OS DESAFIOS DA MATERNIDADE NO SISTEMA PRISIONAL

THE CHALLENGES OF MATERNITY IN THE PRISON SYSTEM

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7226105


Autoria de:

Arianne de Oliveira Ponciano1
Emanoel Lourenço do Nascimento2


RESUMO

O presente artigo cientifico tem como temática os desafios da maternidade no sistema prisional com o objetivo de apresentar uma análise dos diversos aspectos da maternidade das detentas, levando em consideração a gravidez, o parto, os momentos de amamentação, da convivência mãe e filho nas prisões e o processo de separação. Ademais, a pesquisa teve como parâmetros a legislação brasileira e os tratados internacionais que garantem os direitos de diversos aspectos da maternidade no cárcere feminino, além de verificar o quanto as leis são colocadas em prática nesse contexto. No entanto, constatou-se que muito pouco do que é garantido por lei, é de fato praticado nos ambientes prisionais. Dessa forma, o artigo buscou abordar os pontos mais críticos do sistema prisional e quais propostas essenciais para melhorá-lo. O estudo através da pesquisa bibliográfica e exploratória por meio do banco de dados do Google Acadêmico, Scielo e CAPES, permitiu que observássemos a vivência da maternidade no cárcere e seus efeitos negativos nas gestantes e seus fetos, bem como nas crianças após o parto. 

Palavras-chave: Cárcere. Mulheres. Maternidade. Desafios. Filhos

ABSTRACT

The present scientific article has as the challenges of motherhood in the prison system with the study of presenting an analysis of the various aspects of motherhood of childbirth attempts, taking into account pregnancy, childbirth, the moments of purpose thought, of coexistence and child in children. and the separation process. In addition, maternity as parameters Brazilian legislation and the investigation had to guarantee the rights of various aspects of the regulation in the crankcase, in addition to verifying what laws are in question in practice in this context. However, it was known that very little of what is guaranteed by law is actually in the environments. Thus, the article sought to address the most critical points of the prison system and which are essential to improve it. The study of the bibliographic and exploratory research of the Google Scholar Scielo and CAPES database of maternity, through children, which we observed after birth of its effects on pregnancy and fetuses.

Keywords: Prison. Women. Maternity. Challenges. Sons.

1. INTRODUÇÃO

A gravidez é considerado um dos momentos mais especiais da vida de uma mulher, no entanto, também é um momento que exige muita cautela com a saúde. Quando o ambiente prisional e a gravidez se encontram, as mulheres passam pelo desafio de uma maternidade vulnerável e suas necessidades e particularidades necessitam de cuidados especiais durante esse processo. Diante disso, considerando o aumento do número de mulheres nos presídios brasileiros, questões relacionadas à saúde da gestante começam a fazer parte das políticas públicas do país.

O cárcere brasileiro é um assunto bastante debatidos nas últimas décadas em decorrências do seu aumento significativo, alguns dos assuntos mais abordados são pertinentes da superlotação nas unidades prisionais e a situação precária que vivem os detentos. Nesse contexto, é essencial a atenção especial dada às mulheres, em especial as gestantes privadas de liberdade que são esquecidas pelo Poder público e pela sociedade.

Atualmente, detentas em processo de maternidade tem sido alvo de diversas violações, levando em consideração os parâmetros dos direitos humanos, como por exemplo, pela reclusão da mãe para redenção de seus delitos como consequência desfavorável para o desenvolvimento do seu filho, pela falta de estruturas assistenciais adequadas, falta de acolhimento e proteção, falta de interação familiar e social, fatores resultantes  de problemas psicológicos e pensamentos negativos (PEREIRA; SANTANA; MAIA, 2020).

Inicialmente, o encarceramento feminino será observado em um contexto histórico, mostrando a cultura do crime relacionado ao gênero e dados que mostram o crescimento da criminalidade feminina. Posteriormente, serão então observados ​​os dispositivos que asseguraram a assistência humanitária necessária durante a gravidez e os impasses enfrentado durante a maternidade em cárcere.

