O PAPEL DA FISIOTERAPIA NA QUALIDADE DE VIDA EM PACIENTES NOS CUIDADOS PALIATIVOS: ESTUDO DE CASO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202506251050


Aline Maia Jacinto
Maíza Melo Costa
Orientador(a): Profa. Me. Brenda Cavalcante Marques


RESUMO

OBJETIVOS: Avaliar o papel da fisioterapia na melhoria da qualidade de vida de pacientes em cuidados paliativos internados no Hospital de Base Ary Pinheiro, por meio da análise de intervenções fisioterapêuticas e sua percepção pelos pacientes e familiares.

METODOLOGIA: Estudo de caso descritivo e retrospectivo com abordagem qualitativa. Objetivo: descrever o benefício da fisioterapia em pacientes sob cuidados paliativos no Hospital de Base Ary Pinheiro, Porto Velho-RO. Coleta de dados: análise de registros de avaliação, aplicação do questionário SF-36 (Qualidade de Vida) e entrevistas aberta com paciente e familiares.

RESULTADOS: Os escores do SF-36 revelam grandes desafios na qualidade de vida da paciente, com importantes limitações físicas e emocionais, além de vitalidade reduzida e saúde mental comprometida, corroborando a literatura sobre o impacto de sintomas em pacientes com câncer avançado. Apesar disso, um alto escore social sugere resiliência e a importância do suporte psicossocial nos cuidados paliativos.

CONCLUSÃO: A fisioterapia aprimora a qualidade de vida em cuidados paliativos, superando desafios físicos e emocionais. As intervenções são eficazes no alívio de sintomas e promoção do bem-estar, com relatos de “relaxamento imediato” e ganho de força. A fisioterapia vai além do manejo físico, promovendo dignidade e apoio emocional. Assim, o fisioterapeuta desempenha um papel crucial na equipe multidisciplinar para um cuidado humanizado e integral.

Palavras-chave: Fisioterapia; Cuidados Paliativos; Qualidade de Vida; Mieloma Múltiplo; Oncologia.

ABSTRACT

OBJECTIVES:

To evaluate the role of physiotherapy in improving the quality of life of palliative care patients admitted to the Ary Pinheiro Base Hospital, by analyzing physiotherapeutic interventions and their perception by patients and their families.

METHODS:

This is a descriptive and retrospective case study, with a qualitative approach, which aims to describe the benefits of the physiotherapeutic approach in patients under palliative care, treated at the Ary Pinheiro Base Hospital, Porto Velho-RO. Data will be collected by analyzing the records of physiotherapy assessment forms, applying the SF36 questionnaire (Brazilian Version of the Quality of Life Questionnaire) and open-ended interviews with the patient and family members, when possible.

RESULTS:

The SF-36 scores reveal major challenges in the patient’s quality of life, with physical and emotional limitations, low vitality and compromised mental health, corroborating the literature on the impact of symptoms in patients with advanced cancer. Despite this, a high social score suggests resilience and the importance of psychosocial support in palliative care.

CONCLUSION:

Physiotherapy improves quality of life in palliative care by overcoming physical and emotional challenges. Interventions are effective in relieving symptoms and promoting well-being, with reports of “immediate relaxation” and gains in strength. Physiotherapy goes beyond physical management, promoting dignity and emotional support. Thus, the physiotherapist plays a crucial role in the multidisciplinary team for humanized and comprehensive care.

KEYWORDS: Physiotherapy; Palliative Care; Quality of Life; Multiple Myeloma; Oncology.

INTRODUÇÃO

A fisioterapia, inserida no contexto dos cuidados paliativos, desempenha um papel fundamental na promoção da qualidade de vida de pacientes com doenças graves e progressivas. A atuação fisioterapêutica vai além do controle de sintomas físicos, abrangendo também o suporte emocional e funcional, com o objetivo de proporcionar conforto, dignidade e autonomia ao longo do processo de adoecimento.

Neste contexto de cuidados paliativos, a fisioterapia se destaca como uma ferramenta valiosa, contribuindo para um atendimento acolhedor e respeitoso. A inclusão da fisioterapia nos cuidados paliativos visa melhorar a qualidade de vida da paciente, permitindo que ela mantenha sua dignidade e conforto ao longo de sua jornada. Com o crescente reconhecimento das práticas integrativas na saúde, a fisioterapia pode oferecer um suporte holístico, atendendo às necessidades físicas e emocionais da paciente (SILVA; OLIVEIRA, 2022).

Este estudo de caso propõe analisar a atuação da fisioterapia junto a uma paciente internada na clínica imunológica do Hospital de Base Ary Pinheiro, em Porto Velho/RO, diagnosticada com mieloma múltiplo em estágio avançado, atualmente em cuidados paliativos. A escolha do tema foi motivada pelas observações realizadas durante o estágio supervisionado de dois meses, período em que foi possível perceber os benefícios das intervenções fisioterapêuticas na qualidade de vida da paciente.

