O IMPACTO DO AUTISMO NA DINÂMICA FAMILIAR

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7612702


Débora Martins Coelho Freire¹
Mariana de Miranda Seize ²


RESUMO

O Transtorno do Espectro Autista apresenta um quadro cuja gravidade implica em uma demanda de cuidados especiais. Tendo em vista a complexidade do transtorno, a família necessita readaptar-se frente a novas demandas. O presente artigo retrata através de uma revisão de literatura, como um membro que apresenta o Transtorno do espectro autista pode impactar na dinâmica e estrutura familiar, gerando sentimentos como: estresse, angústia, sensação de luto, dentre outras reações. Os resultados das pesquisas apresentadas, foi de que os pais e os familiares são impactados pelas especificas características do Transtorno do Espectro Autista, precisando muitas vezes de apoio e suporte psicológico e social.   

Palavras-chave: Autismo.Impacto. Família. Dinâmica familiar.

      INTRODUÇÃO

      Segundo o Instituto Brasileiro de Direito da Família, o dicionário Houaiss (2016) apresenta uma atual definição da família como sendo “um núcleo social de pessoas unidas por laços afetivos que geralmente compartilham o mesmo espaço e mantêm sobre si uma relação solidária”. Contudo, sabe-se que a vida familiar é a primeira experiência de aprendizado para o sujeito, é com ela que aprendemos a autonomia e a individualidade, é nela que recebemos os valores e conceitos que vão permear a nossa vida (BORALLI, 2013). 

      Ao longo de uma relação conjugal, a família se prepara para a espera de um novo membro que chegará para compor e dar início a uma nova construção familiar. E sob essa espera, é possível gerar um leque de sentimentos, desejos, planejamentos, projeções e idealizações (BEZERRA et al., 2016). No entanto, todo esse ciclo se altera quando nasce uma criança com demandas de cuidados e necessidades especiais. Uma vez que essa apresenta o Transtorno do Espectro Autista – TEA, a família passa a enfrentar um processo de sofrimento, medo, angústia, insegurança e frustração (SILVA, GAIATO e REVELES, 2012).

      Por definição tem-se que: “O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um grupo de desordens de origem neurobiológica que possui um impacto considerável na vida do indivíduo” (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2018).

      Tendo em vista a complexibilidade do Transtorno do Espectro Autista, bem como a relevância da família para o desenvolvimento de um membro com necessidades especiais, é necessário que a família seja amparada e bem instruída para que possa absorver o impacto do diagnóstico e superar a dor da notícia (DUARTE, 2016). Esta, por sua vez, deverá manter a estrutura para lidar com as novas imposições que irão surgir e que irão provocar novas experiências na vida familiar como um todo (JUBIM e BOECHAT, 2017). 

      A hipótese deste estudo é de que há uma relação e diversas questões frente à família quando uma criança é diagnosticada com o Transtorno do Espectro Autista.

      Uma vez que essa criança apresenta demanda de cuidados específicos, a família precisa dispor de tempo e reestruturar a sua dinâmica familiar de maneira a se preparar para lidar com os novos desafios que surgirão ao longo da vida. 

      O trabalho aqui apresentado irá abordar, por meio de uma revisão literária, como o impacto de um diagnóstico de autismo afeta o funcionamento da família. Revisão literária essa, que foi operacionalizada mediante capítulos de livros e buscas eletrônicas de artigos, teses e dissertações, publicados entre 2013 e 2019, nas bases de dados SciELO, CAPS. O refinamento da pesquisa constituiu-se pela busca de descritores chaves como “autismo”, “diagnóstico”, dinâmica familiar, “impacto” e “família.” 

      Foram considerados e listados trabalhos publicados no Brasil e livros com traduções brasileiras, que tivesse como foco e objetivo Autismo e Família. No total foram analisados de forma descritiva 7 livros , 23 produções e 1 site americano. Desse modo, a fim de melhor compreender a relevância do tema aqui apresentado, o objetivo deste artigo é discutir, a partir de uma revisão literária, o impacto do diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista nas relações e na dinâmica familiar. 

      1 ASPECTOS GERAIS DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

      Em 1943, o Psiquiatra Austríaco Leo Kanner descreve pela primeira vez o Autismo como “distúrbios inatos do contato afetivo”. Em seu trabalho, ele fez relatos de 11 crianças que vieram ao mundo sem interesse habitual nas outras pessoas e no contato com o ambiente social. Kanner percebeu que esse transtorno estava presente, provavelmente, desde o nascimento das crianças e que o comprometimento social diferenciava esses distúrbios dos outros transtornos mentais conhecidos.

      Kanner (1943) fez uma descrição precisa e cautelosa dos comportamentos incomuns que os casos relatados apresentavam. Mencionou ainda que essas crianças exibiam “resistência à mudança”, termo que também usou para se referir a comportamentos motores aparentemente sem propósito. Assim, as identificou como portadoras de uma insistência nas mesmas coisas. Observou também que, quando a linguagem delas se desenvolvia por completo, era anormal. Kanner constatou que crianças com autismo não conseguiam dar entonação à sua fala  — podendo falar como um robô e apresentar eco na linguagem. 

      No ano de 1944, o médico Hans Asperger percebeu a presença de sintomas semelhantes em um grupo de meninos na Alemanha. Ele descreveu a presença de déficits de integração social e comportamentos estereotipados, os quais ele denominou “autismo”.  Porém, Asperger percebeu que, nesse grupo de crianças, existia boa linguagem (em alguns aspectos) e habilidades cognitivas aparentemente boas. Os estudos de Asperger foram feitos independentemente do trabalho de Kanner, que nessa época, não obteve reconhecimento. Só em 1980 seu trabalho tornou-se conhecido.

