A IMPORTÂNCIA DA FISIOTERAPIA NA SAÚDE DO TRABALHADOR: REVISÃO DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202510101125


Luzinete de Andrade da Silva
Maria da Conceição Oliveira de Albuquerque
Joseane de Sousa Viana
Noemia Oliveira Alves de Melo
Paulo Victor dos Santos Oliveira


RESUMO

Este artigo teve como objetivo destacar a importância da fisioterapia na saúde do trabalhador, enfatizando sua contribuição na promoção, prevenção e reabilitação de agravos relacionados ao ambiente laboral. Trata-se de uma revisão de literatura, realizada em bases nacionais e internacionais, utilizando descritores relacionados à fisioterapia, saúde ocupacional e ergonomia. A análise dos estudos evidenciou que a atuação fisioterapêutica impacta diretamente na redução de distúrbios osteomusculares, na melhoria da funcionalidade, na diminuição do absenteísmo e na promoção da qualidade de vida. Os resultados também demonstraram que estratégias como ginástica laboral, orientações ergonômicas e programas de reabilitação favorecem a reintegração do trabalhador às suas atividades, contribuindo para ambientes de trabalho mais seguros e saudáveis. Apesar dos avanços, verificou-se escassez de estudos longitudinais e de avaliações econômicas sobre a efetividade das intervenções, o que aponta para a necessidade de novas pesquisas que consolide a base científica da fisioterapia ocupacional. Conclui-se que o fisioterapeuta possui papel estratégico na saúde do trabalhador, atuando de forma interdisciplinar e alinhada às políticas públicas de saúde e segurança laboral.

Palavras-chave: Fisioterapia Ocupacional. Saúde do Colaborador. Ergonomia.

1. INTRODUÇÃO

A saúde do trabalhador é uma área de grande relevância no contexto das políticas públicas e das práticas em saúde, uma vez que a exposição constante a fatores de risco ocupacionais pode comprometer a qualidade de vida e a produtividade. Nesse cenário, a fisioterapia tem ganhado destaque, ao atuar tanto na prevenção quanto na reabilitação de agravos relacionados às atividades laborais, contribuindo para a promoção do bem-estar e para a redução do absenteísmo (Hamu et al., 2023).

Apesar dos avanços tecnológicos e das melhorias em equipamentos e ergonomia, os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT) continuam figurando entre os principais problemas de saúde no Brasil e no mundo. Esses agravos impactam diretamente o trabalhador, que sofre com dor e limitações funcionais, e as organizações, que enfrentam custos elevados com afastamentos e indenizações (Bombazar; Longen; Justo, 2022). Nesse sentido, a problemática central deste estudo se concentra na análise de como a fisioterapia pode ser um recurso estratégico para minimizar tais impactos.

A justificativa para a escolha deste tema está na crescente necessidade de ações que integrem prevenção e promoção em saúde no âmbito ocupacional. A fisioterapia, ao empregar recursos como exercícios terapêuticos, orientação ergonômica e técnicas de reabilitação, amplia as possibilidades de atuação multiprofissional na saúde do trabalhador (Desconsi et al., 2019). Dessa forma, investigar essa contribuição torna-se relevante não apenas para os profissionais da área, mas também para gestores e trabalhadores que buscam qualidade de vida e segurança no ambiente laboral.

Considerando esse contexto, parte-se da hipótese de que a inserção efetiva do fisioterapeuta nos programas de saúde do trabalhador pode reduzir índices de adoecimento ocupacional e afastamentos por incapacidade. Além disso, pressupõe-se que essa atuação fortaleça políticas públicas de saúde e gere benefícios econômicos às empresas e à sociedade (Barbosa, 2021). Assim, discutir a importância da fisioterapia nessa perspectiva é pertinente para validar estratégias que promovam ambientes de trabalho mais saudáveis.

