TRATAMENTO FISIOTERAPEUTICO NO PRÉ OPERATÓRIO DE TETRALOGIA DE FALLOT EM PEDIATRIA

Melissa O. G. P. Almeida Bettencourt*
RESUMO
A Tetralogia de Fallot constitui hoje umas das cardiopatias congênitas cianóticas mais freqüentes dentro da prática pediátrica após primeiro ano de vida, sendo assim é de extrema importância que o fisioterapeuta e toda a equipe multidisciplinar que acompanham este paciente tenham conhecimentos fisiopatológicos e técnicos para melhorar a sobrevida destas crianças, principalmente quando submetidas à correção cirúrgica onde a atuação do fisioterapeuta com suas técnicas, além do vínculo afetivo com a criança e a família é essencial nas complicações pós-operatórias para um desmame mais rápido da ventilação mecânica e para que o paciente volte a sua vida social o mais rápido possível.
Palavras-chave: Fisioterapia, Tetralogia de Fallot, Pediatria.
INTRODUÇÃO
A grande maioria das doenças cardíacas na infância é devida a malformações congênitas, isto é, problemas no desenvolvimento do coração que fazem com que o mesmo não tenha forma e função normal. Cerca de oito em cada 1000 crianças nascem com algum tipo de malformação cardíaca, o que as torna a forma mais comum de malformação presente no nascimento (FROWNFELTER, 2004).
A causa da maioria dos defeitos congênitos do coração é desconhecida. Fatores pré-natais que estão associados a uma incidência maior que a normal da doença incluem rubéola maternal ou outras doenças virais durante a gestação, nutrição deficiente durante o pré-natal, alcoolismo maternal, mães acima dos 40 anos e diabetes. Há uma incidência mais alta de Tetralogia de Fallot em crianças com Síndrome de Down (MARCONDES, 1999).
A Tetralogia de Fallot é uma combinação de quatro anormalidades: uma abertura no septo interventricular; estreitamento severo da artéria pulmonar; anormalidades no ventrículo direito e na artéria aorta (FROWNFELTER, 2004).
A principal característica clínica dessa malformação cardíaca é a cianose persistente ou intermitente, exteriorizada por crises de hipóxia que cedem quando se consegue o relaxamento do infundíbulo do ventrículo direito e a melhora da saturação arterial e constitui hoje uma das cardiopatias congênitas mais freqüentes dentro da pratica pediátrica após o primeiro ano de vida, envolvendo equipe multidisciplinar durante todo o acompanhamento e tratamento dos pacientes portadores dessa patologia (STEFANINI, 2005; REZENDE, 2008).
Os sinais e sintomas dessa doença são: dificuldade para se alimentar, dificuldade para ganhar peso, crescimento lento (em crianças de 0 a 05 anos), desenvolvimento deficiente, descoloração da pele, baqueteamento dos dedos e falta de ar (MARCONDES, 1999).
Uma cirurgia para corrigir os defeitos no coração é normalmente realizada entre 3 e 5 anos, antes da criança iniciar a escola. Nas formas mais graves, a cirurgia pode ser indicada mais cedo. Algumas vezes, uma cirurgia preliminar para criar um fluxo de sangue para os pulmões é feita antes da cirurgia corretiva. A cirurgia corretiva amplia a válvula pulmonar estreitada e corrige o defeito do septo ventricular (MARCONDES, 1999).
Atualmente, a inserção do fisioterapeuta na equipe multiprofissional é amplamente solicitada tanto no período pré-operatório quanto no pós, a fim de atingir condições clínicas que permitem manuseio nas repercussões respiratórias e motoras das internações freqüentes e seqüelas das complicações (ABUD, 2007).
O objetivo do tratamento fisioterapêutico é a higiene brônquica e redução do desconforto respiratório, a fim de propiciar conforto e condições para melhora da oxigenação, que é, por sua vez, inerente à correção cirúrgica proposta (ABUD, 2007).
A fisioterapia pode fazer-se indispensável na equipe clínico-cirúrgica, avaliando e autorizando ou não a liberação do paciente para a cirurgia. Baseando-se no seu estado clínico prévio e sua condição cardiopulmonar identifica-se possíveis complicações pulmonares pós-operatórias, se este paciente for liberado prematuramente (FERNANDES et al., 2001).
No período pré-operatório, são avaliadas as repercussões respiratórias da cardiopatia congênita. Os distúrbios neuromotores são notados, mas não tratados nessa fase a fim de diminuir o gasto metabólico, evitando a descompensação da condição cardíaca (ABUD, 2007).