      Nas décadas de 1950 e 1960, as causas do Transtorno do Espectro Autista foram estabelecidas de forma errada. Nessa época, as características das crianças que nasciam com o Transtorno do Espectro Autista eram associadas como resultado de uma relação emocionalmente fria dos pais (mãe-geladeira) (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2018). Porém, ainda na década de 1960 e na década de 1970, começaram a aparecer teorias biológicas sobre o Transtorno do Espectro Autista. Evidências mostraram que o transtorno era uma condição com base cerebral e fortemente genética (JOSEPH, et al. 2016).

      Na década de 1970, houve um consenso de que o TEA era caracterizado por: (1) déficit no desenvolvimento social, de um tipo muito diferente em comparação aos das crianças sadias; (2) déficit na linguagem e em habilidade de comunicação; (3) resistência à mudança ou insistência nas mesmas coisas; (4) início nos primeiros anos de vida (VOLKMAR e WIESNER, 2019). 

      Já no final da década de 1970, o psicólogo britânico Michel Rutter publicou o artigo “Diagnosis and defininitions of childhood autismo” (Diagnóstico e definições do autismo na infância). Nesse artigo, propôs uma significativa mudança científica sobre as causas do autismo. Sugeriu que os critérios diagnósticos incluíssem déficits sociais e de comunicação não associados a uma deficiência intelectual, comportamentos estereotipados (repetitivos) e um início precoce antes dos 30 meses de idade (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2018).

      Em 1980, o Transtorno do Espectro Autista foi incluído na histórica terceira edição das diretrizes diagnósticas oficiais da American Psychiatric Association (VOLKMAR e WIESENER, 2019). 

      De acordo com Rotta et al. (2016), em 1990, Gillberg publica que: “O autismo é uma disfunção orgânica e que o modo de ver o autismo deveria ser biológico”. Desde então, à medida que novos estudos e pesquisas aconteciam, eram reconhecidas inúmeras condições além das citadas nas décadas anteriores.

      Inúmeros estudos epidemiológicos do Transtorno do Espectro Autista já foram realizados. Contudo sua interpretação é complexa devido às diferenças nos resultados dos estudos, aos critérios diagnósticos utilizados, a outros fatores como comorbidades clínicas e psiquiátricas (VOLKMAR e WIESENER 2019).  É comum que indivíduos com Transtorno do Espectro Autista apresentem quadros de ansiedade, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e transtornos de humor (JOSEPH, et al., 2016).   

      De acordo com Seize (2017), em 2011, na cidade de Atibaia, no interior de São Paulo, foi publicado o primeiro estudo de epidemiologia sobre o Transtorno do Espectro Autista no Brasil. O objetivo do estudo foi investigar a prevalência do transtorno invasivo do desenvolvimento com base nos critérios do DSM-IV (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2018). Segundo Paula (2011 apud JÚLIO-COSTA e ANTUNES. 2018), a taxa encontrada foi de 27,2 crianças com TEA a cada 10 mil crianças. Até o ano de 2019, não se tem a informação precisa de quantos autistas há no Brasil (PAIVA JR., 2019). 

      Um estudo do CDC, Center for Disease control and prevention ASD (Centro de doenças e prevenção do governo dos EUA), publicado em março de 2020, apresentou novos números de prevalência de autismo. Nesse estudo, 1 em 54 crianças foram identificadas com Transtorno do Espectro Autista, o que significa um aumento de 10% em relação a 2014, que era de 1 em 59 crianças (CDC, 2020). Diante desse cenário, Joseph et al. (2016) sinaliza que ainda não há marcadores biológicos para a identificação do Transtorno do Espectro Autista (JOSEPH et al., 2016). Portanto, o processo de avaliação diagnóstica é relevante para ajudar o indivíduo e sua família a conduzirem as intervenções apropriadas. Estudos apontam que, com o diagnóstico e intervenção precoces, crianças com o transtorno do Espectro Autista apresentam resultados cada vez melhores (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2018).

      A avaliação diagnóstica permanece sendo uma das ferramentas de avaliação clínica mais apropriada, quando conduzida por profissionais experientes, do que os testes genéticos (VOLKMAR e WIESENER, 2019). Esse processo deve ser multidimensional e envolver uma combinação de relatos de cuidadores, os quais têm papel significativo nesse diagnóstico, pois convivem com as crianças, muitas vezes, durante os primeiros anos de vida (JOSEPH et al., 2016).

      Os indivíduos com Transtorno do Espectro Autista podem apresentar diferentes sintomas nos mais diversos ambientes. Assim, o uso de vários métodos de avaliação em conjunto fornece uma imagem do diagnóstico de sintomas em todos os contextos (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2018).

      O processo de avaliação diagnóstica do Transtorno do Espectro Autista deve ser abrangente e conter dois níveis de investigação: o diagnóstico e o rastreamento. Deve incluir observações de sintomas, relatórios de cuidadores, bem como uma ampla avaliação do funcionamento cognitivo de linguagem, receptiva e expressiva, da motricidade, da adaptação e uma avaliação das comorbidades (JOSEPH et al., 2016). 

