STANDARD PROBATÓRIO “ALÉM DA DÚVIDA RAZOÁVEL” APLICADO AO  PROCESSO PENAL BRASILEIRO.¹

EVIDENTIARY STANDARD “BEYOND REASONABLE DOUBT” APPLIED TO THE BRAZILIAN CRIMINAL PROCEDURE.

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202505311059


Sarah dos Santos Pereira2
Profª. Dra. Leticia Lourenço Sangaleto Terron3


RESUMO 

O presente trabalho tem por escopo, a análise da aplicação do standard probatório e o critério  da “Prova Além da Dúvida Razoável” para a condenação no processo penal brasileiro, evidenciando a quem compete a implementação desse mecanismo no ordenamento jurídico e  como serão suas fases no processo. Além do mais, conceituar e elucidar a valoração da prova,  o ônus probatório e o princípio da busca pela verdade real. A problemática em questão é a  ausência de um padrão de produção probatória, de modo que o controle punitivo fica à mercê  da discricionariedade do julgador, levando a condenações injustas. Em consonância, a 

implementação do standard de prova, reduziria os riscos de erros judiciários. O artigo foi  elaborado utilizando-se dos métodos qualitativo e bibliográfico, conduzidos por estudos  fundados na Constituição Federal vigente, bem como legislações específicas, artigos  científicos, doutrinas, através de pesquisas na internet, em livros, examinando o entendimento  e a repercussão do tema. Portanto, tem o presente trabalho, o intuito de demonstrar a pertinência  dos standards de prova no ordenamento jurídico brasileiro que somente se preenchidos os  requisitos necessários, forme um juízo condenatório, tendo como efeito uma redução dos danos  causados por erros judiciais. 

Palavras-chaves: Standard Probatório. Além da Dúvida Razoável. Verdade Real. Decisão. 

ABSTRACT 

The present work has as its focus, the analysis of the application of the evidentiary standard and  the criterion of “Proof Beyond Reasonable Doubt” for conviction in the Brazilian criminal  process, as well as to conceptualize and elucidate the evaluation of evidence and the principle  of real truth. The problem in question is the absence of a standard of evidentiary production, so  that punitive control is at the mercy of the discretion of the judge, leading to unjust convictions.  In line, the implementation of the standard of proof would reduce the risks of miscarriage of  justice. The article was prepared using qualitative and bibliographic methods, conducted by  studies based on the current Federal Constitution, as well as specific legislation, scientific  articles, doctrines, through internet research, in books, examining the understanding and  repercussion of the theme. Therefore, the present work aims to demonstrate the relevance of  the standards of proof in the Brazilian legal system that only if fulfilled, form a condemnatory  judgment, with the effect of reducing the damages caused by judicial errors. 

Keywords: Standard Evidence. Beyond Reasonable Doubt. Real truth. Decision.

1. INTRODUÇÃO 

O presente artigo tem como escopo, o estudo da aplicação de um dos standards  probatórios seguindo o padrão da Prova Além da Dúvida Razoável ao processo penal brasileiro,  conceituando a Busca Pela Verdade Real e indicando sua relevância ao poder punitivo, de modo  a demonstrar a pertinência dos standards de prova no ordenamento jurídico brasileiro que  somente se preenchidos os requisitos necessários, forme um juízo condenatório, tendo como  efeito uma redução dos danos causados por erros judiciais. 

Dos standards de prova, depreende-se que são critérios, padrões de um mínimo  probatório, ou seja, de um ‘quanto’ de prova é necessário para que se considere um fato como  provado. Dessa forma, a prova tem total relevância no processo penal, porque é por meio dela  e da forma que será apreciada e valorada pelo magistrado que se chegará em uma sentença mais  digna e justa.  

Há de se considerar que a formação de uma sentença penal ocorre pelo conjunto  probatório apresentado pelas partes, sendo analisado pelo julgador a reconstrução dos fatos  ocorridos entre os litigantes, para que ao fim ele delibere o que não impugna a verdade. Ocorre  que, existe um tensionamento entre a prova e a decisão, já que não basta produzir provas se ao  final abre-se espaço ao decisionismo, isto é, decide-se conforme convicção pessoal. 

