COMPETÊNCIAS DOS DIRETORES ESCOLARES: UM RECORTE SOBRE A LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7774416


Mario Minoru Kitazawa1
Paulo Roberto Prado Constantino2


Resumo: Este artigo tem por objetivo revisitar a literatura sobre o perfil e as competências dos diretores escolares, à luz da matriz de competências apresentada pela Base Nacional Comum de Competências do Diretor Escolar. Primeiramente, foi desenvolvida como uma pesquisa bibliográfica, baseada em fontes abertas. Também se justifica em função da atual da BNC do Diretor, aprovada em 2021 e que aguarda homologação até a presente data. Os resultados permitiram uma aproximação e síntese da literatura existente na educação básica e propedêutica.

Palavras-chave: Direção escolar; Competências; Atribuições.

INTRODUÇÃO

Este artigo tem por objetivo revisitar a literatura sobre o perfil e as competências dos diretores escolares à luz da matriz de competências apresentada pela Base Nacional Comum de Competências do Diretor Escolar. 

Como parte de uma investigação mais abrangente, primeiramente foi desenvolvida como uma pesquisa bibliográfica, baseada em fontes abertas. Também se justifica em função da atualidade do Parecer CNE/CP nº 4/2021 aprovado em 11 de maio de 2021 (BRASIL, 2021) que aguarda homologação até a presente data. Além disso, não foram localizadas, no momento, pesquisas produzidas em relação às demandas das competências previstas no Parecer CNE/CP nº 04/2021, verificadas por meio de diferentes mecanismos de pesquisa como Google Scholar, Scielo Brasil, portal de periódicos CAPES usando diferentes palavras-chave como: ‘Parecer CNE/CP n º 4/2021’, ‘competências do diretor escolar’, ‘competências direção’, ‘competências direção educação profissional’, ‘matriz de competências do diretor’, ‘base nacional comum do diretor escolar’ ou ‘perfil do diretor”.

Desenvolvimento

Com base em nossos interesses de pesquisa, selecionamos, em primeiro, fontes que nos apresentariam a questão das competências dos diretores escolares na literatura, para subsidiar nossas aproximações posteriores à educação profissional e tecnológica, que não constarão deste recorte.

Em 2013 a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico [OECD] publicou um relatório produzido pelo CEPPE – Centre of Study for Policies and Practices in Education, denominado Learning standards, teaching standards and standards for school principals: a comparative study (CEPPE, 2013), a partir de estudos conduzidos em países como Austrália [Queensland e Victoria], Brasil, Canadá [British Columbia e Quebec], Chile, Inglaterra, Alemanha, Coréia, México, Nova Zelândia, Noruega e os Estados Unidos [Califórnia e Texas]. Duas competências foram consideradas essenciais para os diretores: as relativas ao desempenho das funções e aquelas relativas ao campo comportamental (CEPPE, 2013).

Na parte funcional, foram destacadas cinco dimensões: orientação às escolas a partir da missão institucional, criação de condições institucionais, criação de harmonia intraescolar, promoção do autodesenvolvimento e desenvolvimento da equipe e gestão pedagógica (CEPPE, 2013).

Sob o ponto de vista de padrões comportamentais, foram destacados: “gestão flexível para mudança, comunicação, valores e integração teoria-prática” (CEPPE, 2013, p. 56).

Segundo Martins (2019), em relação ao ‘perfil do diretor’, há três elementos destacados: papel do diretor, preparação acadêmica e estilo de liderança.  Quanto ao papel do diretor, refere-se ao fato de ser uma função solitária (MARTINS, 2019) e que as atividades administrativas acabam concentrando a maior parte do tempo, em detrimento da atenção às questões pedagógicas. A pesquisa revelava também a importância que é dada à preparação acadêmica, enfatizando a formação em administração escolar (MARTINS, 2019). Quanto à liderança, o autor destacava a tendência à prática de uma liderança colegiada e estar próximo das lideranças intermediárias é considerado importante (MARTINS, 2019).