      Atualmente, o Transtorno do Espectro Autista é considerado um transtorno de neurodesenvolvimento, complexo e de etiologia multifatorial e, na maioria dos casos, apresenta comorbidades e uma série de dificuldades em grau elevado (ROTTA, 2019).  Devido as atípicas manifestações do Transtorno do Espectro Autista, é possível detectar alguns sintomas já nos primeiros meses de vida (COSTA e ANTUNES, 2017). Portanto, os primeiros indícios de autismo, já causa impacto familiar, pois já demanda tempo e necessidade de cuidados médicos específicos e singulares para a criança (BORALLI, 2013).

      Dessa maneira, os fatores apresentados começam a desencadear alterações na dinâmica e no contexto familiar, causando fortes anseios nas relações entre os familiares (BORALLI, 2013).

      2 O IMPACTO DO DIAGNÓSTICO DO TEA NA FAMÍLIA E AS MUDANÇAS NA DINÂMICA FAMILIAR

      Bosa e Schmidt (2003) relatam que a família de indivíduos portadores de autismo se vê frente ao desafio de ajustar seus planos e expectativas quanto ao futuro. As limitações dessa condição, além da necessidade de adaptar-se à intensa dedicação e prestação de cuidados sobre as necessidades do indivíduo com Transtorno do Espectro Autista, é preocupante para todos os membros da família. 

      Faro et al. (2019) apontam que vários estudos mencionam que as numerosas demandas de cuidados, diante das especificidades do Transtorno do Espectro Autista, tem grande influência na adaptação familiar, levando as famílias a passarem pelos mais diversos tipos de problemas.  

      Borges (2009) comenta que o processo de diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista pode resultar em sofrimentos interpessoal e familiar devido à necessidade de se alterar horários, rotinas, tempo e energia para a identificação e a utilização dos serviços especializados necessários ao portador do Transtorno do Espectro Autista. 

      Segundo Silva, Gaiato e Reveles (2012), o momento em que os pais recebem o diagnóstico do transtorno do Espectro Autista é impactante, pois é o momento em que surgem diferentes emoções, angústias, conflitos, frustações, medos e insegurança.  Evidenciam-se uma sequência de mudanças e transformações na organização familiar ao longo do ciclo de vida. 

      Para a abordagem sistemática a família é:

      […] sempre um conjunto de pessoas consideradas como unidade social, como um todo sistêmico onde se estabelecem relações entre os seus membros e o meio exterior. Compreende-se, que a família constitui um sistema dinâmico, contém outros subsistemas em relação, desempenhando funções importantes na sociedade, como sejam, por exemplo, o afeto, a educação, a socialização e a função reprodutora. Ora, a família como sistema comunicacional contribui para a construção de soluções integradoras dos seus membros no sistema como um todo […] (DIAS, 2011).

      Partindo do conceito se que a família é um grupo social e afetivo com que convivemos por toda a vida, o quadro clínico do Transtorno do Espectro Autista afeta diretamente esse grupo (JUBIM e BOECHAT, 2017). Isso acontece, porque o TEA tem como principais características comprometimentos na comunicação e na interação social, que dificultam a convivência dentro de casa juntamente com a própria família. (BALBI e PORTO, 2015). Todavia, essas características são inviáveis para a reprodução de normas e valores dentro e fora do contexto familiar, levando os pais a experimentar uma sensação de extrema indiferença, no que diz respeito à participação da criança e da família no meio social e cultural nos quais estão inseridos (ABREU et al., 2012).   

      Borges e Porto (2009) relatam que no contexto familiar surgem rupturas devido ao Transtorno do Espectro Autista apresentar interrupções durante o exercício das atividades sociais e culturais, alterando assim, o estado emocional de seus membros. Isso leva os pais a experimentar uma sensação de extrema diferença no que diz respeito à participação da criança e da família no contexto sociocultural dos qual fazem parte. 

      Nos primeiros meses de vida do bebê, a família — supondo que o bebê projetado e esperado, dado após o nascimento como normal é, ao que tudo indica, perfeitamente normal — vive dias felizes e alegres com o filho (BORALI, 2013). Porém, com o passar dos meses, logo se torna visível e óbvio que o seu filho apresenta algo diferente, e os pais começam a ter, então, uma sensação de dúvidas e incertezas (BORALI, 2013). 

      Logo, os pais passam a observar outras crianças e a comparar seu filho com elas e, muitas vezes, se tranquilizam, pois seu filho parece ser esperto e inteligente. Contudo, reabre-se um caminho de dúvidas e incertezas que aumentam a dor quando a verdade se torna visível. Ainda assim, muitas famílias são resistentes a buscar ajuda e, à medida que o filho cresce, aumentam as evidências e com elas, as incertezas. Ocorre, desse modo, a busca por um diagnóstico, que exige dos pais aceitação, abrindo uma etapa de desgaste emocional e psicológico (BORALI, 2013).

      De acordo com Pinto et, al., 2016: 

      O impacto do diagnóstico de uma doença propicia a família a vivenciar as mesmas fases do luto inclusive a negação, sendo estas uma adaptação pelas quais perpassam as pessoas quando perdem algo almejado ou significativo. O sentimento de culpa também pode se fazer presente entre os familiares, especificamente entre os pais.

      Para Costa e Antunes (2018), a notícia do diagnóstico provoca uma reviravolta na família, que precisa manejar aspectos psicológicos, emocionais, financeiros e até logísticos na rotina familiar. Partindo desse conceito, após a descoberta do diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista, a família, por sua vez, começa a assimilar as informações. No entanto, muitos familiares não recebem as informações precisas e necessárias sobre o que é o Transtorno do Espectro Autista, sua etiologia e sobre como a criança com o TEA poderá se desenvolver, entre outras informações básicas. Borges (2009) comenta que, os sentimentos e as respostas vivenciados durante a descoberta do Transtorno do Espectro Autista podem gerar efeito na criança. 