Idealmente, cabe ao legislador estabelecer esses standards, principalmente em sistemas  jurídicos de civil law, onde a codificação do direito predomina. Em países de common law, os  standards são geralmente definidos pelo Judiciário, o que pode gerar insegurança jurídica. O  risco de erro é inerente ao sistema, e a falta de intervenção legislativa não impede o  desenvolvimento de padrões probatórios, que podem ser influenciados pela doutrina e  jurisprudência. Os standards probatórios se aplicam a todas as fases do processo, desde a  investigação até a sentença, com níveis de exigência variando conforme a etapa. 

Portanto, diante do exposto, a aplicação do standard probatório por meio dos métodos  de pesquisa qualitativo e bibliográfico, conduzidos por estudos fundados na Constituição  Federal de 1988, bem como legislações especiais, artigos científicos, pesquisas virtuais e  doutrinárias é de suma relevância na processualística brasileira, para que ocorra uma sistematização dos mecanismos de controle, reduzindo os erros nas decisões judiciais versando  o princípio do in dubio pro reo, que somente após preenchidos os requisitos necessários,  autorize um juízo condenatório.

2. PROVA: CONCEITO E VALORAÇÃO 

Antes de tudo é preciso entender que a palavra ‘prova’, etimologicamente, originou-se do latim “probatio” que significa verificação, confirmação, formar juízo. No processo, a prova  possui natureza polissêmica, isto é, diferentes significados, podendo indicar o ato de provar: ação para verificar a verdade de um fato apresentado; os meios de prova: método utilizado para  demonstrar a verdade e ainda o resultado da ação de provar: momento em que o juiz analisará a validade e legalidade das provas, valorando-as para chegar a uma conclusão. 

Outrossim, é o meio pelo qual as partes demonstram os fatos que sucederam sobre uma  determinada demanda, levando elementos de prova ao conhecimento do magistrado com o  objetivo de lograr seu convencimento, sendo ele o destinatário imediato. Segundo o jurista  Fernando Capez (2024, p. 142): “no que toca à finalidade da prova, destina-se à formação da  convicção do juiz acerca dos elementos essenciais para o deslinde da causa.”. 

Todavia, mesmo que a prova seja todo e qualquer elemento material dirigido ao juiz, é  necessário preencher requisitos elementares para que seja validada, entendendo por licitude, aquela que está de acordo com as normas constitucionais de acordo com o art. 5º, inciso LVI,  CF/88, pertinência, aquela que se relaciona com o assunto em questão e relevância, aquela que  possui caráter essencial para compreender a lide, sendo insignificantes os fatos notórios, os  fatos presumidos e fatos evidentes. 

Portanto, para as partes é elemento instrumental, uma vez que averigua as  fundamentações de suas alegações. Além disso, tem papel crucial no âmbito processual, dado que, é mediante o conjunto probatório que se almeja uma decisão mais justa em conformidade  com o devido processo legal, seja para a absolvição ou condenação de uma demanda. 

Evidentemente, a prova depreende o direito à sua apreciação e valoração pelo julgador no momento da sentença. Diante disso, todas as provas e alegações das partes, garantidas pelo princípio do contraditório, devem ser objeto de análise e avaliação pelo magistrado, sob pena  de violar o referido princípio. 

O sistema vigente para apreciação das provas é o denominado Livre Convencimento  Motivado ou Persuasão Racional, conforme descreve o art. 155 do CPP, segundo o qual o  magistrado tem a liberdade para formar seu convencimento, desde que apresente os  fundamentos de direito e de fato.  

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. 

Por esse sistema, as provas não possuem um valor predeterminado, nem peso legal,  sendo examinadas conforme a livre apreciação que é conferida ao julgador, devendo somente  apresentar as razões para tal decisão, sob pena de nulidade conforme garantia constitucional  expressa no art. 93, inciso IX, CF/88, “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário  serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade […]”. 