O Ministério de Educação do Chile (2015, p.13), no documento Marco para La Buena Dirección y el Liderazgo Escolar, relacionava cinco dimensões da prática que considerava fundamentais para uma escola bem dirigida: construção e implementação de uma visão estratégica compartilhada, desenvolvimento das capacidades profissionais, liderança dos processos de ensino e aprendizagem, gestão da convivência e participação da comunidade escolar e desenvolvimento e gestão do estabelecimento escolar. 

Além disso considerava também como referenciais os princípios como ética, confiança, justiça social e integridade (CHILE, 2015, p.31); habilidades como visão estratégica, trabalho em equipe, comunicação efetiva e capacidade de negociação, aprendizagem permanente, flexibilidade, entre outras (CHILE, 2015, p.32-33); conhecimentos profissionais como liderança escolar, inclusão e equidade, melhoria e mudança escolar, avaliação, práticas de ensino e de aprendizagem, desenvolvimento profissional, política nacional de educação, regulamentos nacionais e regionais e gestão de projetos (CHILE, 2015, p. 34-35).  

Para Libâneo (2018) é comum o termo organização escolar ser equiparada à administração escolar caracterizando princípios e procedimentos ligados ao ato de planejar o trabalho escolar, racionalizar o uso de diferentes recursos quer sejam materiais, humanos ou financeiros (LIBÂNEO, 2018). Segundo o autor, o termo gestão se confunde com administração e a direção, como um aspecto do processo administrativo (LIBÂNEO, 2018, p.85). Para ele, “a direção é responsável pela tomada de decisão na organização, coordenando os trabalhos, em busca de eficácia e eficiência” (LIBÂNEO, 2018, p. 88).

Um dos elementos fundamentais desse processo de gestão numa unidade escolar é o diretor de escola. Apesar das diferentes nomenclaturas que recebem, o diretor é a pessoa que se responsabiliza pelas tomadas de decisões e suas consequências no âmbito daquele espaço denominado “escola”, ainda que todo os processos relacionados a planejamento, execução, alcance de resultados, avaliação e replanejamento sejam feitos com a participação de diversos atores, de forma participativa e democrática. 

A complexidade imbricada na gestão da escola exige inúmeras competências desse profissional que assume a liderança cotidiana na escola. A competência exige conhecimentos, habilidades e atitudes em relação à solução de problemas e tomadas de decisões que precisam ser realizadas. Segundo Lück (2006) a competência pode ser analisada a partir de dois pontos de vista: 

Em relação à função/profissão, competência é o conjunto sistêmico de padrões mínimos necessários para o bom desempenho das responsabilidades que caracterizam determinado tipo de atividade profissional. Em relação à pessoa, constitui na capacidade de executar uma ação específica ou dar conta de uma responsabilidade específica em um nível de execução suficiente para alcançar os efeitos pretendidos (LÜCK, 2006, p.12). 

O papel de liderança exercido pelos diretores escolares é considerado o segundo fator mais relevante para a qualidade educacional de uma instituição de ensino e causa mais impacto em contextos sociais mais desfavorecidos (CEPPE, 2013, p. 48). Impactar o desempenho dos diretores impacta o trabalho de vários docentes que, por sua vez, conseguem alcançar dezenas de alunos, de forma encadeada, de cima para baixo. A busca de melhoria na performance dos diretores proporciona maior autonomia às instituições escolares que se constituem em base do sistema educacional do país. Mais responsabilidades e desempenhos são requeridos por parte dos diretores escolares que devem buscar a melhoria da qualidade do desempenho dos alunos. A busca de melhoria na performance dos sistemas educacionais de forma global tem sido parte das agendas internacionais nos últimos tempos como proposta de buscar o desenvolvimento e equidade social em diferentes países e comunidades ao redor do planeta. 

Segundo o relatório McKinsey, diretores de instituições educacionais de alta performance dedicam 80% do seu tempo na melhoria do ensino tendo como foco a formação de seus professores, numa perspectiva de valorização das atividades pedagógicas sobre as administrativas (MCKINSEY, 2007, p. 38). Segundo o relatório, um dos diretores entrevistados trouxe a seguinte afirmação: “Ser professor é ajudar as crianças a aprender. Ser diretor é ajudar os adultos a aprender” (MCKINSEY, 2007, p. 45). A escolha adequada dos líderes escolares, o investimento em seu desenvolvimento com foco na atividade pedagógica fim foram consideradas as escolhas políticas mais relevantes nos países que têm apresentado alto desempenho dos estudantes. 