      Costa e Antunes (2018) afirma ainda que “O Transtorno do Aspecto Autista não é compatível com as expectativas que os pais têm sobre os filhos e eles não sabem o que é preciso para fazer e lidar com tal situação”.

      Pinto et al. (2016) relatam que possivelmente os sentimentos vivenciados durante a notícia do diagnóstico pelos familiares são ainda mais potencializados por conta da falta de conhecimentos sobre o Transtorno do Espectro Autista. A ausência de informação na hora do diagnóstico leva a família a enfrentar dolorosamente a gravidade da revelação e as dificuldades que estão por vir. 

      Desde questões básicas, como: segurança, sono e problemas com alimentação, há preocupações como: aprendizagem e condições financeiras para arcar com os suportes médicos, psicológicos, fonoaudiológicos, psicopedagógicos. Bem como outras terapias que serão necessárias ao longo da nova jornada. Portanto, essas dificuldades podem afetar os pais, seja individualmente, seja como casal, e, com toda certeza trazer mudanças no contexto e na dinâmica familiar (VOLKMAR e WIESENER, 2019). 

      Borges (2009) afirma ser relevante compreender a dinâmica familiar ao estudar o TEA. Assim, a autora descreve que “[…] a dinâmica familiar é entendida como forma de funcionamento da família, que abrange os motivos que viabilizam esse funcionamento e as relações hierárquicas estabelecidas”.

      Fávero e Santos (2005) afirmam que, após o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista, a dinâmica familiar sofre mobilizações que vão desde aspectos financeiros, à qualidade de vida psíquica e social dos cuidadores e em relação ao ambiente físico. 

      Sprovieri e Assumpção Jr. (2001) escrevem que o Transtorno do Espectro Autista traz consequências para a família, interferindo no contexto e na dinâmica familiar, bem como nos vínculos com o mundo exterior. 

      Borges (2009) acrescenta que, dado o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista, a família necessita de modificações na sua rotina e dinâmica familiar, uma vez que o TEA leva a família a experimentar limitações permanentes.  

      Portanto, considerando a mudança no contexto familiar de um indivíduo com transtorno do Espectro Autista, constata-se que um dos genitores precisará mudar a rotina e dedicar seu tempo para acompanhar o filho com Transtorno do Espectro Autista (KLINGER; OLIVEIRA; LOPES, 2020), tendo em vista a necessidade de acompanhamento para o melhor desenvolvimento da criança (DUARTE, 2016). 

      Ocorre que, na maioria dos casos, são as mães que renunciam à vida profissional para dedicar-se inteiramente ao filho autista (BEZERRA et al., 2016).  Pois, elas acreditam serem as únicas pessoas capacitadas para cuidar e entender as necessidades dos filhos (BEZERRA et al., 2016). Além da vida profissional, as mães de crianças com transtorno do Espectro Autista também tendem a abdicar da vida pessoal e atividades socioculturais (KIQUIO e GOMES, 2018). 

      De acordo com Costa (2012), é difícil conciliar o trabalho ou arranjar emprego que lhes permita ter um horário adequado ou meio período para cuidar do filho. A autora menciona que as mães de famílias com níveis socioeconômicos mais elevados reduzem a carga horária ou abandonam o emprego, dedicando-se inteiramente aos cuidados de seus filhos. 

      De acordo com Baldi e Porto (2015), os custos com tratamento de um filho com Transtorno do Espectro Autismo, bem como a necessidade de a mãe permanecer em casa para cuidar do filho, são agravantes na realidade das famílias. Outra frequente realidade é o esforço extraordinário, diante uma obrigação que algumas mães solteiras fazem, para o seu sustento e o sustento do seu filho que apresenta o transtorno (COSTA, 2012). Observa-se nesse contexto, que a dinâmica familiar precisa ser alterada por questões de ordem financeira (BORGES, 2009).

      Por causa  das grandes alterações na vida familiar, existem situações em que, mesmo com o diagnóstico, a família passa por um processo de não aceitação, vivendo um período de luto pela perda de um filho projetado.Out ros pais negam a vida toda para não enfrentar a real situação (BORALLI, 2013). A raiva surge como revolta e em forma de questionamentos (COSTA, 2012). 

      É preciso que, um dos pais tenha maior habilidade para enfrentar as dificuldades que surgirão (VOLKMAR e WIESENER, 2019). Pois, o posicionamento da família no primeiro momento, após o diagnóstico, pode ajudar ou comprometer o desenvolvimento da criança (COSTA e ANTUNES, 2018). Com toda essa situação, os pais vão criando suas próprias tensões e estresses. 

      Geralmente, famílias que apresentam filhos com necessidades especiais carregam inevitavelmente culpa e sofrimento, quanto maior a problemática do filho, maior é o nível de sensibilidade entre os pais (BORALLI, 2013). Segundo VOLKMAR (2019), pais com poucos recursos — sejam eles, suporte educacional, financeiro ou familiar — têm mais dificuldade para lidar com a situação.

      Outros autores, como Pinto et al. (2016), afirmam que o Transtorno do Espectro Autista é uma situação que desencadeia alterações na vida familiar devido às necessidades de acompanhamento da criança para seu desenvolvimento. Bem como é visto que o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista ocasiona uma grave crise para qualquer família e, de maneira inevitável, produz problemas emocionais para todos os membros dela.