O objetivo geral deste artigo é destacar a importância da fisioterapia na saúde do trabalhador, enfatizando sua contribuição para a prevenção, promoção e reabilitação de agravos ocupacionais. De forma específica, pretende-se: identificar as principais condições de saúde relacionadas ao trabalho que podem ser prevenidas ou tratadas pela fisioterapia; discutir as estratégias fisioterapêuticas voltadas à ergonomia e à promoção da saúde ocupacional; e avaliar os impactos da atuação fisioterapêutica na redução de afastamentos e na melhora da qualidade de vida dos trabalhadores.

Vale destacar que o estudo se propõe a contribuir para a literatura científica ao reunir evidências de diferentes autores e contextos sobre a relevância da fisioterapia na saúde ocupacional. Ao mesmo tempo, busca subsidiar práticas que fortaleçam a integração desse profissional em equipes multidisciplinares, tornando mais efetivas as ações de vigilância e promoção da saúde no ambiente de trabalho (Mendes; Lancman, 2010). Nesse sentido, a revisão de literatura torna-se um instrumento adequado para sistematizar o conhecimento existente e ampliar o debate acadêmico e profissional acerca do tema.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. FISIOTERAPIA PREVENTIVA: ERGONOMIA, GINÁSTICA LABORAL E PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DE DORT/LER

A fisioterapia preventiva representa uma frente essencial para minimizar o impacto dos DORT/LER mediante intervenções ergonômicas, ginástica laboral e acompanhamento sistemático do trabalhador. De acordo com Ferrazo, Lemos e Miolo (2006), um programa preventivo de fisioterapia, envolvendo principalmente ginástica laboral e orientação postural, implementado no ambiente de trabalho, levou à redução significativa da intensidade dos sintomas de desconforto musculoesquelético entre os trabalhadores de uma instituição universitária no Rio Grande do Sul. Esse estudo fornece evidências de que intervenções preventivas contínuas impactam positivamente a saúde, questão relevante na gênese dos agravos ocupacionais.

Outra investigação concentra-se na ginástica laboral como recurso de promoção da qualidade de vida laboral. Barbosa (2021) argumenta que embora seja amplamente utilizada, a ginástica laboral não deve ser considerada solução única para DORT/LER; porém, seu uso combinado com outras estratégias, como ergonômica ambiental e educação postural, mostra-se eficaz. Em muitos casos, a prática de pausas ativas, alongamentos e exercícios de relaxamento inseridos ao longo da jornada de trabalho demonstram efeitos fisiológicos — diminuição da fadiga, da tensão muscular — e psicológicos — melhoria da percepção de bem-estar.

Um estudo de Storch (2022) faz uma análise ergonômica de ambientes de trabalho de fisioterapeutas segundo a nova NR-17, identificando riscos potenciais nas posturas, mobiliário e métodos de trabalho, e propõem ferramentas ergonômicas para correção desses fatores de risco. A norma NR-17 regulamenta requisitos ergonômicos de modo que o fisioterapeuta não apenas realize intervenções terapêuticas, mas também contribua ativamente para ajustar o ambiente de trabalho, prevenir adoecimento e promover conforto postural.

Além disso, em setores financeiramente homogêneos, Ferreira, Shimano e Fonseca (2009) avaliaram trabalhadores para identificar posturas adequadas, uso de ferramentas ergonômicas e aplicação de instrumentos como RULA (Rapid Upper Limb Assessment) para mensurar risco em membros superiores. A partir dessa análise, foram propostas adaptações ergonômicas e programas educativos para minimizar o desenvolvimento de DORT/LER. Tais adaptações incluem ajustes de mobiliário, pausas programadas e conscientização dos trabalhadores sobre posturas seguras, o que se alinha com intervenções realizadas pelo fisioterapeuta preventivamente.

Ainda, há estudos que investigam a incidência de DORT/LER especificamente entre fisioterapeutas, identificando fatores de risco como repetitividade de movimentos, carga física, turnos longos e falta de pausas adequadas. O estudo de Bombazar, Longen e Justo (2022) mostra que mãos, punhos, coluna cervical e lombar são as regiões mais acometidas, reforçando que mesmo os profissionais de saúde sofrem com condições ocupacionais que poderiam ser mitigadas por práticas preventivas. 

