REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202504192136
Ana Cristina de Arruda dos Santos1
Edilene Umbelina Bento2
Leonardo Antunes Ferreira da Silva3
RESUMO
A Lei Brasileira de Inclusão (LBI), também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), visa garantir a igualdade de condições para pessoas com deficiência, especialmente no contexto educacional. No entanto, a efetividade da LBI nas escolas públicas estaduais de Porto Velho ainda enfrenta desafios significativos. O presente estudo analisa a implementação da LBI, investigando aspectos estruturais, pedagógicos e sociais que influenciam sua aplicação. A pesquisa utilizou metodologia exploratória, qualitativa e dedutiva incluindo revisão documental e mapeamento do cenário atual de implementação da LBI nas escolas públicas estaduais de Porto Velho. Os resultados evidenciaram deficiências em infraestrutura, capacitação docente e acesso a tecnologias assistivas, comprometendo a inclusão efetiva de alunos com deficiência. Conclui-se que a plena aplicação da LBI depende de investimentos em infraestrutura e capacitação, bem como do fortalecimento de políticas públicas inclusivas.
Palavras chaves: Inclusão educacional; Lei Brasileira de Inclusão; acessibilidade; educação especial; Porto Velho.
ABSTRACT
The Brazilian Inclusion Law (LBI), also known as the Statute of Persons with Disabilities (Law No. 13,146/2015), aims to guarantee equal conditions for people with disabilities, especially in the educational context. However, the effectiveness of the LBI in the state public schools of Porto Velho still faces significant challenges. This study analyzes the implementation of the LBI, investigating structural, pedagogical and social aspects that influence its application. The research used exploratory, qualitative and deductive methodology including documentary review and mapping of the current scenario of implementation of the LBI in the state public schools of Porto Velho. The results highlighted deficiencies in infrastructure, teacher training and access to assistive technologies, compromising the effective inclusion of students with disabilities. It is concluded that the full implementation of the LBI depends on investments in infrastructure and training, as well as the strengthening of inclusive public policies.
Keywords: Educational inclusion; Brazilian Inclusion Law; accessibility; special education; Porto Velho.
1. INTRODUÇÃO
A Lei Brasileira de Inclusão (LBI), ou Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), tem como objetivo garantir e promover os direitos das pessoas com deficiência em condições de igualdade, superando barreiras e promovendo a inclusão social e a acessibilidade.
Criada em 6 de julho de 2015, a LBI foi elaborada para atender às diretrizes da Convenção Internacional da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada em 2007, reforçando o compromisso global com a inclusão e acessibilidade. A lei se divide em dois blocos principais: os direitos fundamentais das pessoas com deficiência e o acesso à justiça, estabelecendo penalidades para quem descumprir suas normas.
Considerada uma das legislações mais inclusivas das Américas, a LBI promoveu alterações significativas em diversas leis, como o Código Eleitoral, o Código de Defesa do Consumidor, o Código Civil e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entre outras.
No âmbito educacional, a LBI desempenha um papel essencial na garantia do acesso dos estudantes com deficiência a uma educação de qualidade, adaptada às suas necessidades individuais, permitindo seu pleno desenvolvimento em um ambiente inclusivo. No entanto, a realidade das escolas públicas estaduais em Porto Velho evidencia um contexto desafiador, marcado por entraves estruturais, pedagógicos e administrativos que dificultam a implementação efetiva dessa legislação.
A inclusão educacional é um direito fundamental, respaldado por diversas normativas nacionais e internacionais, incluindo a Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 205 assegura o direito universal à educação, e o artigo 208, inciso III, que garante o atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei nº 9.394/1996), em seu artigo 58, define a oferta de educação especial na rede regular, com adaptações específicas para estudantes com deficiência.
O Decreto nº 10.502/2020 regulamenta a Política Nacional de Educação Especial, articulando o atendimento educacional especializado com a educação regular, embora ainda existam controvérsias quanto à sua aplicação.
Em Rondônia, a Lei Estadual nº 3.019/2013 garante o direito ao atendimento educacional especializado, com foco na adaptação curricular e acessibilidade. Apesar dessas normativas, a implementação da LBI nas escolas públicas estaduais de Porto Velho enfrenta diversos desafios.
A falta de infraestrutura adequada, como rampas, banheiros adaptados e salas de recursos, bem como a carência de tecnologias assistivas e materiais didáticos adaptados, limita a inclusão de alunos com deficiência, comprometendo seu desenvolvimento educacional. A escassez de profissionais especializados, como intérpretes de Libras, cuidadores e auxiliares de apoio, também impedem que os alunos recebam o suporte necessário para acompanhar o currículo escolar de maneira eficaz.