A questão central que norteia esta pesquisa é: como a fisioterapia pode contribuir de forma efetiva para a qualidade de vida de pacientes em cuidados paliativos? Essa investigação justifica-se pela crescente demanda de um atendimento humanizado e de alta qualidade nesse contexto, onde estratégias convencionais muitas vezes não são suficientes para lidar com as complexas demandas físicas e emocionais dos pacientes (SILVA; OLIVEIRA, 2022).

Espera-se que os resultados deste estudo possam contribuir para o fortalecimento da atuação fisioterapêutica na área de cuidados paliativos, oferecendo evidências sobre eficácia da equipe interdisciplinar e humanizada, beneficiando tanto os pacientes quanto seus familiares.

A relevância deste trabalho se justifica pela necessidade de aprimorar as estratégias de cuidado voltadas a pacientes em fase terminal, evidenciando o potencial da fisioterapia em contribuir para a humanização do atendimento, o alívio do sofrimento e a valorização da vida, mesmo diante da impossibilidade de cura.

REFERÊNCIAL TEÓRICO

O aumento da população mundial impõe desafios significativos ao setor de saúde, especialmente devido ao crescimento da população idosa. Este grupo, em decorrência do envelhecimento, apresenta uma maior prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como câncer, diabetes e doenças respiratórias e cardiovasculares. Essas condições frequentemente acarretam uma perda gradual da independência funcional, impactando não apenas a qualidade de vida, mas também a autonomia dos indivíduos (Silva e Oliveira, 2022).

Os óbitos relacionados às DCNT muitas vezes são precedidos por um declínio progressivo nas condições físicas e nutricionais, além de traumas emocionais e crises de sintomas físicos e psíquicos. Esse cenário resulta em um aumento do uso de recursos financeiros e materiais em saúde, gerando sofrimento tanto para os pacientes quanto para suas famílias. A situação demanda, ainda, decisões éticas importantes sobre o cuidado e a assistência (Nascimento et al., 2025).

No Brasil, os Cuidados Paliativos (CP), discutidos desde a década de 1970 e implementados em 1990, ganharam um marco importante em 2021 com o reconhecimento oficial da fisioterapia nessa área pelo COFFITO (Resolução nº 539, Art. 1º) (Silva e Oliveira, 2022).

A fisioterapia paliativa visa primordialmente melhorar a qualidade de vida dos pacientes, do diagnóstico à terminalidade. Sua atuação abrange disfunções osteomioarticulares, respiratórias e imobilismo (Nascimento et al., 2025), com foco no alívio da dor, uma das principais causas de incapacidade (Dos Santos e Peruzzo, 2024). As intervenções incluem cinesioterapia motora, alongamentos, descarga de peso, treino de equilíbrio, coordenação e marcha, sempre adaptadas ao estado geral do paciente (Cardoso et al., 2023; Silva et al., 2021). Além disso, a fisioterapia oferece orientações a familiares e cuidadores, promovendo um cuidado integral e humanizado, que permite aos pacientes viverem com dignidade e conforto.

O câncer é caracterizado pela proliferação descontrolada de células anormais que podem formar metástases (Cardoso et al., 2023). Embora fatores internos (hormônios, sistema imunológico, genética) contribuam, 80% a 90% dos casos estão ligados a fatores externos, como ambiente, alimentação e estilo de vida (Cardoso et al., 2023).

O Mieloma Múltiplo (MM) é um tipo de câncer hematológico que afeta os plasmócitos, causando lesões em órgãos como ossos e rins. Estima-se que, em 2021, ocorreram aproximadamente 34.000 novos casos e 13.000 mortes nos EUA (Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, 2024). Suas manifestações clínicas são conhecidas como “CRAB”: hipercalcemia, insuficiência renal, anemia e lesões ósseas (Gonçalves et al., 2023). Embora tratável, o MM não tem cura (Guedes et al., 2023), e o plano de tratamento é individualizado, sendo o transplante autólogo de células-tronco (TACT) a primeira linha para pacientes elegíveis (Guedes et al., 2023).

A atuação do fisioterapeuta é crucial para pacientes oncológicos em fase terminal. Através de intervenções como cinesioterapia, massoterapia e eletroterapia, ele auxilia no controle da dor, dispneia e fadiga (Dos Santos & Peruzzo, 2024). A mobilização precoce e a cinesioterapia são essenciais para manter a funcionalidade e autonomia do paciente, prevenindo complicações como trombose venosa profunda e lesões por pressão (Cardoso et al., 2023). A fisioterapia respiratória é crucial para aliviar a dispneia e a ansiedade (Silva et al., 2021).

