PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DA POPULAÇÃO RIBEIRINHA DA REGIÃO TRANSAMAZÔNICA/XINGU ATENDIDA PELO PROJETO NOVO TEMPO NAS ÁGUAS.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7749195


César Henrique da Silva
Cosmo de Sousa Costa
Ana Karla da Silva
Walber da Silva Duarte
Gissele Farias Cardoso
Thierry da Silva Cardoso
Bruno Ricardo Pereira Rocha
Paulo Raphael Ferreira Pires
Fernanda Nogueira Valentim Lucianelli
Dalberto Lucianelli Júnior
Ozélia Sousa Santos


RESUMO

Introdução: São denominados ribeirinhos as populações tradicionais que habitam em comunidades pequenas às margens de rios, lagos e igarapés. Várias dessas comunidades ribeirinhas encontram-se relativamente isoladas geograficamente e excluídas da sociedade em geral, estas condições associam-se ao alto índice de analfabetismo e podem refletir negativamente sobre aspectos econômicos, sociais e de saúde dessa população. Objetivos: Apresentar o perfil epidemiológico da população ribeirinha da região Transamazônica e Xingu. Métodos: Trata-se de um estudo transversal de caráter observacional e descritivo desenvolvido nas comunidades ribeirinhas da região Transamazônica e Xingu a partir das expedições realizadas pelas ações extensionistas do projeto Novo Tempo nas Águas (NTA). A amostra foi composta por todos os indivíduos do sexo masculino e feminino maiores de 18 anos atendidos pelo Projeto durante as expedições realizadas em março e setembro de 2019, totalizando uma amostra de 218 pessoas. Os dados foram registrados no Instrumento de Atendimento do Novo Tempo nas Águas e reunidos em uma planilha no Microsoft Excel e executou-se as estatísticas descritivas com cálculos de médias, desvio padrão, mediana frequência absoluta e relativa. Resultados: O espaço amostral das populações estudadas representa um total de 218 pessoas composta majoritariamente por mulheres. Dessa população, 11% estavam abaixo do peso, 36,2% possuíam IMC>25 e 12,8% eram hipertensos. 30,7% da população afirmou não possuir alimentação saudável e apenas 24,3% dos entrevistados dizem fazer exercícios físicos. 3,7% dos participantes são fumantes e 17,4% da população analisada consomem bebida alcóolica. As principais queixas patológicas se concentraram, principalmente, em doenças crônicas, doenças osteoarticulares e gastrointestinal. 23,4% da população não tiveram acesso à educação e 27,5% não sabiam ler. Os tipos de ocupações e fontes de rendas se concentraram, majoritariamente, na agricultura e na pesca. A frequência relativa dos que não possuem sistema de esgoto e coleta de lixo regular eram, respectivamente, de 82,1% e 77,9%. As principais fontes de consumo de água provêm do rio e poço. Conclusões: Dessa forma, observa-se que se faz necessário uma melhor atenção nas condições de saúde e indicadores sociais nas comunidades ribeirinhas que se encontram em volta ao Rio Xingu.

PALAVRAS CHAVES: Saúde ribeirinho; Saúde e Saneamento; Epidemiologia.

ABSTRACT

Introduction: Traditional populations that live in small communities on the banks of rivers, lakes and streams are called riparians. Several of these riverside communities are relatively isolated geographically and excluded from society in general, these conditions are associated with a high rate of illiteracy and can reflect negatively on economic, social and health aspects of this population. Objectives: To present the epidemiological profile of the riverside population of the Trans-Amazonian and Xingu region. Methods: This is a cross-sectional observational and descriptive study build out in riverside communities in the Transamazon and Xingu region, based on expeditions carried out by extension actions of the Novo Tempo nas Águas (NTA) project. The sample consisted of all male and female individuals over 18 years old attended by the Project during the expeditions carried out in March and September 2019, totaling a sample of 218 people. The data were recorded in the New Tempo nas Águas Service Instrument and gathered in a Microsoft Excel spreadsheet and descriptive statistics were performed with calculations of means, standard deviation, absolute and relative frequency median. Results: The sample space of the populations studied represents a total of 218 people, composed mostly of women. Of this population, 11% were underweight, 36.2% had a BMI>25 and 12.8% were hypertensive. 30.7% of the population said they do not have a healthy diet and only 24.3% of respondents say they do physical exercises. 3.7% of the participants are smokers and 17.4% of the analyzed population consume alcoholic beverages. The main pathological complaints focused mainly on chronic diseases, osteoarticular and gastrointestinal diseases. 23.4% of the population did not have access to education and 27.5% could not read. The types of occupations and sources of income were mostly concentrated in agriculture and fishing. The relative frequency of those who do not have a sewage system and regular garbage collection were, respectively, 82.1% and 77.9%. The main sources of water consumption come from the river and well. Conclusions: In this way, it is observed that better attention is needed on health conditions and social indicators in riverside communities that are around the Xingu River.