Ademais, durante o estudo as unidades prisionais femininas devem ser analisadas de forma diferente das masculinas, visto que as condições das mulheres se divergem das dos homens, principalmente em questões reprodutivas. A vida no ambiente prisional já é difícil e precária para todas as mulheres, e quando se trata de maternidade a situação é ainda pior, devido à falta de estrutura gestacional envolvendo a equipe médica profissional e os demais problemas a serem enfrentados.

Assim, este trabalho tem como objetivo analisar a distância existente entre as previsões normativas (como deveria ser) e a realidade das prisões brasileiras (como ela é), e a forma como o Estado trata as detentas grávidas e lactantes. Ao mesmo tempo, buscará apresentar os principais direitos fundamentais da mulher em fase de amamentação; discutir a situação das grávidas e mães brasileiras no cárcere e a situação das “crianças encarceradas”

2. CONTEXTUALIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO FEMININO

Desde os primórdios da colonização as mulheres também são encarceradas, no entanto, representavam apenas a porcentagem mais baixa da população carcerária em comparação com os homens. Nesse contexto, não havia necessidade da divisão das unidades prisionais por gênero, devido a quantidade quase que não significativa de detentas, portanto, homens e mulheres dividiam o mesmo ambiente, situação que ocasionou diversos relatos de abusos sexuais, questões de custódia, distúrbios de promiscuidade, etc. E foi somente por voltado do século XIX, que passaram a buscar soluções para resolver a precariedade do sistema brasileiro com relação as mulheres.

Historicamente, o sistema prisional tem sido dominado por homens, porém, de acordo com os levantamentos de dados estudados, a população feminina atingiu um número considerável no sistema prisional, e diferentemente dos homens, possuem características especiais, principalmente em termos de diferenças e desigualdades de gênero que requerem tratamento diferenciado.

Segundo Julita Lemgruber (1999), a ligação entre a mulher e o crime envolve múltiplas dimensões, principalmente diferenças socioculturais e biológicas. À luz disso, os autora observa que à medida que a lacuna socioeconômica entre os sexos diminui, há um aumento correspondente nas taxas de criminalidade feminina.

No Brasil, desde o século XIX, surgiram as prisões compostas por celas individuais, oficinas de trabalho e estruturas para cumprimento de pena (MACHADO, SOUZA e SOUZA, 2013). E, em 1890, o Código Penal passou por uma grande mudança, abolindo a pena de prisão perpétua, limitando a pena de restrição da liberdade a uma pena máxima de 30 anos, assim como estabeleceu a pena de prisão, ação disciplinar e prisão com trabalho obrigatório.

Em meados das décadas de 1930 e 1940, foram criadas prisões femininas em decorrência do aumento do encarceramento de mulheres no Brasil. Assim, em 1937, foi criada o Reformatório de Mulheres Criminosas, que algum tempo depois passou a se chamar Instituto Feminino de Readaptação Social na cidade de Porto Alegre, RS (CURY, MENEGAZ, 2017).

Nesse contexto, seguindo as medidas tomadas por meio da política penal, no que diz respeito à implementação de um sistema mais igualitário no território nacional, o novo código penal foi promulgado em 1940 e trouxe em seu inciso 2º, do artigo 29 uma importante novidade que estabelece a separação física de homens e mulheres nas penitenciaria brasileira.

Art. 29. 2 § As mulheres cumprem pena em estabelecimento especial, ou, à falta, em secção adequada da penitenciária ou prisão comum, ficando sujeita a trabalho interno.

Em São Paulo, no ano de 1941, foi instituído o Decreto-Lei n.º 12.116, que dispõe sobre a criação do Presídio de Mulheres, o qual foi inaugurado em 21 de abril de 1942 até 1973 com apenas sete detentas em uma casa assumindo trabalhos domésticos (SOARES E ILGENFRITZ, 2002).

Vale ressaltar que os projetos de criação de instituições penais para mulheres foram falhos, visto que foram criados por homens de elite associados às crenças tradicionais da época, esses projetos ignoravam todas as condições especiais que as mulheres precisavam, então acabaram se estruturando como uma prisão masculina (OLIVEIRA, 2008). 

Atualmente, as prisões femininas construídas em torno das necessidades das mulheres ainda são muito raras, pois a grande maioria dos espaços existentes são remodelados e aparentemente não oferecem condições dignas, expondo assim graves violações dos direitos humanos fundamentais e garantias constitucionais. (BILIBIO et al, 2016).