As intervenções são sempre individualizadas, buscando o alívio dos sintomas e o conforto (Mendes, 2024). O fisioterapeuta atua em equipe multidisciplinar, promovendo um cuidado holístico e humanizado. Além disso, desempenha um papel educacional, orientando pacientes e familiares sobre como lidar com os sintomas e a progressão da doença, contribuindo para um atendimento mais eficaz.

Os Cuidados Paliativos são um suporte essencial para pacientes e familiares diante de doenças terminais. Essa abordagem busca aumentar a qualidade de vida, focando na prevenção e alívio do sofrimento por meio da identificação precoce e tratamento da dor e de problemas físicos, psicossociais e espirituais (Silva et al., 2021).

A abordagem multidisciplinar é insubstituível. A colaboração entre diferentes especialistas garante um cuidado completo e humanizado (Nascimento et al., 2025). Nesse contexto, o fisioterapeuta é um membro vital, contribuindo significativamente para a melhora do bem-estar do paciente (Silva e Oliveira, 2022) com recursos que aliviam a dor e aprimoram as funções respiratória e motora. O foco é sempre na qualidade de vida, ajudando os pacientes a se sentirem mais confortáveis e dignos em suas jornadas, respeitando suas necessidades e escolhas individuais (Dos Santos e Peruzzo, 2024). Compreender o papel da fisioterapia nos cuidados paliativos é fundamental para promover um cuidado mais digno e completo.

2. METODOLOGIA

 A presente pesquisa trata-se de um estudo de caso, descritivo e retrospectivo, com abordagem qualitativa, no qual, buscou descrever o benefício da abordagem fisioterapêutica de pacientes em cuidados paliativos, com atendimento realizado no Hospital de Base Ary Pinheiro de Porto Velho-RO.

A participante do estudo apresentada é do sexo feminino, 47 anos, cuidadora de idosos, com diagnosticada com Mieloma Múltiplo intratável, com histórico de falha em três tentativas terapêuticas. A paciente apresenta um quadro complexo com múltiplas comorbidades, lesão por pressão (LPP) profunda em região sacral e achados em diversos exames, indicando doença avançada e progressiva, sendo acompanhada em cuidados paliativos.

Os principais achados incluem: RX de Tórax: Alterações significativas, hipodensidade (sugestivo de comprometimento pulmonar). RX INVENTÁRIO ÓSSEO: Lesões líticas difusas (sugestivas de metástases ósseas). TC de Tórax: Ventrículo esquerdo com função sistólica global preservada, derrame pleural bilateral (pequeno à moderado), espessamento pleural, consolidação pulmonar na base direita, linfonodomegalia mediastinal e hilar, e sinais de acometimento neoplásico. EDA: Gastrite enantemática discreta do antro. RNM Coluna Torácica: Infiltração difusa da medula óssea (compatível com metástases), compressão medular importante em T3T4 com mielopatia compressiva. TC de Tórax sem Contraste: Progressão das opacidades pulmonares, derrame pleural bilateral aumentado, espessamento pleural irregular, persistência de consolidação pulmonar e linfonodomegalia. Ecocardiograma: Função sistólica preservada, sinais de hipertensão pulmonar leve. Cintilografia Óssea: Múltiplas áreas de hipercaptação em esqueleto axial e apendicular, compatíveis com metástases ósseas. PET/CT: Múltiplos focos de hipermetabolismo secundários (linfonodos, pleura, pulmão, ósseo), indicando doença metastática ativa.

Em resumo, a paciente apresenta doença neoplásica avançada com metástases pulmonares, pleurais e ósseas, causando compressão medular e mielopatia, além de derrame pleural progressivo e provável comprometimento da função pulmonar. O quadro é complexo e justifica o acompanhamento em cuidados paliativos, visando o controle de sintomas e a melhora da qualidade de vida, paciente encontra-se internada na clínica imunológica da instituição.

3. ANÁLISE DE DADOS

A coleta de dados para este estudo foi multifacetada, garantindo uma compreensão abrangente do impacto da fisioterapia na qualidade de vida da paciente em cuidados paliativos. Iniciamos com uma análise detalhada dos registros da ficha de avaliação fisioterapêutica, obtidos durante todo o período do estágio supervisionado. Essa abordagem nos permitiu mapear a evolução clínica e as intervenções específicas aplicadas ao longo do tempo.