Sabemos, atualmente, que a preparação da criança cardíaca para a cirurgia requer uma maior atenção por parte da equipe clínico-cirúrgica, já que quanto melhor o preparo pré-operatório, mais rápido, seguro e livre de complicações será o pós-operatório (ABUD, 2007).
A fisioterapia pós-operatória, portanto, consiste em diminuir as complicações instaladas, com o uso das manobras de higiene brônquica, mudanças de decúbito, drenagem postural associada a manobras, ambú combinado com manobras de vibrocompressão e aspiração da cânula ao término das manobras (REZENDE, 2008).
É imprescindível o cuidado de manter sempre a criança portadora de cardiopatia em decúbito elevado, a fim de favorecer a mecânica respiratória e a hemodinâmica, reduzindo assim a pós-carga ventricular. Especial atenção deve ser dada ao tipo e tamanho da incisão cirúrgica, bem como aos locais de inserção de drenos, para proporcionar conforto e o mínimo possível de dor durante a terapia (ABUD, 2007).
OBJETIVO
Relatar o caso de um paciente portador da patologia cardiológica Tetralogia de Fallot que esteve internado na U.T.I. Neonatal e Pediátrica do Hospital das Clínicas Samuel Libânio de Pouso Alegre – MG nos meses de Agosto à Setembro de 2007, onde realizou seu pré-operatório e recebeu cuidados de fisioterapia respiratória e motora durante todo período de internação além dos cuidados de toda equipe multidisciplinar deste mesmo setor antes de ser transferido para um hospital de cirurgia cardíaca infantil especializada em São Paulo – SP onde realizou a cirurgia de correção desta patologia e seu pós-operatório.
JUSTIFICATIVA
Desse estudo participará um paciente do gênero masculino lactente com 01 mês de idade, internado na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal e Pediátrica do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, com diagnóstico clínico de Tetralogia de Fallot.
O estudo visa analisar os benefícios trazidos ao paciente após a implantação da fisioterapia no pré-operatório da patologia cardíaca de Tetralogia de Fallot, o antes e depois da terapia, os aspectos hemodinâmicos e o padrão respiratório, ajudando a recuperar as complicações que poderão surgir com o pós-operatório.
De acordo com Rezende (2008), a fisioterapia se torna a cada dia mais imprescindível neste campo, não só pelos seus aspectos técnicos, mas também atuando indiretamente no aspecto emocional e psicológico do paciente e da família o que é de extrema importância para um melhor prognóstico.
MÉTODOS
I Tipo de Estudo
Relato de caso baseado em análise de prontuário.
II Local do Estudo
Esse estudo foi realizado no Hospital das Clínicas Samuel Libânio de Pouso Alegre, Minas Gerais.
III Sujeito da Pesquisa
Paciente do sexo masculino, com 01 mês de idade, nascido de parto cesárea eletiva, sem intercorrências.
IV Relato de caso
Trata-se de um paciente do sexo masculino, nascido de parto cesárea eletiva com 39 semanas sem intercorrências, com peso de 3435g e estatura de 48 cm. Apresentou apgar 8/10. Teve alta hospitalar com 24h de vida após seu nascimento para casa em bom estado geral (BEG).
Com 01 mês de vida foi internado no setor de enfermaria pediátrica de um hospital universitário na cidade de Pouso Alegre, sul de Minas Gerais, com quadro de cianose. Foi realizado ecocardiograma e diagnosticado Tetralogia de Fallot associada à estenose pulmonar infundibulovalvar de grau importante.
Dia 20/08/2007, foi solicitada internação no Pronto Socorro do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, logo em seguida foi solicitado pelo médico responsável, toda rotina laboratorial, ecocardiograma, gasometria arterial, e encaminhado para Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Colocado em Hood com FiO2 a 80% (com 2 litros/min de ar comprimido mais oxigênio a 6 litros/min). Mãe relatou estar com todas as vacinas em dia, relata estar alimentando-o com leite materno e leite NAN e nega passado traumático.
Às 16:00 horas deste mesmo dia foi admitido na UTI Neonatal deste mesmo hospital, passando previamente em consulta pediátrica de rotina, o médico pediatra notou cianose generalizada e encaminhou imediatamente para a avaliação cardiológica.
Feita a avaliação cardiológica pelo médico especializado do serviço de cardiologia infantil, que diagnosticou uma cardiopatia congênita denominada Tetralogia de Fallot, seguindo de internação em UTI Neonatal para monitorização cardíaca.
