ANALYSIS ABOUT THE POSSIBILITY OF THE WIFE’S RETURN TO THE SINGLE NAME STILL IN THE CONSTANCE OF MARRIAGE
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7108331
Autoria de:
Anne Caroline Laureano de Oliveira1
Jeniffer Danielly Silva de Oliveira2
Osmar Coimbra Rocha3
1Bacharelanda no curso de graduação em Direito da FASF
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Alto São Francisco, anne.laureano26@gmail.com
2Bacharelanda no curso de graduação em Direito da FASF
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Alto São Francisco, daniellyjenny3@gmail.com
3Bacharelando no curso de graduação em Direito da FASF
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Alto São Francisco, osmarcoimbrarocha10@gmail.com
Resumo: O estudo tem como objetivo analisar a possibilidade de restabelecimento do nome de solteira da esposa durante a constância do casamento de acordo com a Constituição Federal de 1988, com foco nos princípios da dignidade da pessoa humana, direitos da personalidade e segurança jurídica. Para tanto, o direito ao nome será tratado como aspecto do direito à personalidade em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana. Em seguida, conhecer o instituto do casamento e sua evolução no direito de família, principalmente no que diz respeito ao direito ao nome, e por fim demonstrar a possibilidade de que o sobrenome ainda possa ser devolvido ao nome de solteira durante o casamento, bem como as opiniões dos juristas e doutrinadores correlacionadas as decisões dos tribunais. A utilização de ferramentas teóricas será utilizada como metodologia, visto que o assunto está muito distante do âmbito prático.
Palavras-chave: Direito de personalidade. Direito ao nome. Casamento. Solteira. Dignidade humana.
Abstract: The study aims to analyze the possibility of restoring the wife’s maiden name during the constancy of marriage according to the Federal Constitution of 1988, focusing on the principles of human dignity, personality rights and legal certainty. To this end, the right to a name will be treated as an aspect of the right to personality in line with the principle of human dignity. Then, to know the institute of marriage and its evolution in family law, especially with regard to the right to the name, and finally to demonstrate the possibility that the surname can still be returned to the maiden name during marriage, as well as the opinions of jurists and scholars correlated with court decisions. The use of theoretical tools will be used as a methodology, since the subject is very far from the practical scope.
Keywords: Personality law. Right to name. Wedding. Single. Human dignity.
1 INTRODUÇÃO
O casamento tem ampla experiência no cotidiano brasileiro, pois continua sendo uma ferramenta amplamente utilizada para a formação da família, cujo processo se inicia com a habilitação das partes por meio de análise documental e publicação pela mídia local ou mural do cartório.
Portanto, a formação formal do casamento será realizada por juiz de paz na presença de quatro testemunhas.
Sabe-se que, por questões culturais, mais mulheres incluem o sobrenome do cônjuge, e o contrário é mais esporádico. Possíveis explicações podem ser listadas no Antigo Código Civil de 1916 e no Estatuto da Mulher Casada, onde mencionavam que era obrigatório que as mulheres acrescentassem um sobrenome.
Atualmente, de acordo com o Código Civil de 2002, ambos os cônjuges podem acrescentar o sobrenome do cônjuge ao seu nome. Além disso, há também o entendimento de permitir a supressão do sobrenome, mas com a ressalva da preservação de algum sobrenome familiar para não descaracterizar sua respectiva árvore genealógica.
Portanto, o artigo 1.571, § 2º, do Código Civil de 2002 apenas dispõe que homem ou mulher podem voltar ao nome de solteira em caso de divórcio.
De outro lado, tem-se em caso excepcional em que uma mulher deseja restaurar o nome de solteira durante o casamento, mas não tem intenção de divórcio, o legislador é negligente neste caso.
Embora este seja um comportamento opcional para o casal, é sabido que o sobrenome do cônjuge permanece culturalmente, especialmente no domínio feminino.