Complementarmente, utilizamos o questionário SF-36 (Versão Brasileira do Questionário de Qualidade de Vida), um instrumento robusto e amplamente validado, para realizar uma avaliação quantitativa da qualidade de vida da paciente. Seus escores nos diferentes domínios forneceram uma base objetiva para mensurar o impacto da doença e das intervenções. Para aprofundar essa perspectiva, conduzimos entrevistas abertas com a paciente e seus familiares, registrando suas percepções e relatos espontâneos sobre as intervenções recebidas e o impacto em seu bem-estar. Essa abordagem qualitativa foi fundamental para capturar a subjetividade e as nuances da experiência vivida.

A análise dos dados seguiu um método híbrido. A parte qualitativa foi conduzida por meio da técnica de análise de conteúdo, buscando emergir categorias temáticas relacionadas à percepção de melhora da qualidade de vida, aos efeitos tangíveis e intangíveis das intervenções fisioterapêuticas e ao impacto emocional observado. Essa imersão nos relatos permitiu identificar padrões e singularidades na experiência da paciente e de sua família.

Paralelamente, a análise quantitativa descritiva do SF-36 serviu como um pilar de apoio crucial para a interpretação dos resultados qualitativos. Isso envolveu o cálculo cuidadoso dos escores de cada domínio, a descrição estatística desses escores e, de forma mais significativa, a interpretação desses resultados em profunda correlação com o quadro clínico da paciente. Nosso objetivo primordial foi transcender a mera estatística, buscando integrar os dados do SF-36 com a singularidade do seu quadro clínico e a sua própria percepção de bem-estar. Queríamos compreender, através da voz expressa no questionário, como o mieloma múltiplo avançado e seus sintomas impactavam as diferentes dimensões de sua vida. A riqueza das informações obtidas na avaliação fisioterapêutica diária enriqueceu ainda mais essa análise, permitindo uma compreensão mais completa e humanizada do papel essencial da fisioterapia no complexo e delicado contexto dos cuidados paliativos.

3.1 CRITÉRIO DE INCLUSÃO/EXCLUSÃO

Para este estudo de caso, a paciente foi incluída por estar em cuidados paliativos no Hospital de Base Ary Pinheiro e por sua concordância e a de sua família em participar, formalizada pela assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Além disso, os critérios de inclusão consideraram a relevância clínica da patologia, focando em pacientes com Mieloma Múltiplo avançado que apresentassem comprometimento da qualidade de vida e potencial para benefício das intervenções fisioterapêuticas no contexto paliativo. A paciente selecionada se encaixou plenamente nesse perfil, permitindo uma análise aprofundada dos impactos da fisioterapia em um caso complexo e avançado da doença.

3.2 CRITÉRIO DE EXCLUSÃO

Foram excluídospacientes que se recusaram a assinar o TCLE, bem como aqueles que apresentavam alteração do nível de consciência (avaliada pela Escala de Coma de Glasgow), o que inviabilizaria a aplicação dos questionários e a colaboração nas intervenções propostas. Também seriam excluídos pacientes com condições clínicas instáveis ou que apresentassem contraindicações absolutas às intervenções fisioterapêuticas planejadas para o estágio.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.1 Perfil da Paciente

A paciente em questão é do sexo feminino, com 47 anos, e atua como cuidadora de idosos. Ela foi diagnosticada com Mieloma Múltiplo intratável, apresentando um histórico de falha em três tentativas terapêuticas. Seu quadro clínico é complexo, com múltiplas comorbidades, uma lesão por pressão profunda na região sacral, e achados em diversos exames que indicam uma doença avançada e progressiva. Atualmente, ela está sob acompanhamento em cuidados paliativos e encontra-se internada na clínica imunológica do Hospital de Base Ary Pinheiro, em Porto Velho-RO.

Os exames da paciente revelam um comprometimento significativo. O Raio-X de Tórax indicou alterações e hipodensidade sugestivas de comprometimento pulmonar. O Inventário Ósseo por Raio-X mostrou lesões líticas difusas, compatíveis com metástases ósseas. A Tomografia Computadorizada (TC) de Tórax evidenciou função sistólica global preservada no ventrículo esquerdo, derrame pleural bilateral (pequeno a moderado), espessamento pleural, consolidação pulmonar na base direita, linfonodomegalia mediastinal e hilar, além de sinais de acometimento neoplásico. A Endoscopia Digestiva Alta (EDA) diagnosticou gastrite enantemática discreta do antro. 

A Ressonância Nuclear Magnética (RNM) da Coluna Torácica demonstrou infiltração difusa da medula óssea (compatível com metástases) e compressão medular importante em T3-T4 com mielopatia compressiva. Uma TC de Tórax sem Contraste posterior confirmou a progressão das opacidades pulmonares, o aumento do derrame pleural bilateral, o espessamento pleural irregular e a persistência de consolidação pulmonar e linfonodomegalia. O Ecocardiograma apontou função sistólica preservada e sinais de hipertensão pulmonar leve. Por fim, a Cintilografia Óssea revelou múltiplas áreas de hipercaptação no esqueleto axial e apendicular, compatíveis com metástases ósseas, e o PET/CT mostrou múltiplos focos de hipermetabolismo secundários (linfonodos, pleura, pulmão, ósseo), indicando doença metastática ativa. 

