QUALIDADE DO SONO E SONOLÊNCIA DIURNA EM ACADÊMICOS DE UMA UNIVERSIDADE PÚBLICA DO PIAUÍ

SLEEP QUALITY AND DAYTIME SLEEPYNESS IN STUDENTS AT A PUBLIC UNIVERSITY IN PIAUÍ

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202503311543


Maximiliano de Souza Zierer1; Lidiane Pereira de Albuquerque1; Kátia Bonfim Leite de Moura Sérvulo1; Regina Maria Sousa de Araújo1


RESUMO

Este trabalho verificou a qualidade do sono e o nível de sonolência diurna de graduandos da Universidade Federal do Piauí, visando compreender os fatores envolvidos no possível comprometimento da qualidade do sono nesse público. Participaram da pesquisa 317 estudantes de 8 cursos de graduação e de ambos os sexos. A coleta dos dados foi feita pelo preenchimento de um questionário contendo 18 questões objetivas. Os resultados mostraram que 65% dos estudantes avaliaram a qualidade do seu sono como regular, boa ou excelente; 85% dormiram entre cinco e sete horas por noite e 70% levaram de 15 a 30 minutos para adormecer. O nível de sonolência diurna durante as aulas na universidade atingiu 86% e 48% dos estudantes relataram ter acordado durante a noite e em seguida terem dificuldade para voltar a dormir. Parcela substancial da amostra afirmou não usar medicamento para induzir o sono nem consumir bebida alcoólica. Contudo, 66% dos acadêmicos foram considerados sedentários ou insuficientemente ativos. Portanto, a sonolência diurna excessiva constatada instiga a construção de redes de apoio para os discentes, criando condições de uma vivência adaptativa ao meio acadêmico, bem como estimula estudos futuros para uma melhor compreensão dos fatores que influenciam a qualidade do sono e sonolência diurna nesse público.

Palavras-chave: Sono, Sonolência Diurna, Universitários.

ABSTRACT

This study assessed the quality of sleep and the level of daytime sleepiness among undergraduate students at the Federal University of Piauí, aiming to understand the factors involved in the possible impairment of sleep quality in this population. A total of 317 students from 8 undergraduate courses and of both genders participated in the study. Data collection was done by completing a questionnaire containing 18 objective questions. The results showed that 65% of the students evaluated the quality of their sleep as regular, good or excellent; 85% slept between five and seven hours per night and 70% took 15 to 30 minutes to fall asleep. The level of daytime sleepiness during classes at the university reached 86% and 48% of the students reported waking up during the night and then having difficulty going back to sleep. A substantial portion of the sample stated that they did not use medication to induce sleep or consume alcoholic beverages. However, 66% of the students were considered sedentary or insufficiently active. Therefore, the excessive daytime sleepiness observed encourages the construction of support networks for students, creating conditions for an adaptive experience in the academic environment, as well as stimulating future studies for a better understanding of the factors that influence the quality of sleep and daytime sleepiness in this public.

Keywords: Sleep, Daytime Sleepiness, College Students.

1. INTRODUÇÃO

O sono é um estado fisiológico normal das atividades cerebrais, considerado reversível e cíclico, organizado em fases e que combina diversos processos fisiológicos primordiais para a manutenção da saúde e do bem-estar, tais como função reparadora, imunológica e de conservação de energia (Dinis & Bragança, 2018; Castro et al., 2020). Ainda, o sono saudável está relacionado à melhoria do raciocínio e da habilidade de linguagem, contribuindo nos processos criativos e na redução do estresse emocional (Diekelmann, 2014). Para que as funções do sono sejam efetivas, é necessário manter diariamente uma quantidade e qualidade de sono, que varia de pessoa para pessoa e no decorrer da vida (Hirshkowitz et al., 2015).

O sono pode ser afetado por fatores que interferem no ciclo sono-vigília, dentre os quais privação do sono, presença de distúrbios mentais, hábitos de vida e rotinas estressantes, idade, patologias físicas e cognitivas, mudança de fuso horário e ritmo circadiano (Nascimento et al., 2018). A privação do sono, caracterizada por um período longo sem dormir ou do sono fragmentado, pode prejudicar a qualidade do sono e acarretar sonolência diurna excessiva que pode estar associada a uma necessidade aumentada de dormir (Souza, 2007). Assim, perturbações na qualidade do sono resultam em danos significativos à saúde, contribuindo para o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis; comprometimento do sistema imunológi­co; alterações repentinas de humor, aumento da sensação de estresse, depressão e ansiedade; e lapsos de memória (Castro et al., 2020; Santos et al.,2020). Adicionalmente, problemas de sono geram impactos econômicos e sociais que envolvem desde risco de acidentes de trânsito à redução da capacidade de trabalho (Adams et al., 2017).

