A DESPERSONALIZAÇÃO DA ESCRITA PELA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202504251232


Carla Dornelles da Silva1
Maria Luci Freire de Duran2


1. INTRODUÇÃO

A Inteligência Artificial Generativa (IAG) é uma tecnologia que cria conteúdo, como textos, músicas e imagens, a partir de dados e padrões pré-estabelecidos pelas Ciências da Computação. Tem avançado rapidamente, trazendo inovações e desafios, especialmente no campo educacional. A IAG, popularizada pelo ChatGPT da OpenAI, é uma tecnologia de ponta que usa algoritmos para gerar novos conteúdos a partir de dados existentes. 

Conforme Lima e Serrano (2024), o ChatGPT teve importante repercussão em diversas áreas, gerando tanto impactos positivos quanto negativos para a sociedade. O modelo de linguagem, treinado com textos da internet, é um marco na IAG. No entanto, é importante destacar que, embora os algoritmos possam gerar textos, eles não possuem consciência ou compreensão do conteúdo, uma vez que não são organismos pensantes. Isso levanta críticas sobre a relevância e o uso dessas tecnologias na produção de textos científicos e criativos. Assim sendo, a relevância do tema, pauta-se na importância em discutir as implicações da despersonalização da escrita para a sociedade, a cultura e o mundo do trabalho.

Para que a pesquisa adquirisse teor científico, propôs-se como percurso epistemológico os seguintes autores: Turing (1950), Minsky (1961), Weizenbaum (1966) e Searle (1980), entre outros, salientando que esses pesquisadores são fundamentais no campo da inteligência artificial e da filosofia da mente. Ressalta-se também os autores que estudam o impacto das tecnologias na educação, como Prensky (2010), Papert (1996) e Siemens (2013). Atualmente, no âmbito educacional, destacam-se Arruda (2024), Ertel (2017), Hagos, Battle e Rawat (2024). No que diz respeito aos construtos éticos, a pesquisa se apoia em Müller e Bostrom (2014), Floridi (2018) e Asaro (2017), entre outros.

Corroborando essa construção científica, tem-se como objetivo geral do artigo identificar como a crescente capacidade da Inteligência Artificial Generativa de gerar textos autônomos impacta a originalidade e autenticidade da escrita humana, causando sua despersonalização. Apresentam-se como objetivos específicos descrever o percurso epistemológico da IAG, identificar os impactos da despersonalização da escrita humana na comunidade acadêmica, analisar os desafios e oportunidades da IAG para a sociedade e considerar as questões éticas e sociais relacionadas à IAG na produção textual.

Essa pesquisa revelou o caráter inédito da temática, tendo em vista encontrados apenas dois artigos com propostas semelhantes a este. Afirma-se que o interesse pelo tema decorre dessa observação sobre o inusitado e inédito fenômeno da despersonalização da escrita, bem como da disseminação das tecnologias digitais e da IAG em todos os contextos socioeducacionais. Outro ponto a ser salientado diz respeito ao compromisso ético com a formação de profissionais críticos e cônscios de suas responsabilidades.

Considerando os critérios estabelecidos, selecionaram-se dois artigos científicos completos e fragmentos das obras dos autores citados anteriormente. Assim, para a análise de conteúdos, foram determinadas categorias ao longo da pesquisa: 1 – Conceituação e Histórico, 2 – Impactos da Despersonalização da Escrita, 3 – Impactos na Educação e Desafios e Oportunidades, 4 – Considerações Éticas e Sociais. Ressalta-se que, na etapa de inferência e interpretação, optou-se por utilizar a técnica de análise reflexiva, a fim de responder à questão norteadora e aos objetivos propostos neste artigo.

Para tanto, este trabalho será apresentado com a seguinte estrutura: Resumo, Introdução, Procedimentos Metodológicos, Resultados e Discussão das variáveis elencadas e Considerações Finais. Assim, esta revisão bibliográfica de cunho qualitativo pode contribuir para futuros estudos sobre essa temática inédita.