Além disso, no caso de viuvez, o nome de solteira foi restabelecido, e de acordo com decisão do STJ de 2018, o CNJ estipulou o seguinte artigo 82, de 3 de julho de 2019, que pode realizar correções administrativas na respectiva RCPN registros no país.
Então, em decisão do STJ de 2021, trata-se da possibilidade de restabelecer o nome de solteira, no qual a cônjuge ainda estaria na constância do casamento, em casos excepcionais.
A par disso, serão analisados o direito ao nome enquanto direito da personalidade, com ênfase ao princípio da dignidade humana, de modo que, após serão abordados os aspectos do instituto do casamento e os elementos jurídicos pertinentes e, por fim, demonstrar a possibilidade de retorno ao nome de solteira durante a constância do casamento.
Ao final, por intermédio da conclusão, enfatiza-se os principais elementos tratados durante à pesquisa acadêmica e demonstra-se a possibilidade de retorno ao nome de solteira mesmo a esposa continuando casada.
2 DIREITO AO NOME ENQUANTO DIREITO DA PERSONALIDADE FACE AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Cediço que os nomes são os elementos identificadores mais antigos e eficazes na sociedade, uma vez que, partindo dessa premissa é possível identificar pessoas de todas as civilizações de forma individualizada.
Desse modo, é possível distinguir uma pessoa da outra desde os termos mais remotos, inicialmente usando um primeiro nome e um sobrenome para se referir ao local onde morava, sua família, nome do pai ou mesmo de uma pessoa.
2.1 Do direito ao nome como um direito da personalidade
Verifica-se que os direitos de personalidade são conceituados como direitos de que objetos são propriedades físicas com aspectos psicológicos e morais da pessoa humana em si mesmo e em suas projeções sociais.
A ideia que norteia a disciplina dos direitos da personalidade é a esfera além da hereditária do indivíduo, em que a pessoa tem a reconhecida proteção do ordenamento jurídico, uma série indeterminada de valores como a vida, integridade física, intimidade, honra, dentre outros.
Como direitos inerentes a pessoa humana, em suas projeções físicas, espirituais e morais, os direitos da personalidade são dotados de certas características, que lhes conferem uma posição ímpar no cenário dos direitos privados.
Os direitos de personalidade possuem como características: Absoluto: oponibilidade erga omnes, irradiando influências em todas as esferas e dando o dever coletivo de respeitá-las; Gerais ou necessários: concedidos a todos, simplesmente porque existem; Extrapatrimoniais: não há conteúdo legado direto que possa ser mensurado objetivamente, mesmo que o dano tenha impacto econômico; Indisponível: Mesmo a própria vontade do indivíduo não pode alterar o titular dos direitos; Impenhoráveis: Os direitos morais nunca podem ser prometidos porque estão fora da mesa e inalcançáveis; Imprescritíveis: não há prazo para seu exercício e não se extinguirão por não uso e Vitalício: Acompanha a pessoa humana desde sua primeira aparição em vida até sua morte. (GAGLIANO; FILHO, 2017).
Pode-se categorizar os direitos da personalidade em decorrência do corpo/mente/espírito, de modo que, é possível classificar os direitos da personalidade de acordo com a sua proteção, sendo a vida, bem como a integridade física, moral e mental, inclusive criatividade intelectual.
Nessa esteira, considerando que a temática do presente trabalho o é quanto a possibilidade de alteração do nome de casada para o de solteira durante a constância do casamento, passa a demonstrar o direito ao nome enquanto direito de personalidade.
O direito de personalidade busca proteger a integridade moral, mais precisamente o direito a honra, imagem e identidade pessoal do indivíduo, de modo que, a honra é um dos direitos mais importantes da personalidade e acompanha o indivíduo desde o nascimento até o nascimento após sua morte.
Consiste em um conceito avaliativo que pode se manifestar de duas formas: honra objetiva (correspondente a reputação da pessoa, incluindo seu bom nome e sua reputação na sociedade); e honra subjetiva (corresponde ao senso de respeito de um indivíduo ou consciência de sua própria dignidade).