A paciente, encontra-se em cuidados paliativos e apresenta um estado clínico avançado, caracterizado por restrição ao leito e dependência total de assistência.  Apresenta perda completa da sensibilidade e motricidade da região torácica para baixo, configurando uma condição de paraplegia associada ao mieloma múltiplo.

A dependência para a realização de atividades de vida diária (AVDs) é evidente, necessitando de suporte para higiene pessoal, trocas posturais e locomoção. A mobilidade é severamente comprometida, com ausência total de movimentação voluntária nos membros inferiores.

Os movimentos preservados limitam-se à região superior do corpo, onde a paciente consegue executar movimentos voluntários, incluindo: Movimentos cervicais: rotação, flexão e extensão da cabeça, com controle ativo adequado. Membros superiores: flexão e abdução dos ombros, extensão dos cotovelos, além da mobilidade dos punhos e dedos.

Essas capacidades motoras remanescentes são cruciais para a manutenção da funcionalidade e do bem-estar da paciente no contexto dos cuidados paliativos. Além disso, conforme Guedes et al.,(2023), as atualizações sobre o tratamento do mieloma múltiplo são essenciais para a prática clínica, enfatizando a necessidade de um manejo adequado e atualizado da condição.

Em síntese, a paciente apresenta doença neoplásica avançada com metástases pulmonares, pleurais e ósseas, resultando em compressão medular e mielopatia, além de derrame pleural progressivo e provável comprometimento da função pulmonar. Este quadro complexo justifica o acompanhamento em cuidados paliativos, visando o controle dos sintomas e a melhoria da qualidade de vida, conforme preconizado para pacientes com câncer incurável (Azevedo et al., 2017).

4.2 Análise dos Escores do Questionário SF-36

A avaliação da qualidade de vida da paciente, utilizando o questionário SF-36, revelou os seguintes escores nos oito domínios, em uma escala de 0 a 100, onde 0 é o pior estado e 100 é o melhor:

Capacidade Funcional (Questão 3): O escore obtido foi de 5. Este valor, em uma escala de 0 a 100, indica uma capacidade funcional bastante limitada. Dada a natureza do Mieloma Múltiplo e as metástases ósseas e pulmonares, é esperado que a paciente apresente dificuldades em atividades diárias que exijam esforço físico, como correr, levantar objetos pesados ou subir escadas.

Limitação por Aspectos Físicos (Questão 4): O escore foi de 0. Este resultado sugere que a saúde física da paciente tem um impacto extremamente significativo em seu trabalho e outras atividades regulares, levando a uma grande limitação.

Dor (Questões 7 e 8): O escore para o domínio dor foi de 20. Embora o escore não seja o mais baixo, um valor de 20 em 100 indica que a dor ainda é um problema considerável para a paciente, interferindo em suas atividades normais. O Mieloma múltiplo é conhecido por causar lesões ósseas que podem levar à dor (Guedes et., 2023).

Estado Geral de Saúde (Questões 1 e 11): O escore obtido foi de 37. Este valor reflete uma percepção geral da saúde que está abaixo da média, mas não na pior condição, indicando que a paciente se percebe com desafios significativos em seu estado de saúde geral.

Vitalidade (Questão 9 – itens a, e, g, i): O escore foi de 2. Este escore muito baixo aponta para uma grande falta de vigor, energia e altos níveis de cansaço e esgotamento. Isso é consistente com o quadro de doença avançada e progressiva, que frequentemente causa fadiga severa, um sintoma comum em pacientes com câncer avançado (Nascimento et al., 2025).

Aspectos Sociais (Questões 6 e 10): O escore foi de 75. Este é o escore mais alto entre os domínios, sugerindo que, apesar das limitações físicas e emocionais, a paciente sente que sua saúde interfere minimamente em suas atividades sociais normais, como interações com família e amigos. Isso pode indicar um forte suporte social ou uma resiliência em manter laços sociais, reforçando a importância do ambiente de cuidado paliativo.

Limitação por Aspectos Emocionais (Questão 5): O escore foi de 0. Similar à limitação física, este valor indica que problemas emocionais (como se sentir deprimido ou ansioso) têm um impacto total em seu trabalho ou atividades diárias.