2. METODOLOGIA

A pesquisa bibliográfica é um tipo de pesquisa que se baseia na análise e revisão de obras publicadas, como livros, artigos científicos, dissertações, teses e outros materiais relevantes, para embasar teoricamente um estudo ou explorar um tema. Segundo Gil (2019), a pesquisa bibliográfica visa fundamentar teoricamente o estudo, identificar lacunas na literatura existente, entender o estado da arte sobre determinado tema e, muitas vezes, orientar o desenvolvimento de hipóteses ou questionamentos para outras investigações. Também pode ser utilizada para comparar diferentes abordagens, autores ou teorias sobre um tema específico.

Neste artigo, utilizou-se a análise de conteúdo que, conforme Lakatos e Marconi (2017), visa examinar o conteúdo de um texto para entender como as informações são estruturadas e como os significados são atribuídos a diferentes partes do texto. Assim, a análise de conteúdo busca identificar padrões, categorias ou temas recorrentes no material analisado, levando em conta o contexto e a intenção do autor. Além disso, tem o intuito de compreender como determinadas mensagens são transmitidas em textos.

Na pré-análise dos materiais encontrados nas plataformas Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Google Acadêmico, Portal da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Portal CAPES), Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), Agência USP de Gestão da Informação Acadêmica (ABCD USP) e Scopus, a escolha dessas bases de investigação se deu por serem de amplo acesso, conterem trabalhos indexados de forma completa e possuírem credibilidade acadêmica e científica. Utilizou-se como estratégia de busca os termos “Inteligência Artificial Generativa”, “Despersonalização da Escrita” e “Produção Textual”. O período de pesquisa ocorreu de agosto de 2024 a janeiro de 2025.

O estudo do material e a análise dos resultados possibilitaram a codificação e categorização dos artigos encontrados com base nos critérios de exclusão, tais como artigos de fontes duvidosas, artigos que não contivessem os descritores escolhidos, artigos que não apresentassem a temática ou relevância para a pesquisa, e nos critérios de inclusão, como ser escrito em português, inglês ou espanhol, ser relevante para a pesquisa, apresentar temática em consonância com o estudo e ter sido publicado a partir de 2022.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise de conteúdo é um processo interativo que exige um trabalho minucioso de codificação, interpretação e reflexão. Ao seguir essas fases, o pesquisador consegue extrair informações significativas de textos ou outros materiais, gerando uma compreensão aprofundada dos dados analisados. Cada fase é fundamental para garantir que a análise seja rigorosa, confiável e válida.

Durante a pesquisa, identificou-se a multiplicidade de usos e aplicações de modelos de linguagem, bem como a diversidade de possibilidades no processo de escrita e no ato educativo, pois esses aspectos constituem uma fonte de interesse, tendo em vista o aprofundamento de experiências de aprendizado em quaisquer níveis da educação.

3.1 PERCURSO EPISTEMOLÓGICO E CONCEITUAL SOBRE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA

O desenvolvimento da IA remonta a 1936, com os estudos de Alan Turing e Alonzo Church, que estabeleceram as bases teóricas e matemáticas para a criação de máquinas capazes de processar informações logicamente. Turing, por meio de sua máquina abstrata, conhecida como Máquina de Turing, propôs um modelo computacional baseado em algoritmos para resolver problemas lógicos. Enquanto isso, os primeiros computadores, como o Electronic Numerical Integrator and Computer (ENIAC), surgiram na década de 1940, possibilitando cálculos complexos. Em 1945, o matemático John von Neumann introduziu a arquitetura de von Neumann, que permitiu o armazenamento de dados e programas na mesma memória, um avanço essencial para o desenvolvimento da IA.

Nos anos 1940, Norbert Wiener fundou a cibernética, teoria que inspirou as redes neurais artificiais ao se basear no funcionamento do cérebro humano. A Segunda Guerra Mundial acelerou a inovação tecnológica, especialmente na decodificação de mensagens e nos cálculos para mísseis. Durante esse período, Turing propôs seu famoso Teste de Turing (1950), um método para avaliar se uma máquina pode simular a inteligência humana, influenciando profundamente o campo da IA.