Em média são 5,8% de mulheres presas de 94,2% de homens no Brasil. Apesar do aumento acentuado nas taxas de criminalidade feminina, as mulheres continuam a cometer relativamente poucos crimes em comparação com os homens, de acordo com os dados (BRASIL, 2014a, p. 39).

Além disso, 68% da população carcerária feminina é responsável por crimes de tráfico de drogas (BRASIL, 2014b, p. 5). A maioria deles não representa uma ameaça real para a sociedade porque, quando estão detidas, observa-se que desempenham tarefas não muito importantes, como transportar drogas ou distribuí-las em pequenas quantidades no contexto dos crimes mencionados (CONSÓRCIO INTERNACIONAL SOBRE POLÍTICAS DE DROGAS, 2016, p. 4).

Vale ressaltar que a motivação para os crimes de tráfico de drogas geralmente é obter apoio para familiares/dependentes com o incentivo do namorado/companheiro/marido ou de outros familiares (CONSÓRCIO INTERNACIONAL SOBRE POLÍTICAS DE DROGAS, 2016, p. 4).

Em relação às mães presas, foram feitas alterações no Código de Processo Penal em 2016, lideradas pela Lei nº 13.257, mais especificamente o artigo 318. Nesse sentido, os juízes podem substituir a prisão preventiva pela prisão domiciliar de gestantes e mulheres com filhos até 12 anos. Claramente, esses direitos raramente são garantidos. As reportagens da mídia, embora muitas vezes exageradas, sugerem que não é incomum que os filhos de muitas mulheres grávidas sejam algemados e que os partos ocorram por conta própria dentro da prisão com a ajuda de outros presas ou agentes penitenciários.

Em alguns casos, as mulheres têm o direito de ficar com seus filhos em enfermarias específicas dentro da prisão durante os primeiros meses de vida. No entanto, esta não é a realidade mais comum. Vale ressaltar que, mesmo em ambientes prisionais, existem políticas públicas de acolhimento que visam resguardar o direito ao vínculo afetivo entre mãe e filho. 

3. MATERNIDADE NO SISTEMA PRISIONAL

3.1. CÁRCERE FEMININO

No Brasil, até a década de 1940, o ordenamento jurídico não previa nada referente as prisões femininas, de modo que o cárcere eram realizados em celas, salas ou subdivisões diferentes das prisões masculinas, porém, essa distinção não eram uma regra, dando as autoridades o poder de definir a separação de homens e mulheres. No entanto, em 1940, a Lei nº 2.848, que definiu o Código Penal, previa que as mulheres deveriam ser mantidas em prisões separadas dos homens, ou seja, era previsto um local específico para elas.

Um marco muito importante foi a Lei nº 11.942, de 27 de maio de 2009, que visa garantir condições mínimas para as mães privadas de liberdade e seus filhos, incluindo pelo menos seis meses de amamentação, e seção para grávidas e puérperas.

Ademais, está presente na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso L, onde assegura que as mulheres privadas de liberdade possam conviver com seus filhos durante a amamentação. Defender os direitos e garantias das gestantes e seus filhos dentro do sistema prisional, como argumentos, em razão da saúde de ambas as partes, enquanto a justificativa de atuação pautada em princípios holísticos depende da proteção estatal, que deve ser dada ao máximo prioridade para assegurar a saúde, a vida e a dignidade corretas.

Com base nos dados apresentados no INFOPEN MULHERES (2018), pode-se notar que a maioria das residentes no sistema prisional feminino são solteiras, negras, mulheres jovens, com baixa escolaridade, têm filhos, e em sua maioria, sem condenação e que praticaram crimes de menor potencial ofensivo. 

Segundo a autora Nana Queiroz (2015) em seu livro “Presos que Menstruam”, após entrevistar cerca de 100 detentas, observou que a realidade dos presídios femininos é brutal. Os problemas enfrentados incluem falta de produtos básicos de higiene, violência por parte de agentes penitenciários, comida estragada no refeitório, dificuldades para visitar os casais, além da falta de dormitórios para gestantes e pré-natal, creches e berçários. Tal situação de insalubridade torna não somente a vida de uma gestante, mas também do bebê como inviável.

