolidam em ações articuladas, sendo frequentemente contornadas por outros  interesses e não assegurando a preservação do patrimônio arquitetônico e sua ambiência. 

Além disso, é possível dizer que o COPPAM demonstra uma ação política pouco  combativa em relação à preservação, além da falta de estrutura para fiscalização e da  regulamentação de outros instrumentos além do tombamento, como o IPTU.  A revitalização, cujo projeto foi abordado na pesquisa, não se concretizou por completo e, aparentemente, não deu conta de resolver as questões  impregnadas no processo complexo de conciliação entre desenvolvimento econômico  local e a valorização do patrimônio arquitetônico que se propôs. Tendo feito parte de um plano de governo que visou atender a gramática reivindicativa dos comerciantes locais  articulados, às práticas relativas ao patrimônio se voltaram muito mais a uma idealização  de como o centro deveria ser, especialmente nos aspectos relacionados à materialidade da  estrutura, se distanciando da compreensão da centralidade e do sentido, da valorização e  resgate das dimensões que dão identidade e significado a esse espaço urbano. 

Pudemos entender, portanto, ao longo das análises empíricas e teóricas desenvolvidas na pesquisa, que a integração do conteúdo social e cultural, não  apenas o aspecto físico e a materialidade das estruturas do patrimônio arquitetônico, é  fator fundamental para que a cidade como um todo reconheça esses aspectos e, assim, tanto a preservação e quanto a revitalização de fato possam se se efetivar. 


1INEPAC – Instituto Estadual do Patrimônio Cultural 
2IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional consolidação da Área de Especial Interesse Cultural (AEIC), e explicitou a necessidade
3Demolida mais tarde pois além de impedir a visão da Praça São Salvador, a função de prisão já não se  adequava mais a um espaço tão central e acessível (Faria, 2008). 
4A saber, aqueles de autoria de Bellegarde, Pralon, Saturnino de Brito e Coimbra Bueno/Alfred Agache. 
5Definido conforme Gusfield (1981), quando um aspecto demanda ser tratado como objeto de ação coletiva.
6O referido Instituto foi criado para pensar o planejamento urbano e a preservação de patrimônio de  Campos aos moldes do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), entretanto, por  motivos políticos não obteve sucesso e durou menos de um ano (PUGLIA, 2011). 
7Arquiteto de atuação reconhecida na cidade, criador e coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo  da UNIFLU – Centro Universitário Fluminense desde 2005, associado da ANFEA e proprietário do  escritório Cláudio Valadares Arquitetura e Construções.

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