Distúrbios do sono, especialmente a sonolência diurna excessiva, são problemas prevalentes e crescentes entre universitários, nos quais a análise da sonolência diurna é de grande relevância, pois ao longo da formação acadêmica o aumento de responsabilidades, a elevada demanda de estudos e de atividades extracurriculares geram grandes pressões psicológicas, tornando estes indivíduos mais susceptíveis a problemas de sono (Santos et al., 2020; Silva et al., 2020; Dutra da Silva et al., 2021). Tais irregularidades de descanso repercutem negativamente na saúde desses estudantes, havendo comprometimento da memória, aumento da ansiedade, diminuição do estado de alerta e do desempenho de suas atividades acadêmicas (Furlani & Ceolim, 2005; Carone et al., 2020).

Somada às dificuldades associadas às demandas acadêmicas, a qualidade do sono dos estudantes pode ser afetada por hábitos considerados não saudáveis, dentre os quais o consumo regular de substâncias psicoativas, como tabaco, álcool, café e medicamentos, a inatividade física, comportamentos alimentares inapropriados e o uso de aparelhos eletrônicos durante a noite (Lopes et al., 2018; Santos et al., 2020). Vale ressaltar que os universitários representam o capital nacional e o investimento para o futuro de uma nação, sendo, portanto, de grande importância que sejam pessoas com hábitos de vida saudáveis para contribuir para o desenvolvimento de um país (Oliveira, 2010).

Vários estudos têm constatado uma má qualidade do sono e sonolência diurna excessiva entre universitários (Carvalho et al., 2013; Araújo et al., 2016; Fonseca et al., 2016; Portilla Maya et al., 2019; Santos et al., 2020; Oliveira et al., 2020; Araújo et al., 2021; Silveira & Véras, 2022). Apesar desse quadro, pouco se discute sobre a qualidade de sono no ambiente acadêmico e os fatores associados, assim como as medidas de apoio aos discentes.

Dessa forma, o desenvolvimento de pesquisas sobre a prevalência de má qualidade do sono e seus impactos em universitários é de extrema importância, pois estes conhecimentos podem divulgar os riscos e conscientizar os estudantes a prevenir distúrbios do sono adotando ações que visam educá-los de uma maneira que possam dormir adequadamente, como dieta saudável, cuidados com a saúde mental e prática de exercícios físicos (Araújo et al., 2021; Rocha et al., 2024).

Diante do exposto, este trabalho propôs avaliar a qualidade do sono e o nível de sonolência diurna nos acadêmicos de graduação da Universidade Federal do Piauí, campus Teresina, visando compreender os fatores envolvidos no possível comprometimento da qualidade do sono nesses indivíduos.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo, transversal, analítico e com abordagem quantitativa. O público-alvo foi composto por graduandos dos cursos de Medicina, Odontologia, Nutrição, Medicina Veterinária, Agronomia, Química, Educação Física e Ciências Biológicas da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Município de Teresina. Participaram do estudo 317 acadêmicos escolhidos de forma aleatória, de ambos os sexos, e a amostragem foi calculada com nível de confiança de 95% e o erro amostral de 5%.

O instrumento escolhido para a coleta dos dados foi um questionário com 18 questões objetivas disponibilizado aos estudantes via link do Google Formulários. O link foi enviado aos participantes após o aceite espontâneo em colaborar com a pesquisa, demonstrado a partir da assinatura do Termo de Consentimento Livre Esclarecido.

A coleta dos dados foi realizada no período de março a outubro de 2024. Os dados coletados foram armazenados em planilha do Excel 2010 e analisados por meio de estatística descritiva com valores manifestos em média e desvio padrão (DP), considerando o nível de significância de p<0,05. A pesquisa atendeu as exigências éticas da Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, sendo cadastrada na Plataforma Brasil e anuída pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFPI (parecer de número 76661923.7.0000.5214).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dos 317 participantes, a maioria foi do sexo feminino (60%) e a idade mediana de 20,15 anos (DP ± 2,36). No contexto social, o estudo apontou que 92% dos estudantes declararam-se solteiros e 74% afirmaram morar com familiares.