O ano de 1956 é frequentemente considerado o marco inicial da IA como campo de estudo formal, principalmente devido à Conferência de Dartmouth. Foi nesse evento que o termo “Inteligência Artificial” foi utilizado pela primeira vez, e o campo passou a ser reconhecido como uma disciplina independente da ciência da computação.

A conferência foi organizada por um grupo de cientistas renomados, incluindo John McCarthy (criador do termo Inteligência Artificial e da linguagem de programação LISP), Marvin Minsky (pioneiro no desenvolvimento de redes neurais e na pesquisa sobre a simulação do pensamento humano), Nathaniel Rochester (responsável pelo desenvolvimento do computador IBM 701) e Claude Shannon (conhecido por aplicar a teoria da informação e da comunicação no aprendizado e processamento de dados).

O objetivo desse evento era explorar a ideia de que todas as faculdades humanas de aprendizado e inteligência podem ser descritas com precisão, de modo que uma máquina pudesse ser programada para simulá-las, conforme proposto no programa de pesquisa da conferência. Esse encontro teve um impacto profundo no campo da IA, pois estabeleceu um objetivo claro: compreender e replicar as funções cognitivas humanas por meio de máquinas.

Nos anos 1980, John Searle, com seu Experimento da Sala Chinesa, argumentou que computadores podem simular inteligência, mas não possuem verdadeira compreensão ou consciência. Por outro lado, em 1986, Marvin Minsky desenvolveu a teoria dos “frames”, modelando como o cérebro organiza informações.

A partir dos anos 1990, a IA começou a se expandir com o aumento do poder computacional e o uso de aprendizado de máquina, destacando-se o supercomputador Deep Blue, que venceu o campeão mundial de xadrez Garry Kasparov em 1997. Nos anos 2010, o aprendizado profundo (deep learning) revolucionou a IA, permitindo avanços em reconhecimento de imagem e processamento de linguagem natural, como exemplificado pelo modelo GPT, lançado pela OpenAI em 2018. 

Atualmente, a IA se encontra em um estágio avançado e integrado à vida cotidiana. Algumas de suas capacidades incluem processamento de linguagem natural (PLN): a IA tornou-se capaz de compreender e gerar texto de maneira impressionante, sendo usada em chatbots, tradutores automáticos e assistentes pessoais como Siri e ChatGPT; visão computacional: a IA pode reconhecer e interpretar imagens e vídeos, com aplicações em segurança, diagnóstico médico e veículos autônomos; recomendações inteligentes: a IA alimenta sistemas de recomendação de filmes, músicas e produtos em plataformas como Netflix, Spotify e Amazon; análise preditiva: a IA é amplamente usada para prever padrões em volumes significativos de dados, o que é útil em áreas como finanças, saúde e marketing; aprendizado contínuo: muitas IAs podem aprender com novas informações em tempo real, melhorando seu desempenho e adaptabilidade (Hagos, Battle e Rawat, 2024).

3.2 OS IMPACTOS  E IMPLICAÇÕES DA DESPERSONALIZAÇÃO DA ESCRITA

A era da IA está transformando a maneira como se vive, trabalha e interage com o mundo ao nosso redor. A IA tem o poder de otimizar processos, automatizar tarefas repetitivas, aprimorar a análise de dados e até mesmo viabilizar inovações em áreas como saúde, educação e mobilidade. Além disso, pode impulsionar descobertas científicas e fortalecer a economia.

No entanto, apesar de todo o seu potencial, a IA também apresenta desafios, como questões relacionadas à privacidade, segurança, ética e impacto no mercado de trabalho. No que diz respeito à escrita, um dos desafios é a despersonalização do texto.