Ao exame apresentou-se em bom estado geral, corado, hidratado, anictérico, com cianose de extremidades em uso de oxigênio suplementar a 5l/min., afebril, pulsos palpáveis, enchimento capilar periférico satisfatório, desconforto respiratório leve, com tiragem intercostal leve, mantendo saturação de oxigênio entre 80 – 85%. Colocado em oxigênio por cateter nasal à 3l/min.
De acordo com orientação do serviço de cardiologia infantil, prescrito propanolol dose de 01 miligrama por kilo por dia, reavaliação periódica e pedido novo ecocardiograma.
Gasometria arterial admissional:
pH: 7,43 SO2: 36%
PCO2: 31 HCO3: 20
PO2: 20 BE: -3
No resultado do ecocardiograma pediátrico do dia 20/08/2007, às 13:00 horas foi confirmado cardiopatia congênita, sendo a tetralogia de fallot, estenose pulmonar infundíbulo valvar de grau importante, atresia pulmonar com comunicação interventricular, canal arterial pérvio, forame oval pérvio.
Após quatro dias foi repetido o exame de ecocardiograma pediátrico que obteve os seguintes resultados: atresia pulmonar, comunicação interventricular, canal arterial pérvio, colaterais sistêmico-pulmonares e devido apresentar-se em mal estado geral, desidratado, taquipneico, cianótico, foi realizado intubação oro-traqueal e colocado sob ventilação pulmonar mecânica pelo ventilador modelo Inter 0 modo IMV com os seguintes parâmetros: Pinp:23, PEEP:5, Tinp: 0,45, FR: 25, FiO2:60%. Com melhora da saturação para 80%.
No dia seguinte, foi realizada avaliação inicial da fisioterapia onde o recém-nascido apresentava-se com saturação de 69%, freqüência cardíaca de 118 e a pressão arterial de 72/26, com expansão torácica simétrica, hipoativo, reativo, cianótico, tônus muscular fisiológico. Apresentava na ausculta pulmonar murmúrio vesicular presente bilateralmente com roncos difusos. Apresentava-se em ventilação mecânica invasiva pelo ventilador modelo Inter 3, com os seguintes parâmetros 27 / 5 / 30x / 0,45 / 100%. Foi realizada aspiração da cânula oro-traqueal e vias aéreas superiores, posicionamento em decúbito dorsal em ninho. A secreção encontrava-se espessa de coloração amarelada com rolha na cânula oro-traqueal em média quantidade e nas vias aéreas superiores, um fluído claro em pequena quantidade. Após o atendimento do fisioterapeuta responsável pelo setor, os parâmetros foram reduzidos para FiO2 até 21% e PIP até 20%, com saturação de 83 a 89%. O médico plantonista responsável pelo setor foi comunicado e o recém nascido manteve o quadro.
A fisioterapia se baseou em higiene brônquica através de manobras de bag squeezing modificado, aceleração do fluxo expiratório, drenagem postural, aspiração da cânula oro-traqueal e vias aéreas superiores, estímulo diafragmático, checagem de padrões radiológicos, checagem de valores gasométricos e monitorização de parâmetros de ventilação mecânica, estimulação sensório-motora além do posicionamento e mudanças de decúbito no leito.
REVISÃO DE LITERATURA
5.1 Conceito
A malformação de Falott perfaz 15% das cardiopatias congênitas em pacientes com mais de dois anos de idade, constituindo-se na cardiopatia congênita cianogênica mais freqüente naqueles que sobrevivem ao primeiro ano de vida (GESSNER; VICTORICA 1996).
Caracteriza-se anatomicamente por quatro elementos fundamentais: 1. dextroposição de aorta; 2. estenose pulmonar infundibulovalvar; 3. comunicação interventricular (CIV); 4. hipertrofia do ventrículo direito (VD). A gênese da tétrade de Falott depende de um único erro embriológico, ao da má posição de um dos coxins do septo conotroncal. O septo conotroncal durante o desenvolvimento do coração sofre duas anomalias fundamentais responsáveis pela alteração do septo infundibulovalvar no coração adulto. A primeira consiste num desvio anterior do septo infundibular, que se coloca sobre o ventrículo direito. A segunda corresponde à distorção desse mesmo septo, ao nível do ramo parietal da crista supraventricular, que sofre desvio anterior e para a esquerda. Esses fatos levam à obstrução do infundíbulo do ventrículo direito e prejudicam o alinhamento do septo conotroncal com o interventricular, o que dá origem à comunicação intreventricular. Além disso, fatores hemodinâmicos contribuem para a moldagem da anatomia da malformação, levando a graus variáveis de estenose da valva e artéria pulmonar (GESSNER; VICTORICA 1996).