2.2. FISIOTERAPIA REABILITADORA E IMPACTO NA REINTEGRAÇÃO, DESEMPENHO FUNCIONAL E REDUÇÃO DE AFASTAMENTOS

Além da prevenção, a fisioterapia reabilitadora assume papel central em casos em que o adoecimento já se manifesta, atuando não apenas no alívio dos sintomas, mas na recuperação da funcionalidade, reintegração ao trabalho e minimização dos impactos socioeconômicos derivados de afastamentos.

Um estudo com pacientes diagnosticados com LER/DORT de membros superiores comparou os efeitos de tratamento cinesioterapêutico em grupo versus individual, observando melhorias significativas em dor e função em ambos os grupos, embora o tratamento individual tenha apresentado ganhos ligeiramente maiores em alguns domínios funcionais (Mendes; Lancman, 2010). Isso evidencia que o fisioterapeuta, ao planejar intervenções adaptadas ao contexto e estágio da doença, consegue promover retorno mais eficaz às atividades laborais.

Desconsi et al. (2019) investigaram fatores associados à melhora em dor lombar crônica. Os resultados apontaram que intervenções fisioterapêuticas, especialmente aquelas que combinam exercícios terapêuticos de fortalecimento, alongamento e mobilização, contribuem para redução da dor e melhora da capacidade funcional, o que pode ter efeito direto na diminuição dos dias de afastamento por dor lombar.

Outros estudos apontam que a avaliação diagnóstica da situação ocupacional, identificando se há correlação entre atividades laborais e sintomas, é importante para estruturar intervenções reabilitadoras. Cardoso et al. (2017) verificaram que muitos problemas de saúde são atribuíveis, em parte, à exposição ocupacional; reconhecer isso permite ao fisioterapeuta elaborar intervenções mais eficazes e fundamentadas, facilitando o planejamento de retorno ao trabalho ou modificações nas atividades laborais. 

Além disso, artigos sobre programas de atenção à saúde do trabalhador, como o desenvolvido pelo PET-Fisioterapia na UEG, mostram que intervenções com exercícios de mobilidade, alongamento e fortalecimento muscular resultaram em alívio da dor para mais de metade dos participantes, indicando que programas regulares reabilitadores conseguem impactar positivamente a percepção de dor e a funcionalidade dos trabalhadores (Hamu et al., 2023).

Em suma, o impacto econômico e social da fisioterapia reabilitadora também é ressaltado: ao reduzir os afastamentos e melhorar a qualidade de vida do trabalhador, há ganhos para a empresa (menor custo com licenças, menor rotatividade, melhor produtividade) e para o sistema de saúde como um todo. Embora existam poucos estudos que quantifiquem monetariamente esses benefícios, a literatura sugere que os custos com intervenções fisioterapêuticas são menores do que os gerados por afastamentos prolongados, produção reduzida e indenizações.

3. MATERIAL E MÉTODOS

3.1. TIPO DE PESQUISA

O presente artigo trata-se de uma revisão de literatura, de caráter qualitativo e exploratório. Essa modalidade busca reunir, descrever e discutir informações já publicadas em livros, artigos científicos e documentos técnicos a respeito da importância da fisioterapia na saúde do trabalhador, sem aplicação de protocolos sistemáticos de seleção e análise.

3.2. BASES DE DADOS CONSULTADAS

A busca pelos materiais foi realizada nas seguintes bases: Scientific Electronic Library Online (SciELO); PubMed/Medline; Google Scholar; Biblioteca Virtual em Saúde (BVS); e Periódicos CAPES. Essas bases foram escolhidas por contemplarem ampla produção científica nacional e internacional na área da saúde e por fornecerem acesso a artigos em texto completo.