A pesquisa mostrou também que não há grande variação na forma de atuação entre diretores de diferentes níveis de ensino ao oferecer suporte e prover condições para o desenvolvimento educacional, de tal modo que, há um certo consenso de que as atividades de gestão são bastante abrangentes e vão além daquelas de sala de aula exercidas pelos docentes. 

Estudos e relatórios têm fortalecido a importância da definição de marcos, referenciais ou padrões de desempenho para os diretores de escolas considerando suas responsabilidades, atividades, atribuições, de forma a orientar o trabalho desses profissionais no alcance de seus objetivos. Muitos países consideram esses padrões de desempenho como ferramentas estratégicas para a melhoria da qualidade educacional (CEPPE, 2013, p. 49). Os padrões de desempenho definem o que os diretores devem saber e devem saber fazer. Pelo menos quatro elementos delineadores são fundamentais, segundo CEPPE (2013, p. 50): que seja especificada a função dos diretores de modo a estabelecer qual é o papel do diretor, o que compete ou não a sua função, as políticas internas da instituição em relação ao papel do diretor. Uma segunda questão importante trata-se da formação dos diretores com estratégias de curto, médio e longo prazo para o desenvolvimento desse profissional, com uso de diferentes possibilidades de formação: estudos, palestras, conferências, oficinas, cursos online. A avaliação, como elemento de feedback para reorientar as ações a partir de reflexões surgidas da prática do diretor, é o terceiro elemento fundamental. A partir dessa análise é possível identificar possibilidades de avanço na performance do diretor. O quarto elemento consiste na seleção dos diretores, na política adotada institucionalmente ou pelo sistema de ensino, que podem ir de simples entrevistas, tempo de experiência, formação, avaliações formais, bancas examinadoras etc. 

Segundo CEPPE (2013, p.54), os padrões desejados nos países que foram estudados são assemelhados e estão representados no Quadro 1:   

Quadro 1 – Padrões funcionais para diretores nos sistemas de ensino estudados

Siglas: AU (Australia), BC (British Columbia), CA (California), CH (Chile), EN (England), GE (Germany), KR (Korea), QU (Quebec), TX (Texas), USA (United States- ISLLC). 

Fonte: OECD (2013). 

Segundo o estudo comparativo feito entre os diferentes países a respeito dos padrões de desempenho funcionais, as cinco grandes dimensões nas quais eles foram categorizados representam o que as literaturas trazem como práticas eficazes de liderança (CEPPE, 2013, p.55).

As cinco dimensões ou domínios (CEPPE, 2013, p.55) nas quais são categorizados os padrões de desempenho funcionais podem ser descritas da seguinte forma conforme o Quadro 2

Quadro 2 – Dimensões para os padrões funcionais

Fonte: CEPPE (2013). 

Observa-se pelo Quadro 1 que Coreia, Quebec [Canadá] e Alemanha, países com alto índice de desenvolvimento educacional em avaliações de larga escala como o PISA [Programme for International Student Assessment] apresentam, respectivamente 3, 6 e 7 padrões funcionais. A pesquisa não esclarece porque tais países apresentam poucos padrões funcionais.

Entre os padrões funcionais mais destacados, com 90,9% [10 países] presentes entre os 11 países pesquisados conforme Quadro 1, temos:

a.       Organiza os recursos e as instituições de acordo com a missão;

b.      Estabelece relação entre a instituição de ensino e o meio ambiente;

c.       Motiva os professores intelectualmente e promove o seu desenvolvimento profissional.

Em seguida, com 72,7% [8 países] de presença entre os países pesquisados, temos:

d.      Colabora com as famílias no processo educativo e na cultura escolar;

e.       Orienta a gestão de recursos humanos de acordo com critérios de qualidade definidos;

f.        Analisa informações para tomar decisões com o objetivo de melhorar;

g.      Supervisiona o ensino;

h.      Monitora o aprendizado e o bom uso dos dados;

i.        Divulga boas práticas e tecnologias para o ensino.