Keywords: Riverside health; Health and Sanitation; Epidemiology

RESUMEN

Introducción: Las poblaciones tradicionales que viven en pequeñas comunidades a orillas de ríos, lagos y arroyos se denominan ribereños. Varias de estas comunidades ribereñas se encuentran relativamente aisladas geográficamente y excluidas de la sociedad en general, estas condiciones están asociadas a un alto índice de analfabetismo y pueden reflejarse negativamente en aspectos económicos, sociales y de salud de esta población. Objetivos: Presentar el perfil epidemiológico de la población ribereña de la región Transamazónica y Xingu. Métodos: Se trata de un estudio observacional y descriptivo transversal realizado en comunidades ribereñas de la región Transamazónica y Xingu, a partir de expediciones realizadas por acciones de extensión del proyecto Novo Tempo nas Águas (NTA). La muestra estuvo conformada por todos los individuos mayores de 18 años de sexo masculino y femenino atendidos por el Proyecto durante las expediciones realizadas en marzo y septiembre de 2019, totalizando una muestra de 218 personas. Los datos fueron registrados en el Instrumento de Servicio Novo Tempo nas Águas y recopilados en una hoja de cálculo de Microsoft Excel y se realizaron estadísticas descriptivas con cálculos de medias, desviación estándar, mediana de frecuencia absoluta y relativa. Resultados: El espacio muestral de las poblaciones estudiadas representa un total de 218 personas, compuesto en su mayoría por mujeres. De esta población, el 11% presentaba bajo peso, el 36,2% tenía un IMC>25 y el 12,8% era hipertenso. El 30,7% de la población dice no tener una alimentación saludable y solo el 24,3% de los encuestados dice hacer ejercicio físico. El 3,7% de los participantes son fumadores y el 17,4% de la población analizada consume bebidas alcohólicas. Las principales quejas patológicas se concentraron principalmente en enfermedades crónicas, enfermedades osteoarticulares y gastrointestinales. El 23,4% de la población no tenía acceso a la educación y el 27,5% no sabía leer. Los tipos de ocupaciones y fuentes de ingreso se concentraron mayoritariamente en la agricultura y la pesca. La frecuencia relativa de quienes no cuentan con alcantarillado y recolección regular de basura fueron, respectivamente, 82,1% y 77,9%. Las principales fuentes de consumo de agua provienen del río y del pozo. Conclusiones: De esta manera, se observa que se necesita una mejor atención sobre las condiciones de salud e indicadores sociales en las comunidades ribereñas que se encuentran alrededor del río Xingu.

PALABRAS CLAVE: Salud ribereña; Salud y Saneamiento; Epidemiología.

INTRODUÇÃO

São denominados ribeirinhos as populações tradicionais que habitam em comunidades pequenas às margens de rios, lagos e igarapés, geralmente, oriundas da miscigenação entre índios, colonizadores portugueses e africanos1. Essas populações encontram na agricultura de pequena escala, no extrativismo e na pesca, suas principais e por vezes, exclusivas atividades de subsistência, que são reguladas pelos ciclos de sazonalidade, períodos de cheia e seca dos rios1.

Várias dessas comunidades ribeirinhas encontram-se relativamente isoladas geograficamente e excluídas da sociedade em geral, condições estas que associadas ao alto índice de analfabetismo podem refletir negativamente sobre aspectos econômicos, sociais e de saúde dessa população2. Dessa forma, a saúde do ribeirinho da região Amazônica tem sido foco de atenção especial de muitos estudos, os quais apontam a vulnerabilidade dessas comunidades que padecem com a falta de atenção básica, primordialmente na área da saúde, com ausência quase total dos serviços de média e alta complexidade3.

