AUSÊNCIA DE ÁREAS DE LAZER COMUNITÁRIAS: IMPACTOS NA PRÁTICA DE ATIVIDADES FÍSICAS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202509091302


Herlane Ferreira dos Santos1
Izabel Sousa dos Santos2
Andrea Borges Araruna de Galiza3


Resumo: Este estudo abordou as consequências da ausência de locais de lazer para a saúde do público infanto juvenil entre 8 e 15 anos. Um questionário aplicado a 40 crianças da comunidade coletou dados sobre os hábitos de atividade física das crianças. O objetivo foi analisar como a falta de áreas de lazer impacta a prática de atividades físicas entre crianças e adolescentes, identificando os hábitos de vida realizados na ausência desses locais e propondo soluções para a criação e valorização desses espaços. Um estudo descritivo, de âmbito qualitativo, do tipo relato de experiência, realizado pelos estudantes do quarto período do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas Afya Santa Inês/MA, durante o módulo de Comunidades IV. Foi realizado primeiramente o mapeamento do território da UBS Aeroporto e posteriormente palestras educativas e dinâmicas avaliativas com duração de 3 horas abordando conceitos sobre atividade física e enfatizando a necessidade da prática de pelo menos 60 minutos diários de atividades físicas no módulo de comunidades IV. Entre as crianças que fazem prática regular de atividades físicas ao menos três vezes por semana, apenas 30% responderam afirmativamente. A maioria faz uso de tecnologias como celulares para lazer, principalmente aos fins de semana. Entre os resultados positivos, 90% realizavam atividade física na escola durante as aulas de educação física. Esses dados ressaltam a conexão entre a falta de espaços de lazer adequados e a prática limitada de atividades físicas infantis, evidenciando a necessidade de promover áreas de lazer e educação sobre a importância da atividade física para as crianças. Este estudo reforça a necessidade da ampliação de projetos sociais e investimentos em infraestrutura urbana que priorizem espaços de lazer e prática esportiva para crianças. 

Palavras-chaves – Áreas de lazer. Atividades físicas infantis. Saúde e Educação.

INTRODUÇÃO

A prática de atividades físicas é fundamental para o desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes, sendo recomendado que jovens realizem pelo menos 60 minutos de atividade física moderada a vigorosa diariamente (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2019), a fim de garantir não apenas um crescimento adequado, mas também uma melhoria na saúde mental e social. 

No bairro Aeroporto, em Santa Inês/MA, a ausência de áreas de lazer adequadas tem gerado um impacto significativo na prática de atividades físicas entre os jovens e somado a outras realidades, essa falta de espaços públicos destinados ao lazer e à prática esportiva contribui para o sedentarismo, que já era uma preocupação crescente antes da pandemia de Covid-19. A incidência de atividade física insuficiente durante a pandemia foi de 69,6%, sendo os subgrupos de adolescentes mais afetados os que se autodeclararam da raça/cor da pele preta, que relataram dificuldades financeiras durante a pandemia (SANTI et al, 2023). 

Essa situação é ainda mais delicada em comunidades como a do Aeroporto, onde a carência de áreas apropriadas para o exercício físico não só limita as oportunidades de atividade, mas também afeta o desenvolvimento social e emocional das crianças, uma vez que o esporte e as atividades recreativas são essenciais para promover a socialização e o fortalecimento de vínculos entre os jovens (HALLAL et al., 2012). 

Dessa forma, a falta desses espaços resulta no aumento do tempo gasto em tecnologias e sedentarismo, impactando negativamente na qualidade de vida dos jovens da comunidade, sendo crucial abordar essa questão com urgência, buscando meios que propiciem a prática de atividade física na realidade local.

MATERIAIS E MÉTODOS/PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente trabalho trata-se de um estudo descritivo, de âmbito qualitativo, do tipo relato de experiência, realizado pelos estudantes do quarto período do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas Afya Santa Inês/MA, durante o módulo de Comunidades IV, tendo como local de estudo a UBS Aeroporto e suas microáreas, durante o período dos dias dez e vinte e quatro de outubro de 2024. 

O relato se desenvolveu em duas etapas principais, com o objetivo de investigar a importância das áreas de lazer para a prática de atividades físicas infantis no bairro Aeroporto, em Santa Inês/MA. Inicialmente a equipe se reuniu para elaborar um plano de ação que incluía o mapeamento das áreas disponíveis no território da Unidade Básica de Saúde (UBS) Aeroporto. 

Em uma segunda etapa, organizou-se uma palestra educativa sobre atividade física, onde se abordou definições, quantidade necessária para ser considerada adequada e sua importância para o desenvolvimento infantil. Dinâmicas foram realizadas para avaliar o desempenho físico dos participantes e um questionário foi aplicado para coletar dados sobre os hábitos de atividade física das crianças. 