Este é também o direito de personalidade elevado às condições de liberdade pública, conforme expresso no Art. X. 5º da CF/88 (X – Intimidade, Vida Privada, Honra e imagem humana, assegurando o direito à indenização por danos materiais ou morais decorrentes de sua inadimplência).
A par disso, tem-se que o direito ao nome é um ramo do direito de personalidade, sendo direito subjetivo e intrínseco do ser humano, sendo que atualmente, o direito ao nome, como um dos desdobramentos do direito da personalidade, está fundamentado na Constituição Federal e tem como principio a dignidade da pessoa humana.
Além disso, a Lei nº 6.015/73, conhecida como Lei de Registros Públicos, e o Código Civil de 2022 também amparam esse direito.
Destaca-se que os nomes civis geralmente seguem o princípio da imutabilidade, ou seja, não pode ser alterado, exceto em circunstâncias especiais uma vez que a alteração se dá em casos de necessidade comprovada e, não pelo fato que o nome talvez não agrade a pessoa portadora daquela identificação, ou seja, desde que justificado.
Entretanto, quanto a imutabilidade do nome possui exceções, sendo elas: nomes absurdos, apelidos públicos notórios, mal-entendidos no registro civil, erros ortográficos, homófonos, nomes estrangeiros, nomes fora do registro civil, alterações por leis de proteção a vítimas e testemunhas, nomes de sócios emocionais, nomes de pessoas trans e adoção. (GONÇALVES, 2016).
E mais, o nome poderá sofrer alteração quando instituído o casamento ou a união estável, logo, poderá, também, alterar quando da realização do divórcio ou dissolução da união estável. (GONÇALVES, 2016).
Nesse mesmo sentido, disciplina Dias, senão vejamos:
É possível também mudar o nome por ocasião do casamento, sendo facultado a qualquer dos noivos adotarem o nome do outro. Na situação da mudança em virtude do casamento, leva-se em consideração o valor da identificação da família, que é considerada a base da sociedade. Admissível é também a adoção do nome do companheiro na união estável, assim como também se permite mudar o nome no momento que ocorre a separação ou divórcio do casal, restando ao livre arbítrio de quem mudou o nome ao casar-se retornar ou não ao nome que possuía antes do casamento. Assim como é possível para o divorciado excluir o nome que adotou do seu cônjuge em virtude do casamento, também é possível ao viúvo excluir do seu nome o sobrenome do falecido, pois não mais existe a condição de casado que o nome simbolizava. Para a exclusão, basta singelamente a manifestação de tal desejo, sendo desnecessário declinar os motivos, pois se trata do exercício de um direito, porém a tendência é ainda exigir a identificação de causas e o reconhecimento dos motivos como relevantes porque ainda predomina o entendimento que a supressão só é possível no caso de novo casamento ou por outro motivo justificado. (DIAS, 2013, p.147).
De lado a lado, verifica-se que a personalidade é um atributo do ser humano com o qual decorre o direito ao nome, com o qual está inseparavelmente ligada a personalidade, pois, terá como durabilidade a vida, ao passo que, enquanto a pessoa viver, ela será dotada de individualidade.
2.2 Da dignidade humana enquanto pilar dos direitos da personalidade
É sabido que os princípios constitucionais se constituem como as entrelinhas das normas jurídicas, ou seja, são elementos norteadores precípuos, sendo imprescindíveis à configuração do Estado Democrático de Direito. Nesse mesmo contexto, também se salienta que os princípios são denominados “mandados de otimização”, podendo efetivar diferentes graus e possibilidades jurídicas:
Princípios são, por conseguinte, mandados de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. “O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes”. (ALEXY, 2008, p. 90)
Em caráter complementar, disserta Silva que os princípios se constituem como exemplo, traçando a conduta que deve ser seguida em toda e qualquer operação jurídica, sendo o ponto de partida essencial ao contexto vivenciado pelo operador do Direito:
No sentido, notadamente no plural, significa que as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixam para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. Desse modo, exprimem sentido mais relevante que o da própria norma ou regra jurídica. Mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-as em perfeitos axiomas. Princípios jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito. Indicam o alicerce do Direito. (SILVA, 2005, p. 49, grifo nosso).