3.2. MATERNIDADE DE MULHERES ENCARCERADAS

Em decorrência do considerável aumento do número de detentas no sistema prisional, as graves violações dos direitos das mulheres grávidas presas e de seus filhos nascidos no cárcere têm recebido notoriedade, bem como em virtude de  recomendações  internacionais, sobre  direitos  humanos  das  mulheres,  das  crianças  e  sobre  direitos  reprodutivos (VENTURA; SIMAS; LAROUZÉ, 2015).

No Brasil, o Ministério da Saúde e da Justiça estabeleceu diretrizes sobre prevenção e atendimento às pessoas privadas de liberdade, prestadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) por meio do Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário (PNSSP), substituído pela Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema  Prisional (PNAISP) de  2014. Embora o PNSSP seja considerado um grande avanço na área da saúde, questões relacionadas à saúde da gestante raramente são discutidas no sistema prisional. Dessa forma, a atenção e o cuidado com a assistência às gestantes ou puérperas são inadequados, vendo-se como uma violação de seus direitos no sistema prisional (MATÃO et al., 2016).

A relação entre mãe e filho estabelecida durante a gravidez constitui um assunto amplo e singular com implicações relevantes no campo jurídico em decorrência de uma série de questões delicadas, como (a) o direito à vida e à saúde do filho que vai nascer, encontra-se abalado pelo ato da genitora. Dessa forma, discutir a gravidez na prisão é lidar com uma violação dos direitos fundamentais garantidos às mulheres grávidas. Fica claro que, dessa forma, não são respeitados os princípios da dignidade humana, especialmente a humanidade da pena.

A pesquisa que tem como foco a saúde das gestantes encarceradas parte da premissa de que o ambiente prisional impacta na qualidade de vida das detentas – porque o sistema prisional é insalubre, estão em situação prejudicial – e que a saúde da gestante também afeta diretamente seu bem-estar enquanto cumpre sua pena. Afinal, as gestantes já vivenciam as mudanças biopsicossociais inerentes à gravidez que são exacerbadas pelo cárcere, muitas vezes de forma negativa.

A pesquisa que tem como foco a saúde das gestantes encarceradas parte da premissa de que o ambiente prisional impacta na qualidade de vida das detentas — porque o sistema prisional é insalubre, e estão em situação prejudicial — e que a saúde da gestante também afeta diretamente seu bem-estar enquanto cumpre sua pena. Afinal, as gestantes já vivenciam as mudanças biopsicossociais inerentes à gravidez que são exacerbadas pelo cárcere, muitas vezes de forma negativa. (MELLO, 2011). 

Com isso em mente, Braga (2015a) defende que em razão das repetidas violações dos direitos representados pela privação de liberdade, aliadas às mudanças que a gravidez traz, toda gravidez vivenciada na prisão deve ser considerada uma gravidez de risco.

É importante ressaltar que os presídios nacionais são caracterizados por condições ambientais precárias, agravando ainda mais os problemas de saúde de toda a população carcerária, com atendimento muitas vezes inadequado e difícil andamento dos processos judiciais. Diante de todas essas questões, as gestantes e lactantes se preocupam com as demandas da gravidez, violações de direitos durante o parto, persistência (ou não permanência), além da maior necessidade de apoio psicológico e social para as crianças na prisão.

O Cadastro Nacional de Presas Grávidas e Lactantes, criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), apurou em seu último levantamento que 622 presidiárias no Brasil estavam grávidas ou amamentando. A maioria está no estado de São Paulo, onde há 235 mulheres, sendo 139 grávidas e 94 amamentando (CNJ, 2018).

O gráfico abaixo demonstra a quantidade de detentas grávidas ou lactantes por estado:

Fonte: CNJ (2018)

De acordo com a legislação brasileira, gestantes ou lactantes devem ter acesso a atendimento e acompanhamento médico especializado, além de espaço adequado e reservado para estar e conviver com seus filhos. De acordo com as visitas do CNJ (2018) às prisões e os serviços médicos continuam precários, sendo mais um exemplo de violação dos direitos garantidos por lei das presas grávidas e lactantes.