Diante das adversidades observadas evidenciam-se a falta de tratamento do esgoto, a insalubridade da água e doenças decorrentes do esgoto a céu aberto, assim como a leptospirose, hepatite, dengue e febre amarela; além do assoreamento dos rios que dificulta no transporte e o trabalho com a pesca4. O isolamento geográfico vivenciado por essas comunidades inviabiliza percorrer longas distâncias em curto tempo, restringindo apenas ao uso de embarcações fluviais, sendo que a navegação pode durar dias5.

Outrossim, as comunidades ribeirinhas residentes na região Transamazônica e Xingu foram impactadas gravemente pelas transformações provenientes da implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, pois sem o cumprimento das condicionantes do impacto ambiental as quais intencionavam preparar a região para receber o impacto socioambiental da obra, resultou em uma potencialização da vulnerabilidade social já existente nessas comunidades6.

A importância de tal impacto já é relatada em estudos que revelaram alterações prejudiciais na qualidade de vida, modificação nos hábitos alimentares, sociais e culturais, além da introdução de novos fatores de risco em grupos populacionais que residem próximos aos locais de construção de usinas hidrelétricas na Amazônia7. Nota-se que a inserção de diversos riscos socioambientais poderá resultar futuramente em mudanças relevantes no perfil de morbimortalidade no que se refere, por exemplo, a doenças cardiovasculares, como o aumento da prevalência de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) 8.

Sabe-se que o Sistema Único de Saúde (SUS) tem como um de seus pilares a igualdade e universalidade de seus serviços. No entanto, o SUS depara-se com uma enorme barreira ao tentar alcançar as comunidades ribeirinhas, apresentando fragilidades ao suprir as necessidades dos mesmos, seja por falta de recursos, ausência de profissionais ou ineficiência administrativa 4,5,9.

Tal dificuldade é amplamente observada na facilidade que os moradores urbanos encontram ao procurar serviço de saúde, os quais normalmente apresentam maior proximidade, o mesmo não pode ser visto com os ribeirinhos, que necessitam se deslocar de onde residem para outra comunidade, cidade ou município para ter acesso aos serviços ofertados, evidenciando assim a precariedade da cobertura que a saúde pública deveria proporcionar para essa população9.

A saúde do ribeirinho da Amazônia desperta atenção principalmente ao observar as mudanças ocorridas nas atividades realizadas em seu cotidiano nos últimos anos, assim como as atividades físicas, onde observa-se o crescimento de uma nova geração de indivíduos que não aderem ao tradicionalismo como a caça, a pesca, as atividades de extrativismo e a agricultura de pequena escala. Ao invés das atividades anteriormente exercidas, nota-se que a nova geração está cada vez mais optando pelo trabalho assalariado e inserindo-se no mercado de trabalho10.

Nota-se que os resultados dessas alterações refletem na rotina diária a curto e longo desses indivíduos, uma vez que, o estado de saúde dessas comunidades tem sofrido alterações consideráveis decorrentes de mudanças nos hábitos alimentares e as maiores facilidades apresentadas no mundo moderno, tal como alimentos industrializados 10. Pedrosa et al 10 afirma que a soma desses fatores atua como um “gatilho” no desenvolvimento e na potencialização de agravos à saúde, assim como a maior incidência em casos de sobrepeso, acúmulo de gordura corporal e níveis séricos elevados de mercúrio, os quais estão correlacionados com o percentual de gordura corporal 10. Ademais, o aumento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) tem sido destacada nas últimas décadas, ganhando desataque a obesidade, diabetes e hipertensão arterial 2.

Outrossim, as doenças infecto parasitárias também se apresentam elevadas e carecem de maior assistência11. Regularmente associada ao baixo nível de escolaridade e ao conhecimento das condições higiênicas e sanitárias de uma população, a alta prevalência de infecção de um ou mais parasitas tem sido recorrente tanto em infantos como em adultos12. Por consequência advinda do quadro de parasitoses observa-se a presença elevada de anemias, diarreia e má absorção de nutrientes em ribeirinhos. Sabe-se que esses fatores podem afetar aspectos nutricionais e resultar em danos nos processos cognitivos dessa população 12,13. Apesar dos índices elevados as parasitoses e a anemia são consideradas enfermidades de baixa prioridade na saúde pública no Brasil, sendo por vezes chamadas de doenças negligenciadas 12.