      Barolli (2013) pontua que os pais passam a projetar um no outro sentimento de culpa para acalmar a pressão. Os filhos, por sua vez, exigem maior atenção em contrapartida à atenção dedicada ao irmão autista. Outros familiares, como tios, primos e avós, se afastam diante de um clima angustiante e conflituoso, pois não sabem lidar com a nova circunstância. Outras vezes, familiares com desejo de ajudar ocasionam mais pressão sobre a família que se encontra totalmente fragilizada.

      Mais adiante, Barolli (2013) também menciona que “um filho com Transtorno do Espectro Autista exige muita energia da família”. Assim, frente à complexidade do Transtorno do Espectro Autista e a ausência de informações, algumas famílias buscam o isolamento, fugindo do convívio social e das programações de família (RIBEIRO, 2011). Porque a criança autista grita, não se sente bem com barulho e carrega consigo suas questões e estereotipias, as pessoas desaprovam e criticam a situação, sem fazer o menor esforço em apoiar e ajudar. Por esses e outros motivos, toda a estrutura e dinâmica familiar passa por mudanças (BORALLI, 2013).

      Duarte (2016) escreve que, devido à gravidade do Transtorno do Espectro Autista, é comum que a família se desespere e até se desestruture por um tempo. Portanto, faz-se necessário um suporte e apoio familiar, para que todos possam absorver o impacto do diagnóstico, superar a dor e manter a estrutura para lidar com a nova situação: cuidar de uma pessoa que demanda maiores atenções.

      Volkmar e Wiesner, 2019 enfatizam que “cada família é única  — coisas que podem ser terrivelmente difíceis para uma família administrar podem ser mais fácil para outras”.  Também vale ressaltar que cada família apresenta a sua construção de valores, suas crenças, suas histórias e experiências. (MONTE e PINTO, 2015). Portanto, é preciso compreensão e amor para que toda dificuldade seja enfim superada (FREIRE, 2020).

      2.1 O estresse familiar frente ao impacto do diagnóstico do TEA

      Schmidt e Bosa (2003) relatam que os estudos têm revelado a existência de estresse agudo em famílias que receberam o diagnóstico de um membro com transtorno do Espectro Autista.  Os estudos apresentados mostram que os pais ou cuidadores de indivíduos portadores do Transtorno do Espectro Autista lidam diariamente com diversos estressores.  O TEA é uma condição que afeta todos os membros da família, causando estresse direta — pobreza na interação social — ou indiretamente — impacto financeiro (SCHMIDT e BOSA, 2003).

      De acordo com Fávero e Santos (2005):

      […] indubitavelmente as famílias que se encontram em circunstâncias especiais, promotoras de mudanças na atividade de vida diária e no funcionamento psíquico dos seus membros, deparam-se com uma sobrecarga de tarefas exigidas especiais que podem suscitar situações potencialmente indutoras de estresse e tensão emocional.

      Desse modo, aumentam os conflitos entre casais, entre filhos e parentes, tornando-se grandes as queixas de vida no trabalho, o mal humor, a vontade de sumir, bebedeiras, dentre outros fatores de estresse conjugal e familiar (BORALLI, 2013). Nesse sentido, Correa (2017) afirma que os estudos sobre o TEA  mostram impactos sobre os familiares e suas especificidades nos subsistemas conjugal, parental e fraterno. 

      As autoras Andrade e Teodoro (2012) identificam alguns aspectos que estão associados ao estresse manifestado entre as famílias que convivem com um membro que apresenta o TEA, são eles: o modo de funcionamento da dinâmica familiar, os padrões de comunicação inter e extra familiar, a qualidade do sistema de saúde e a crença da família sobre a doença.

      Para Lampreia (2007), a família pode manifestar diversos aspectos estressores; entre eles estão a demora em obter o diagnóstico e as frustrações, passando depois por um processo de assimilação sobre o Transtorno do Espectro Autista. 

      Por outro lado, Schmidt e Bosa (2003) comentam que os cuidados ao longo da vida, a pouca expectativa de melhoras, os tratamentos necessários e a falsa aparência saudável são fatores que contribuem fortemente para o estresse familiar. 

      Andrade e Teodoro (2012) acreditam que o estresse em pais de crianças portadoras de TEA é influenciado especificamente por características do transtorno. 

      Sprovieri e Assumpção Jr. (2001) dizem ainda que os gastos com medicamentos e profissionais especializados pesam sobre as finanças da família, estimulando uma carga de estresse entre os familiares.

      Rogers (2015) relata que: 

      […] décadas de pesquisas demonstraram que uma das coisas mais uteis que pode fazer para combater o estresse familiar é construir uma forte rede social de apoio. Constituída por amigos e membros da família. Isso irá ajudar a família a protegerse dos efeitos negativos proporcionados pelo estresse.” De aos amigos chegados e a sua família a dadiva da inclusão.

      2.2 A sobrecarga materna e o impacto do disgnóstico do TEA

      Schmidt e Bosa (2003) relatam em seu trabalho, que estudos apontam que as mães, devido à demanda e ao cuidado com o filho, tendem a apresentar um maior impacto após o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista, bem como a apresentar um maior risco de crise de estresse do que os pais, 

      Segundo Pinto et al. (2016), a sobrecarga materna no processo do cuidado de crianças com necessidades especiais, como o Transtorno do Espectro Autista, ocorre devido ao próprio constructo histórico-cultural estabelecido pela sociedade. Somado a essa questão, o vínculo afetivo pode justificar o protagonismo no ato do cuidar (PINTO et al., 2016).