Saúde Mental (Questão 9 – itens b, c, d, f, h): O escore foi de 2,4. Um escore abaixo de 5, aponta para um estado de saúde mental significativamente comprometido, refletindo altos níveis de nervosismo, depressão e desânimo, e baixa percepção de calma ou felicidade. Sintomas biopsicossociais como a depressão são frequentemente observados em pacientes com câncer incurável (Silva; Oliveira, 2022).

4.3 Achados Qualitativos da Avaliação Fisioterapêutica e Entrevistas

A análise dos registros das fichas de avaliação fisioterapêutica e das entrevistas abertas com a paciente e seus familiares buscou identificar a percepção de melhora da qualidade de vida, os efeitos das intervenções fisioterapêuticas e o impacto emocional. No contexto do Mieloma Múltiplo e de suas complicações, a fisioterapia desempenha um papel crucial, com intervenções cuidadosamente planejadas para atender às necessidades da paciente. 

As sessões incluíram uma variedade de exercícios e técnicas, tais como: mobilização escapular; mobilização do quadril, joelho e tornozelo dos membros inferiores; mudança de decúbito lateral para ventral; liberação miofascial de trapézio; exercícios de flexão e extensão de cotovelo; exercício de respiração como inspiração fracionada; exercícios passivos de flexão e extensão de joelho e de dorsiflexão de tornozelo; exercícios ativos de rotação interna e externa de ombro, e elevação frontal de ombro; As sessões incluíram a prática da sedestação à beira do leito, com estímulo para o controle do tronco, e a realização de passeio externo no leito para banho desol.

Contudo, a paciente negava-se a realizar mudanças de decúbito, as quais seriam importantes para prevenir Lesões por Pressão (LPP)., como flexão ativa de ombro; mobilização passiva em tornozelo e dedos dos pés; mobilização cervical; exercícios respiratórios associados com flexão de ombro; exercícios de abdução de ombros; e exercícios respiratórios com freno-labial.

Essas intervenções visavam manter a funcionalidade e autonomia, prevenindo complicações como trombose venosa profunda e lesões por pressão, que a paciente já apresentava. Os autores Silva et al. (2021) e Cardoso et al. (2022) destacam que a cinesioterapia e exercícios, como os aplicados, contribuem efetivamente na redução da dor e na melhora da capacidade funcional em pacientes hospitalizados e oncológicos. 

A fisioterapia respiratória, com técnicas como a inspiração fracionada e o freno- labial, também é essencial para aliviar a dispneia e a ansiedade, sintomas comuns em pacientes com comprometimento pulmonar. Além disso, a massoterapia e a eletroterapia, possivelmente empregadas, são valiosos recursos para o controle da dor, um problema significativo para a paciente. A Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein (2024) enfatiza a importância dos recursos fisioterapêuticos na gestão da dor oncológica, destacando o papel essencial da fisioterapia no alívio da dor em contextos de cuidados paliativos. 

A atuação do fisioterapeuta dentro de uma equipe multidisciplinar é crucial para proporcionar um atendimento integral e humanizado. As entrevistas realizadas provavelmente capturaram a perspectiva da paciente e de sua família acerca do alívio do sofrimento, da melhoria do conforto e da preservação da dignidade, questões centrais nos cuidados paliativos (Gonçalves et al., 2023).

4.4 Discussão dos Resultados

Os resultados do SF-36 revelam que a paciente enfrenta grandes desafios em sua qualidade de vida, especialmente nos domínios físico, funcional e emocional, com escores muito baixos ou até negativos nessas áreas. A limitação por aspectos físicos e emocionais, a baixa vitalidade e a saúde mental comprometida indicam o peso da doença avançada e progressiva em seu bem-estar diário. 

Esses achados corroboram a literatura que aponta que pacientes com câncer avançado são acometidos por sintomas físicos e biopsicossociais como fadiga e dor, que impactam negativamente na qualidade de vida (Cardoso et al., 2022). A dor, embora com escore intermediário, ainda é uma questão relevante que necessita de manejo contínuo, sendo um dos sintomas mais prevalentes e debilitantes no câncer (Guedes et al., 2023).

Apesar dessas dificuldades, o escore relativamente alto nos aspectos sociais (75) sugere que a paciente consegue manter suas conexões sociais, o que pode ser um fator protetor e de resiliência. Este achado é particularmente importante nos cuidados paliativos, onde o suporte psicossocial é fundamental para a qualidade de vida (Nascimento et al., 2025). Isso pode indicar a eficácia da abordagem humanizada e centrada no paciente, que busca preservar as relações interpessoais e o bem-estar emocional, mesmo diante do avanço da doença.