Além disso, muitos professores e equipes pedagógicas não possuem a formação adequada e contínua sobre educação inclusiva, o que dificulta a aplicação de metodologias e práticas necessárias para a inclusão dos alunos com deficiência. Para além dos desafios estruturais e pedagógicos, ainda existem barreiras sociais, como preconceitos e a falta de conscientização sobre a importância da inclusão, que afetam a integração dos alunos com deficiência no ambiente escolar.
A acessibilidade, portanto, constitui um direito humano fundamental, que busca garantir o pleno exercício da cidadania às pessoas com deficiência. Nesse contexto, destaca-se o papel do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), que estabelece diretrizes gerais da política urbana, entre elas a promoção da justiça social e da inclusão, inclusive no que tange à acessibilidade nos espaços públicos.
Em consonância com essa legislação, o Plano Diretor do Município de Porto Velho, como instrumento básico da política de desenvolvimento urbano, também prevê normas voltadas à mobilidade urbana e à eliminação de barreiras arquitetônicas, assegurando que o ambiente urbano seja mais acessível e inclusivo para todos os cidadãos. Assim, é necessário avaliar como essas diretrizes vêm sendo implementadas na prática, especialmente no município de Porto Velho.
Nesse contexto, o presente artigo tem como objetivo analisar a efetividade da implementação da Lei Brasileira de Inclusão no município de Porto Velho, identificando os principais desafios e as práticas adotadas para assegurar os direitos dos estudantes com deficiência e promover a igualdade de oportunidades no ambiente escolar.
O trabalho está estruturado em três tópicos: o primeiro apresenta um breve relato sobre a Lei nº 13.146/2015, que estabelece as diretrizes para garantir a inclusão e igualdade de oportunidades, eliminando barreiras físicas, pedagógicas e atitudinais; o segundo aborda os desafios da implementação dessa inclusão, especialmente no contexto das escolas públicas da rede estadual de Porto Velho, onde a infraestrutura escolar ainda é insuficiente para garantir a acessibilidade física e pedagógica; e, por fim, discute a falta de capacitação específica para professores, que compromete a qualidade da inclusão nas salas de aula, apesar da exigência da LBI para a formação contínua e especializada desses profissionais.
2. MATERIAL E MÉTODOS
A metodologia adotada neste estudo fundamentou-se em uma pesquisa exploratória, na qual foram examinados relatórios governamentais, dados do Censo Escolar, políticas públicas estaduais e municipais voltadas para a educação inclusiva, além de legislações pertinentes e documentos legais, como livros e artigos científicos.
A análise foi realizada com base na legislação vigente, doutrinas e estudos acadêmicos, utilizando a revisão documental para mapear o cenário da implementação da Lei Brasileira de Inclusão (LBI) nas escolas públicas estaduais de Porto Velho. Esse tipo de pesquisa possibilitou a análise de narrativas diversificadas a partir de interpretações individuais, permitindo a comparação entre diferentes perspectivas sobre um mesmo documento e o confronto com outras pesquisas de abordagens variadas, mas que tratam do mesmo tema.
Optou-se pela abordagem qualitativa, que possibilitou uma compreensão aprofundada da implementação da LBI nas escolas públicas estaduais, além de uma visão ampla sobre as formas de aplicabilidade da legislação, com base na análise de doutrinadores do Direito. O objetivo foi compreender as complexidades envolvidas no processo de inclusão educacional.
A pesquisa apresentou caráter exploratório e descritivo. O objetivo exploratório buscou investigar o direito dos estudantes com deficiência, tendo como referência a Lei Brasileira de Inclusão, enquanto o objetivo descritivo visou analisar e relatar os impactos da ausência de uma inclusão efetiva no ambiente escolar. Assim, este estudo pretende contribuir para uma compreensão abrangente e detalhada do tema.
3. RESULTADOS
Nos resultados da pesquisa sobre a efetividade da Lei Brasileira de Inclusão (LBI) nas escolas estaduais de Porto Velho, verificou-se que sua implementação apresenta variações conforme os recursos disponíveis e a capacitação das equipes pedagógicas. A LBI garante o acesso universal à educação para alunos com deficiência, assegurando o ensino regular com adaptações e suporte especializado. Além disso, prevê adaptações curriculares que flexibilizam conteúdos, metodologias e materiais didáticos para promover a inclusão efetiva.