Conscientes de que a escrita tem a função de transmitir conhecimento, registrar fatos, eventos e celebrações sociais, culturais e espirituais — sendo, inclusive, um dos marcos revolucionários na história —, é possível compreender a relevância dessa prática ao longo do tempo. Corroborando essa ideia, Villela (2013, s.p.) reflete que:

A escrita produz-se no limiar do próprio sujeito, no limiar do que existe, na delicada e sutil faixa entre o pensamento e a palavra. Ao escrever, articulamos indissociavelmente três dimensões: a língua, a linguagem e o dizível. A língua, com suas condições, regras, operações, protocolos, correspondências, fazendo às vezes de substrato para o pensamento poder aderir e se desenvolver. A linguagem, aqui entendida como o arranjo estratégico do discurso em funcionamento, o modo de dizer, proferir, enunciar, narrar, interpelar, proclamar, persuadir, sugerir, induzir etc. E o dizível, por fim, efeito do entrelaçamento entre a palavra e o olhar, aquilo que, porque é possível ser visto e pensado, é possível ser dito ou, ao contrário, porque é possível ser dito, é possível ser visto e pensado. 

O advento da IAG tem impactado significativamente a produção textual, levando à despersonalização da escrita. Esse fenômeno ocorre quando o autor se distancia de sua identidade e estilo, criando textos impessoais, objetivos e neutros. A despersonalização pode ser observada de diferentes formas, como em práticas científicas que buscam objetividade ou no uso de ferramentas automatizadas, como assistentes de IA (como o GPT), que geram textos sem a intervenção direta do escritor. Nesses casos, a escrita perde identidade emocional, estilo e a visão própria do autor.

Embora textos despersonalizados possam ser claros e objetivos, eles falham em estabelecer uma conexão emocional com o público. A comunicação humana depende da personalização, da empatia e do toque individual — aspectos que as máquinas têm dificuldade em replicar. Isso pode reduzir o impacto de campanhas de marketing, discursos e obras literárias, tornando a experiência de leitura menos envolvente, o que, por sua vez, pode afetar a maneira como o público responde ou se engaja com o conteúdo.

Com o crescimento da IAG, a natureza do trabalho criativo pode sofrer mudanças substanciais. Profissionais que antes escreviam com um estilo único podem ser substituídos ou pressionados a adotar ferramentas automatizadas para se manterem competitivos. Isso pode afetar diversas áreas, como a produção de conhecimento e a construção do saber, resultando na desvalorização do trabalho humano na escrita e na redução da diversidade de vozes e perspectivas nos textos gerados. Como consequência, o emprego e as funções tradicionais da escrita criativa podem ser comprometidos, levando a um empobrecimento das produções.

O uso da IA para criar textos de forma despersonalizada também levanta questões éticas relevantes, especialmente no que diz respeito à transparência e à confiança. Quando um texto é produzido por uma IA sem identificação clara, os leitores podem sentir-se enganados, o que compromete a credibilidade das fontes e das publicações. Além disso, a IA pode ser utilizada para gerar conteúdos manipulados, trazendo implicações éticas significativas, como a desumanização das relações interpessoais e a perda de autenticidade nas interações.

Do ponto de vista ético, a crescente dependência de algoritmos para moldar escolhas e tomar decisões — como no aprendizado de máquina e na robótica — também é uma preocupação. Como ressaltado por Floridi (2021), os desafios éticos estão intrinsecamente ligados ao uso de dados e algoritmos, exigindo uma avaliação contínua das políticas e práticas adotadas. Asaro (2010) destaca, ainda, as implicações éticas da IAG, especialmente em áreas como medicina, justiça e setor militar, onde decisões automatizadas podem impactar profundamente os direitos humanos. A questão central é até que ponto as máquinas devem ser responsabilizadas por suas ações e como as decisões tomadas por sistemas digitais podem ser avaliadas moralmente.

Além disso, a IAG, ao criar textos com base em grandes volumes de dados, tende a influenciar diversas áreas da sociedade, como educação, saúde e economia, sem, no entanto, considerar a riqueza das experiências culturais, sociais e espirituais individuais. Essa uniformização pode reduzir a diversidade cultural nas produções escritas, nas descobertas científicas e na literatura. Ao seguir padrões algorítmicos, as máquinas podem não refletir as complexidades e nuances culturais de diferentes povos e regiões, resultando no empobrecimento da variedade de conteúdos, do conhecimento e das experiências compartilhadas.