      Costa (2012) afirma que toda a família sofre com o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista de um de seus membros, contudo as mães enfrentam sofrimentos sob um alto grau de estresse, a busca por crenças religiosas ajuda a manter a esperança de melhoria para o filho. Por muitas vezes, as mães se mostram insatisfeitas com a família e consigo mesma, pois se dedicam inteiramente ao filho portador do Transtorno do Espectro Autista, fechando-se para outras vivencias, como para  o papel de esposa e mães de outros filhos (COSTA, 2012). Por outro lado, a autora também relata que as mães que são apoiadas pelos maridos têm menos estresse e sobrecarga. 

      Contudo, na divisão das tarefas domésticas e dos cuidados com filhos, as mães, evidentemente, são responsáveis pelos cuidados regulares dos filhos, tais como atividades de trabalho mais físico e rotineiro. (COSTA, 2012).  A autora ainda ressalta que, em algumas famílias de nível socioeconômico mais elevado, são as empregadas domésticas que desempenham essa função.

      Kiquio e Gomes (2018) apontam que as mães assumem uma maior responsabilidade nos cuidados com os filhos, o que acarreta uma sobrecarga de estresse. O autor completa que quanto mais alto o nível de estresse, menor será a qualidade de vida das mães. 

      Faro et al. (2019) relatam que:

      Há apontamentos na literatura sobre a necessidade de apoio social reportada por mães de crianças com o transtorno do espectro autista, em particular o suporte familiar, sendo percebido como a principal fonte de auxílio para elas nas adversidades que surgem em decorrência das demandas do filho com Transtorno do Espectro Autista.

      Fávero (2005) pontua que estudos revisados evidenciam que enquanto algumas mães possuem comprometimento psíquico, outras mães conseguem obter qualidade de vida. Monte e Pinto (2015) complementam que o estresse materno pode alterar a psicodinâmica da família, tendo em vista a mãe como a figura primordial na recuperação de seus filhos. 

      Para Rogers (2015), os pais de crianças com TEA têm mais probabilidade de experimentar a ansiedade devido as incógnitas e preocupações que resultam de cuidados para com uma criança diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista.

      O autor menciona ainda que a ansiedade tem várias facetas: 

      Sentimentos constantes de ansiedade e receio (ansiedade generalizada) podem despoletar pensamentos repetitivos, irracionais e perturbadores (obsessões) pode despoletar ações repetitivas ligadas ao lidar com ansiedade irracional (compulsões)ou pode tomar a forma de ataques de pânico, que para algumas pessoas se assemelha a um ataque de coração.

      Nesse contexto, Volkmar (2019) esclarece que a mãe é quem costuma passar a maior parte do seu tempo na linha de frente cuidando das necessidades do seu filho. O pai é, em geral, convocado quando a mãe precisa de respaldo. 

      A esse respeito, Schmidt e Bosa mencionam que existe um sentimento de desamparo das mães, pela ausência de suporte dos maridos. O autor relata que o desejo das mães é que os maridos assumam a responsabilidade espontânea e conjunta nos cuidados com os filhos. 

      2.3 As relações conjugais e o impacto do TEA

      Tendo em vista as relações conjugais, Costa (2012) afirma que no ano de 2008, nos Estados Unidos, aconteceu um estudo com pais de 54 crianças, que sofriam com Transtorno do Espectro Autista. Esse estudo conclui que os pais apresentam maior estresse devido aos comportamentos inadequados dos filhos e as mães devido às dificuldades reguladoras. Tanto os pais como as mães apresentam estresse ligado às dificuldades Sociais. 

      Assim, Sprovieri e Assumpção Jr. (2011) esclarecem que:

      A família enfrenta os efeitos de um de seus membros ser permanentemente sintomático, com deficiências que progridem gradativamente. Os períodos de alívio das exigências ligadas a doença são mínimos, o que contribui para a família se disfuncionar. 

      Na mesma linha, Volkmar (2019) pontua que existem tensões obvias para a família, o casal e o casamento de quem convive com um indivíduo portador do Transtorno do Espectro Autista. Essas tensões ocorrem à medida que a criança se desenvolve. 

      Balbi e Porto (2015) apontam que uma das principais maneiras com que o TEA  impacta as família é colocando estresse sobre o casamento dos pais da criança portadora. Sob essa mesma ótica, Correa (2017) relata que é possível notar um impacto negativo global que é validado por números de divórcio em famílias de criança com o transtorno do espectro Autista ser duas vezes maior do que com famílias de desenvolvimento típico. 

      Segundo Antunes e Costa (2018):

      Até a década de 2000, acreditava-se que as taxas de divórcio em famílias com crianças com autismo eram maiores, entretanto, em 2010, o professor Freedman do Kenedy Krieger Institute, em Baltimore nos EUA, divulgou dados que comprovaram que as taxas de separação de pais de crianças com TEA é semelhante a de pais de crianças com desenvolvimento típicos (63% e 64%, respectivamente) (Kenedy Krieger Institue, 2010). Esses dados aumentaram a discussão sobre os impactos do diagnóstico na família […].

      Esses resultados apresentados por Freedman, por terem limitado a coleta em um único momento (Pesquisa transversal), foram rebatidos por um estudo mais amplo (Pesquisa longitudinal), nesse mesmo ano de 2010, que constatou que as taxas de divórcio são equivalentes tanto para os pais de filho com Transtorno do Espectro Autista, como para os pais de filho com desenvolvimento típico, na primeira década de vida da criança (HARTLEY et al., 2010).