2.1 O ônus da prova no processo penal 

Já superado o conceito e valoração da prova, cabe agora aclarar quem tem o ônus probatório no processo penal. No âmbito do processo civil entende-se que cada parte deve  provar os fatos alegados, já no processo penal existem dois entendimentos, sendo que o  entendimento predominante está no mesmo sentido da sistemática do processo cível, e o  entendimento minoritário aduz que a carga probatória incumbe somente a acusação. 

Assim sendo, a doutrina majoritária interpreta que, (Capez, 2017, p.407): 

Cabe provar a quem tem interesse em afirmar. A quem apresenta uma pretensão cumpre provar os fatos constitutivos; a quem fornece a exceção cumpre provar os fatos extintivos ou as condições impeditivas ou modificativas. A prova da alegação (onus probandi) incumbe a quem a fizer  (CPP, artigo 156, caput). Exemplo: cabe ao Ministério Público provar a existência do fato criminoso, da sua realização pelo acusado e também a prova dos elementos subjetivos do crime (dolo ou culpa); em contrapartida, cabe ao acusado provar as causas excludentes da antijuridicidade, da culpabilidade e da punibilidade, bem como circunstâncias atenuantes da pena ou concessão de benefícios legais. 

Todavia, mesmo mencionado no entendimento predominante, nota-se uma interpretação  errônea, uma vez que, o caput do art. 156, CPP, determina que quem alega/acusa deve provar,  ou seja, se a alegação é feita pelo acusador ele deve demonstrar a autoria e materialidade do  crime, não o acusado, nesse caso, ocorreria a inversão do ônus o que não existe no processo  penal. Em contrapartida a doutrina minoritária, Aury Lopes Junior (2017, p.357) interpreta: 

A primeira parte do artigo 156 do CPP deve ser lida à luz da garantia  constitucional da inocência. O dispositivo determina que ‘a prova da alegação incumbirá a quem a fizer’. Mas a primeira (e principal) alegação feita é a que  consta na denúncia e aponta para a autoria e a materialidade; logo, incumbe ao MP o ônus total e intransferível de provar a existência do delito. Gravíssimo erro é cometido por numerosa doutrina (e rançosa jurisprudência), ao afirmar que à defesa incumbe a prova de uma alegada excludente. Nada mais equivocado, principalmente se compreendido o dito até aqui. A carga do acusador é de provar o alegado; logo, demonstrar que alguém (autoria) praticou um crime (fato típico, ilícito e culpável). Isso significa que incumbe ao acusador provar a presença de todos os elementos que integram a tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade e, logicamente, a inexistência das causas de justificação. 

O princípio da presunção de inocência é a garantia fundamental do acusado, pois  ninguém será declarado culpado sem fato devidamente provado, muito menos produzirá provas  contra si. O papel da defesa, nesse sentido, é de contrapor as hipóteses suscitadas em juízo pelo  acusador, fazendo contraprovas e até mesmo produzir provas independentes. 

No entanto, o dano que a defesa pode assumir é a teoria intitulada ‘Perda de uma  chance’, pois se a defesa tem provas consideráveis da inocência do acusado e deixa de  apresentar as chances de êxito da acusação é maior. O silêncio do acusado, é um dos casos  frequentes que evidencia esse fato, muitas das vezes o réu opta por não falar e a chance de  lograr o convencimento do juiz é perdida. Mas, mais uma vez, frisa-se que a acusação deve provar as alegações e suficientemente demonstrar o fato, isto é, atender a um padrão mínimo  de provas.  

Sendo assim, é evidente que o ônus probatório no processo penal deve seguir à luz das  garantias da Constituição da República, em que o juiz é mero espectador da ação, cabendo ao acusador demonstrar provas detalhadas sobre as alegações imputadas que superem a dúvida  razoável, sob pena do pedido condenatório ser improcedente, pois a única certeza é a inocência  do acusado. 

3. PRINCÍPIO DA VERDADE REAL 

Preliminarmente, a verdade que se busca nas provas através do procedimento é a  aproximação dos fatos tendo como base a produção probatória apresentada pelas partes, de  modo que esta verdade não pode ser considerada absoluta, isso porque o juiz desconhece os  fatos, tendo contato apenas com a reconstrução deles e decidindo por aquilo que mais lhe  parecer verossímil. 