3.3. DESCRITORES E OPERADORES BOOLEANOS

Foram utilizados descritores em português e inglês, conforme o vocabulário estruturado dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS/MeSH):

  • Fisioterapia / Physiotherapy / Physical Therapy
  • Saúde do Trabalhador / Occupational Health / Workers’ Health
  • Ergonomia / Ergonomics
  • Doenças Ocupacionais / Occupational Diseases
  • Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) / Work-Related Musculoskeletal Disorders (WMSD)

A estratégia de busca combinou os descritores por meio de operadores booleanos, como:

  • AND (ex.: Physiotherapy AND Occupational Health);
  • OR (ex.: Ergonomics OR Work-Related Musculoskeletal Disorders).

3.4. CRITÉRIOS DE INCLUSÃO

Foram incluídos na revisão: artigos publicados entre 2010 e 2025, para contemplar a produção científica mais atual; textos em português e inglês; estudos que abordem direta ou indiretamente a atuação da fisioterapia na prevenção, promoção e/ou reabilitação da saúde do trabalhador; e artigos disponíveis em texto completo nas bases selecionadas.

3.5. CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO

Foram excluídos da análise: trabalhos duplicados em diferentes bases; publicações sem acesso ao texto completo; artigos em idiomas diferentes do português ou inglês; e estudos que não abordassem a fisioterapia no contexto da saúde do trabalhador (ex.: pesquisas apenas médicas ou exclusivamente voltadas à engenharia de segurança sem interface com fisioterapia).

3.6. PROCEDIMENTOS DE SELEÇÃO

Inicialmente, realizou-se a leitura dos títulos e resumos para verificar a aderência ao tema. Em seguida, os artigos potencialmente relevantes foram analisados na íntegra. Apenas os que atendiam aos critérios de inclusão permaneceram para composição do corpo de discussão.

3.7. ORGANIZAÇÃO E SÍNTESE DOS DADOS

Os artigos selecionados foram organizados em fichamentos com informações sobre autor, ano, objetivos, metodologia e principais resultados. Posteriormente, os conteúdos foram agrupados em eixos temáticos (fisioterapia preventiva e fisioterapia reabilitadora), permitindo a construção dos resultados e a análise crítica.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os estudos revisados apontam consistentemente que estratégias fisioterapêuticas preventivas e reabilitadoras têm impactos positivos na saúde dos trabalhadores, especialmente nos sintomas musculoesqueléticos, funcionalidade, qualidade de vida e reintegração ao trabalho.

Um estudo clássico de Ferrazo, Lemos e Miolo (2006) demonstrou que o programa preventivo de ginástica laboral e orientação postural em trabalhadores universitários reduziu de forma significativa a intensidade dos sintomas musculoesqueléticos. Esse resultado evidencia que, mesmo em ambientes não industriais, a intervenção fisioterapêutica preventiva pode alterar de maneira palpável o quadro de desconforto físico, mostrando-se uma medida eficaz para promoção de saúde ocupacional.

Em ambientes industriais, onde há repetitividade, exigência física ou posturas inadequadas frequentes, outra revisão integrativa demonstrou que a fisioterapia preventiva associada à ergonomia tem potencial de reduzir implicações de DORTs. Magalhães et al. (2025) apontam que programas de ginástica laboral, adaptação de postos de trabalho e educação ergonômica são capazes de diminuir tanto a incidência quanto a gravidade dos sintomas relacionados a movimentos repetitivos. 

Além de prevenção, estudos mostram que a aplicação de metodologias participativas e educacionais em ergonomia eleva o nível de conhecimento dos trabalhadores e pode reduzir percepções de risco. Rothstein et al. (2013) avaliaram trabalhadores de uma indústria têxtil e constatou que após intervenção educativa os participantes demonstraram melhora no conhecimento sobre práticas ergonômicas e no comportamento relativo ao uso correto dos postos de trabalho. Esse tipo de resultado reforça a ideia de que a fisioterapia não atua apenas nos níveis físicos, mas também nos cognitivos e comportamentais, aspecto essencial para a sustentabilidade das ações de promoção de saúde.