Dentre as iniciativas bem-sucedidas, destacam-se a presença de Salas de Recursos Multifuncionais em algumas escolas, que oferecem tecnologias assistivas, materiais adaptados e professores especializados para o Atendimento Educacional Especializado (AEE). Um exemplo expressivo é a Escola Estadual José Otino de Freitas, que possui uma Sala de Recursos Multifuncionais (SEM) atendendo 23 estudantes com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e deficiências intelectual, auditiva, visual e física, fornecendo suporte complementar ao ensino regular.
Outra ação relevante observada foi a implementação de adaptações físicas e tecnológicas em algumas unidades escolares. A Escola Estadual Ulisses Guimarães, por exemplo, se destaca por suas melhorias em acessibilidade, contando com banheiros adaptados, pisos táteis e rampas para facilitar a mobilidade de alunos com deficiência.
Ainda que existam políticas de inclusão e adaptações curriculares, a realidade muitas vezes expõe dificuldades na adaptação das escolas, principalmente no que se refere a acessibilidade física, tecnologias assistivas e apoio pedagógico individualizado, ainda é possível encontrar inúmeros desafios como a falta de infraestrutura adaptada, escassez de recursos materiais e humanos especializados, e uma formação insuficiente de professores para lidar com as demandas da educação inclusiva.
Dados obtidos no portal e-SIC, administrado pela Controladoria Geral do Estado de Rondônia, evidenciam a precariedade da acessibilidade nas escolas estaduais de Porto Velho em 2023. A Escola Estadual General Osório, por exemplo, não possui qualquer tipo de adaptação para alunos com deficiência, enquanto a Escola Estadual Risoleta Neves conta apenas com um banheiro adaptado, o que demonstra um cenário ainda distante da plena acessibilidade prevista pela LBI.
Ademais, em 2023, a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB-RO encaminhou um ofício ao Ministério Público de Rondônia relatando que 20 instituições de ensino negaram matrícula ou impediram o acesso de alunos por falta de professor auxiliar. O Ministério Público informou que, em um primeiro momento, pelo menos sete desses casos já estavam sob investigação.
A implementação da LBI nas escolas estaduais de Porto Velho revela tanto avanços quanto desafios na construção de um ambiente educacional verdadeiramente inclusivo e acessível. Iniciativas como as Salas de Recursos Multifuncionais e adaptações estruturais representam progressos, mas ainda são insuficientes diante das necessidades. A escassez de recursos financeiros, a infraestrutura inadequada e a formação limitada dos profissionais continuam sendo barreiras substanciais para a plena inclusão escolar. Assim, garantir uma educação sem barreiras exige um compromisso permanente do poder público, das instituições de ensino e da sociedade. Somente por meio de investimentos estruturais, capacitação docente e fortalecimento das políticas inclusivas será possível assegurar que todos os alunos tenham acesso à educação de qualidade em condições de equidade.
4. DISCUSSÃO
O número de alunos com deficiência matriculados nas escolas tem aumentado significativamente no Brasil. Em 2022, o Censo Escolar registrou cerca de 1,3 milhão de estudantes com deficiência (BRASIL, 2022). Em Rondônia, o Censo de 2023 identificou mais de 7.000 alunos com diferentes tipos de deficiência, com Porto Velho concentrando uma parte considerável desses estudantes. As escolas estaduais da cidade atendem a 2.324 alunos diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA), 268 com baixa visão, 61 com cegueira, 195 com deficiência auditiva, 352 com deficiência física, 3.132 com deficiência intelectual, 61 com surdez e 252 com altas habilidades (INEP, 2023). Para apoiar essa diversidade, o estado conta com 238 salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE), 304 professores especializados, 917 cuidadores e 42 intérpretes de Libras, evidenciando uma estrutura voltada à inclusão.
A educação inclusiva é um direito garantido pela Constituição Federal de 1988 (art. 205 e 208) e pela Lei Brasileira de Inclusão (LBI, Lei nº 13.146/2015), que obriga as escolas a se adaptarem para receber alunos com deficiência. A LBI exige a transformação do ambiente escolar, incluindo adaptações físicas, formação de profissionais e flexibilização curricular. Segundo Fonseca (2018), muitas escolas carecem de infraestrutura adequada, como rampas e banheiros adaptados, o que dificulta a participação dos alunos.
Além das diretrizes constitucionais e da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, é importante destacar que o Estatuto da Cidade e o Plano Diretor do Município de Porto Velho desempenham papel fundamental na promoção da acessibilidade urbana.