O Princípio da Verdade Real vigora no processo penal e vislumbra a existência de um sentimento de busca pelo magistrado quanto a veracidade e realidade dos fatos. O julgador não  deve se satisfazer apenas com aquilo que é levado pelos litigantes aos autos da demanda, longe  disso, necessita investigar a verdade, determinando quando necessário, um conjunto probatório  para alcançar a denominada verdade real, assim como preceitua o art. 156 do Código de  Processo Penal. 

Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:  

I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; 

II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.  

Seguindo o princípio, o magistrado deve proceder de maneira ativa procurando provas  com o objetivo de obter a verdade dos fatos. Para Capez (2005, p.26) “no processo penal, o juiz  tem o dever de investigar como os fatos se passaram na realidade, não se conformando com a  verdade formal constante dos autos”. 

No entanto, esse princípio subsiste, mas é utilizado de maneira equivocada, uma vez  que, a verdade que é buscada se forma a qualquer custo a fim de proceder um veredito com  insuficiência de provas. 

Isto está pautado em um sistema inquisitório ligado em teses punitivistas, em que o julgador se confunde com a acusação, tratando o acusado como mero objeto do julgamento, não  valendo-se do amplo contraditório que lhe é conferido. Em muitos casos a defesa somente existe  para dar formalidade ao procedimento.  

O juiz deve ser imparcial, pois unir defesa e acusação é insustentável e o acusado deve  ser visto como sujeito de direitos, detentor de garantias processuais e principalmente  constitucionais, que, caso desconsideradas, invalidarão as provas da acusação, além de eventual  condenação. 

Não muito distante o grande crítico e escritor francês Voltaire citava que “a verdade são  frutos que apenas devem ser colhidos quando bem maduros”, que se encaixa perfeitamente ao  procedimento penal, em que o juiz dará validade a verdade quando atingido seu completo  desenvolvimento.  

4. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO 

O princípio do in dubio pro reo é um dos fundamentos essenciais do Direito Processual  Penal e está diretamente ligado à proteção dos direitos do acusado durante o processo criminal.  Traduzido do latim como “na dúvida, a favor do réu”, esse princípio estabelece que, sempre  que persistirem dúvidas razoáveis quanto à culpabilidade do acusado, a decisão deve ser  favorável a ele, assegurando, assim, a presunção de inocência. Trata-se de uma garantia  constitucional que visa evitar condenações injustas e preservar a dignidade da pessoa humana,  colocando o ônus da prova sobre a acusação e exigindo que a culpa seja demonstrada além de  qualquer dúvida razoável.

Sua aplicação é especialmente importante na fase de julgamento, momento em que o  juiz deve avaliar criteriosamente as provas produzidas durante o processo. Caso restem dúvidas  que não possam ser afastadas com segurança, deve-se optar pela absolvição do réu, pois o  sistema penal privilegia a liberdade individual e evita que o erro judicial cause danos  irreparáveis. Esse princípio também reflete uma postura ética e prudente do sistema de justiça,  que reconhece a falibilidade humana e a complexidade inerente à prova penal. 

Além disso, o in dubio pro reo não significa que a dúvida deva ser absoluta ou irracional,  mas sim que o convencimento do julgador deve ser formado com base em provas suficientes e  claras. A dúvida razoável implica que a incerteza persiste mesmo após uma análise detalhada  do conjunto probatório, justificando, portanto, o benefício ao acusado. Assim, o princípio atua  como um filtro rigoroso para a condenação, garantindo que esta ocorra apenas quando houver  segurança quanto à culpa. 

Em suma, o princípio do in dubio pro reo é um pilar do processo penal democrático e  justo, assegurando que a presunção de inocência seja respeitada e que a liberdade do indivíduo  não seja cerceada sem provas robustas e convincentes. Sua observância fortalece a confiança  no sistema judiciário e protege os direitos fundamentais do acusado, consolidando-se como uma  garantia indispensável na busca pela justiça penal. 