A tétrade de Fallot, basicamente, é constituída de comunicação interventricular (CIV) e obstrução da via de saída do ventrículo direito (VD). Esses defeitos são responsáveis pelo quadro fisiológico da cardiopatia, que determinam baixo fluxo pulmonar e aumento do fluxo sistêmico. Os pacientes são cianóticos ou “rosados” pela insaturação periférica de oxigênio e a pressão que se constata no ventrículo direito é similar à aórtica (MACRUZ, 1988).
A Tetralogia de Fallot ocorre aproximadamente entre três a cinco por dez mil nativivos e representa cerca de 7% das cardiopatias congênitas. É a segunda causa mais comum de doença cardíaca cianótica em crianças. (DOYLE, 2000).
A Tetralogia de Fallot é classificada como um defeito cardíaco cianótico, pois o distúrbio resulta em sangue insuficientemente oxigenado bombeado para o corpo, o que leva a uma cianose e falta de ar. Há um fluxo de sangue não oxigenado na circulação geral e uma diminuição do fluxo de sangue para os pulmões, o que compõe o distúrbio cianótico. Ao nascer, a criança não mostra sinais de cianose, mas pode desenvolver, mais tarde, episódios de pele azulada ao chorar ou ao se alimentar (DOYLE, 2000).
O aspecto anatômico mais característico desta patologia é o desvio ântero-cefálico do septo infundibular, levando a estenose subpulmonar, cavalgamento da aorta sobre o septo interventricular e comunicação interventricular; estas, associadas à hipertrofia secundária do ventrículo direito compõe a tetralogia descrita por Fallot em 1888 (DOYLE, 2000; SYWIK et al, 2001).
O grupo classicamente denominado tétrade de Falott consiste na entidade que já definimos como sendo constituída de quatro elementos anatômicos fundamentais que passamos a examinar:
1. Obstrução ao fluxo pulmonar – essa é dada pela estenose infundibular, acompanhada ou não de alterações da valva e artéria pulmonar. O infundíbulo, morfologicamente, pode exibir aspectos diferentes e produzir vários graus de estenose, chegando às vezes a uma verdadeira atresia, sendo esta denominada Falott extremo. Em alguns casos há estenose do orifício proximal do infundíbulo, com conseqüente dilatação em seu corpo, formando uma terceira câmara ventricular direita. Em 25% dos casos existe estenose da valva pulmonar que é conseqüente a alterações da valva por displasia das válvulas e/ou hipoplasia do anel valvar. O tronco da artéria pulmonar exibe também hipoplasia de graus variáveis e quando extrema, transforma-se num cordão fibroso. Quanto aos ramos da artéria pulmonar podem ser normais ou hipoplásicos.
2. Dextroposição da aorta – é o deslocamento para a direita da valva aórtica, permitindo o seu relacionamento como ventrículo direito e a comunicação interventricular. Essa dextroposição da aorta ocorre em graus diversos, podendo às vezes, a aorta originar-se totalmente do ventrículo direito, simulando uma dupla via de saída.
3. Comunicação interventricular – a comunicação interventricular da malformação de Falott localiza-se abaixo da crista supraventricular. Pode apresentar dois aspectos morfológicos dependendo da sua borda póstero-inferior. Raramente a comunicação interventricular se localiza entre os feixes musculares da crista supraventricular e é denominada intracristal.
4. Hipertrofia do ventrículo direito – é um achado constante na tétrade de Falott e conseqüente à dextroposição de aorta, à estenose pulmonar e a comunicação interventricular. A tétrade de Falott caracteriza-se por um grande espectro quanto à sua anatomia, tendo gruas diversos de severidade. Quando muito grave caracteriza-se por estenose acentuada (atresia) do infundíbulo que termina em fundo cego e não se comunica com a artéria pulmonar. Esta pode ser tão hipoplásica a ponto de se transformar em um cordão fibroso e a valva pulmonar atrésica (GESSNER; VICTORICA, 1996).
O desconforto respiratório, a hipersecreção e o broncoespasmo são sinais comuns nos casos de cardiopatias que cursam com hiperfluxo pulmonar, como comunicação interatrial e tronco arterioso comum. Porém, nesses casos, é necessário lembrar que o aspecto da secreção é claro e fluido, diferente da infecção pulmonar. O desconforto piora quando há aumento da atividade motora da criança; essa piora é mais evidente nos casos de congestão pulmonar (ABUD, 2007).