3.3 INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA E IMPACTOS NA EDUCAÇÃO

No contexto educacional, a IA pode proporcionar um aprendizado personalizado aos estudantes, ajustando as experiências conforme os conteúdos e respeitando o ritmo e as necessidades individuais, o que favorece a acessibilidade e a inclusão. Destaca-se, ainda, o apoio ao ensino por meio da criação de conteúdos, permitindo que os educadores utilizem a IA para desenvolver materiais didáticos. Isso possibilita que os professores se concentrem em aspectos mais interativos e criativos do ensino, como debates, discussões e atividades práticas, além de oferecer suporte ao ensino de idiomas.

Atento a essas questões, Papert (1996) discute o desenvolvimento do conceito de construcionismo, que enfatiza a importância do aprendizado ativo e da construção do conhecimento por meio da experiência prática. Ele propõe que a aprendizagem se torna mais eficaz quando os alunos têm a oportunidade de construir suas próprias representações do conhecimento. Nesse sentido, a tecnologia — especialmente o computador — pode atuar como uma ferramenta facilitadora desse processo de construção ativa do saber. Um aspecto relevante dessa teoria é a linguagem de programação Logo, desenvolvida para ensinar crianças a programar e a pensar de maneira lógica e estruturada.

Em 2013, Siemens apresentou à comunidade científica e educacional sua teoria sobre o conectivismo, que propõe que o aprendizado ocorre em redes sociais e é altamente influenciado pela conectividade entre indivíduos e fontes de informação. O conectivismo enfatiza que o conhecimento é distribuído por meio de uma rede e que a aprendizagem acontece ao se conectar a essas redes. Assim, essa teoria reconhece a importância da tecnologia na mediação e facilitação do aprendizado, pois permite o acesso à informação e a colaboração entre pessoas de maneira global. Argumenta-se que a aprendizagem no século XXI envolve a habilidade de navegar em redes de conhecimento, cujas fontes de informação estão em constante evolução. O foco, portanto, deve estar na capacidade de aprender de forma contínua, adaptativa e colaborativa.

Entretanto, surgem desafios preocupantes. A IAG pode levar a uma dependência excessiva de ferramentas automatizadas, o que pode comprometer o desenvolvimento das habilidades cognitivas e criativas dos alunos. Se os estudantes passam a depender da IA para produzir conteúdos, como redações ou projetos, isso pode prejudicar seu próprio aprendizado e sua capacidade de raciocínio independente.

Outro desafio relevante diz respeito à avaliação. A IAG cria dificuldades para os professores no processo avaliativo, pois ferramentas automatizadas podem gerar conteúdos de forma autônoma, dificultando a distinção entre o trabalho original do aluno e aquele produzido pela IA. Isso levanta questões sobre plágio e autenticidade. Além disso, a despersonalização pode reduzir a expressão pessoal e a individualidade do autor, o que pode ser problemático em contextos em que a voz única é valorizada, como na literatura, na poesia ou em blogs pessoais.

No Brasil, a disparidade social levanta questões sobre o acesso e a implementação da IAG na educação, que pode aprofundar as desigualdades tecnológicas. Enquanto algumas escolas ou países têm acesso a essas ferramentas avançadas, outras podem não dispor dos recursos necessários, exacerbando as diferenças educacionais. Além disso, o uso da IAG em ambientes educacionais traz preocupações éticas relacionadas à privacidade e ao uso de dados dos alunos. Ferramentas de IA frequentemente coletam informações sobre o desempenho, a atuação e o comportamento dos estudantes, o que gera inquietação quanto ao armazenamento e à utilização desses dados.

Com o aumento da automação no ensino, o papel do educador pode sofrer mudanças significativas. Ainda que a IA possibilite a personalização da aprendizagem e otimize a criação de conteúdo, o professor continua sendo essencial como mentor, orientador e facilitador do pensamento crítico. No entanto, se a IA for vista como uma solução completa para o ensino, há o risco de que essa função seja minimizada. O uso excessivo da IA pode reduzir as interações humanas em sala de aula, prejudicando a formação de relações interpessoais e o desenvolvimento emocional dos alunos. Quando a escrita se torna excessivamente despersonalizada, especialmente com o uso da IA, há o risco de que o elemento humano da comunicação se perca, comprometendo o engajamento emocional do leitor.