5. STANDARD PROBATÓRIO 

O standard probatório é comumente utilizado em países anglo-saxônicos e compreende se como sendo padrões, critérios de provas para se considerar um fato provado. Trata-se de um  mínimo, ou melhor dizendo, um “quanto” de produção probatória é fundamental para que seja  proferida uma sentença condenatória ou absolutória. 

Aury Lopes Junior (2023, p.170), conceitua standard probatório da seguinte maneira: 

Podemos definir como os critérios para aferir a suficiência probatória, o “quanto” de prova é necessário para proferir uma decisão, o grau de confirmação da hipótese acusatória. É o preenchimento desse critério de suficiência que legitima a decisão. O standard é preenchido, atingido, quando o grau de confirmação alcança o padrão adotado. 

Não há previsão legal desse sistema no processo penal brasileiro, fazendo com que o  juiz tenha espaço para decretar a sentença conforme a discricionariedade e livre convencimento. Dessa maneira, distancia-se da ideia de um sistema democrático e também do princípio do in  dubio pro reo, que estabelece que havendo dúvidas no processo por falta de elementos  acusatórios, a medida que se impõe é a absolvição.

Em relação à aplicação do standard probatório, o magistrado não terá que se enquadrar em determinar quantidades e quais provas específicas no procedimento, porém deverá estabelecer critérios, para que por meio de uma valoração racional do conjunto probatório possa  decidir e proferir uma sentença instituindo um fato provado.  

Cabe ressaltar que os standards de prova são mecanismos de controle do poder punitivo,  pois estabelecendo um modelo que determine um maior rigor, quanto sua quantidade e  qualidade de provas necessárias para determinar um fato provado, menor será a incidência de  eventuais erros judiciais. Isso quer dizer que, diminui o número de condenações errôneas, uma  vez que, a exigência probatória aumenta. 

Corroborando com os parágrafos subscritos tem a decisão condenatória prolatada pelo  Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro na Apelação Criminal n. 0464692- 3.2015.8.19.0001:  

[…] A justiça criminal de Estados democráticos não pode ser reduzida à uma fábrica fordista, orientada a reproduzir condenações a qualquer custo. O que chamamos de erro judiciário é, na verdade, um erro que resulta de um somatório de diversas ações e omissões e, além de representar castigo aos injustamente condenados, também significa impunidade para os reais culpados. 

Logo, é imprescindível a legitimação de medidas capazes de controlar o poder punitivo, pois dessa forma a prova conterá maior confiabilidade, de modo que as decisões sejam mais  assertivas, evitando falhas judiciais. 

5.1 Quem deve definir os standards probatórios  

Até o momento, foi possível compreender que os standards probatórios desempenham  várias funções, como a orientação das partes envolvidas no processo, a justificação da decisão,  a distribuição dos riscos e a definição de um conceito normativo. Diante dessas características,  é correto afirmar que, idealmente, cabe ao legislador estabelecer os standards probatórios de  cada sistema jurídico, pois é função do Poder Legislativo definir como os riscos de erro devem  ser distribuídos na legislação, incluindo a fixação de parâmetros para evitar a condenação de  inocentes ou a absolvição de culpados. Além disso, é necessário avaliar a relação entre esses  dois tipos de risco para determinar se o standard será mais ou menos rigoroso. 

Esse argumento é particularmente relevante no contexto dos países de civil law, onde o  direito codificado tem predominância. Não é coincidência que, em países como Chile,  Colômbia e Itália, que adotam standards no direito penal, a escolha do standard aplicável tenha  sido incumbida ao legislador. Isso, por sua vez, difere dos países de common law, onde a definição dos standards geralmente fica a cargo do Poder Judiciário, algo que não é desejável  no sistema do civil law. Além da questão da legitimidade, há também a preocupação com a  segurança jurídica, dada a difícil relação com a obrigatoriedade dos precedentes. 