Diante dessa perspectiva, é essencial que o cuidado adote uma visão holística da população, entendendo que o vínculo criado se torna um elo, onde a população ribeirinha abordada cria uma maior confiança e credibilidade nos profissionais de saúde envolvidos na intervenção4. As comunidades ribeirinhas do estado do Pará localizam-se nas margens dos rios de difícil acesso aos serviços de saúde, que estão comumente situados nos centros urbanos, devido à isso apresentam carências particulares às quais realça a importância e necessidade de projetos de extensão e pesquisa que visem sanar as dificuldades vivenciadas pelos ribeirinhos 12.

Portanto, este estudo possui como objetivo apresentar o perfil epidemiológico da população ribeirinha da região Transamazônica e Xingu contemplada pelas ações extensionistas do projeto Novo Tempo nas Águas.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal de caráter observacional e descritivo desenvolvido nas comunidades ribeirinhas da região Transamazônica e Xingu a partir das expedições realizadas pelo projeto Novo Tempo nas Águas (NTA).

O Projeto Novo Tempo nas Águas é um projeto de extensão universitária que realiza expedições de saúde para comunidades ribeirinhas da região Transamazônica e Xingu desenvolvendo ações de prevenção, educação e reabilitação. Duas vezes ao ano uma equipe constituída por graduandos, pós-graduandos, funcionários e docentes da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Pará – campus Altamira; em parceria com a Associação Adventista para o Desenvolvimento, Recursos e Assistência (ADRA) da Comunidade Sentir Mais e Secretaria Municipal de Saúde, deslocam-se para a região a fim de promover atenção à saúde nas comunidades ribeirinhas desassistidas por outras organizações.

A escolha das comunidades a serem contempladas pelas ações de saúde foi baseada nos critérios apresentados por estudos semelhantes, a saber: infraestrutura de saúde e sanitária existentes nas sedes municipais; grau de dificuldade para acesso aos recursos de saúde; indicadores de saúde desfavoráveis; zonas endêmicas de patologias infectocontagiosas e risco de eclosão de epidemias ou de recrudescimento de patologias regionais até então sob controle em áreas sabidamente endêmicas14,. Assim, as comunidades ribeirinhas que se serviram das ações do projeto estão localizadas em torno da Ilha do Chicote.

A amostra foi composta por todos os indivíduos do sexo masculino e feminino maiores de 18 anos atendidos pelo Projeto Novo Tempo nas Águas nas expedições realizadas em março e setembro de 2019, totalizando uma amostra de 218 pessoas.

A pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa/Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CEP/CONEP) da Universidade Federal do Pará, e foi aprovada sob o parecer de número: 4.347.985.

Os dados foram registrados no Instrumento de Atendimento do Novo Tempo nas Águas e reunidos em uma planilha no Microsoft Excel e executou-se as estatísticas descritivas com cálculos de médias, desvio padrão, mediana frequência absoluta e relativa. Nas variáveis estudadas encontram-se o sexo, idade, peso, ocupação, Índice de Massa Corporal (IMC), tabagismo, fonte de água para consumo, tratamento da água e presença de comorbidades. Na análise dos dados foram utilizados os programas Excel, Microsoft Word 2019 e R Development Core Team (2009). Sendo que, para a análise estatística foi usado o

software RStudio requires R 3.0.1+ e as variáveis quantitativas e métodos de análise inferencial foram analisadas através do teste qui-quadrado de Pearson e Excel 2019.

RESULTADOS

A somatória do espaço amostral das duas expedições, foi de 218 pessoas, das quais a maioria era constituída por mulheres (56%), e o restante formado por homens (44%), sendo que a maior classe de faixa etária atendida se encontra entre 46 a 59 anos (28,9%) (TABELA 1).

No que diz respeito aos dados relacionado a saúde, tem-se que a análise do Índice de Massa Corporal (IMC) revelou que 11% dos 218 participantes estavam abaixo do peso ideal, sendo que sendo que a maioria dessas pessoas abaixo do peso concentram-se na faixa etária entre 0 a 14 anos, revelando, dessa forma, uma possível má alimentação dessas crianças e pré-adolescentes (TABELA 1).