Marc Prensky (2010) contribui para o processo de ensino e aprendizagem ao apresentar o conceito de nativos digitais e imigrantes digitais. Ele argumenta que as gerações mais jovens, que cresceram imersas na tecnologia, possuem um modo de pensar e aprender extremamente diferente das gerações anteriores, que não nasceram em um ambiente tecnológico. Seu estudo popularizou a ideia de que os alunos de hoje são nativos digitais, ou seja, pessoas que cresceram em um mundo no qual a tecnologia está presente na maior parte das atividades diárias. Por outro lado, os imigrantes digitais são indivíduos mais velhos, que aprenderam a lidar com a tecnologia em um momento posterior. Com base nisso, Prensky (2010) defende o uso de jogos digitais e outras tecnologias interativas como ferramentas eficazes para envolver os alunos no processo de aprendizagem, tornando-o mais dinâmico e significativo.

Segundo Ertel (2017), as tecnologias digitais podem ser integradas aos processos educacionais de maneira eficaz, eficiente e ética. O autor examina a transformação digital e os impactos das ferramentas digitais no ambiente de aprendizagem, apontando como possibilidades o uso da IA na personalização do ensino, a implementação de tecnologias para aprimorar a qualidade da aprendizagem colaborativa e a adaptação das ferramentas educacionais à diversidade de perfis de aprendizagem.

No contexto educacional atual, diversos autores têm explorado como as tecnologias e a IAG estão moldando o ensino e a aprendizagem. Pesquisadores como Arruda (2024), Ertel (2017), Hagos, Battle e Rawat (2024) trazem contribuições significativas para a integração da tecnologia na educação. Embora alguns desses autores possuam publicações específicas, a maioria de seus trabalhos concentra-se na análise das formas pelas quais a IA, as novas tecnologias e as inovações digitais influenciam os métodos pedagógicos, a gestão educacional e as experiências dos alunos.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A IAG se consolidou como uma ferramenta poderosa para acelerar o processo de criação textual, trazendo benefícios significativos. No entanto, seu uso indiscriminado pode comprometer aspectos essenciais da escrita, como a criatividade, a originalidade, a reflexão crítica e o desenvolvimento de uma voz autêntica. Por isso, é fundamental que os escritores utilizem a IA como um complemento, e não como um substituto para o esforço criativo e a reflexão pessoal.

As consequências da despersonalização são complexas. Embora a IA possa aumentar a eficiência e a objetividade na criação de conteúdo, também pode comprometer a autenticidade, a conexão emocional e a riqueza da expressão humana. Em textos criativos, a ausência de um estilo pessoal pode tornar o conteúdo menos envolvente e autêntico, dificultando a conexão com o leitor. O desafio, portanto, é equilibrar o uso da IA com a preservação da individualidade, criatividade, autenticidade e ética na produção textual.

No campo da educação, o impacto da IAG dependerá de como for integrada aos sistemas educacionais. Será necessário um equilíbrio cuidadoso entre sua implementação e a preservação de aspectos fundamentais da educação, como a interação humana, o desenvolvimento de habilidades críticas, a proteção dos direitos dos alunos e o estímulo às competências sociais e cognitivas. Embora a IA tenha o potencial de transformar a educação de forma positiva, proporcionando personalização, eficiência e oportunidades de aprendizagem criativa, também apresenta desafios, como a dependência tecnológica, o impacto na avaliação acadêmica, as desigualdades no acesso e questões éticas relacionadas à privacidade.

A crescente dependência de ferramentas automatizadas pode levar à padronização dos textos e à falta de originalidade, o que é problemático em contextos em que a criatividade e a inovação são essenciais. Portanto, é imprescindível garantir que o uso da IA seja equilibrado, preservando a autenticidade e a criatividade na educação e na produção textual, em geral.