O Estatuto das Cidades determina que a gestão democrática da cidade deve priorizar a função social da propriedade e a inclusão social. No caso de Porto Velho, o Plano Diretor Municipal contempla dispositivos específicos para a mobilidade urbana acessível e a eliminação de barreiras físicas em espaços públicos. No entanto, a realidade observada nos bairros e nos centros urbanos da capital rondoniense revela lacunas entre a teoria e a prática, evidenciando a necessidade de maior efetividade na implementação dessas normas, sobretudo na fiscalização e adequação das vias públicas, calçadas e edificações.
A qualificação docente é outro ponto crítico que representa um desafio significativo. A escassez de profissionais especializados, como intérpretes de Libras, professores auxiliares e cuidadores, compromete a efetividade da inclusão, uma vez que esses profissionais desempenham um papel fundamental no suporte individualizado aos estudantes (Ferreira & Oliveira, 2020).
A adaptação curricular, essencial para tornar os conteúdos acessíveis a todos os estudantes, também é um desafio. Muitas escolas não implementam as adaptações necessárias, prejudicando a aprendizagem dos alunos com deficiência (Cunha, 2019). O Ministério da Educação (MEC, 2019) recomenda o uso de recursos visuais, táteis e sonoros, mas sua aplicação ainda é limitada.
Em Porto Velho, o aumento no número de matrículas de alunos com deficiência tem colocado à prova a capacidade das escolas de atender às demandas de inclusão. O Censo Escolar de 2023 revela que, embora o número de alunos tenha crescido, a quantidade de salas de AEE e profissionais especializados ainda é insuficiente (Secretaria de Educação do Estado, 2023). Isso destaca a necessidade urgente de investimentos em recursos humanos e materiais e de uma reestruturação das políticas públicas para garantir uma educação verdadeiramente inclusiva.
A efetividade da LBI nas escolas de Porto Velho exige a análise das diretrizes legais e a identificação dos obstáculos que ainda limitam a inclusão plena desses alunos. A educação inclusiva transcende adaptações pontuais, demandando uma reestruturação sistêmica do modelo educacional para assegurar que todos os alunos, independentemente de suas limitações, tenham acesso a uma educação de qualidade. Além disso, requer modificações profundas no sistema educacional, incluindo uma nova organização curricular que considere as necessidades de todos os estudantes.
O Plano Estadual de Educação (PEE) 2014-2024 enfatiza a expansão da educação inclusiva, com ênfase na formação contínua dos profissionais, na adequação da infraestrutura escolar e na criação de práticas pedagógicas inclusivas (Governo do Estado de Rondônia, 2014). No entanto, apesar dos avanços nas matrículas, muitas escolas ainda enfrentam dificuldades para implementar as diretrizes da LBI. De acordo com a SEDUC (2021), apenas 60% das escolas estaduais de Porto Velho possuem infraestrutura acessível, e cerca de 45% relatam falta de recursos pedagógicos e tecnologias assistivas para atender alunos com deficiência.
Outro ponto crítico é a formação dos professores. Pesquisa da UNIR (2022) revelou que mais de 70% dos professores nas escolas estaduais não se sentem preparados para atender alunos com deficiência. Esses educadores enfrentam dificuldades na adaptação curricular e na aplicação de metodologias pedagógicas inclusivas, evidenciando a lacuna entre as diretrizes legais e a prática educacional.
Esses desafios impactam diretamente o desempenho acadêmico dos alunos com deficiência, que enfrentam barreiras físicas, atitudinais e pedagógicas. A falta de profissionais de apoio, como intérpretes de Libras, cuidadores e mediadores escolares, é um obstáculo significativo para a garantia de uma educação equitativa, como estabelecido pela LBI e pelo PEE.
Na perspectiva doutrinária, Maria Aparecida Gurgel (2019) enfatiza que a implementação da educação inclusiva não pode se limitar à mera existência de legislação, mas deve envolver uma mudança estrutural e cultural na gestão educacional. A autora destaca que a inclusão efetiva depende da cooperação entre os entes federativos, das políticas públicas e da atuação dos órgãos fiscalizadores para garantir a aplicação da LBI.
Além disso, segundo Gurgel, a judicialização da inclusão educacional tem sido um mecanismo frequentemente acionado por famílias que buscam assegurar os direitos de seus filhos, revelando a dificuldade de implementação espontânea da legislação por parte do poder público.
