VIOLÊNCIA FAMILIAR E IMPACTOS PSICOPEDAGÓGICOS: UM ESTUDO DE CASO

FAMILY VIOLENCE AND PSYCHOPEDAGOGICAL IMPACTS: A CASE STUDY

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202510200854


Jéssica Marques Ziata Pestana1


Resumo
Este artigo apresenta um estudo de caso de uma família em situação de desorganização relacional e conflitos intergeracionais, evidenciando os impactos da violência familiar e da permissividade parental no desenvolvimento escolar e socioemocional de adolescentes. A análise revelou ausência de limites claros, dificuldades comunicativas e envolvimento em situações de violência no ambiente escolar. Como proposta de intervenção, aponta-se a necessidade de fortalecimento dos vínculos familiares, delimitação de papéis parentais e articulação entre escola e família em projetos de prevenção à violência. Conclui-se que a psicopedagogia, aliada às políticas públicas, é fundamental para enfrentar os desafios impostos pela violência familiar no processo de aprendizagem.

Palavras-chave: violência familiar; psicopedagogia; adolescência; estudo de caso.

Abstract

This article presents a case study of a family experiencing relational disorganization and intergenerational conflicts, highlighting the impacts of family violence and parental permissiveness on adolescents’ academic and socioemotional development. The analysis revealed a lack of clear boundaries, communication difficulties, and involvement in violent situations within the school environment. As an intervention proposal, the study emphasizes the need to strengthen family bonds, clarify parental roles, and foster collaboration between school and family through violence prevention programs. It is concluded that psychopedagogy, combined with public policies, is essential to address the challenges posed by family violence in the learning process.

Keywords: family violence; psychopedagogy; adolescence; case study

1. Introdução

A família é a base da formação humana, responsável por transmitir valores, afeto e limites. Quando há falhas nesse processo, surgem vulnerabilidades emocionais e sociais que afetam diretamente o desempenho escolar (SOARES; JUNIOR, 2018).

O estudo aborda o caso de uma família composta por Joana (*), 70 anos, e seu marido de 75 anos; a filha Carolina (*) com o marido e dois filhos, Camila (*), 6 anos, e Felipe (*), 14 anos, todos residindo com os avós. Joana (*) relata solidão, preocupação e episódios de depressão, destacando dificuldades na convivência familiar.

Recentemente, o filho mais velho enviou seu filho Gabriel (*), 16 anos, para morar com os avós, visando maior privacidade para seu novo relacionamento. Apesar de a casa ter boas condições, os avós sentiram-se pressionados a acolher o adolescente.

As relações familiares mostram fragilidade na comunicação, interferência mútua na educação das crianças e adolescentes, e falta de obediência às orientações dos adultos. Gabriel (*) apresenta problemas escolares e comportamentais, incluindo envolvimento com grupo de jovens com atitudes inadequadas e violência. A escola comunicou à família um episódio em que Gabriel (*) agrediu um colega durante o recreio, causando fratura no braço da vítima.

Entre os fatores que comprometem o desenvolvimento infantil e juvenil, a violência familiar — explícita ou velada — aparece como um dos mais significativos. A permissividade, entendida como ausência de limites, também pode configurar uma forma de violência, gerando insegurança, comportamentos de risco e dificuldades de aprendizagem (LIPP, 2014).

O presente artigo tem como objetivo relatar e analisar o estudo de caso de uma família multigeracional marcada por conflitos e negligência, discutindo os riscos identificados e propondo um plano de intervenção psicopedagógica.

O núcleo familiar apresenta riscos de vinculação por parte dos membros constituintes da família, uma vez que as relações comunicativas foram se perdendo no decorrer das situações apresentadas do cotidiano. A mudança na dinâmica familiar se mostra um fator estressor para crianças e jovens, acarretando insegurança nos estudantes, que acabam por se tornar indivíduos sem limites claros de conduta, sem objetivos e perspectivas, além de apresentarem comportamentos descontrolados.

2. Metodologia

O estudo foi realizado no âmbito do módulo Psicopedagogia Comunitária, Violência e Sociedade do curso de Psicopedagogia da Universidade Católica de Santos. Trata-se de um estudo de caso qualitativo, baseado em análise documental e relatos familiares.

Participaram indiretamente os membros de uma família composta por avós, filhos adultos e netos adolescentes. Foram utilizados nomes fictícios para preservar o sigilo e garantir os aspectos éticos da pesquisa.

3. Resultados e Discussão

3.1 Dinâmica familiar

A família analisada apresentou ausência de comunicação clara, sobreposição de papéis parentais e permissividade exacerbada. A matriarca mostrou fragilidade emocional, relatando sentimentos de solidão e depressão, o que afetou sua autoridade no núcleo familiar.