Sobre a autopercepção da qualidade do sono, 45% dos estudantes afirmaram o seu sono como regular, 29% como ruim, 18% como bom, 6% como péssimo e apenas 2% consideraram excelente (Figura 1), ou seja, 65% dos estudantes consideraram o sono como regular, bom ou excelente, enquanto 35% relataram seu sono como ruim ou péssimo. Diferentemente da nossa pesquisa, ao analisar a qualidade subjetiva do sono nos estudos observacionais e transversais de Araújo et al. (2013), Depieri et al. (2016), Bastos et al. (2020), Barrinha et al. (2023) e Coelho et al. (2023), os seus resultados mostraram predominância da qualidade ruim de sono entre os estudantes de cursos diversos. A rotina em uma universidade frequentemente expõe os estudantes a um período integral de aulas com altas demandas acadêmicas, consequentemente ao aumento de responsabilidades, exigência em relação aos estudos e atividades extracurriculares, gerando sobrecarga psicológica, levando a um tempo inconstante e insuficiente de sono (Silva et al., 2019a).

Figura 1: Índice da autoavaliação da qualidade do sono em universitários.

Fonte: Autores, 2024.

Em relação às horas de sono por noite no último mês, a maioria dos estudantes (85%) dormiu entre cinco e sete horas e apenas 10% alcançaram um valor um pouco acima, entre oito e nove horas de sono (Figura 2). Similarmente aos nossos resultados, Rocha et al. (2024) destacaram que a maioria dos acadêmicos de Enfermagem (74%) de uma universidade pública do estado de Mato Grosso dormiam entre cinco e sete horas por noite. Araújo et al. (2013), ao investigar a qualidade do sono de estudantes na Universidade Federal do Ceará (UFC) dos campi da cidade de Fortaleza, observaram que apenas 18% dos participantes conseguiram alcançar um valor superior a sete horas de sono e 62% um pouco abaixo desse valor (entre seis e sete horas). O estudo ainda ressaltou que 52% dos alunos que dormiam menos de cinco horas diárias cursavam entre o 1º e o 4º semestres.

Ainda em relação ao tempo de sono, na pesquisa de Marques et al. (2024), somente 28 % dos estudantes dormiam mais que 7 horas por noite. Estes autores avaliaram a percepção subjetiva da qualidade do sono dos estudantes do curso de Medicina do Centro Universitário de Manhuaçu – MG; o estudo afirmou que a maioria dos estudantes da referida instituição estaria passando por períodos de privação de sono e poderia ser preocupante à manutenção da saúde. Estudos confirmam a relação entre menor quantidade de horas de sono com o maior risco de desenvolver hipertensão arterial e prejuízos no rendimento acadêmico (Silva et al., 2019b; Bezerra et al., 2020).

Figura 2: Percentual da duração do sono por noite no último mês.

Fonte: Autores, 2024.

Sobre o período de latência do sono, para 39% dos estudantes da presente pesquisa foi necessário até 15 minutos para dormir, para 31% até 30 minutos, para 16% até 45 minutos, para 9% até 60 minutos e para 5% até 90 minutos (Figura 3). Assim, quase 70% dos acadêmicos levaram de 15 a 30 minutos para adormecer e 30% dos estudantes necessitaram  de  um  tempo  superior  a  30  minutos. Semelhante a estes resultados, Gomes-Segundo et al. (2017) avaliaram, através de um estudo transversal, o padrão de sono e os fatores associados à sua qualidade entre 277 estudantes do curso de Medicina da Universidade Federal da Paraíba e constataram que 36% não conseguiam adormecer em até 30 minutos. Uma frequência um pouco superior foi relatada por Depieri et al. (2016) que, ao analisar o tempo gasto para adormecer de 19 formandos em Ciências Biológicas de uma universidade estadual, notaram que 47% deles levaram mais de 30 minutos e 52% adormeceram em até 30 minutos. Diferentemente, a maioria dos estudantes entrevistados da UFC e da Universidade Estadual de Londrina necessitaram de um tempo inferior a 30 minutos para adormecer (Araújo et al., 2013; Lopes et al., 2018), não apresentando problemas na latência do sono.

Figura 3: Percentual do tempo (minutos) necessários até adormecer à noite.

Fonte: Autores, 2024.

No presente estudo, foi verificado que 20% dos estudantes tiveram dificuldades de permanecer acordado por uma vez por semana, 34% por duas vezes, 19%  por três vezes e 13% por  quatro ou mais vezes. Apenas 14% dos estudantes não apresentaram dificuldades de permanecer acordado durante as aulas (Figura 4). Dessa forma, a sonolência diurna atingiu 86% dos estudantes avaliados, um nível bastante expressivo e preocupante. Os nossos resultados corroboram com os achados de Gomes-Segundo et al. (2017) e Lopes et al. (2018) que revelaram que os universitários apresentaram sonolência diurna em 81% e 74%, respectivamente. Sonolência diurna excessiva também esteve presente na população composta por 173 estudantes da Universidade Federal Rural de Pernambuco, especialmente da área da Saúde (50%) (Carvalho et al., 2013) e com estudantes da graduação em uma universidade do Estado de Goiás, com prevalência de sonolência diurna excessiva em 54% (Dutra da Silva et al., 2021).