Da mesma forma, os padrões comportamentais apresentados pelos diferentes sistemas educacionais são apresentados no Quadro 3 (CEPPE, 2013):

Quadro 3 – Padrões comportamentais para diretores nos sistemas de ensino estudados 

Siglas: AU (Australia), BC (British Columbia), CA (California), CH (Chile), EN (England), GE (Germany), KR (Korea), QU (Quebec), TX (Texas), USA (United States- ISLLC).

Fonte: OECD (2013). 

Novamente nota-se que Alemanha e Coréia se destacam com nenhum padrão comportamental. Em relação aos padrões funcionais se destacam os seguintes padrões:

Com 72,7% [8 países]:

•           Demonstra valores organizacionais E com 63,6%:

•           Adapta a liderança às necessidades da escola e ao entorno em mudança.

•           Promove as relações interpessoais num contexto de respeito e aceitação.

•           Incorpora contribuições da pesquisa para suas práticas de liderança

Conforme CEPPE (2013) em relação aos aspectos comportamentais, quatro dimensões são consideradas importantes para a prática eficaz de liderança nas escolas. 

A primeira dimensão refere-se à capacidade de realizar uma gestão flexível a mudanças considerando as necessidades da escola e o cenário local, adotando soluções efetivas a partir da compreensão das necessidades de mudanças para problemas complexos. 

A segunda dimensão é a capacidade de comunicar claramente seus pontos de vista e praticar a escuta ativa. 

A terceira dimensão dos aspectos comportamentais refere-se à demonstração dos valores organizacionais e promover valores como a democracia, equidade, respeito, diversidade, proteger a privacidade dos estudantes e familiares e promover o relacionamento interpessoal em um contexto de respeito e aceitação. 

E na quarta dimensão está a incorporação de estudos e pesquisas para sua prática de liderança tendo em vista garantir a efetividade das aprendizagens dos estudantes e o alcance da missão institucional (CEPPE, 2013)

A partir dessa perspectiva, utilizou-se também como referência para os estudos o material publicado pelo Ministério da Educação [Mineduc] do Chile denominado Marco para La Buena Dirección y el Liderazgo Escolar. Este faz distinção entre o que denominamos de competências e práticas (CHILE, 2015). As competências implicam o domínio de um conhecimento conceitual, habilidades procedimentais e comportamentos atitudinais. Segundo Leithwood (2012, p. 4-5), uma “competência é tipicamente definida como uma característica subjacente de um indivíduo que está causalmente relacionado a um desempenho eficaz ou superior de um trabalho”. Embora descrevam capacidades, elas não conseguem explicar os comportamentos quando se trata de interações com outras pessoas, conjunturas, situações problemas, e não fazem sentido quando se trata de aplicar a contextos específicos do trabalho cotidiano.

Corroborando essa ideia, Carroll (2008, p. 364) relaciona a diferença entre competências e prática da seguinte forma, conforme Quadro 4:

Quadro 4 – Distinção entre competência e prática 

Fonte: CARROLL, B.; LESTER, L.; RICHMOND, D. (2008). 

A competência é fragmentada, de natureza essencialmente racional, objetiva, descontextualizada dos fatos e acontecimentos concretos, não mantendo uma relação mais orgânica. 

Da mesma forma, Leithwood (2012, p.5) define “prática” como um conjunto de atividades exercidas por uma pessoa ou grupo de pessoas em função de contextos específicos em que se encontram e com expectativas de resultados compartilhados. 

O Ministério da Educação do Chile considera o documento Marco para La Buena Dirección y el Liderazgo Escolar como um referencial para que os diretores possam exercer uma liderança eficaz descritos em termos de competências, atributos pessoais e conhecimentos fundamentais. As práticas descrevem o que é necessário fazer de forma abrangente considerando diferentes contextos de cada escola. Essas práticas precisam ser complementadas por atributos pessoais que os motivam na aplicação delas, num todo integrado, coerente e interdependente, sem hierarquias (CHILE, 2015).