      Entretanto, o estudo vai além e observa que:

      Porém com o passar dos anos, as taxas de divórcio diminuem para as famílias sem crianças com TEA e mantêm-se altas naquelas com filhos com esse transtorno do neuro desenvolvimento. Para os autores, os resultados são explicados no contexto de que a pressão inicial da parentalidade continua forte para casais de filhos com TEA, enquanto para o outro grupo de pais, aqueles que conseguem resistir à pressão inicial, organizam as suas demandas familiares. (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2010).

      Ainda segundo Costa e Antunes, as pesquisas mostram consistência, independentemente da direção ou abordagem adotada, ao indicar que os pais com crianças com o Transtorno do Espectro Autista apresentam alto nível de estresse, bem como outros problemas de saúde mental. As pesquisas também mostram que diagnósticos e intervenções precoces resultam em impactos familiares menores (JÚLIO-COSTA e ANTUNES, 2018).

      Balbi e Porto (2015) acrescentam que de acordo com estudo realizado nos Estados Unidos e publicado no Journal of Family Psychology, os pais de criança com Transtorno do Espectro Autista apresentaram 9,7% mais probabilidade de se divorciar do que outros pais.  O Transtorno do Espectro Autista apresenta várias maneiras de sobre-exceder o casamento, o diagnóstico da criança é aceito pelos pais de maneiras diferentes, levando a conflitos conjugais.

      Borges (2009) relata que o divórcio entre os pais de crianças com Transtorno do Espectro Autista é o fator mais impactante para a família, já que a criança com transtorno do Espectro Autista necessita está inserida em um ambiente tranquilo e favorável para o seu desenvolvimento. O autor ainda acrescenta que o TEA “pode causar afastamento do casal, podendo gerar possibilidade de um dos membros buscarem acolhimento em outra pessoa fora da relação do casal” (BORGES, 2009). Volkmar (2019) escreve que nos Estados Unidos é comum o divórcio entre casais com filhos portadores do Transtorno do Espectro Autista. Apesar disso, o autor aponta para a necessidade de  os pais manterem uma boa comunicação em função do filho, o que pode ser difícil quando o divórcio é doloroso (VOLKMAR e WIESENER, 2019). O autor acrescenta que as piores situações para a família que possui um membro com Transtorno do Espectro Autista surgem nesse contexto. 

      Costa (2012) acredita que o impacto do diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista na relação conjugal pode estar relacionado com o nível socioeconômico, como também ao nível de escolaridade de cada família.

      Adicionalmente, afirma que:

      As famílias de nível socioeconômico e escolaridade mais elevados têm uma relação mais coesa, tendo um efeito positivo favorecendo a união. À medida que o nível socioeconómico e de escolaridade diminuem, a capacidade de superar os problemas e até mesmo avaliar o impacto da deficiência na sua relação conjugal é menor.

      Rogers et al. (2015) afirma que tomar conta de uma criança com Transtorno do Espectro Autista resulta em ter menos tempo para a relação conjugal, já que as necessidades da criança com Transtorno do Espectro Autista vêm primeiro do que as do companheiro. Contudo, deixar o companheiro de lado pode levar a perda de um importante apoio social.

      Portanto, constata-se que toda a dinâmica familiar é fortemente alterada pelo diagnóstico, estresse e divórcio (BORGES, 2009). Esses fatores refletem no filho que apresenta Transtorno do Espectro Autista, pois, é preciso que o ambiente de um indivíduo portador do Transtorno do Espectro Autista seja favorável para o seu desenvolvimento e benéfico à sua saúde emocional (BORGES, 2009). 

      2.4 Irmãos e o impacto do TEA 

      Ter um irmão com Transtorno do Espectro Autista pode ser impactante na vida de um indivíduo com desenvolvimento típico. Esse impacto de ter um irmão com TEA pode levar as crianças a se questionarem se de alguma forma foram a causa do problema do irmão, podendo haver confusão quanto ao que causou o transtorno. Outras vezes, elas demonstram raiva ao perceber maior atenção da família em relação ao irmão com necessidades especiais.  Ainda assim, o autor afirma que alguns se sentem constrangidos em terem um irmão com Transtorno do Espectro Autista (VOLKMAR e WIESENER, 2019).

      Para Cezar e Smeha (2016), a relação entre irmãos com desenvolvimento típico e atípico se torna prejudicada quando apresentada a partir do contexto de um indivíduo com Transtorno do Espectro Autista.  A falta de comunicação e interação entre os irmãos é fato preocupante para os pais. 

      Pinto et al. (2016) esclarece que os filhos com transtorno do Espectro Autista são motivos de conflitos e ciúme para os demais irmãos. O autor afirma que esses conflitos comprometem muitas vezes, a relação afetiva entre todos os membros da família. O autor justifica que, os irmãos com desenvolvimento típico se sentem menos amados porque acreditam que os pais priorizam o irmão que possui um desenvolvimento atípico (Pinto et al., 2016). 

      Rogers et al. (2015) asseveram  que o impacto do Transtorno do Espectro Autista para os irmãos menores faz eles se sentirem mal, rejeitados ou não amados. O irmão não compreende por que motivo a criança com TEA não brinca e nem fala com ele. Por fim, os irmãos sentem-se preocupados e até consideram que o Transtorno do Espectro Autista seja algo contagioso (ROGERS et al., 2015).