Tabela 1 – Distribuição da população por faixa etária e sexo relacionada com as populações abaixo do peso.

  Idade  Masculino  Feminino  Total  Abaixo do Peso
  0 a 14  20.8%  17.2%  18.8%  91,7%
  15 a 29  18.7%  9.0%  13.3%  8,3%
  30 a 45  11,4%  21.3%  17.0%  0%
  46 a 59  19,8%  36.1%  28.9%  0%
  60 a 75  15.6%  9.8%  12.4%  0%
  Ignorado  13.5%  6.5%  9.6%  0%
  Total (n)  96  122  218  24
Fonte: Dados obtidos em trabalho de campo março/2019 e setembro/2019.

Vale ressaltar que 17,4% dos participantes estavam com sobrepeso, 13,3% com obesidade grau I, 2,8% com obesidade grau II e 2,7% com obesidade grau III, tento assim uma somatória de 36,2% da população total com distúrbios característicos relacionados ao peso. No que concerne a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), observa-se que 12,8% da população são hipertensos, porém, através do teste qui-quadrado de Pearson realizado na tabela 3, observou-se que não houve significância (p = 0,08919) entre as variáveis de HAS e IMC elevado (>25), normal, ou abaixo do peso (<25) (TABELA 2 e 3).

Tabela 2 – Relação do IMC com HAS por faixa etária.

Faixa etáriaPeso normalSobrepesoObesidade grau IObesidade grau IIObesidade grau III  HAS
  0 a 14110000
15 a 291561110
30 a 451679125
46 a 591616123212
60 a 75965019
Ignorado522102
Total6238296628
Fonte: Dados obtidos em trabalho de campo março/2019 e setembro/2019.

Tabela 3 – Relação entre HAS com IMC.

 Sem HASCom HASTotal
Pessoas com IMC>25611879
Pessoas com IMC<25761086
Total13728165
Fonte: Dados obtidos em trabalho de campo.

Em relação a alimentação adequada e a prática de atividade física, constata-se que boa parte dos participantes que responderam aos questionários têm uma boa alimentação, posto que 55,5% dos cidadãos presentes declararam possuir uma alimentação saudável, todavia 30,7% da população afirmaram não possuir alimentação saudável, vale destacar que 13,8% não responderam o formulário relacionado ao quesito de qualidade alimentar (TABELA 4). No que se refere a prática de exercícios físicos, tem-se que apenas 24,3% dos entrevistados dizem fazer exercícios físicos, esse percentual reduzido de praticantes pode ser um dos fatores propulsores do elevado número de pessoas que estão acima do peso.

Tabela 4 – Qualidade da Alimentação por faixa etária.

Faixa etáriaAlimentação saudávelAlimentação não saudável
0 a 142910
15 a 291112
30 a 452114
46 a 593721
60 a 75178
Ignorado62
Total12167
Fonte: Dados obtidos em trabalho de campo março/2019 e setembro/2019.

Na relação entre faixa etária e o uso de substâncias toxicas, tem-se que 3,7% dos participantes são fumantes, sendo que desse total de fumante há maior concentração nas faixas etárias de 30 a 45 anos e de 46 a 59 anos, possuindo, cada uma, 37,5%. Além do mais,17,4% da população analisada consomem bebida alcóolica, e desse total 28,9% concentra-se nas pessoas com idade entre 46 a 59 anos.

No que concerne as questões patológicas, constatou-se que as principais hipóteses diagnósticas se concentraram, principalmente, nas doenças crônicas (15,9%), doenças osteoarticulares (16,4%), queixas relacionadas ao sistema gastrointestinal (11,1%) e por fim nas queixas urológicas (15,9%).

Em relação aos dados socioeconômicos, observa-se na população analisada um percentual relevante de pessoas que não tiveram acesso à educação, tendo uma frequência relativa de 23,4%. Destacando também que 27,5% dos participantes não sabiam ler. Demonstrando, assim, um grande problema educacional nessas comunidades ribeirinhas.