A análise doutrinária reforça a necessidade de um compromisso efetivo para a concretização da educação inclusiva. A adaptação das escolas, a formação dos professores e a destinação de recursos financeiros e humanos são medidas fundamentais para que os princípios da LBI sejam cumpridos na prática, garantindo que os alunos com deficiência tenham acesso a um ensino de qualidade e verdadeiramente inclusivo. Portanto, para que a LBI cumpra seu propósito de garantir uma educação de qualidade para todos, é imprescindível que o Estado de Rondônia, especialmente Porto Velho, redobre seus esforços em adaptar as escolas, formar os educadores e investir nos recursos necessários.
Somente com um compromisso conjunto entre poder público, escolas e sociedade será possível garantir uma educação inclusiva efetiva, que permita a todos os alunos, independentemente de suas limitações, o pleno exercício de seu direito à educação.
4.1 LEI Nº 13.146 DE 2015
No dia 06 de julho de 2015 entrou em vigor no Brasil a Lei n. 13.146, que trata da criação do Estatuto da Pessoa com Deficiência, também conhecido como Lei Brasileira de Inclusão (LBI), com o propósito de assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais das pessoas com deficiência. A norma representa um avanço significativo na legislação brasileira ao priorizar a inclusão social, a acessibilidade e a eliminação das barreiras que dificultam a plena participação dessas pessoas na vida em sociedade.
A LBI foi resultado de um longo processo de debates e mobilizações da sociedade civil, especialmente de entidades que defendem os direitos das pessoas com deficiência. O Estatuto foi inspirado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da Organização das Nações Unidas (ONU), adotada em 2006 e ratificada pelo Brasil em 2008 com status de emenda constitucional.
O projeto de lei que originou a LBI foi apresentado pela então senadora Marta Suplicy e tramitou no Congresso Nacional por vários anos recebendo contribuições de diversas comissões parlamentares, organizações da sociedade civil e especialistas em direitos humanos e acessibilidade. Após sua aprovação no Congresso, a lei foi sancionada pela então presidente Dilma Rousseff em 2015.
Criada para corrigir desigualdades históricas enfrentadas pelas pessoas com deficiência no Brasil, antes de sua implementação, muitas barreiras arquitetônicas, sociais, educacionais e profissionais impediam a plena inclusão dessas pessoas. A lei nasce para estabelecer diretrizes para garantir o direito ao acesso ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao lazer e à saúde, também para buscar combater práticas discriminatórias, assegurar o direito à acessibilidade em locais públicos e privados e criar mecanismos para que pessoas com deficiência tenham autonomia e participação ativa na sociedade.
A Lei nº 13.146/2015 também representa um marco por estabelecer o conceito de pessoa com deficiência a partir da interação entre as limitações individuais e as barreiras impostas pelo meio. Essa perspectiva social da deficiência reforça a responsabilidade do Estado e da sociedade na remoção desses obstáculos, sejam eles físicos, comunicacionais, atitudinais ou institucionais.
Nesse sentido, a LBI estabelece como dever do poder público garantir o acesso universal à educação, com adaptações razoáveis e suporte individualizado, promovendo o desenvolvimento pleno das potencialidades dos alunos com deficiência em igualdade de oportunidades com os demais estudantes.
O Capítulo IV do Estatuto trata especificamente do direito à educação, e em seu artigo 27 dispõe:
Art. 27. A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem. Parágrafo único. É dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência, colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e discriminação.
Além da LBI, a Constituição Federal de 1988 também assegura o direito à educação inclusiva nos artigos 205 e 208, impondo ao Estado e às instituições educacionais o dever de se adaptarem para atender alunos com deficiência. A inobservância desses dispositivos não apenas compromete a inclusão, como também configura afronta aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da cidadania.
4.1.1 A Lei nº 13.146/2015 e a Realidade das Escolas Públicas Estaduais de Porto Velho
A realidade das escolas públicas estaduais de Porto Velho revela um notável descompasso entre as garantias previstas na Lei nº 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão – LBI) e a prática cotidiana no ambiente escolar.
A LBI assegura às pessoas com deficiência o direito a uma educação inclusiva, equitativa e de qualidade, exigindo do poder público a implementação de medidas que garantam acessibilidade física, pedagógica e comunicacional. Isso inclui adaptações estruturais, como rampas de acesso, banheiros adaptados e mobiliário adequado, além da oferta de atendimento educacional especializado, com salas de recursos multifuncionais e profissionais capacitados. A lei também estabelece a obrigatoriedade de formação continuada para docentes e demais servidores, com foco na adoção de práticas pedagógicas inclusivas.