Conforme o Quadro 5, as dimensões da prática definidas pelo MINEDUC (CHILE, 2015, p. 20-29) são cinco:  

Quadro 5 – Dimensões da prática

Fonte: CHILE (2015). Organizado pelo autor.

Os atributos pessoais são os princípios, as habilidades e os conhecimentos profissionais (CHILE, 2015) .Entre os princípios temos a ética que orienta as ações e decisões do diretor como líder que garante o direito à educação dos cidadãos; a confiança transmitida pela promoção de relações positivas e de colaboração eficaz garantindo sua credibilidade; a justiça social na realização das ações com transparência, imparcialidade, igualdade, respeito; a integridade demonstrada pela honestidade, coragem e sabedoria para analisar criticamente as atitudes e crenças pessoais e profissionais (CHILE, 2015).

As habilidades se referem a capacidades comportamentais e técnicas que permitem implementar processos e ações para o alcance dos objetivos institucionais. Fazem parte a visão estratégica que permite análises de cenários identificando oportunidades e ameaças, em diferentes contextos políticos, culturais, sociais que impactam na atividade educacional; o trabalho em equipe para coordenar e articular diferentes atores para solução coletiva de problemas; a comunicação eficaz para transmitir informações, ideias, projetos e ser capaz de ouvir atentamente diferentes opiniões e propostas de soluções; a capacidade de negociação para obter apoio, acordos e aprovação entre pessoas, empresas, comunidade, dirimindo conflitos e buscando alternativas de solução; a aprendizagem permanente que permita a autorreflexão e a ampliação dos conhecimentos e práticas pessoais e profissionais; a flexibilidade que é a capacidade de se adaptar a diferentes contextos em busca de melhorias na qualidade educacional; a empatia, percebendo e compreendendo a experiência de vida e emoções de outras pessoas, favorecendo abertura ao outro; o sentido de auto eficácia, que é a crença em si próprio, nas suas capacidades pessoais de realização e a resiliência para mudar ou ajustar-se diante de adversidades mantendo altas expectativas sobre os resultados a serem alcançados por todos os atores educativos da escola (CHILE, 2015, p. 32-33).

Segundo Lück (2009) o estabelecimento de padrões de desempenho para atuação do diretor é essencial para que as instituições e sistemas de ensino possam selecionar os profissionais mais bem preparados para o exercício do cargo. Esses padrões serão também referenciais para a permanente formação em exercício dos profissionais, bem como para avaliá-los e orientá-los. Essas competências, descritas a partir de padrões de desempenho, permitem que o diretor tenha uma visão global do seu trabalho e do que é necessário para bem desempenhar suas atividades. 

Lück (2009) organiza a gestão escolar em duas grandes áreas: a da organização e da implementação. Fazem parte da organização as dimensões relacionadas à ordenação, provimento de recursos, sistematização do trabalho, o planejamento do trabalho, a retroalimentação, com a finalidade de manter a infraestrutura necessária para a implementação e alcance dos objetivos educacionais. São meios para o alcance das finalidades. A implementação contempla dimensões cujas finalidades são a de promover mudanças e transformações das práticas educacionais, melhorando a qualidade dos processos e resultados educacionais.

A área “organização” contempla quatro dimensões e a área “implementação” apresenta seis dimensões, para as quais foram descritas as competências que o diretor deve apresentar ou realizar.

O Quadro 6 mostra a relação de competências em função das dez dimensões da gestão escolar.

Quadro 6 – Dimensões da gestão escolar e competências do diretor escolar 

A partir do entendimento que a complexidade e a responsabilidade do trabalho dos diretores escolares vêm aumentando nos últimos anos, Pessoa (2018) estudou em sua tese a qualidade das lideranças dos diretores nas escolas de Portugal. A partir da percepção que os países europeus e a OECD têm investido em um conjunto de ações para melhor selecionar e também criar normas profissionais para os diretores escolares, foi realizada uma pesquisa com diretores e professores nas escolas de ensino básico e secundário distribuídas em diferentes regiões de Portugal, aproximando-se da metodologia aplicada no projeto Effective Leadership and Pupil Outcomes na Inglaterra. 