Embora a IAG possa desempenhar um papel importante na criação de conteúdo, a escrita, como forma de expressão e comunicação, sempre terá um componente humano fundamental. Ainda que as máquinas possam gerar textos de forma eficiente e até criativa, é a experiência humana, com suas emoções, subjetividades e complexidades, que dá e continuará dando sentido à escrita. O futuro da escrita e da IA, portanto, tende a envolver uma parceria entre humanos e máquinas. A IAG pode ser uma ferramenta poderosa, mas é a voz humana que mantém a profundidade, o contexto e a conexão emocional que tornam a escrita verdadeiramente significativa para a humanidade.

REFERÊNCIAS

ARRUDA, U. C. Contribuições da inteligência artificial na aprendizagem dos alunos de Pedagogia e Administração em um polo de EaD de uma IES privada em Recife-PE: um estudo sobre a utilização de IA no Ensino Superior. Revista Brasileira de Aprendizagem Aberta e a Distância, [S.l.], v. 24, n. 1, p. 55-70, 2024.

ASARO, R. What Should We Want from a Robot Ethics? In: SANDLER, R. (Ed.). Ethics and Emerging Technologies. New York: Palgrave Macmillan, 2010.

CARR, N. The Shallows: What the Internet Is Doing to Our Brains. See discussions, stats, and author profiles for this publication at. New York: Norton, 2010. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/262245164. Acesso em: 10 jan. 2024.

CHURCH, A. The Journal of Symbolic Logic. Published By: Association for Symbolic Logic. A Bibliography of Symbolic Logic, [S.l.], v. 1, n. 4, p. 121-123, dec. 1936.

ERTEL, C. Digital Learning: Teaching and Learning in the Digital Era. Teaching and Learning in the Digital Era, [S.l.], 2017.

FLORIDI, L. Ética digital on e offline. São Leopoldo: Instituto Humanitas Unisinos, 2021. Disponível em: https://www.ihu.unisinos.br/categorias/612729-etica-digital-on-e-offline-artigo-de-luciano-floridi. Acesso em: 10 jan. 2024. 

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2019.

HAGOS, D. H.; BATTLE, R.; RAWAT, D. B. Recent advances in generative ai and large language models: Current status, challenges, and perspectives. IEEE Transactions on Artificial Intelligence, [S.l.], 2024.

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos de metodologia científica. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

LIMA, C. B.; SERRANO, A. Inteligência Artificial Generativa e ChatGPT: uma investigação sobre seu potencial na Educação. Transinformação, [S.l.], v. 36, p. e2410839, 2024.

MINSKY, M. The Society of Mind. New York: Simon & Schuster, 1986.

MÜLLER, V. C.; BOSTROM, N. Future progress in artificial intelligence: A poll among experts. AI Matters, [S.l.], v. 1, n. 1, p. 9-11, 2014.

PAPERT, S. The Connected Family: Bridging the Digital Generation Gap. Atlanta: Longstreet Press, 1996. 

POSTMAN, N. Amusing Ourselves to Death: Public Discourse in the Age of Show Business. 1985 (On-line). Disponível em: http://www.ydmjy.com/kindeditor/Upload/file/20140615/20140615095918141814.doc. Acesso em: 13 jan. 2024.

PRENSKY, M. Teaching Digital Natives: Partnering for Real Learning. Thousand Oaks: Corwin, 2010.

SEARLE, J. Mind, Language, and Society: Philosophy in the Real World. New York: Basic Books, 1998.

SIEMENS, G. Learning in the Digital Age: A New Era of Learning. Calgary: University of Calgary, 2013.

TURING, A. M. Computing Machinery and Intelligenc. Mind, [S.l.], v. 49, p. 433-460, 1950.

TURING. A. M. On computable numbers, with an application to the entscheidungsproblem. 1936 (On-line). Disponível em: http://www.abelard.org/turpap2/tp2-ie.asp. Acesso em: 13 jan. 2024.

VILLELA, P. M. A escrita acadêmica: do excessivo ao razoável. Rev. Bras. Educ., [S.l.], v. 18, n. 52, mar. 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-24782013000100013. Acesso em: 13 jan. 2024.

WEIZENBAUM, J. Computer Power and Human Reason: From Judgment to Calculation. San Francisco: Freeman and Company, 1976.