Embora o risco de erro seja uma consequência da falibilidade humana e da limitação do  conhecimento sobre os fatos, esse é um dilema que cada ordenamento jurídico deve enfrentar.  Isso não significa, contudo, que a ausência de intervenção do Poder Legislativo deixe o sistema  jurídico sem qualquer tipo de standard. Como foi afirmado no início, o standard probatório é  um requisito fundamental do processo probatório, pois sem ele não há um critério adequado  para decidir se uma hipótese foi comprovada ou não. 

Em países onde apenas um dos elementos decisórios é mais claro, como no critério de  avaliação da prova, a falta de uma norma específica pode levar à adoção de um modelo de  avaliação no próprio standard probatório ou ao desenvolvimento de critérios de suficiência  probatória pela jurisprudência e doutrina. Tanto a doutrina quanto às decisões judiciais devem  abordar essa questão, e ao longo do tempo, uma posição predominante acaba por se consolidar. 

O primeiro exemplo disso pode ser visto nos Estados Unidos, onde é utilizado o standard  de “além de qualquer dúvida razoável”, com a avaliação das provas sendo baseada em um  critério de razoabilidade. Nesse caso, a presença de um dos dois elementos decisórios  condiciona o outro. A segunda situação ocorre quando há o desenvolvimento de um standard,  sendo crucial a atuação dos precedentes judiciais para conferir estabilidade ao standard que  prevalecerá no sistema jurídico. Como discutido neste capítulo, o standard não pode ser  decidido de forma aleatória por cada juiz, pois isso acarretaria a ausência de parâmetros  decisórios seguros, perpetuando uma subjetividade difícil de controlar. 

Nesse sentido, é fundamental a conexão entre os standards probatórios e a teoria dos  precedentes, especialmente conforme estabelecido no artigo 926 do CPC. Quando os standards  probatórios são definidos como questões de direito, é responsabilidade dos tribunais superiores  estabelecer e uniformizar os standards aplicáveis ao direito brasileiro. Caso haja uma definição,  esta deve ser respeitada e aplicada tanto pelos tribunais superiores quanto pelos órgãos  jurisdicionais vinculados a eles. 

6. PROVA ALÉM DA DÚVIDA RAZOÁVEL 

Dentre os critérios existentes: Prova Clara e Convincente; Prova Mais Provável que a  Sua Negação; Preponderância da Prova; Prova Além da Dúvida Razoável, o mais rigoroso quanto aos seus padrões é o último, adotado nos Estados Unidos, Itália, Chile e possivelmente  melhor aplicável ao processo penal brasileiro, quanto à condenação final. Por este standard, o fato para ser convalidado, requer uma probabilidade bem alta de  eventualidade, não restando qualquer dúvida quanto à sua veracidade. Em outros termos, o  standard da Prova Além da Dúvida Razoável, é aquela em que o juiz esteja firmemente  convencido da culpa ou inocência do acusado, não havendo incertezas quanto ao fato.  Ademais, a dúvida razoável é compreensível, porém, é difícil sua definição, já que em não nada se refere a uma dúvida irracional ou meramente especulativa, mas tem como base a  razão e a certeza moral, devendo ser concreta e não abstrata. Segundo entende o Promotor de  Justiça do estado de Goiás, André Wagner Melgaço Reis:  

Não se trata simplesmente de uma dúvida possível, já que tudo que está relacionado com a atividade humana, o qual depende de provas que apenas produzem certeza moral, está aberto a alguma dúvida possível ou imaginária.  A dúvida razoável trata, portanto, desse estado do caso que deixa a mente do julgador em uma condição tal que não possa dizer que experimenta uma  convicção perdurável, que produz certeza moral, sobre a verdade buscada. 

Posto isso, se chega à conclusão que prova Além da Dúvida Razoável é aquela que deixa  o juiz convencido da culpabilidade do acusado, indicando através de uma sentença suas  fundamentações, alicerçada nas evidências ou na falta delas. Mas se ao final restar alguma  dúvida quanto a prova e a culpabilidade, poderá o suspeito usufruir da presunção de inocência  que o Estado garante.  