Em consonância à temática exposta e tendo em vista a existência de inúmeros princípios constitucionais que possam ser aplicáveis no âmbito do Direito de Família, destaca-se o princípio da dignidade humana, da igualdade e da afetividade. (ALMEIDA, JÚNIOR,2012).
A par disso, compreende-se, de antemão, que o princípio da dignidade humana ocupa uma posição privilegiada no contexto constitucional, haja vista que o mesmo se constitui como fundamento da República Federativa do Brasil (artigo 1º, inciso III, CRFB/88), sendo um imperativo máximo de justiça social.
Sob esse mesmo contexto, pode-se aduzir que a dignidade humana abarca não apenas o fator “dignidade”, mas todos os direitos e garantias fundamentais aos indivíduos, para que possam viver de maneira mais equilibrada e justa no âmbito social. Ademais, a dignidade humana abarca um conjunto de valores que são incorporados ao patrimônio humano:
Esse vetor agrega em torno de si a unanimidade dos direitos e garantias fundamentais do homem, expressos na Constituição de 1988. Quando o Texto Maior proclama a dignidade da pessoa humana, está consagrando um imperativo de justiça social, um valor constitucional supremo. Por isso, o primado consubstancia o espaço de integridade moral do ser humano, independentemente de credo, raça, cor, origem ou status social. O conteúdo do vetor é amplo e pujante, envolvendo valores espirituais e materiais. Seu acatamento representa a vitória contra a intolerância, o preconceito, a exclusão social, a ignorância e a opressão. A dignidade humana reflete, portanto, um conjunto de valores civilizatórios incorporados ao patrimônio do homem. (BULOS,2011, p. 502)
Em razão de o princípio da dignidade humana exercer um papel tão importante no campo jurídico e social hodierno, compreende-se que sua efetividade se encontra a cargo do Estado, sendo este o maior responsável pela satisfação de direitos fundamentais em prol dos administrados.
Nesse sentido, leciona Sarlet:
Verifica-se, portanto, que também nesta perspectiva a dignidade da pessoa humana (independentemente, no nosso sentir, de se aceitar, ou não, a tese da dignidade da vida não humana) há de ser compreendida como um conceito inclusivo, no sentido de que a sua aceitação não significa privilegiar a espécie humana acima de outras espécies, mas sim, aceitar que do reconhecimento da dignidade da pessoa humana resultam obrigações para com outros seres e correspondentes deveres mínimos e análogos de proteção. (SARLET, 2011, p.20)
Em relação ao princípio da dignidade humana aplicado no âmbito do Direito de Família, pode-se mencionar que tal situação encontra-se abarcada pelo artigo 227, caput, da Lei Maior.
O referido artigo visa assegurar às crianças, aos adolescentes e aos jovens o direito a uma existência digna, respeitando as necessidades básicas para a vida em sociedade e exigindo total proteção dos incapazes contra qualquer tipo de violência, crueldade, exploração, discriminação ou negligência:
Art. 227.É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010). (BRASIL,1988).
Ademais, consoante Amarilla, existe uma conexão entre o princípio da dignidade humana e a parentalidade, ou seja, a família, enquanto instituto de representação do indivíduo, deverá agir sob os mesmos preceitos emanados pelo mencionado princípio:
Retomando o fio condutor da argumentação e estabelecendo a necessária conexão entre o princípio em questão e a parentalidade, deve-se ter presente que, se de acordo com a Constituição de 1988, um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é ‘construir uma sociedade livre, justa e solidária’, a família , enquanto representação primária da sociedade para o indivíduo deve operacionalizar seus institutos com lastro nessas mesmas premissas, colhendo igualmente fundamento no princípio da dignidade humana, verdadeiro ‘núcleo essencial da organização sociopolítico-cultural e jurídica brasileira’. (AMARILLA, 2014, p. 81)
Diante do contexto apresentado, compreende-se que o princípio da dignidade humana se encontra presente em toda a seara jurídica e, inclusive, no campo do Direito de Família, haja vista que as crianças e adolescentes merecem total amparo e proteção por parte daqueles que o representam.