      Araujo et al (2012), observaram que:

      […]muitos pais apresentaram uma grande dificuldade em prover uma vida normal também ao irmão sem deficiência. Muitos relataram comportamentos de ciúmes, uma vez em que o filho com autismo exige uma grande demanda de atenção. Outros relataram que embora reconheçam que o irmão sem deficiência busca de alguma forma ajudar nos cuidados gerais do irmão com autismo, é evidente que esse esforço gera um significativo nível de estresse nesse irmão.

      Entretanto, Araujo et al. (2012) relatam que os estudos feitos com irmãos tiveram poucas amostras, deixando evidente a necessidade de maior investigação sobre o perfil emocional dos irmãos com comportamento típico. 

      O impacto de se ter um irmão com Transtorno do Espectro Autista é mais uma das infinitas possibilidades de acontecimentos que podem resultar em modificações na dinâmica familiar (FELTRIN, 2OO7).

      É sabido que as crianças com Transtorno do Espectro Autista apresentam problemas relevantes relacionados à comunicação e a tudo que envolva aprendizagem social em todos os contextos (VOLKMAR e WIESENER, 2019). Contudo, a forma com que os pais enfrentam o diagnóstico de um filho com Transtorno do Espectro Autista terá o mesmo impacto em como os irmãos irão reagir. (VOLKMAR e WIESENER, 2019).

      CONSIDERAÇÕES FINAIS

      O estudo aqui apresentado teve como objetivo discutir, por meio de uma revisão de literatura, como o diagnóstico de um membro da família portador do Transtorno do Espectro Autista pode impactar na estrutura e na dinâmica de uma família.

      Observa-se que o Transtorno do Espectro Autista é algo complexo e desafiador, um assunto que há décadas vem sendo pesquisado. E, à medida que o tempo, passa novas mudanças e pesquisas a respeito do conceito e da compreensão vão surgindo. Entretanto, constata-se que, no que se refere a família e autismo as pesquisas ainda são escassas.

      A família e um indivíduo portador do Transtorno do Espectro Autista são permeados de sentimentos afetivos e emocionais que oscilam entre culpabilização, superproteção e estresse. Tais sentimentos obrigam a família a assumir novas mudanças diante da vida e da dinâmica familiar de todos os membros que residem sobre o mesmo teto. 

      Os estudos revisados apontaram que, no contexto familiar, o nascimento de um filho é algo indescritível para o casal, pois configura o momento em que surgem os melhores e mais diversos sentimentos associados à chegada do filho perfeito. Porém, quando é apresentado à família um diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista, ela expressa reações como: medo, raiva e negação, tentando, nesse momento, entender e assimilar um turbilhão de informações e a dor do luto pela perda de expectativa de um filho perfeito. 

      A partir do enfrentamento pela família do diagnóstico de um filho com TEA, foi possível observar na literatura, que a dinâmica familiar sofre mobilizações que vão desde o aspecto financeiro aos ajustes entre os outros irmãos que também são impactados pelo Transtorno do Espectro Autista. 

      A literatura aponta que, devido a demanda de cuidados com o filho, as mães são as mais afetadas pelo estresse nas famílias. Por muitas vezes, as mães precisam renunciar à vida profissional e pessoal para viver em função do filho com TEA, gerando um sentimento de solidão. 

       Alguns autores apontam que nos Estados Unidos é frequente o número de divórcio nas famílias em que há um membro com Transtorno do Espectro Autista. Contudo, o Rogers (2015), em seu livro Autismo compreender e agir em família  relata que, pesquisas baseadas em diversas famílias de crianças com Transtorno do Espectro Autista, desde a infância até a idade adulta, mostraram que não existe diferença nas taxas de divórcio de casais com e sem filhos com TEA.       

      Rogers (2015) afirma que:

      […]à medida em que as crianças atingiam a adolescência e a vida adulta, os casais com crianças acometidos pelo transtorno do espectro autista, tinham, de alguma forma, maior probabilidade em divorciar-se, mas não se sabe ao certo quais os motivos para isso.

      Em relação aos irmãos de portadores do Transtorno do Espectro Autista, os estudos demonstram divergências quanto aos resultados, destacando a necessidade de estudos que visem a uma  inves tigação mais aprofundada a fim de compreender melhor o impacto de ser ter um irmão com TEA.  De forma geral, não foi encontrando necessariamente fatores estressantes nos irmãos quando se existe uma relação familiar bem estruturada seguida de uma rede de apoio. Os estudos feitos com irmãos tiveram poucas amostras, deixando evidente a necessidade de maior investigação no perfil emocional (KIQUIO e GOMES, 2018).

      O conhecimento gerado diante das revisões de literatura, aqui apresentadas, foi de que as famílias sofrem impactos significativos com a presença de um filho com Transtorno do Espectro Autista.  Esse impacto afeta a família e a dinâmica familiar como um todo. Diante da gravidade do problema enfrentado ao receber o diagnóstico, bem como as necessidades de cuidados ao longo da vida, fica evidente a necessidade de um suporte social e psicológico, visando à saúde emocional para todos os membros da família e objetivando tornar o ambiente familiar harmônico e feliz.

      Por fim, ressalta-se que foram encontrados poucos artigos e pouca literatura relacionada ao tema abordado. Portanto, devido à relevância do impacto do diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista na família e na dinâmica familiar, recomenda-se que mais pesquisas com esse foco sejam realizadas na aérea. 

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      ¹Psicopedagoga, Neuropsicopedagoga, Esp. em Autismo PUC – RJ. Terapeuta familiar em Formação.
      ²Orientadora.