A partir de Quadros de referência de liderança elaborados pela OECD em países como Inglaterra, Canadá e EUA tendo como base autores como Leithwood, Hallinger, Day, Woods entre outros, Pessoa estudou seis dimensões que se desdobram em 66 competências.

As dimensões definidas no estudo foram: orientação estratégica, visão e missão; processo de ensino e aprendizagem; relações interpessoais e aprendizagem; organização e gestão de recursos; prestação de contas e responsabilização e relações com a comunidade conforme o Quadro 7. 

A pesquisa aplicada a diretores e docentes mostrou que ambos os grupos reconheceram que os referenciais advindos dos estudos feitos pela OECD (2018; 2019; 2021) configuram parâmetros para o exercício da liderança por parte dos diretores escolares (PESSOA, 2018): 

Quadro 7 – Quadro de referência de liderança no contexto de Portugal

Fonte: Pessoa (2018). Organizado pelo autor.

Em nossa área de interesse, estudos sobre quem são e como atuam os diretores nos sistemas ou redes de educação profissional têm sido limitados até o momento. Como exemplo, entre as poucas publicações encontradas, temos as teses de doutorado de Gomes (2015) e Alves (2017) e a dissertação de Vieira (2019) que se voltavam à prática gestionária de diretores na educação profissional; a dissertação de Santos (2015), que trazia questões relativas à formação do diretor das escolas estaduais de educação profissional do Estado do Ceará e os gaps dessa formação; Vieira (2014) também apresentou questões relacionadas à formação dos gestores de educação profissional do Estado do Piauí; e Gomes (2015) pesquisou o perfil de competências dos gestores das escolas estaduais de educação profissional do Ceará. 

As pesquisas sobre gestão educacional e a direção que consultamos se concentram nos sistemas públicos da educação básica – ensino fundamental e médio (p.ex.; OLIVEIRA; CARVALHO, 2018; OECD, 2020; PONT et al., 2008; WERLE, 2001) – especialmente; ou no ensino superior.  

Outro referencial em relação às competências do diretor escolar é o Parecer CNE/CP nº 04/2021 que institui a Base Nacional Comum de Competências do Diretor Escolar [BNC – Diretor Escolar], aprovado em 08 de maio de 2021. O documento define as competências gerais, as competências específicas e atribuições e foi elaborado a partir de análises em documentos oficiais brasileiros e internacionais, como relatórios da OECD e da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [UNESCO]. É direcionado ao contexto da educação básica, portanto, possui vínculos com a educação profissional técnica de nível médio e a formação inicial e continuada.

O Parecer (BRASIL, 2021) estabelece uma matriz de competências que organizam 4 dimensões de atuação e as atribuições dos diretores escolares. Por sua vez, as dimensões são desdobradas em 17 competências e estas, por sua vez, em 95 atribuições. As dimensões têm natureza interdependente e inter-relacional. Procura estabelecer referências para o trabalho dos diretores a partir de elementos pertencentes à formação inicial, os processos de escolha, o acompanhamento de rotinas e sua formação continuada. 

Segundo o parecer, a liderança do diretor é o segundo elemento interno à escola mais relevante para o alcance de uma educação com qualidade, ficando somente após a qualidade do trabalho docente (BRASIL, 2021, p.06).

Ao referir-se à noção de competências o Parecer considera o conjunto de conhecimentos e conceitos, habilidades práticas, cognitivas e socioemocionais e atitudes e procedimentos necessários à gestão de uma escola. 

Ao fundamentar a importância de estabelecer referenciais para o diretor de escola (BRASIL, 2021, p. 9), o Parecer ressalta o fato de que os novos cenários disruptivos têm exigido muito mais desse profissional, além do papel de um administrador, que precisa entender e aplicar políticas públicas, legislação e normas educacionais, a promoção de relacionamentos interpessoais saudáveis com os atores internos e demais stakeholders [como sindicatos, prefeituras, secretarias de educação, secretarias de meio ambiente, famílias dos estudantes], ser capaz de alavancar processos de avaliação institucional, exercer liderança e motivar equipes de trabalho, promover o engajamento, exercitar a criatividade na solução dos problemas, buscar estratégias e tecnologias para garantir a melhoria das aprendizagens, numa visão transformadora da sociedade por meio de uma gestão democrática, valorizando uma educação cada vez mais inclusiva, com equidade e promoção de uma cultura de paz (BRASIL, 2021). 