5.2 Aspectos Fisiopatológicos
Na tétrade de Falott a magnitude da cianose relaciona-se diretamente ao grau de obstrução da via de saída do ventrículo direito e ao estado funcional em que se encontra o paciente. Por maior que seja a resistência imposta ao esvaziamento sanguíneo da câmara ventricular direita, a sua pressão sistólica será sempre idêntica à de ventrículo esquerdo, ou seja, limitada a níveis de pressões sistêmicas. Resulta disso que a insuficiência cardíaca, embora a cianose possa aumentar proporcionalmente quando não se desenvolve circulação colateral de suplência, seja extremamente rara nos lactentes e crianças em geral. Entretanto, pode estar presente em adultos ou quando complicado por problemas endomiocárdicos (MACRUZ, 1988).
A cianose pode acentuar-se transitoriamente, acarretando estados de hipóxia, em função de fatores que elevam a resistência pulmonar (esforço físico, choro, movimentos intestinais, taquicardia, etc.) ou que diminuem a resistência sistêmica permitindo maior fluxo de direita pra esquerda (MACRUZ, 1988).
Cianose e sopro são os principais achados da tétrade. O sopro é ejetivo, rude, sem clique, associado a uma segunda bulha única, e aparece como conseqüência de estenose infundibulovalvar e obstrução ao fluxo pulmonar. A mistura sanguínea ao nível ventrículo-arterial resulta em cianose central. Na fase neonatal, a cianose é mais discreta, assim como o sopro, em razão da hipertensão pulmonar fisiológica do recém-nascido, tornando-se mais intenso nos primeiros meses de vida. Nos períodos de exacerbação da fisiopatologia básica com crises de cianogênese ou de hipóxia ocorre o aumento do shunt da direita pra esquerda (ABUD, 2007).
A ausculta pulmonar é semelhante para infecção e congestão, devendo ser utilizada como ferramenta da avaliação continuada com o objetivo de localizar a secreção na via aérea, que vai permear a escolha do recurso fisioterapêutico a ser usado, bem como seus resultados (ABUD, 2007).
Todo mecanismo que causa aumento da resistência ao fluxo pulmonar ou diminuição da resistência sistêmica é capaz de desencadear as crises. Pode-se citar, aumento da reatividade infundibular muscular, aumento da pressão torácica ou pulmonar, anemias, infecções sistêmicas, febre, banhos quentes no neonato. Há, ainda, causas iatrogênicas, como uso de vasodilatadores e digitálicos (MACRUZ, 1988).
5.3 Quadro Clínico
O bebê com estenose significativa ou atresia é cianótico desde o nascimento. Frequentemente o bebê é pequeno para a idade gestacional e há uma alta incidência de anomalias associadas. A presença de um sopro sistólico de ejeção de alta freqüência no terceiro espaço intercostal esquerdo na extremidade no esterno implica patência do trato de saída ventricular direita. Com atresia não há sopro do trato ventricular direito, embora um sopro suave, continuo do duto arterial aberto ou dos vasos colaterais brônquicos possa ser audível. Uma ejeção aórtica sadia devida ao volume de ejeção aumentado numa grande aorta anterior é comum (GESSNER; VICTORICA, 1996).
Os dados clínicos se relacionam basicamente ao grau de insaturação de oxigênio arterial, decorrente da obstrução pulmonar e “shunt” de direita pra esquerda, resultando na presença de cianose. Essa cianose pode manifestar-se desde o nascimento ou após alguns meses ou mesmo anos de vida. O aparecimento dessa e de outros sintomas, como dispnéia ou crises hipóxicas, ou a adoção da posição genupeitoral (lactentes) e cócoras nas crianças maiores, depende da magnitude da estenose pulmonar ao nascimento e do seu desenvolvimento como tempo (MACRUZ, 1988).
Ao exame dos pacientes, observam-se, com freqüência, hipodesenvolvimento pondo-estatural, cianose e hipocratismo digital, de aparecimento mais tardio. A pressão arterial é habitualmente normal, embora possa desenvolver hipertensão sistêmica após alguns anos de cianose e policitemia mais expressivas (MACRUZ, 1988).
À vezes encontra-se sopro contínuo na região subclavicular e no primeiro espaço intercostal esquerdo, dado pela persistência do canal arterial. Outras vezes, esse tipo de sopro ocupa áreas mais extensas e, inclusive, irradia-se para o dorso, relacionando com circulação colateral brônquica muito desenvolvida (GESSNER; VICTORICA, 1996).