Diante dos argumentos expostos, a dignidade da pessoa humana tem similitude tanto na esfera jurídica quanto no pessoal, ou seja, ela é considerada algo dinâmico em que vincula com as necessidades e interesses de cada pessoa.
Sem o direito da dignidade humana como o principal norteador do ordenamento jurídico brasileiro não seria possível o embate desse tema. Além disso, os avanços sociais e o direito devem andar lado a lado para que a legislação não se torne obsoleta.
Destarte, compreende-se, de antemão, que o princípio da dignidade humana é essencial e notório que seja empregado em todos os campos da esfera jurídica, tendo em vista, que ele se constitui como fundamento da República Federativa do Brasil (artigo 1º, inciso III, CRFB/88), sendo um imperativo máximo de justiça social.
3 INSTITUTO DO CASAMENTO: ANÁLISE CONCEITUAL E ELEMENTOS JURÍDICOS PERTINENTES
De acordo com Clóvis Beviláqua, o casamento ocorre quando um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legalizando por ele suas relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole que de ambos nascer. (BEVILÁQUA,1976)
Em sentido complementar aos dizeres de Beviláqua (1976), compreendem Dower e Laurent sob as palavras de Diniz (2006) que o casamento representa a mais poderosa das instituições de direito privado, sendo o sustentáculo da família e o núcleo essencial da sociedade:
É o casamento a mais importante e poderosa de todas as instituições de direito privado, por ser uma das bases da família, que é pedra angular da sociedade. Logo, o matrimônio é a peça-chave de todo sistema social, constituindo o pilar do esquema moral, social e cultural do país. Deveras Laurent chega até a afirmar que ele é o ‘fundamento da sociedade, base da moralidade pública e privada. (DOWER, LAURENT apud DINIZ,2006, p. 41)
Dessa forma, observa-se que o casamento se constitui como um vínculo jurídico estabelecido entre um homem e uma mulher, uma relação dinâmica e progressiva, onde, através do auxílio mútuo, do companheirismo e do amor, alcança-se a construção de uma entidade familiar. (DINIZ,2006). Nesse mesmo contexto, cumpre ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça reconheceu e agregou ao conceito de casamento a possibilidade de união entre pessoas do mesmo sexo (uniões homoafetivas). (GONÇALVES,2016).
3.1 Características e finalidades
O casamento, consoante Gonçalves (2016), detém algumas características próprias. Dessa forma, pode-se considerar tal entidade proveniente de um ato solene (constitui-se um ato repleto de formalidade, iniciando –se com o processo de habilitação e publicação dos editais, realização da cerimônia e registro em livro próprio),normas que regulamentam o casamento possuem índole pública (normas imperativas que não podem ser derrogadas por convenção entre particulares), estabelece comunhão plena de vida, haja vista que na igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges, não comporta termo ou condição (sendo considerado um ato jurídico simples), permite liberdade de escolha do nubente (sendo livre a manifestação de escolha das partes).
No mesmo sentido, preconiza o jurista (GONÇALVES, 2016), que as finalidades do casamento são inúmeras. Dessa feita, as doutrinas hodiernas se dividem entre a satisfação das necessidades pessoais, sentimentos subjetivos e até mesmo procriação:
Para a corrente individualista retro mencionada, a satisfação sexual, ou seja, o amor físico constitui o único objetivo do matrimônio. Tal concepção avilta, evidentemente, a dignidade da união matrimonial. Embora se possa considerar que o instinto sexual possa, segundo a lei da natureza, atuar como mola propulsora e que o casamento representa uma possibilidade de pacificação e expansão do sexo, que se torna convencionalmente permitido com a forma solene do casamento, segundo a consciência religiosa, não resta dúvida ser a affectio maritalis, ou o amor que une um homem e uma mulher, no qual se converte a atração sexual inicial, e a pretensão a um direcionamento comum na vida, como salienta Arnaldo Rizzardo, os motivos ou finalidades principais do casamento.