3.2.1. Proteção integral a criança ao direito a convivência familiar

Para os recém-nascidos, ter a oportunidade de estar com a mãe após o nascimento significa uma espécie de conforto psicológico que os ajuda a enfrentar a transição do estado intrauterino para a vida fora do corpo materno. A aproximação física ajudará a ocorrência da amamentação, trazendo incontáveis benefícios físicos e colaborando para o fortalecimento do vínculo mãe-bebê (VIEIRA; VERONESE, 2015, p. 213). Ademais, é importante salientar a importância do aleitamento materno para a prevenção de infecções e prevenção do desenvolvimento de doenças imunológicas e crônicas (JACOB, 2010, p. 12).

Já no cenário prisional, encontram-se as “Regras de Bangkok”, estabelecendo na Regra 49 que “Crianças vivendo com suas mães na prisão jamais serão tratadas como presas”, respeitando – teoricamente – a não transcendência da pena (BRASIL, 2016a, p. 33)

No âmbito da legislação interna, o artigo 83, § 2º, da Lei de Execução Penal, também alterada pela Lei nº 11.942/09, garante que as instituições penais femininas sejam obrigadas a ter creches, “[…] onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até seis meses de idade”

Conforme mencionado, o artigo 89 da “Lei de Execução” estipula que, além das creches, as instituições correcionais para mulheres também devem ser equipadas com “[…] de creche para abrigar as crianças maiores de seis meses e menores de sete anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa”. No entanto, as informações coletadas do último INFOPEN Mulheres mostraram que somente 32% das unidades penitenciarias femininas possuem creche, em comparação com apenas 3% das unidades mistas. Em se tratando de creche, apenas 5% das instituições femininas possuem creche; nenhuma está cadastrada para instalar em unidade mista (BRASIL, 2014b, p. 19).

A Resolução 3/2009 recomenda que a manutenção dos vínculos maternos seja priorizada em todas as circunstâncias e que a criança tenha a garantia de viver com a mãe por pelo menos um ano e seis meses. Após esse período, deve ser iniciado um processo de separação gradual, que pode durar até seis meses.

Quando descartada as hipóteses da concessão da prisão domiciliar e da criança ficar com sua mãe no ambiente intramuros, ela poderá permanecer com sua família natural, quais sejam pai e irmãos (artigo 25, Estatuto da Criança e do Adolescente). Em caso de negativa, a criança será enviada a algum integrante da família “[…] formada por parentes próximos com os quais a criança convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade” (artigo 25, parágrafo único, Estatuto da Criança e do Adolescente).

No entanto, as garantias previstas na lei claramente não correspondem à realidade. Para Vieira e Veronese (2015, p. 188), o problema não é o âmbito formal, mas o que está acontecendo no sistema prisional brasileiro. Como resultado, a maioria das instituições não possui creches e berçários, obrigando as crianças a ocuparem espaços indignos e insalubres.

3.2.2. Violação dos direitos da gravidez 

As prisões são tradicionalmente vistas como um ambiente perigoso, desamparado, privado de liberdade, instável, superlotado, insalubre, celas apertadas e desrespeitosos aos direitos individuais dos encarcerados. Pensando nisso, Santos e Bispo (2018) mencionaram em seu estudo que o ambiente prisional, por sua heterogeneidade, apresenta muitos riscos, principalmente riscos físicos e psicológicos, principalmente a transmissão de doenças infecciosas, aumentando assim a vulnerabilidade materna e infantil.

Para corroborar essa evidência, França e Silva (2015) também relatam que o ambiente prisional apresenta múltiplos riscos, como a disseminação de doenças infecciosas. Porque nos presídios, onde há um aumento acentuado da vulnerabilidade à infecção, a morbimortalidade tem aumentado, atribuída às precárias condições físicas dos presídios e presídios, vagas de emprego e encarceramento.

Estudos têm demonstrado que o isolamento da mulher durante a gravidez e o puerpério exacerba alguns dos efeitos negativos. Nesse aspecto, é referido que na prisão, para além de estar na prisão, existem emoções como a solidão e a saudade devido à distância familiar, o que também pode levar ao desamparo na oferta de alimentos, falta de tranquilidade e privacidade, interferência no sono e descanso (FOCHI et al., 2017).