Durante o crescimento da criança, observa-se uma exacerbação da cianose e desaparecimento do sopro, agravados pelas crises de hipóxia, seguidas de dispnéia e palidez cutânea que ocorre entre os 6 e 12 meses, além de aparecimento de baqueteamento digital e procura pela posição de cócoras quando a estenose infundibulovalvar já é importante. Após o esforço, o baixo débito pulmonar melhora quando se aumenta a resistência sistêmica e diminui o retorno venoso. Pode ainda apresentar letargia e sonolência durante 1 a 5 minutos, podendo estender-se por até 30 minutos a 1 hora. Tais episódios têm regressão espontânea na maioria das vezes, porém o tratamento médico especializado pode fazer-se necessário (GESSNER; VICTORICA, 1996).
5.4 Diagnóstico
O diagnóstico é clínico, acompanhado de exames complementares simples como a radiografia de tórax, que se constata aumento da cavidade ventricular direita (“coração em formato de bota”) e hipofluxo pulmonar com tronco da artéria pulmonar escavado, opacidade heterogênea difusa para os quadros de congestão pulmonar e mais localizada na infecção, podendo haver broncograma aéreo; no eletrocardiograma (ECG) observa-se sobrecarga ventricular direita e eixo mantido para a direita após meses de vida. Trinta por cento dos casos têm o arco aórtico para a direita; o ecocardiograma define a anatomia e o grau de obstrução ao fluxo pulmonar, além de determinar a anatomia coronária; e um hemograma completo mostra contagem aumentada de células sanguíneas e hematócrito (ABUD, 2007; BERNARDES, 2004 )
A ferramenta de avaliação inicial é a inspeção da expansibilidade da caixa torácica seguida pela ausculta pulmonar e, assim que possível, radiografia de tórax. A gasometria arterial é solicitada imediatamente após a admissão da criança, a seguir, a necessidade de coleta fica vinculada à gravidade do caso ou mudança de conduta médica (ABUD, 2007).
Medidas preventivas, como diagnosticar e tratar anemias, infecções e, sobretudo, detectar precocemente os pacientes que têm crises de hipoxia indicam o tratamento cirúrgico de correção total ou paliativo o mais rápido possível.
5.5 Aspectos Radiológicos
O tamanho do coração é normal, mas tem um ápice levantado para cima e uma área do tronco pulmonar de saída ventricular direita côncava. Um arco aórtico direito está presente em 25% dos casos. Anomalias do esqueleto estão freqüentemente presentes. A vascularização arterial pulmonar está diminuída (GESSNER; VICTORICA, 1996).
A área cardíaca se apresenta com dimensões dentro da normalidade; mas há uma certa cardiomegalia nos casos de intensa hipoxemia em pacientes de maior idade. A forma do coração é muito característica: botão aórtico saliente, arco médio escavado ou pouco retificado e a ponta cardíaca arredondada de situação elevada – coração em “sabot” ou “tamanco holandês”. O arco aórtico, em cerca de 25% dos casos, está à direita, cujo reconhecimento pode ser feito através da traquéia e do esôfago baritado, que se deslocam para a esquerda da linha média. Ao contrário, quando o arco aórtico está à esquerda essas duas estruturas deslocam-se para a direita. Nos casos mais raros, em que predomina ou existe apenas a estenose valvar, o arco médio pode ser normalmente desenvolvido ou apresentar discreta dilatação pós-estenótica (Durante o crescimento da criança, observa-se uma exacerbação da cianose e desaparecimento do sopro, agravados pelas crises de hipóxia, seguidas de dispnéia e palidez cutânea que ocorre entre os 6 e 12 meses, além de aparecimento de baqueteamento digital e procura pela posição de cócoras quando a estenose infundibulovalvar já é importante. Após o esforço, o baixo débito pulmonar melhora quando se aumenta a resistência sistêmica e diminui o retorno venoso. Pode ainda apresentar letargia e sonolência durante 1 a 5 minutos, podendo estender-se por até 30 minutos a 1 hora. Tais episódios têm regressão espontânea na maioria das vezes, porém o tratamento médico especializado pode fazer-se necessário (MACRUZ, 1988).
A radiografia de tórax mostra área cardíaca normal com evidências de aumento do ventrículo direito, tronco da artéria pulmonar escavado e hipofluxo pulmonar (SILVA; LOPEZ; GOMES, 1999).