Referente a ocupação, tem-se que há pessoas que possuem mais de uma forma de ocupação. Das formas de ocupações presentes, desde agricultura até outros, observa-se que a maior forma de ocupação consiste na agricultura (48,2%), seguido pela pesca (17,9%). Quando se trata de fonte de renda, é observado que as características das ocupações são mantidas, posto que a agricultura (33,9%) e a pesca (25,7%) constituem a maior fonte de renda para a população ribeirinha estudada.

No que se refere a questão de saneamento básico, pode-se constatar que a situação de moradia dos cidadãos analisados está precária, visto que a frequência relativa dos que não possuem sistema de esgoto em suas casas é de 82,1%, e a frequência relativa dos que não possuem coleta de lixo é 78%. Tais percentuais servem para refletir a questão de saúde dessas populações. Em relação aos tipos de fontes de água, tem-se que as principais provém do rio (52,8%) e poço (33%), seguido da rede de abastecimento e da chuva, com 2.7% e 0.5% respectivamente; e as principais formas de tratamentos, para as pessoas que usam apenas um método de tratamento de água, consiste no uso de filtro (40,8%), hipoclorito (21,1%), e 11% das pessoas não usam nenhum tipo de tratamento de água. Observa-se também que 5,5% das pessoas utilizam mais de uma forma de tratamento de água.

DISCUSSÃO

O estudo propôs analisar o perfil epidemiológico da população ribeirinha da região Transamazônica e Xingu e identificar suas características relacionadas a qualidade de vida. As principais respostas encontradas foram que grande parte dos ribeirinhos apresentam doenças nutricionais, possuem indicadores socioeducacionais e saneamento precários o que reflete na saúde dos mesmos, e a maioria deles vivem da agricultura e pesca.

A Usina Hidrelétrica de Belo Monte proporcionou graves impactos para as comunidades ribeirinhas que residem na região Transamazônica e Xingu, sobretudo, na agricultura, pesca e saneamento básico, pois a ausência do cumprimento das exigências condicionantes do impacto ambiental que almejavam preparar as regiões adjacente a construção de tal usina para receber as consequências socioambientais negativas da obra levou a uma potencialização da vulnerabilidade social que já persistia nessas comunidades6.

Ademais, já é observado em estudos alterações prejudiciais na qualidade de vida, modificações nos hábitos alimentares, sociais e culturais, além do aparecimento de novos fatores de riscos em grupos populacionais que residem próximos aos lacais de construção de usinas hidrelétricas na Amazônia7.

Nos dados em saúde observados nas duas expedições haviam um alto índice de desnutrição em crianças e em jovens de até 14 anos, haja vista que devido, em parte, ao consumo de alimentos inadequados, incapaz de atender as demandas mínimas metabólicas4. Desse modo, a desnutrição infantil constitui um grave problema social no Brasil, seus índices de mortalidade, por exemplo, ocupa a nona posição, dentre as causas que mais causam óbitos infantis, em todos os estados do Norte e Nordestes 15. Além disso, devido a dificuldade de acesso desses povos tradicionais aos serviços de saúde têm-se como consequência altas taxas de subnutrição nos indicadores sociais ribeirinhas4.

Paralelamente, nas faixas etárias economicamente ativas, a partir dos 18 anos, apresentam um grande número de obesos, para o qual, segundo BRASIL 16 essas alterações metabólicas, decorrente do excesso de peso, estão relacionados a diversos danos ao organismo, sobretudo, na sua forma crônica. Embora este estudo não tenha apresentado uma associação significativa dos parâmetros HAS com IMC > 25 na amostragem (p > 0,05), para Barroso 17 a obesidade geral e a obesidade abdominal estão associadas ao aumento do risco de HAS de tal forma que, concomitantemente, estão entre os fatores de riscos numa linha tênue para desfechos cardiovasculares e metabólicos.

Além disso, foi constatado um grande número de pessoas sem práticas regulares de atividades físicas, em parte, presume-se o alto índice de pessoas com obesidade no estudo. Assim, algumas mudanças observadas nos últimos anos na nova geração, como a não adesão das práticas do tradicionalismo ribeirinhos, a exemplo do exercício da pesca, da caça e da agricultura a nível local favorecem cada vez mais o aumento da obesidade nessas populações10.