O acompanhamento da saúde, ou a falta dele, durante a gravidez pode predispor as gestantes a preocupações persistentes com sua própria saúde e a de seus bebês, como ansiedade em relação ao parto e medo de desenvolver certas complicações durante a gravidez. (MATÃO, 2016)

De acordo com Chaves e Araújo (2020), muitas vezes as gestantes são algemadas durante o transporte das instituições para os hospitais e durante o parto, tornando o momento do parto um evento doloroso, humilhante e traumático. Além disso, essa abordagem destaca a separação imediata entre mãe e filho, que ocorre 24 horas após o nascimento da criança. Como atesta a análise, tais eventos chocam psicologicamente mães e bebês, causando problemas emocionais e até mesmo males físicos, tornando-se um fator extremamente perturbador no binômio mãe-bebê.

Um dos principais motivos que colocam em risco as relações binomiais é a falta de estruturas nos ambientes prisionais para acolher as puérperas e seus recém-nascidos. Um ambiente mal planejado não favorece o aleitamento materno exclusivo, nem favorece o desenvolvimento normal da criança. Locais improvisados, cercados por celas e grades, causam ansiedade e medo nas crianças, sendo esta uma das razões pelas quais as mães desistem de ficar com os filhos. Portanto, a reconstrução do ambiente prisional mostrou-se um fator importante na construção da relação familiar mãe-filho (ANDRADE; GONÇALVES, 2018).

4. CONSIDERÇÕES FINAIS

O presente estudo teve por objeto analisar a maternidade no sistema carcerário brasileiro e os desafios enfrentados pelas mulheres no ambiente prisional durante a maternidade, fazendo principalmente uma análise em relação aos direitos constitucionais e garantias legais das presas gestantes e seus (suas) filhos (filhas). Ademais, através da pesquisa bibliográfica foi possível conhecer como é a vivência de gestantes e puérperas encarceradas. Todavia, com base nos resultados e discussões apresentadas, é essencial a implementação de intervenções necessárias para atender de forma humanizada mulheres que, refém da justiça, encontram-se em condições inadequadas no cárcere, que é considerado um ambiente insalubre e precário para viver honestamente durante o gestar e o puerpério com o bebê

Como resultado, o estudo sobre crimes praticados por mulheres também revelou a história do encarceramento feminino. Posteriormente, foram analisadas as condições de vida dessas mulheres no ambiente prisional.

É evidente a dificuldade em acessar as garantias dispostas na legislação desde o período gestacional até o momento que a criança deverá se desligar da sua genitora e passará a viver no ambiente extramuros.

A maioria dos presídios femininos não possuem creches e berçários estruturados para receber bebês, deixando-os em celas superlotadas, com a falta de higiene, exposição a doenças e falta de estrutura, ou seja, falta das condições mínimas necessárias para uma existência digna, portanto, é uma ação violadora dos princípios da proteção integral e da dignidade humana.

Diante do exposto, algumas ações tornaram-se urgentes. Nessa perspectiva, políticas públicas sociais devem ser desenvolvidas para reduzir o envolvimento das mulheres no tráfico de drogas, pois é o crime mais comum praticado por elas que elas; a legislação pertinente deve ser revisada para garantir necessidades específicas de gênero e buscar alternativas ao encarceramento para gestantes, mães ou responsáveis por infantes, como a aplicação de medida cautelar de prisão domiciliar. Além da efetivação dos direitos e garantias citados nesse artigo, não se restringindo apenas ao plano normativo. 

Portanto, a manutenção dos laços familiares é de suma relevância para que os prejuízos do cárcere sejam amenizados, enquanto outras medidas – como o desencarceramento de mulheres – parecem inalcançáveis.

REFERÊNCIAS

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1Acadêmica de Direito pela Faculdade Interamericana de Porto Velho-UNIRON.

2Prof. Orientador Emanuel Lourenço do Nascimento, Professor de Direito. Especialista em Segurança Publica e Direito Humano, Especialista em Docência no Ensino Superior,  e especialista MBA em Planejamento Estratégico no Setor Público.