5.6 Aspectos Ecocardiograficos
A anomalia de posição da aorta condiocio-se ao desaparecimento da continuidade entre a parede anterior da artéria e o septo interventricular. Dessa forma, observa-se o aspecto característico da aorta “cavalgando” o septo. Paralelamente, identifica-se dilatação de aorta, hipertrofia de ventrículo direito e do septo interventricular. O reconhecimento da valva pulmonar, de magnitude e mobilidade diminuídas, oferece alguma dificuldade e a sua presença elimina a presença de troco arterioso. A continuidade entre a cúspide anterior da valva mitral com a valva aórtica, característica da tétrade, permite o diagnóstico diferencial com a dupla via de saída de ventrículo direito (MACRUZ, 1988).
5.7 Aspectos Eletrocardiograficos
O eletrocardiograma mostra desvio do eixo do ângulo QRS para a direita e sobrecarga de ventrículo direito (SILVA; LOPEZ; GOMES, 1999).
Há freqüente aumento atrial direito. O eixo QRS frontal médio está para a direita mas dentro dos limites da faixa normal. O padrão precordial, mesmo em recém-nascidos, mostra hipertrofia ventricular direita do tipo sobrecarga de pressão com ondas R puras, rR ou um modelo qR nas derivações precordiais direitas (GESSNER; VICTORICA, 1996).
5.8 Tratamento Geral
O tratamento das crises pode ser iniciado com medidas simples, como colocar a criança na posição genupeitoral, retira-la de ambientes quentes em demasia, aliviar a causa de obstipação intestinal, tratar a anemia, o foco infeccioso ou a febre (REZENDE, 2008).
5.9 Tratamento Cirúrgico
O tratamento em geral é cirúrgico, para aliviar a obstrução pulmonar e ocluir o defeito septal, já corrigindo a dextroposição aórtica. Outra e, última opção terapêutica é a anastomose sistêmico-pulmonar do tipo Blalock-Taussig modificado. Entretanto, há o tratamento paliativo, que visa principalmente avaliar a hiper-reatividade infundibular. Para isso, utiliza-se beta-bloqueadores, como o propanolol. A sedação e suporte ventilatório são usados em casos extremos, assim como adrenalina endovenosa (REZENDE, 2008).
A indicação cirúrgica se faz em torno de 01 ano de idade, porém pode ser prorrogada nas crianças menos sintomáticas. No seguimento pós-operatório, é preciso ficar atento a defeitos residuais, como certo grau de estenose pulmonar, persistência de pequeno defeito septal e principalmente insuficiência valvar pulmonar, registrada com certa freqüência em nosso meio. A profilaxia para a endocardite bacteriana sempre deve ser feita e orientada (REZENDE, 2008).
5.10 Tratamento Fisioterapêutico
O objetivo do tratamento é a higiene brônquica e redução do desconforto respiratório, a fim de propiciar conforto e condições para melhora da oxigenação, que é, por sua vez, inerente à correção cirúrgica proposta (ABUD, 2007).
Durante a ventilação mecânica, os objetivos são manter pérvia a via aérea, a fim de abreviar o tempo de ventilação mecânica e prevenir as complicações respiratórias. A vibrocompressão associada à drenagem postural tem sido utilizada em substituição à tapotagem. Também se utiliza a técnica de bag squeezing, que consiste na hiperventilação com ressuscitador manual seguida de compressão expiratória. Com o aumento do fluxo expiratório, a secreção é arrastada para a via aérea proximal e aspirada. Essa manobra deve ser realizada com monitorização, pois a variação abrupta de pressão intratorácica pode produzir diminuição do fluxo pulmonar. Já nas crianças com risco de crises de hipertensão pulmonar, o atendimento deve ser o mais breve possível, sob sedação contínua (ABUD, 2007).
A vibrocompressão associada à drenagem postural tem sido utilizada em substituição à tapotagem. Também se utiliza como manobra de higiene brônquica o bag squeezing. Essa manobra deve ser realizada com monitorização, pois a variação abrupta de pressão intratorácica pode produzir diminuição do fluxo pulmonar (ABUD, 2007).
Segundo Regenga (2000) e Fernandes et al. (2001), a umidificação contínua dos gases evita o acúmulo de secreções. Um maior resultado é observado quando associa-se manobras de higiene brônquica, drenagem postural (decúbito lateral contrário à lesão), vibração e compressão sincronizadas a ventilação e posição prona. É desnecessária a oferta de grandes quantidades de oxigênio objetivando promover melhora da saturação de O2, pois é uma cirurgia paliativa, onde a criança manterá uma saturação em torno de 85%.