Diante do exposto, este relato de experiência não requer aprovação do comitê de ética e pesquisa, uma vez que não houve identificação de locais nem de usuários específicos durante as atividades realizadas. A abordagem adotada permitiu uma reflexão sobre os desafios enfrentados e os resultados obtidos, contribuindo para uma melhor compreensão da relação entre a falta de áreas de lazer e a prática de atividades físicas entre crianças e adolescentes no bairro Aeroporto

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Durante a intervenção no território da UBS Aeroporto, realizamos um mapeamento do bairro com o auxílio dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), identificando a ausência de locais públicos destinados à prática de atividades físicas. Esse diagnóstico revelou a inexistência de praças, parques ou quadras esportivas que poderiam ser acessadas pela população infantil do bairro. Essa falta de ambientes adequados para a prática de atividades físicas está associada ao sedentarismo, que pode comprometer o desenvolvimento físico e cognitivo das crianças (SILVA; SILVA, CAVALCANTE NETO, 2017). 

Ao percebermos essa lacuna, buscamos alternativas para envolver as crianças em atividades físicas. Foi então que identificamos um projeto social de acolhimento, o “Projeto Crianças de Deus”, que oferece suporte às crianças carentes da região. Este projeto utiliza o pátio de uma igreja local para realizar momentos de estudo bíblico, seguidos de brincadeiras e atividades físicas, como correr, pular e brincar de pega-pega. Tal iniciativa, embora não substitua um espaço público dedicado, proporciona uma oportunidade para que as crianças tenham alguma atividade física em um ambiente seguro e acolhedor. 

Decidimos então captar crianças tanto do bairro quanto do projeto social para avaliar o impacto da falta de locais para lazer na qualidade de vida deles. Além disso, buscamos compreender outros fatores como o uso excessivo de tecnologias, o sedentarismo e a participação nas atividades físicas escolares e domésticas, identificando as barreiras enfrentadas por essas crianças para manter uma rotina ativa e saudável. 

No dia da intervenção, realizamos uma palestra educativa voltada para as crianças e adolescentes de 9 a 14 anos, abordando conceitos sobre atividade física. Durante a palestra, enfatizamos que a prática de pelo menos 60 minutos diários de atividades físicas é essencial para o desenvolvimento motor e para a prevenção de doenças relacionadas ao sedentarismo, assim como as práticas pedagógicas adequadas ao contexto infantil são fundamentais para a formação integral da criança (COUTO; COUTO; BRUNHEROTTI, 2019). 

Posteriormente, realizamos dinâmicas que visavam avaliar o desempenho físico das crianças, medindo habilidades motoras como força, agilidade e coordenação. Dinâmicas simples, como corridas e jogos, ajudam a avaliar o condicionamento físico e a promover a atividade entre as crianças (SILVA; SILVA, CAVALCANTE NETO, 2017). Essas dinâmicas proporcionaram uma visão clara sobre o nível de condicionamento físico das crianças participantes. A partir disso, percebemos uma variação significativa nas habilidades motoras, com algumas crianças apresentando menor resistência física, o que pode ser reflexo da baixa prática regular de atividades físicas. 

Para complementar a avaliação, aplicamos um questionário estruturado com perguntas sobre a rotina de atividades físicas das crianças.

Quando questionadas sobre a prática regular de atividades físicas, pelo menos três vezes por semana, apenas 21,6% responderam afirmativamente, enquanto 78,4% indicaram que não praticavam. A justificativa para essa baixa taxa de atividade é a falta de espaços adequados e seguros, uma barreira comum em regiões urbanas carentes, que impede as crianças de se exercitarem ao ar livre.

Quanto à participação em atividades ao ar livre, como correr ou andar de bicicleta, observamos uma adesão tão baixa quanto a anterior, com apenas 35,6% das crianças relatando esse tipo de atividade regularmente. A maioria, 64,4%, indicou que não realiza atividades físicas ao ar livre, reforçando o impacto negativo da falta de locais seguros para brincar e se exercitar. Este dado vai na contramão de estudos que afirmam que devemos ter uma visão alargada em relação à crença de que a aprendizagem só ocorre dentro da sala de aula e engrandecer quaisquer espaços que sejam livres (TIRIBA, 2018).

Ademais, o levantamento também mostrou que 90% das crianças participam das aulas de educação física na escola, o que sugere que a escola é o único espaço onde elas têm contato regular com atividades físicas estruturadas. Essa informação ressalta a importância da educação física no currículo escolar como uma ferramenta essencial, visto que os alunos terão a oportunidade não apenas de compreender os conceitos teóricos relacionados ao esporte na escola, mas também de vivenciar na prática a importância da inclusão e da promoção de hábitos saudáveis, contribuindo para o desenvolvimento holístico de cada indivíduo na Educação Física Escolar (SANTOS, 2024).

Quanto aos finais de semana, apenas 34% das crianças disseram fazer alguma atividade física, como jogar futebol ou dançar. A maioria, 66%, permanece inativa, o que evidencia um estilo de vida sedentário e dependente de opções de lazer menos ativas. Esse comportamento pode estar relacionado à insegurança em áreas externas e à falta de incentivo ou de locais adequados para práticas esportivas nos bairros.