Sustentam alguns ser a procriação a exclusiva finalidade do casamento. Todavia, como claramente demonstra Washington de Barros Monteiro, não procede semelhante ponto de vista, “que deixa sem explicação plausível o casamento in extremis vitae momentis e o de pessoas em idade avançada, já privadas da função reprodutora. Além disso, aceito que a reprodução constitua o fim exclusivo do matrimônio, ter-se-á logicamente de concluir pela anulação de todos os casamentos em que não advenha prole, conclusão profundamente perturbadora da estabilidade do lar e da segurança da família” (RIZZARDO, MONTEIRO apud GONÇALVES,2016, p.18, grifo nosso)
Em que pese tais finalidades elencadas, compreende Diniz (2006) que a finalidade mor do casamento gira em torno do estabelecimento de uma comunhão plena de vida, ou seja, numa relação de companheirismo, baseada no amor e afeição existente entre os nubentes e pautada na igualdade de direitos e deveres. Ademais, ressalta-se que os demais objetivos (satisfação sexual, educação dos filhos, procriação, dentre outros) são considerados secundários.
3.2 Capacidade para o casamento
Segundo Gonçalves (2016), uma das críticas ligadas ao Código Civil de 1916 é o fato de confundir, no artigo 183, a questão de incapacidade para o casamento com o denominado impedimento matrimonial. Dessa forma, observa-se que a incapacidade para o casamento se encontra ligada a inaptidão do indivíduo para se casar com quem quer que seja. Por outro lado, o impedimento está ligado a falta de legitimação do indivíduo para se casar com uma pessoa/ pessoas determinadas:
Uma das críticas endereçadas ao Código de 1916 é a de confundir, no art.183, incapacidade para o casamento com impedimento matrimonial. A incapacidade significa a inaptidão do indivíduo para casar-se com quem quer que seja, como sucede no caso do menor de 16 anos, da pessoa privada do necessário discernimento e da já casada. O impedimento se funda, todavia, na ideia de falta de legitimação, trazida da seara do direito processual para o direito civil. Não se cogita, nessa hipótese, de uma incapacidade genérica, mas de inaptidão para o casamento com determinada pessoa. (GONÇALVES, 2016, p. 25)
Compreende-se também que alguns autores, como Josserand e Lafayette consideram “falta de legitimação” como uma expressão nada satisfatória para traduzir o impedimento matrimonial. Dessa forma, observam-se mais cabível as expressões “impedimentos relativos” (quando há um certo obstáculo para se casar com uma pessoa determinada) e “impedimentos absolutos” (quando o indivíduo se encontra impossibilitado de se casar com qualquer pessoa). (GONÇALVES,2016)
Em que pese tais confusões oriundas do Código Civil de 1916, observa-se certas inovações por parte do Código Civil de 2002 no que se refere a questão de capacidade matrimonial:
O Código Civil de 2002 inovou ao tratar, em capítulo próprio (arts. 1.517 a 1.520), da capacidade para o casamento, que deve ser demonstrada no processo de habilitação, fixando em 16 anos a idade mínima, denominada idade núbil, tanto para o homem como para a mulher. Ordenando a matéria, o novel diploma tratou separadamente da capacidade nos arts. 1.517 a 1.520, dos impedimentos nos arts. 1.521 e 1.522, e das causas suspensivas nos arts. 1.523 e 1.524. Estas últimas eram, no Código de 1916, impedimentos não dirimentes, também denominados proibitivos ou meramente impedientes, que não tinham o condão de desfazer o casamento e apenas impunham sanções aos noivos.