Surge, porém, uma problemática, que é absolver a qualquer custo, pois o ato de julgar é  passível de incertezas, todavia, essa concepção é superada, uma vez que, a dúvida razoável é a  hipótese alternativa à tese incriminatória, que se mostre logicamente possível e amparada pelo  lastro probatório no processo. 

Em suma, o que se busca desse standard não é um sistema absoluto, mas que por meio  dele atenue os erros judiciais, policiando as tomadas de decisões do magistrado. Contudo,  alguns parâmetros devem ser preenchidos para poder vigorar. 

Badaró (2019), dispõe uma ideia de aplicação no código de processo penal: 

Art. XX. Toda pessoa é presumidamente inocente até que se prove a sua culpa em definitivo, de modo que incumbe ao acusador provar todos os elementos de cada hipótese fática tipificada penalmente, autorizando-se a condenação  somente se houver prova além da dúvida razoável de materialidade e autoria do crime. 

§1º A hipótese acusatória deve ser capaz de explicar de modo coerente e íntegro todos os elementos fáticos comprovados no processo, apresentando critérios confirmatórios disponíveis. 

§2º Considera-se dúvida razoável a hipótese alternativa à tese incriminatória que se mostre logicamente possível e amparada pelo lastro probatório do processo.

§3º A sentença ou acórdão deve apresentar motivação fática consistente, a partir de critérios objetivos e racionais, indicando elementos probatórios que  justifiquem cada afirmação fática e analisando eventuais hipóteses  alternativas de potencial dúvida razoável 

Em princípio, deve o órgão acusatório seja querelante ou o Ministério Público por regra  geral, cumprir com o ônus da prova, comprovando todos os elementos das hipóteses suscitadas  de modo coeso e íntegro respeitando a produção probatória em contraditório. E em segundo  lugar, entra a atuação do julgador, que após uma análise rigorosa das provas, apura sua  credibilidade e verifica se resta alguma incerteza sobre o fato. 

6.1 Standard probatório e as fases do processo 

Ao se falar em standard probatório, é essencial relacioná-lo ao grau de suficiência que  uma hipótese precisa atingir para ser considerada verdadeira. Embora esse raciocínio  normalmente se conecte à fase final do processo, em que a hipótese acusatória deve superar o  standard de prova para que o acusado seja condenado, o uso dos standards de prova não se  limita à sentença. Eles podem e devem ser aplicados em todas as fases do processo, incluindo  a fase pré-processual. 

Um processo passa por várias etapas antes de ser concluído. Em cada uma dessas etapas,  são tomadas decisões que devem ser analisadas à luz de um standard de prova adequado. O  grau de suficiência necessário depende da decisão que precisa ser tomada em cada fase  processual. 

O processo começa antes mesmo de ser formalmente instaurado, com a fase  investigatória. Nesse momento, aplicamos o primeiro standard de prova. Como essa fase visa  apurar as alegações e esclarecer os fatos relacionados à notícia crime, não é razoável exigir um  grau elevado de suficiência. O standard utilizado aqui não pode ser confundido com o “além de  qualquer dúvida razoável”, que é um padrão mais rigoroso. O standard aplicado nessa fase  inicial é menos exigente, pois, se fosse diferente, nenhum inquérito seria instaurado. O objetivo  é evitar alegações falsas ou infundadas, assegurando que haja, ao menos, uma certa  verossimilhança nos fatos relatados. 

Um segundo standard de prova é aplicado quando o juiz decide se aceita ou rejeita a  denúncia. Nessa fase, o magistrado deve verificar se há justa causa para a instauração do  processo. Esse segundo standard de prova está entre o primeiro (aplicado no inquérito policial)  e o standard mais rigoroso da fase final. Embora seja mais exigente que o da fase inicial, ele  será menos rigoroso do que o standard aplicado na sentença.

Outro momento importante para a aplicação de um standard de prova ocorre quando o  juiz decide se absolve sumariamente o acusado. Se houver alguma causa de exclusão de  ilicitude ou culpabilidade, ou se a prova indicar que o fato não constitui crime, a acusação não  terá superado o standard de prova necessário, e o juiz pode decidir pela absolvição. Se nenhuma  dessas situações for encontrada, entende-se que a acusação superou o standard exigido nesse  ponto do processo. 