DISCUSSÃO
O diagnóstico das cardiopatias tornou-se mais preciso, e as alterações hemodinâmicas melhor compreendidas, permitindo, assim, um amplo conhecimento das condições da criança a ser operada e também prever as alterações encontradas no pós-operatório. Essas crianças devem ser encaminhadas para centros especializados para um atendimento adequado pré, peri e pós-operatório (STEFANINI, 2005).
Stephenson et al. (1978) afirmam que o tratamento tradicional das crianças com tetralogia de fallot no primeiro ano de vida é, na maioria dos casos, a paliação realizada por meio da cirurgia de Blalock-Taussig, visto que apresenta baixo risco. Grande parte das crianças apresenta melhora imediata e não são observados efeitos desfavoráveis quanto da correção total.
Já para Neches et al. (1975) a operação de Blalock-Taussig tem menor morbidade e mortalidade que outras anastomoses sistêmico-pulmonares. Em estudos realizados por Tyson et al. (1978) não houve mortalidade e complicações significativas em 12 crianças com menos de 01 ano de idade submetidas a esta cirurgia. Para Guyton et al. (1983) os estudos angiográficos pós-operatórios demonstraram ainda, o crescimento de ambos os ramos da artéria pulmonar.
Anos depois, conforme descrito por Ullon et al. (1987), foi evidenciado que a técnica de Goretex em neonatos diminui a incidência de trombose da anastomose, complicação que ocorre em aproximadamente 7% dos casos no primeiro mês pós-operatório.
Moraes Neto et al. (2000) descrevem as possíveis vantagens da correção da tetralogia de Fallot nos primeiros anos de vida. Dentre elas incluem-se a normalização precoce do fluxo e das pressões nas quatro câmaras cardíacas, interrupção do processo de hipertrofia do ventrículo direito e ressecção menor do infundíbulo. Evita-se, principalmente, a distorção das artérias pulmonares e desenvolvimento de hipertensão pulmonar, decorrentes de complicações das operações de shunt, além das vantagens econômicas e psicossociais.
Deste modo, diminui o trabalho cardíaco observado na presença de estenose pulmonar que ocorre na hipertrofia ventricular direita, uma menor incidência tardia de arritmias, e evita os efeitos deletérios da hipoxemia crônica sobre os outros órgãos, normalizando a saturação arterial.
Já para Castaneda et al. (1977), conforme descrito por Moraes Neto et al. (2000) os dois únicos fatores de risco que contra-indicam a correção no primeiro ano de vida são a hipoplasia acentuada das artérias pulmonares e a origem anômala da artéria descendente anterior da coronária direita.
As vantagens e desvantagens da correção definitiva vêm sendo investigadas há vários anos, sendo concluído por Castaneda em 1989, que tal conduta atenua os efeitos secundários em órgãos vitais, produzidos pela lesão cardíaca. Reddy et al. (1995) defendem o baixo índice de mortalidade no reparo precoce da tetralogia de fallot, o que é descrito por Moraes Neto et al. (2000).
Segundo Frownfelter e Dean (2004), a aplicação da fisioterapia com crianças requer adaptações criativas porém terapêuticas e não recreativas. Em pacientes que requerem cuidados intensivos, a mobilização é possível e necessária. Como conseqüência da imobilização o paciente torna-se descondicionado, reduzindo sua capacidade de realizar exercícios aeróbicos, diminuindo sua tolerância aos esforços e pode comprometer o desmame de pacientes submetidos a períodos prolongados de ventilação mecânica.
Fernandes et al. (2001) afirmam que o fisioterapeuta é capaz de oferecer recursos indispensáveis à equipe multidisciplinar com manobras de higiene brônquica, que mobilizam secreções e aumentam a amplitude torácica. Qualquer criança imóvel e sob suporte ventilatório que não apresente uma expansibilidade torácica satisfatória deve ser submetida à mudança postural no mínimo a cada 2 horas.
Johnson apud Frownfelter e Dean (2004) relatam que a imobilização deve ser evitada e que movimentos passivos devem ser iniciados imediatamente. A deambulação é iniciada logo após a extubação e a retirada dos acessos atriais.
De acordo com Regenga (2000), após a extubação dessas crianças, vários trabalhos demonstram que um programa rigoroso de fisioterapia diminui significativamente as atelectasias pulmonares. Tokuda (2004) em seu estudo observou melhora significativa dos pacientes pediátricos com o uso da ventilação Não Invasiva (VNI).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Tetralogia de Fallot atualmente é um das cardiopat