Os impedimentos considerados relativamente dirimentes no Código anterior são tratados no diploma de 2002 como causas de anulação do casamento (arts. 1.550 e s.). Só são chamados de impedimentos, atualmente, os que o de 1916 tratava como dirimentes absolutos e que ensejavam a nulidade do casamento. (GONÇALVES,2016, p.30)
Consoante Almeida e Júnior (2012), no Brasil, exige-se apenas o limite de idade mínima para contrair matrimônio. Dessa forma, compreende-se que a ancianidade não interfere na capacidade para o casamento.
É importante destacar ainda que homens e mulheres possuem capacidade para contrair matrimônio a partir dos dezesseis anos de idade. Contudo, entre dezesseis anos e os dezoito, caso não tenham sofrido um processo de emancipação, necessitarão da autorização dos representantes legais dos mesmos para a realização de tal feito. Em que pese tal possibilidade de autorização, a lei ainda abarca a questão de não consentimento por parte de um dos tutores, apresentando uma possível solução (suprimento judicial):
Pode acontecer de o pai autorizar o casamento e a mãe não, ou vice-versa, nesse caso, há divergência quanto ao exercício do poder familiar e, conforme determina o parágrafo único do art. 1.631 do Código Civil, o conflito deverá ser solucionado pelo juiz. Se ambos os pais, ou o tutor ou o curador não autorizam o casamento, o juiz pode suprir o consentimento se a sua denegação for injusta. (ALMEIDA, JÚNIOR,2012, p.110)
Salienta-se, ademais, que a legislação em vigor prevê duas hipóteses para a realização do casamento de pessoas que não tenham completado a idade núbil (para evitar a imposição ou cumprimento de uma sanção criminal ou em caso de gravidez). (ALMEIDA, JÚNIOR,2012).
4 DA POSSIBILIDADE DE RETORNO AO NOME DE SOLTEIRA DURANTE A CONSTÂNCIA DO CASAMENTO
Os sobrenomes, como componente dos nomes civis, geralmente indicam a origem do indivíduo, mas também podem ser inseridos no sobrenome do cônjuge ou companheiro em razão de casamento ou união estável. A última possibilidade advém das regras estabelecidas no art. O artigo 1.565, § 1º, do Código Civil estabelece que “qualquer cônjuge, se assim o desejar, poderá acrescentar ao seu sobrenome o sobrenome do outro”.
Embora a cláusula trate do casamento, a jurisprudência tem reconhecido a mudança de nome em razão da união estável (REsp 1.206.656/GO).
Quando escrevemos sobre a imutabilidade relativa, destacamos a possibilidade de retorno ao nome civil por divórcio, separação ou dissolução do casamento por morte de um dos cônjuges, não se falando de possibilidade de retorno durante a constância do matrimônio.
Noutro prumo, em sede de Recurso Especial 1.873.918/SP, tendo como Relatora Min. Nancy Andrighi, firmou-se pelo entendimento da possibilidade de retorno do nome da esposa em permanecer com o nome de solteira mesmo que o casamento não tenha dissolvido, senão vejamos:
(…) O direito ao nome é um dos elementos estruturantes dos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana, pois diz respeito à própria identidade pessoal do indivíduo, não apenas em relação a si, como também em ambiente familiar e perante a sociedade.
Conquanto a modificação do nome civil seja qualificada como excepcional e as hipóteses em que se admite a alteração sejam restritivas, esta Corte tem reiteradamente flexibilizado essas regras, interpretando-as de modo histórico-evolutivo para que se amoldem a atual realidade social em que o tema se encontra mais no âmbito da autonomia privada, permitindo-se a modificação se não houver risco à segurança jurídica e a terceiros. Precedentes.