Dessa forma, é datado que o sedentarismo está associado a uma ampla escala de doenças crônicas não transmissíveis, além do aumento da morbimortalidade precoce 18.

Quanto aos dados referentes ao uso de drogas lícitas, tem-se que o uso de tais substâncias são fatores de riscos modificáveis, assim como a inatividade física e a má alimentação, pois partem primordialmente de uma mudança de estilo de vida, e uma vez que tais determinantes de saúde se modificam há presunção diminuída, consideravelmente, nos indicadores de morbidade causada por diversas doenças crônicas não transmissíveis 4.

Já pela análise dos dados socioeconômicos, no quesito educação, os ribeirinhos da Ilha do Chicote- PA apresentaram um alto índice de analfabetismo representado por 23,4%, pelo qual é posta em consonância com o estudo proposto por Gama 19, envolvendo comunidades ribeirinhas do amazonas, com 9,7% de analfabetismo. Em contrapartida, com as taxas observadas em grandes capitais do Norte, como Belém (3,3%) e Manaus (3,8%)20. Assim, essas altas taxas de analfabetismo refletem a precariedade do acesso da educação

para tais indivíduos, seja pela inexistência das escolas nessas comunidades, seja pelo relativo isolamento geográfico, seja pelas precárias e/ou a inviabilidade da trafegabilidade dos meios de transportes que permitem o acesso às escolas. Condições estas associam ao alto índice de analfabetismo e, consequentemente, refletem negativamente nos diversos indicadores socioeducacionais 2.

Já em relação aos seus meios de ocupação e subsistências observadas no estudo, os componentes familiar dos ribeirinhos vivem, primordialmente, da agricultura (48,2%) e da prática da pesca (17,9%), o qual, para Lira 21, esta inter-relação sociedade-natureza perpassa muito mais que a percepção de subsistência para os ribeirinhos, são também responsáveis por criar laços mútuos de respeito com a natureza e que são perpetuados e cultivados, além dos saberes e valores que são repassados de geração em geração.

Os dados socioeconômicos referentes as condições de saneamento tornam-se ainda um grave problema social nessas populações, uma vez que, majoritariamente, não possuem rede de esgotos (82,11%). Dessa forma, o despejo de esgoto proveniente, provavelmente, de lixos inorgânicos e lixos orgânicos são lançados diretamente no rio, que por consequência ocasiona a danificação da fauna e flora aquática, com detrimento e/ou prejuízos para os que vivem tanto da pesca quanto para aqueles que têm como o rio fonte de água para o consumo (52,8%) 22. Em relação a coleta de lixo regular, tem-se que 78% dos entrevistados não possuem coleta de lixo, dessa feita é importante destacar que o acúmulo de lixo em locais indevidos serve como vetor para inúmeras doenças causadas pela proliferação de ratos, moscas, vermes, etc., afetando, portanto, os ecossistemas e como consequência o homem 22.

Além disso, o consumo de água colhida diretamente do rio pelos ribeirinhos favorece, segundo Gomes 12, para altas taxas de doenças infecciosas parasitológicas. Em seu estudo com ribeirinhos do Amazonas, 98,1% (n = 52) apresentavam enteroparasitoses gastrointestinais. Dessa forma, nas expedições realizadas na Ilha do Chicote- PA no ano de 2019, os distúrbios gastrointestinais representaram a terceira queixa mais frequente relatada pelos ribeirinhos nas consultas médicas. Na análise dos seus determinantes, as más condições de saneamento e o consumo impróprio de água retirada diretamente do rio explicam esses altos índices de infecção parasitológica19.

CONCLUSÃO

O presente estudo apontou nesta comunidade ribeirinha um elevado número de crianças no estado de subnutrição e adultos obesos, somados as más condições de saneamento e o consumo impróprio de água colhida, majoritariamente, do rio. Outrossim, os impasses decorrentes das condições socioeconômicas desfavoráveis, aliadas as limitações geográficas constituem importantes barreiras para o acesso de tais populações ribeirinhas aos serviços de saúde e melhoria na qualidade de vida em busca de prevenção e promoção da saúde.

Portanto, observa-se a necessidade de uma melhor atenção nas condições de saúde e indicadores sociais nas comunidades ribeirinhas, desassistida em volta do rio Xingu no Estado do Pará.

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