3.2 Riscos e consequências

O adolescente Gabriel demonstrou comportamentos de risco, afastamento escolar e envolvimento em atos de violência. A interferência de múltiplos cuidadores sem consenso gerou insegurança, enquanto a permissividade dificultou a formação de limites adequados. Segundo Melo (2008 apud LIPP, 2014), filhos criados sem limites se tornam emocionalmente órfãos, o que explica a instabilidade do grupo analisado.
Conforme relata Montessori (2014) os adultos vivem em tal confusão que conseguiram fazer um caos assustador a base da organização social. O ser humano revela ter uma necessidade fundamental de ordem desde os primeiros anos de vida. Ele tem necessidade de viver em meio organizado e de disciplina, para que assim possa agir livremente e seguir os imperativos da vida. 

3.3 Dificuldades cognitivas e seu impacto no desenvolvimento infantil e adolescente

As dificuldades emocionais podem comprometer a capacidade cognitiva da criança e do adolescente de adquirir novos conhecimentos, assim como interferir no desenvolvimento da linguagem e do pensamento. Tais limitações frequentemente estão associadas à baixa percepção das próprias potencialidades e à dificuldade de reconhecimento do indivíduo enquanto ser em desenvolvimento.

Experiências de ferimentos, fraturas, lesões ou contusões podem afetar não apenas o desenvolvimento físico e intelectual, mas também o emocional e psicológico, manifestando-se por meio de quadros de pânico, fobias, traços de personalidade antissocial ou na repetição de experiências de abuso previamente vividas.

Portanto, a afetividade é o motor da nossa conduta, fator que nos direciona, acolhe e motiva para o desempenho de um papel em contexto e momento específicos. Quando conquistamos as possibilidades existenciais e reduzimos as tensões, tornamo-nos protagonistas da gratificação das nossas necessidades e da realização como seres humanos ( Nery, 2014).

3.4 Intervenção proposta

  • Apoio psicológico à matriarca, fortalecendo sua saúde emocional.
  • Estabelecimento de papéis claros entre pais e avós, evitando sobreposição de funções.
  • Parceria escola-família, com acompanhamento individualizado e projetos de prevenção à violência.
  • Inclusão dos adolescentes em atividades extracurriculares que promovam vínculos saudáveis e controle da agressividade.
  • Acompanhamento e orientação psicopedagógica ao estudante e grupo escolar visando a elaboração emocional e organização do cotidiano escolar.

4. Conclusão

O estudo evidenciou que a desestrutura familiar e a ausência de limites contribuem para o aumento da violência e para dificuldades no processo de aprendizagem. É de suma importância que os pais tenham valores preestabelecidos para gerenciamento da família, ainda que com flexibilidade de ajustá-los quando necessário. Não se propõe rigidez de princípios, mas sim elaboração de um código de ética, de valores e de conduta que reflitam o que exatamente aquela família deseja nutrir para, em conjunto, enfrentar os estressores da vida moderna e florescer com os avanços extraordinários que o mundo inteiro está presenciando (LIPP, 2014, p. 162).

A psicopedagogia se apresenta como ferramenta essencial de mediação entre família e escola, favorecendo a construção de vínculos afetivos e o fortalecimento da cidadania. Intervenções integradas, associadas às políticas públicas, são fundamentais para reduzir os efeitos da violência familiar e promover o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes.

Referências

LIPP, Marilda (org.). O stress em crianças e adolescentes. Campinas: Papirus, 2014. Acesso em: 25 set. 2022.

SOARES, F. A.; JUNIOR, C. A. Desestrutura Familiar e Desinteresse Escolar: Uma avaliação multidimensional. Revista Atlante, 2018. Disponível em: https://www.eumed.net/rev/atlante/2018/09/desestrutura-familiar.html. Acesso em: 25 set. 2022.

BATISTA, C.; SIQUEIRA DE ANDRADE, M. “Reimaginar nosso futuro juntos”: interfaces e reflexões educacionais. II Congresso de Educação, Subjetividade e Psicanálise – PPGE UNIB. [s.l.: s.n.]. p. 179. Disponível em: https://www.editoraschreiben.com/_files/ugd/e7cd6e_713a1a878ea1445c8edca7f678cb9ace.pdf#page=11. Acesso em: 07 set. 2025.

MONTESSORI, Maria. A educação e a paz. 1. ed. Campinas: Papirus, 2014. E-book. Disponível em: https://plataforma.bvirtual.com.br. Acesso em: 11 out 2025.

NERY, Maria da Penha. Vínculo e afetividade. 1. ed. São Paulo: Ágora, 2014. E-book. Disponível em: https://plataforma.bvirtual.com.br. Acesso em: 11 out 2025.


1Instituição: Universidade Católica de Santos
Av. Conselheiro Nébias, 296 – Vila Mathias / Santos – SP
E-mail para contato: jessicaziata@yahoo.com.br

Título resumido: Impactos Psicopedagógicos da Violência — Psychopedagogical Impacts of Violence
(*) Nomes fictícios para proteger a identidade dos personagens