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) estabelece que as instituições de ensino têm a incumbência de elaborar sua proposta pedagógica, administrar pessoas, recursos materiais e financeiros, articular-se com a família e comunidade local, assegurar o cumprimento das atividades acadêmicas, zelar pelo plano de trabalho dos docentes, promover a cultura da paz, promover o combate à violência (BRASIL, 1996). Atribuídas às instituições escolares, essas incumbências repercutem no profissional responsável pela gestão da escola, em especial, o diretor escolar. 

Dessa forma, a partir de ações mais amplas a serem adotadas pela unidade escolar, a BNC (BRASIL, 2021) estabeleceu dez Competências Gerais para o diretor escolar, conforme o Quadro 10. Segundo o documento “tais Competências devem se constituir em macro diretrizes comuns para todas as escolas, redes escolares, sistemas de ensino e instituições formadoras do país, como Base Nacional Comum de Competências que todo Diretor Escolar deve desenvolver, para o seu pleno exercício profissional, como um líder eficaz e inspirador” (BRASIL, 2021, p.9-10). Coordenação geral, cultura organizacional, promoção da aprendizagem, formação continuada, gestão dos recursos, implantação e desenvolvimento da proposta pedagógica estão entre os itens prestigiados.

Quadro 8 – Competências gerais do diretor escolar

Fonte: BRASIL. Parecer CNE/CP Nº 4/2021 (BRASIL, 2021).

Em se tratando de organização do trabalho escolar, um dos focos de atenção da atividade do diretor escolar, a BNC ecoa o trabalho de Libâneo (2018), ao relacionar-se com as quatro dimensões propostas pelo autor: vida escolar, processos de ensino e aprendizagem, atividades de apoio técnico-administrativo e relação entre escola e comunidade. 

Considerações finais

As características dos diferentes papéis desempenhados pelo diretor nos convidam a refletir. A princípio, podemos entender duas grandes dimensões sob o ponto de vista de categorização quanto às finalidades: uma atividade-fim que pertence à dimensão pedagógica com intersecção na dimensão técnica, quando esta é compreendida sob aspectos das novas tecnologias e seus usos para inovação, desenvolvimento de produtos e processos que impactam a oferta dos cursos e os serviços prestados às empresas; e a atividade-meio que engloba os aspectos administrativo, político e técnico. 

Assim, conhecer como se forma inicialmente um diretor de uma escola de educação profissional, quais são as competências necessárias ao cargo e quais precisam ser desenvolvidas em serviço, além de identificar aquelas que vão se constituindo, a partir de suas práxis analisadas sob um olhar crítico, são elementos relevantes para uma discussão mais apropriada de como os profissionais podem contribuir para uma educação de qualidade, alinhado- às competências esperadas. 

A literatura pesquisada não tem mostrado aplicação de pesos nas dimensões, com a finalidade de estabelecer quais delas são mais relevantes ou não no desempenho dos diretores, de forma que não será adotado também nesse estudo. Foi considerado que para atribuição de pesos às dimensões seriam necessárias outras pesquisas que demonstrem os impactos das ações das atribuições e ou atividades na prática gestionária das escolas que possam fornecer indicadores de quais desempenhos mereceriam maior peso e que poderiam ser complementados com consulta aos diversos agentes educativos sobre a importância de umas sobre as outras.  

REFERÊNCIAS

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1Mestre em Gestão e Desenvolvimento da Educação Profissional pela Unidade de Pós-Graduação, Extensão e Pesquisa do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza – CEETEPS.
2Doutor em Educação. Professor e Pesquisador do PPG em Gestão e Desenvolvimento da Educação Profissional pela Unidade de Pós-Graduação, Extensão e Pesquisa do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza – CEETEPS.