Quanto aos sintomas musculoesqueléticos em função de postura ou exigência física ocupacional, estudos evidenciam correlações claras entre exposição de postura em pé prolongado e dor lombar, especialmente entre trabalhadores de limpeza e cuidadores de idosos. O trabalho de Sato et al. (2022) avaliou o tempo em pé, tempo andando e tempo correndo em trabalhadoras desses setores, constatando correlação positiva entre dor lombar e tempo em pé (r = 0,52; p < 0,05). Esse tipo de achado aponta para a relevância de intervenções ergonômicas mais precisas e de ajustes no cotidiano laboral, que podem ser sugeridas ou implementadas por fisioterapeutas.

A dor musculoesquelética e os riscos ergonômicos em docentes também aparecem de forma destacada, como evidenciado pelo estudo de Kraemer, Moreira e Guimarães (2020) no Instituto Federal Catarinense. Nesse estudo, 72% dos docentes entrevistados relataram permanência em postura em pé ou sentada por longos períodos, além de uso inadequado de mobiliário e equipamentos como fatores de risco. Todas as regiões corporais avaliadas apresentaram alta prevalência de dor nos últimos 12 meses. Tal resultado reforça que os ambientes de trabalho que exigem postura estática ou mobiliário mal dimensionado geram sobrecarga, e que a fisioterapia ergonômica pode atuar tanto preventivamente quanto para correções no ambiente, minimizando o sofrimento físico.

No que tange à reabilitação e retorno ao trabalho, estudos apontam para desafios e variáveis prognósticas que influenciam o sucesso dessa reintegração. Sekiya e Silva Júnior (2023) tratam justamente disso: identificam variáveis como duração do afastamento, tipo de intervenção, suporte psicossocial e adaptações no posto de trabalho como fatores que podem favorecer ou dificultar o retorno ao trabalho. Esses achados enfatizam que a fisioterapia isolada talvez não seja suficiente — é preciso integração com políticas de saúde ocupacional, apoio institucional e modificações ambientais.

Silva (2023) demonstrou que, após intervenção de exercício terapêutico (cinesioterapia) laboral, os trabalhadores apresentaram melhora funcional significativa e redução da dor. Esse tipo de estudo com delineamento intervencionista aponta para benefício direto das ações fisioterapêuticas no ambiente em que se prestam, sobretudo em ambientes hospitalares ou de assistência à saúde, onde as exigências físicas e repetitivas tendem a ser maiores.

Há, também, evidências específicas para condições particulares do ombro. Barbosa et al. (2012) mostraram que essa abordagem trouxe alívio de dor e melhora na qualidade de vida em trabalhadores acometidos pela síndrome do impacto do ombro, que é uma das DORTs. De modo semelhante, relatos de caso mais recentes confirmam a eficácia de intervenções fisioterápicas traumato-ortopédicas para redução de dor e melhora funcional em pacientes com ombro acometido por dor de impacto (Sousa et al., 2023).

Guimarães et al. (2022) mostram que o ambiente domiciliar, muitas vezes improvisado, pode agravar ou gerar novos sintomas, devido à má postura, mobiliário inadequado, falta de pausas ou intervalo de postura, estresse mental associado e poucas condições ergonômicas. Esse achado evidencia que a fisioterapia voltada à saúde do trabalhador precisa considerar contextos variados (empresa, indústria, hospital, home office), e adaptabilidade das intervenções.

Os resultados levantados demonstram de forma convincente que a fisioterapia tem papel relevante tanto na prevenção quanto na reabilitação de problemas relacionados ao trabalho. No entanto, algumas lacunas e desafios emergem da literatura que devem ser considerados.

Primeiro, muitos estudos são transversais, o que limita a identificação de relações de causa-efeito. Por exemplo, estudos que relatam correlações entre exposição a posturas ou número de horas em pé e dor musculoesquelética (como Sato et al., 2022) não garantem que a postura foi a causa exclusiva da dor. Estudos longitudinais ou ensaios controlados são menos frequentes, embora o estudo de cinesioterapia laboral (Silva, 2023) represente um avanço nessa direção. 