Na hipótese, a parte, que havia substituído um de seus patronímicos pelo de seu cônjuge por ocasião do matrimônio, fundamentou a sua pretensão de retomada do nome de solteira, ainda na constância do vínculo conjugal, em virtude do sobrenome adotado ter se tornado o protagonista de seu nome civil em detrimento do sobrenome familiar, o que lhe causa dificuldades de adaptação, bem como no fato de a modificação ter lhe causado problemas psicológicos e emocionais, pois sempre foi socialmente conhecida pelo sobrenome do pai e porque os únicos familiares que ainda carregam o patronímico familiar se encontram em grave situação de saúde.
Dado que as justificativas apresentadas pela parte não são frívolas, mas, ao revés, demonstram a irresignação de quem vê no horizonte a iminente perda dos seus entes próximos sem que lhe sobre uma das mais palpáveis e significativas recordações – o sobrenome -, deve ser preservada a intimidade, a autonomia da vontade, a vida privada, os valores e as crenças das pessoas, bem como a manutenção e perpetuação da herança familiar, especialmente na hipótese em que a sentença reconheceu a viabilidade, segurança e idoneidade da pretensão mediante exame de fatos e provas não infirmados pelo acórdão recorrido (…). (REsp 1873918/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 02/03/2021, DJe 04/03/2021).
Em casos específicos, por motivos emocionais e existenciais, a mulher pretende restaurar o nome de solteira, mas não se divorciar do cônjuge.
Para resolver este problema, Min. Nancy Andrighi aproveita ao máximo uma ampla interpretação do artigo 1.565, § 1º, do Código Civil, o qual dispõe que o direito de escolha de acrescer o nome não impede a renúncia ao mesmo direito do nome, especialmente quando o pedido for justificado e houver pouco risco para a segurança jurídica ou direitos de terceiros.
No caso do julgado, a requerente comprovou que o sobrenome paterno do cônjuge passou a ser o protagonista de seu nome civil, comprometendo seu sobrenome e dificultando sua adaptação. Também com base nessa decisão, os autores têm preocupações legítimas em perder um parente mais próximo, possivelmente esquecendo sobrenomes familiares.
A relevância desse assunto está intimamente ligada ao avanço de direito das mulheres ao longo dos anos, especialmente porque o nome, característica inarredável da pessoa humana, e que tem função de individualizar e contextualizar a pessoa no círculo social.
Nesse sentido, tem-se que o Estado, com um olhar voltado para preservar a dignidade da pessoa humana, passou a adotar e acompanhar essa evolução social, ensejando a possibilidade de alteração do nome e, por conseguinte, flexibilizando o princípio da imutabilidade do nome.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa teve como principal base a possibilidade de retorno ao nome de solteira durante a constância do matrimônio, bem como a efetividade da legislação perante referida temática, e a sua importância em relação ao Direito de Família.
Desta forma o que se pode concluir que o direito ao nome enquanto direito da personalidade possui imutabilidade relativa, sendo que, no ordenamento jurídico, o entendimento não se limita tão somente nas hipóteses previstas na legislação, pois, a alteração do nome com o casamento não precisa da dissolução do matrimônio.
Assim, verifica-se que para haver a possibilidade de retorno ao nome de solteira durante a constância do casamento, a parte deverá comprovar de forma justificada o seu interesse em retornar com o sobrenome suprimido.
Para tanto, os assuntos desenvolvidos no presente artigo, tem a possibilidade de observar que a legislação, doutrina e entendimento do tribunal não se ajustando e evolucionando com a atualidade, e ao direito familiar, bem como nos vínculos conjugais.
REFERÊNCIAS
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ALMEIDA, Renata Barbosa de; JÚNIOR, Walsir Edson Rodrigues. Direito Civil- Famílias. São Paulo: Atlas, 2012.
AMARILLA, Silmara Domingues Araújo. O Afeto como Paradigma da Parentalidade. Curitiba: Juruá,2014
BEVILÁQUA. Clóvis. Direito de Família. Rio de Janeiro: Ed.Rio, 1976.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, 05 de outubro de 1988.
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