O último e mais importante standard de prova é o que é aplicado na sentença. Esse é o  momento em que a acusação precisa superar o maior grau de suficiência, ou seja, “além de  qualquer dúvida razoável”. Esse standard é crucial, pois erros judiciais nesta fase podem ter  consequências graves. As decisões precisam ser submetidas a um filtro rigoroso para garantir  que sejam racionais e bem fundamentadas. Assim, o standard probatório na sentença é o mais  exigente de todos ao longo do processo. 

Portanto, cada fase do processo exige um standard de prova específico, com diferentes  graus de exigência, de acordo com a natureza das decisões a serem tomadas. 

7. CONCLUSÃO 

Em suma, nota-se a necessidade de regulamentação do standard probatório no  ordenamento jurídico brasileiro, haja vista a ausência de previsão legal expressa. A aplicação  de um standard com critérios lógicos é fundamental para valoração da prova, objetivando o controle punitivo das decisões com teor discricionário, corroborando ao princípio do in dubio  pro reo.  

Em síntese, os standards probatórios são essenciais para garantir a segurança jurídica e  a correta distribuição dos riscos de erro no processo penal, cabendo idealmente ao legislador  sua definição. A ausência de normas claras pode levar à influência da jurisprudência e da  doutrina na consolidação desses parâmetros, o que reforça a importância da uniformização  promovida pelos tribunais superiores, assegurando critérios estáveis e legítimos para a  avaliação da prova. 

Ademais, a prova no processo penal não possui um valor predeterminado, nem peso  legal, sendo examinadas conforme a livre apreciação que é conferida ao magistrado, entretanto tem total relevância já que é através dela e da forma que será apreciada e valorada pelo  magistrado que se chegara em uma decisão mais justa e democrática. 

No que tange a verdade real, deve o juiz ater-se de forma imparcial perante as partes e  ao procedimento, deixando de lado o caráter inquisitivo já superado pelo sistema legal, de forma  a resguardar as garantias constitucionais previstas. 

Com base na análise dos diversos standards probatórios aplicados ao longo do processo  penal, conclui-se que o grau de suficiência exigido para a formação do convencimento judicial  varia conforme a etapa processual, refletindo a natureza e a relevância das decisões a serem  tomadas. Desde a fase investigatória, em que se adota um padrão mais brando para evitar o  arquivamento prematuro de possíveis crimes, até a sentença, onde prevalece o rigoroso padrão  “além de qualquer dúvida razoável”, observa-se uma progressiva elevação da exigência  probatória. Essa gradação é fundamental para assegurar o equilíbrio entre a proteção dos  direitos individuais e a efetividade da persecução penal, prevenindo tanto acusações infundadas  quanto condenações injustas. Dessa forma, a correta aplicação dos standards probatórios em  cada fase contribui para a legitimidade e a segurança jurídica do processo penal. 

Nesse sentido, o standard probatório ‘Prova Além da Dúvida Razoável’ é o mais viável  e pertinente a legislação no que tange ao estágio final do processo, visto que, além de ser  internacionalmente reconhecido e adotado em outros países, é por meio dele que se tem um  controle e filtragem maior das provas. Sendo assim, torna o procedimento mais confiável e  somente após preenchidos os requisitos e superadas as dúvidas razoáveis autorize um juízo  condenatório.  

Sendo importante destacar que standard de prova não imuniza o risco do decisionismo,  mas é o meio de controle do poder punitivo evitando danos irreparáveis que as condenações  injustas causam. 

REFERÊNCIAS 

BADARÓ, Gustavo Henrique. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: RT, 2019. 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União,  Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 25 de maio de 2025. 

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1Trabalho de conclusão de curso apresentado do curso de Direito do Centro Universitário de Santa Fé do Sul – SP, UNIFUNEC.

2Discente do 9º semestre do curso de Direito do Centro Universitário de Santa Fé do Sul – SP, UNIFUNEC.

3Docente do curso de Direito do Centro Universitário de Santa Fé do Sul – SP, UNIFUNEC.