Segundo, embora haja benefício relatado em muitos casos, a variabilidade metodológica entre estudos (diferenças nos tipos de intervenção, duração, intensidade, medidas de desfecho) torna difícil fazer comparações ou quantificar precisamente o efeito médio.

Por exemplo, intervenções que envolvem ginástica laboral, orientação postural ou exercícios de fortalecimento têm escalas de tempo e adesão muito distintas. Algumas avaliações consideram mudanças de curto prazo (meses), outras de médio prazo, mas poucas de longo prazo. Essa heterogeneidade torna a generalização dos resultados complexa.

Terceiro, enquanto intervenções preventivas são relativamente bem representadas, ainda é mais escassa a literatura sobre reabilitação ocupacional com bom nível de evidência no Brasil, especialmente em pequenas empresas ou setores menos regulados. 

Por fim, também se nota que muitos estudos enfatizam os sintomas e percepções subjetivas (como dor, desconforto), mas menos estudos mensuram desfechos objetivos de desempenho funcional ou produtividade mensurável. O estudo clínico que usou cinesioterapia laboral (Silva, 2023) é uma exceção ao medir o desempenho funcional de membros superiores. 

A partir desses resultados, podem ser sugeridas algumas implicações práticas:

  • Implementação de programas preventivos regulares de fisioterapia em empresas, com ginástica laboral, pausas ativas, orientação postural e análises ergonômicas constantes.
  • Capacitação ergonômica dos trabalhadores, com workshops, metodologias interativas, educação continuada — para que o trabalhador participe ativamente da promoção de sua saúde.
  • Intervenções personalizadas, especialmente para funcionários com perfil de risco ou já acometidos por dor ou DORT/LER, com adaptações do posto de trabalho, redução de cargas físicas, alternância de postura, exercícios terapêuticos específicos.
  • Políticas institucionais de retorno ao trabalho, com suporte psicológico, adaptação do ambiente laboral, reestruturação de funções ou carga de trabalho conforme limitação funcional, bem como integração entre fisioterapia, medicina do trabalho e segurança do trabalho.
  • Necessidade de pesquisa futura com maior rigor metodológico, acompanhamento longitudinal, análise de custo-benefício, uso de medidas objetivas de produtividade e desempenho, para fortalecer a evidência e ampliar aceitação institucional.

5. CONCLUSÃO

A análise da literatura evidencia que a fisioterapia desempenha papel fundamental na promoção, prevenção e reabilitação em saúde do trabalhador. Intervenções fisioterapêuticas, sejam elas voltadas para a educação em ergonomia, para a ginástica laboral ou para programas específicos de cinesioterapia, demonstraram impacto positivo na redução de sintomas musculoesqueléticos, na melhoria da funcionalidade e na qualidade de vida dos trabalhadores.

Além disso, observa-se que a atuação do fisioterapeuta contribui para a diminuição do absenteísmo, para a reintegração ao ambiente laboral e para a preservação da capacidade produtiva, confirmando sua relevância nos diferentes cenários ocupacionais.

Contudo, a literatura revisada também aponta lacunas importantes. A maioria dos estudos apresenta delineamento transversal, limitando o estabelecimento de relações causais entre exposição e adoecimento ocupacional. Ainda são escassas as pesquisas que abordam indicadores objetivos de desempenho funcional e impacto econômico das intervenções fisioterapêuticas. Nesse sentido, reforça-se a necessidade de investigações longitudinais, de ensaios clínicos controlados e de análises de custo-benefício que fortaleçam a base científica e subsidiem a formulação de políticas públicas consistentes.

Diante disso, conclui-se que a atuação da fisioterapia na saúde do trabalhador deve ser compreendida como uma prática interdisciplinar, que ultrapassa o cuidado clínico individual e se insere em um contexto de promoção de ambientes laborais mais saudáveis, seguros e produtivos.

O fortalecimento das ações de fisioterapia ocupacional, aliado à integração com equipes multiprofissionais e ao apoio institucional, constitui um caminho essencial para reduzir agravos relacionados ao trabalho e promover a saúde integral do trabalhador.

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