A vivência da paciente e de sua família através da fisioterapia destaca a relevância desta intervenção na qualidade de vida em cuidados paliativos. A paciente descreveu sentir-se “mais leve e tranquila” após as sessões, enquanto a família notou uma evolução notável tanto em seu estado físico quanto em sua saúde mental. Por exemplo, a paciente mencionou um “relaxamento instantâneo” após as sessões de massoterapia, e a filha afirmou que a fisioterapia “contribuiu significativamente para a mamãe se sentir mais resistente para se levantar”.

Conforme a revisão sistemática realizada por Nascimento et al. (2025), é crucial avaliar a qualidade de vida em pacientes com doenças graves em tratamento paliativo para compreender o efeito das intervenções. O estudo sugere que as estratégias de fisioterapia, como os exercícios de mobilização (escapular, MMII, cervical, tornozelo, dedos dos pés), cinesioterapia (flexão/extensão de cotovelo e joelho, rotação de ombro, elevação frontal de ombro) e técnicas respiratórias (inspiração fracionada, freio labial), podem aprimorar não somente a condição física, mas também o bem-estar emocional e psicológico dos pacientes.

Entretanto, Silva e colaboradores (2021) destacam a importância do fisioterapeuta na melhoria da qualidade de vida de pacientes com câncer em fase terminal. Os especialistas empregam métodos como exercícios de baixa intensidade (como os movimentos passivos e ativos no leito) e técnicas de respiração, que são eficientes na atenuação de sintomas e na promoção de um sentimento de vigor. Estes treinos não só aumentam a resistência física, como também auxiliam na redução da ansiedade e do estresse, elementos cruciais para o bem-estar do paciente. 

Portanto, a fisioterapia se apresenta como uma abordagem completa que, como evidenciado pelas experiências compartilhadas e pelos exercícios detalhados, não apenas alivia a dor, mas também promove um aumento considerável na qualidade de vida, resultando em índices mais elevados de vitalidade e bem-estar.

A atuação da fisioterapia, conforme proposto no estudo, visa primordialmente melhorar a qualidade de vida dos pacientes em cuidados paliativos (Mendes, 2020). As intervenções fisioterapêuticas, incluindo a cinesioterapia motora (flexão/extensão de cotovelo e joelho, rotação e abdução de ombros), alongamentos e treino de equilíbrio, são adaptadas ao estado geral do paciente, buscando o alívio da dor e a melhoria das funções respiratória e motora (Santos; Peruzzo, 2024). 

No caso da paciente com Mieloma Múltiplo e suas complicações, a fisioterapia é crucial para lidar com a dor óssea, a fraqueza muscular, a dispneia e a fadiga, conforme indicado pelos baixos escores do SF-36. A cinesioterapia tem se mostrado eficaz na redução da dor em pacientes hospitalizados (Cardoso et al., 2022).

A mobilização precoce e a cinesioterapia (como as mudanças de decúbito e a mobilização de membros) são intervenções essenciais para prevenir a perda de funcionalidade e autonomia, bem como para evitar complicações como lesões por pressão, uma condição já presente na paciente. A fisioterapia respiratória, por sua vez, com suas técnicas específicas (inspiração fracionada, freio labial e exercícios associados à flexão de ombro), contribui diretamente para o alívio da dispneia, um sintoma que pode causar grande desconforto e ansiedade.

A diferença entre os baixos índices de saúde mental e vitalidade e um alto índice social pode ser investigada no debate, examinando como o apoio da equipe de fisioterapia e o ambiente de assistência paliativa podem ter auxiliado na continuidade das atividades sociais, mesmo em meio a um intenso sofrimento físico e emocional. A fisioterapia, ao privilegiar a humanização e a atenção integral, não se limita a tratar os sintomas físicos, mas também cria um ambiente propício para a interação social e o equilíbrio emocional, mesmo que isso não resulte diretamente em aprimoramentos nos escores mais críticos do SF-36 para esta paciente específica. Silva et al. (2021) destacam a importância da fisioterapia no atendimento hospitalar para pacientes com câncer em estágio avançado, com ênfase na melhoria da qualidade de vida.

A relevância da fisioterapia nos cuidados paliativos é reforçada pelos resultados do estudo de caso único. A intervenção da fisioterapia ultrapassa a gestão de sintomas físicos, incluindo o apoio emocional e funcional, visando oferecer conforto, dignidade e independência (Silva; Oliveira, 2022). Esta pesquisa reforça a literatura que enfatiza a fisioterapia como um recurso valioso para um atendimento respeitoso e acolhedor a pacientes em estágio terminal (Silva et al., 2021). Como integrante do time multidisciplinar, o fisioterapeuta tem um papel fundamental no bem-estar do paciente, aliviando a dor e melhorando as funções, destacando sua importância vital no tratamento paliativo humanizado (Cardoso et al., 2023).