Além disso, verificamos que 85% das crianças preferem passar mais tempo jogando videogames ou usando dispositivos móveis em comparação com atividades físicas. Assim, o aumento do tempo de tela entre as crianças têm levantado questões sobre o futuro da saúde mental infantil e a necessidade de intervenções preventivas e políticas de saúde pública (HADDAD FILHO et al., 2024) 

A presença de espaços públicos bem projetados para atividades físicas não apenas estimula a prática regular de exercícios, mas também promove a saúde e o bem-estar nas comunidades urbanas (SANTOS, 2023). Ao analisar os dados coletados, observamos que a ausência de locais seguros limita a prática de atividades ao ar livre, o que, associado ao uso crescente de dispositivos eletrônicos, contribui para o aumento do tempo de sedentarismo. 

Desta forma, a nossa intervenção evidenciou a necessidade de implementar políticas públicas externas para a criação e manutenção de espaços de lazer e atividades físicas nos bairros periféricos. A construção de parques, quadras poliesportivas e áreas recreativas poderia oferecer uma alternativa para o lazer ativo das crianças, diminuindo os índices de sedentarismo e promovendo o desenvolvimento físico e social dos jovens.

CONCLUSÃO 

Em conclusão, o mapeamento e a intervenção realizada no bairro da UBS Aeroporto confirmaram a necessidade de medidas para promover a atividade física infantil, destacando a importância de iniciativas comunitárias e políticas públicas que fomentem espaços seguros para a prática de atividades recreativas. O envolvimento de projetos sociais mostrou-se uma estratégia eficaz, mas ainda limitada pela falta de infraestrutura. Logo, incentivar a participação em atividades físicas e reduzir o tempo de tela são desafios essenciais para melhorar a qualidade de vida das crianças na comunidade. 

Outrossim, a prática regular de atividades físicas é essencial para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, impactando positivamente seu crescimento físico, cognitivo e emocional. A participação em atividades físicas diminui à medida que a idade avança, e a motivação para o exercício também varia com a idade (MELANOROUZI; KHOO; MORRIS, 2015). Dessa forma, a ausência de espaços públicos adequados para a prática de exercícios tem sido um fator limitante, especialmente em áreas urbanas com infraestrutura precária, formando jovens sedentários e com menor vigor físico. 

Assim, recomendamos a ampliação de projetos sociais e investimentos em infraestrutura urbana que priorizem espaços de lazer e prática esportiva para crianças. Além disso, a educação sobre os benefícios das atividades físicas deve ser uma prioridade nas escolas e comunidades, promovendo uma cultura de saúde e bem-estar desde a infância

REFERÊNCIAS

World Health Organization. Guidelines on physical activity, sedentary behaviour and sleep for children under 5 years of age. Geneva: World Health Organization; 2019. 

SANTI, Nathália Mota Mattos et al. Prevalência e incidência da prática insuficiente de atividade física em adolescentes brasileiros durante a pandemia: dados da ConVid Adolescentes. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 26, p. e230049, 2023.

Hallal PC, Andersen LB, Bull FC, et al. Global physical activity levels: surveillance progress, pitfalls, and prospects. Lancet. 2012;380(9838):247-257. 

SILVA, Gabrielle Cerqueira; SILVA, Rodrigo Alves dos Santos; CAVALCANTE NETO, Jorge Lopes. Saúde mental e níveis de atividade física em crianças: uma revisão sistemática. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, v. 25, n. 3, p. 607-615, 2017. 

COUTO, Fernanda Maria; COUTO, Daniela Paula; BRUNHEROTTI, Marisa Afonso Andrade. O ambiente coletivo na educação infantil: a importância da recreação para o desenvolvimento integral da criança. Aletheia, v. 52, n. 1, 2019. 

TIRIBA, L. Desemparedamento da infância: a escola como lugar de encontro com a natureza. 2ª ed. Rio de Janeiro: Criança e Natureza/Alana, 2018. 

SANTOS, Ricardo Braga dos. Educação física escolar, saúde e qualidade de vida: ressignificando práticas pedagógicas para a educação escolar. 2024. Dissertação de Mestrado.

HADDAD FILHO, Marcelo et al. IMPACTO DO USO DE DISPOSITIVOS ELETRÔNICOS NA SAÚDE MENTAL INFANTIL: UMA PERSPECTIVA PEDRIÁTRICA. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, v. 10, n. 4, p. 1097-1104, 2024.

SANTOS, Carlos Israel Rodrigues dos. Perfil etário e modo de utilização de espaços públicos para a prática de atividade física na cidade de Bauru-SP. 2023.

MELANOROUZI, Keyvan; KHOO, Selina; MORRIS, Tony. Motives for adult participation in physical activity: type of activity, age, and gender. BMC Public Health, v. 15, n. 1, 31 jan. 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12889- 015-1429-7. Acesso em: 10 nov. 2024


 1Enfermeira. Afya Faculdade de Ciências Médicas de Santa Inês. herlane.santos@afya.com.br
2Enfermeira. Afya Faculdade de Ciências Médicas de Santa Inês. izabel.santos@afya.com.br
3Enfermeira. Afya Faculdade de Ciências Médicas de Santa Inês. andrea.galiza@afya.com.br