Entretanto, o cenário encontrado em grande parte das escolas públicas estaduais de Porto Velho é adverso. Muitas unidades carecem de infraestrutura mínima para atender estudantes com deficiência: rampas mal projetadas ou inexistentes, ausência de banheiros acessíveis e salas de aula inadequadas são obstáculos recorrentes. O transporte escolar acessível, essencial para garantir o direito à educação, é insuficiente ou simplesmente inexistente em diversas regiões, especialmente nas áreas rurais e periféricas.
Além disso, a formação continuada dos profissionais da educação, prevista na LBI, não tem sido implementada de maneira eficaz, pois muitos professores da rede pública nunca receberam formação específica sobre inclusão ou atendimento especializado, o que gera insegurança, limitações na aplicação de práticas inclusivas pedagógicas e compromete o processo de aprendizagem dos alunos. A carência de profissionais de apoio, como intérpretes de Libras, cuidadores, psicopedagogos e assistentes educacionais, é outro entrave significativo. Quando esses profissionais estão presentes, sua quantidade costuma ser insuficiente para atender à demanda, o que sobrecarrega o sistema e compromete a qualidade do atendimento. Soma-se a isso a escassez de tecnologias assistivas, como softwares leitores de tela, materiais em braille e recursos audiovisuais adaptados, que deveriam ser disponibilizados para promover uma aprendizagem mais acessível e eficiente.
Por fim, as escolas da zona rural ou de bairros periféricos enfrentam ainda mais dificuldades em relação à acessibilidade e ao cumprimento da LBI, o que acentua as desigualdades educacionais.
Esse panorama evidencia que a falta de investimentos adequados, de políticas públicas eficazes e de compromisso institucional com a inclusão educacional impede a plena efetivação dos direitos garantidos pela Lei nº 13.146/2015.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pelo exposto, é possível concluir que o presente artigo demonstrou a importância do tema da aplicabilidade da Lei Brasileira de Inclusão. Concluímos que a aplicabilidade da Lei Brasileira de Inclusão (LBI) nas escolas públicas estaduais de Porto Velho ainda encontra obstáculos significativos que comprometem a efetivação do direito à educação inclusiva. O estudo evidenciou que as barreiras estruturais, pedagógicas e de gestão são persistentes, refletindo a distância entre o arcabouço legal existente e a realidade vivenciada por alunos com deficiência.
Apesar de o Brasil dispor de um sólido conjunto normativo, que inclui a Constituição Federal, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a LBI, o Estatuto das Cidades e o Plano Diretor Municipal, a efetivação dos direitos assegurados a esse público exige uma atuação integrada entre o poder público, a sociedade civil e os diversos agentes educacionais. A inclusão não pode ser tratada como um mero cumprimento formal da legislação, mas como uma política de Estado comprometida com a equidade, a justiça social e a promoção da dignidade da pessoa humana.
Para que a inclusão escolar seja plena e efetiva, torna-se essencial ampliar os investimentos em infraestrutura adequada, formação continuada de professores, contratação de profissionais de apoio, aquisição de tecnologias assistivas e adaptação dos espaços urbanos conforme as diretrizes do Estatuto das Cidades e do Plano Diretor do Município de Porto Velho. É necessário, ainda, que haja planejamento urbano e educacional que dialogue com a diversidade e que seja sensível às múltiplas formas de existência e aprendizado.
Construir uma escola inclusiva é, portanto, um desafio que ultrapassa os muros da escola e exige o compromisso coletivo com a transformação social. Cabe aos gestores públicos, educadores e à sociedade como um todo promover a efetivação de políticas públicas inclusivas, capazes de transformar Porto Velho e, por extensão, o Estado de Rondônia em um espaço acessível, justo e igualitário, pautado nos valores fundamentais da dignidade humana, da igualdade de oportunidades e da cidadania plena.
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1Acadêmica de Direito. E-mail: ana.arruda@faculdadesapiens.edu.br. Artigo apresentado à Faculdade Unisapiens, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO.
2Acadêmica de Direito. E-mail: edilene.umbelina@faculdadesapiens.edu.br. Artigo apresentado à Faculdade Unisapiens, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO.
3Professor Orientador. Professor do curso de Direito. Especialista em Direito Processual Civil, Direito do Entretenimento, Direito Desportivo e Gestão. E-mail: leonardo.antunes@gruposapiens.com.br.