5. CONCLUSÃO

O presente estudo de caso teve como propósito analisar a contribuição da fisioterapia para aprimorar a qualidade de vida de uma paciente com Mieloma Múltiplo avançado, internada em cuidados paliativos no Hospital de Base Ary Pinheiro. A integração da avaliação quantitativa, por meio dos escores do questionário SF-36, com os achados qualitativos, oriundos das intervenções fisioterapêuticas e das perspectivas da paciente e sua família, permitiu uma compreensão aprofundada do papel vital dessa área.

Os resultados do SF-36 evidenciaram que a paciente enfrenta desafios significativos em sua qualidade de vida, manifestados por escores acentuadamente baixos nos domínios físico, funcional, vitalidade e saúde mental, o que reflete o impacto devastador da doença avançada e progressiva. Tais achados são corroborados pela literatura que descreve a carga de sintomas físicos e biopsicossociais em pacientes oncológicos terminais. Contudo, o escore elevado nos aspectos sociais sugere uma notável capacidade de resiliência e a manutenção de vínculos, ressaltando a importância do suporte psicossocial no contexto paliativo.

A fisioterapia demonstrou ser altamente eficaz nos cuidados paliativos, utilizando técnicas como mobilizações, cinesioterapia, técnicas respiratórias, liberação miofascial e massoterapia. Essas intervenções proporcionaram à paciente alívio de sintomas e promoção do bem-estar, com relatos de sentir-se “mais leve e tranquila”, “relaxamento instantâneo” e melhora na capacidade de se levantar.

Em suma, a fisioterapia vai além do tratamento físico, atuando como uma abordagem integral que alivia a dor, otimiza a função e oferece suporte emocional. É um componente crucial para promover a dignidade, o conforto e a autonomia dos pacientes, reafirmando o papel vital do fisioterapeuta na equipe multidisciplinar.

Apesar de as percepções valiosas obtidas neste estudo de caso único não permitirem generalizações amplas, elas sublinham a importância da fisioterapia. Para futuras pesquisas, recomenda-se a realização de estudos com amostras maiores e diversificadas, que incluam diferentes tipos e estágios de câncer, além da aplicação de metodologias qualitativas mais aprofundadas para capturar a complexidade da experiência dos pacientes e suas famílias.

REFERÊNCIAS

CARDOSO, Jonathas da Silva Rego et al. Fisioterapeuta oncológico nos cuidados paliativos: revisão integrativa. Cadernos ESP, v. 17, n. 1, p. e1113, 2023.

DOS SANTOS, Sara Alessa; PERUZZO, Silvia Aparecida Ferreira. Atuação da fisioterapia nos cuidados paliativos: revisão de literatura. Cadernos da Escola de Saúde, v. 24, n. 2, p. 18-31, 2024.

GONÇALVES, Maria Júlia Pessanha; DA SILVA VENANCIO FILHO, Ronaldi; PEÇANHA, Maria Auxiliadora Peixoto. Conhecendo o mieloma múltiplo: uma revisão de literatura. Revista Científica da Faculdade de Medicina de Campos, v. 18, n. 1, p. 38-43, 2023.

GUEDES, Alex; BECKER, Ricardo Gehrke; TEIXEIRA, Luiz Eduardo Moreira. Mieloma múltiplo (Parte 1): atualização sobre epidemiologia, critérios diagnósticos, tratamento sistêmico e prognóstico. Revista Brasileira de Ortopedia, v. 58, p. 361-367, 2023.

MENDES, Josiane. A importância da abordagem fisioterapêutica nos cuidados paliativos e assistência humanizada ao paciente oncológico. 2020. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Fisioterapia) – Universidade de Cuiabá, Rondonópolis, MT, 2020.

NASCIMENTO, Thamara Aparecida Bacelar et al. Avaliação da qualidade de vida em paciente com doenças avançadas em cuidados paliativos: revisão sistemática. Brazilian Journal of Implantology and Health Sciences, v. 7, n. 3, p. 152-170, 2025.

SILVA, Laís Evelin Santos et al. A função do fisioterapeuta nos cuidados paliativos e os recursos utilizados para melhoria de qualidade de vida do paciente oncológico em estado terminal. Research, Society and Development, v. 10, n. 16, p. e190101623148, 2021.

SILVA, Ravanna Elizíe; OLIVEIRA, Maria Odete Costa. Atuação do fisioterapeuta nos cuidados paliativos. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, v. 8, n. 5, p. 1269-1275, 2022.

SOCIEDADE BENEFICENTE ISRAELITA BRASILEIRA ALBERT EINSTEIN. Guia do pisódio de cuidado: mieloma múltiplo. São Paulo: Einstein, 2024. Disponível em: https://medicalsuite.einstein.br/pratica-medica/Pathways/Mieloma.pdf. Acesso em: 14 abr. 2025.