A sonolência é uma consequência fisiológica ocasionada pela privação do sono, podendo acarretar também situações de mau humor, confu­são, diminuição do estado de alerta e da capacidade reduzida da memória. Adicionalmente, a qualidade do sono e a sonolência diurna em universitários apresentam influências multifatoriais que envolvem altas demandas acadêmicas, aulas que iniciam muito cedo pela manhã, uso de aparelhos eletrônicos antes de dormir, privação de sono e horários irregulares de dormir e acordar (Chang et al., 2015; Amra et al., 2017; Araujo et al., 2021).

Figura 4: Percentual da frequência com a qual o aluno teve dificuldade de permanecer acordado durante as aulas na universidade.

Fonte: Autores, 2024.

O uso excessivo de aparelhos eletrônicos é um comportamento bastante comum dos universitários. A luz artificial de dispositivos, como de smartphone, utilizados principalmente à noite pode reduzir a sonolência noturna, a queda da secreção de melatonina, atrasos no horário de dormir e aumento da sonolência na manhã seguinte ao uso (Chang et al., 2015; Freitas et al., 2017). No nosso estudo, 46% dos estudantes relataram que sempre usaram o celular até antes de dormir e apenas 5% afirmaram que raramente utilizam o celular (Figura 5).

Figura 5: Percentual da frequência do uso do celular pelos estudantes até antes de dormir.

Fonte: Autores, 2024.

Em relação à frequência com a qual o estudante acordou durante a noite e teve dificuldade para voltar a dormir, 52% deles afirmaram que não teve este tipo de problema; dos 48% que relataram dificuldades para voltar a dormir, 20% mostraram por 1 vez na semana, 13% por 2 vezes, 8% por 3 vezes e 7% por 4 ou mais vezes (Figura 6).

Estes resultados diferem dos achados de Depieri et al. (2016) e de Gomes-Segundo et al. (2017) destacando que a maioria dos universitários das respectivas pesquisas acordaram no meio da noite pelo menos uma ou duas vezes por semana.

Figura 6: Percentual da frequência com a qual o estudante acordou à noite e teve dificuldade para voltar a dormir.

Fonte: Autores, 2024.

Uma das variáveis que pode predizer a qualidade do sono e a sonolência diurna em universitários é o uso/abuso de substâncias psicoativas, como sedativos. No presente estudo, foi avaliada a frequência semanal do uso de medicação para induzir o sono no último mês e foi constatado que 90% dos estudantes não usaram qualquer medicamento e 10% afirmaram o uso, sendo 2% por 1 vez na semana, 4% por 2 vezes, 1% por 3 vezes e 3% por 4 ou mais vezes. Estes resultados foram similares aos encontrados em outros estudos com universitários: Almeida et al. (2011) demonstraram que, dos 260 participantes, apenas 7% deles fizeram uso de medicação para dor­mir por pelo menos uma vez por semana no mês anterior ao preenchimento dos instrumentos de avaliação; dos 234 alunos de uma faculdade privada na cidade de Natal-RN, da pesquisa de Araujo & Almondes (2012), e dos 701 acadêmicos da UFC investigados por Araujo et al. (2013), uma parcela substancial da amostra (80% e 91%, respectivamente), durante o último mês, não utilizou nenhum medicamento prescrito por médico ou ainda por conta própria para induzir o sono; ainda, Rocha et al. (2024) referiram que dos 78 estudantes de uma universidade de Mato Grosso, a maioria (78%) afirmou não usar medicação de forma contínua.

No entanto, outras pesquisas identificaram que os universitários, em sua maioria, possuem uma má qualidade de sono e, por isso muitos recorreram aos medicamentos para induzir a este estado de repouso e não terem prejuízos como queda da produtividade, déficit cognitivo e desmotivação (Lopes et al., 2018; Carvalho et al., 2023). Silva et al. (2020) trouxeram dados preocupantes dos seus estudos com a significativa parcela de estudantes de Medicina de uma faculdade do alto sertão paraibano que relataram usar medicação sedativo-hipnótica para dormir ao menos uma vez por semana durante o mês que antecedeu a aplicação da pesquisa. Neste estudo, o índice chegou a 21%. A preocupação com a elevada incidência do uso de sedativos pelos estudantes é o risco de toxicodependência e pelos efeitos colaterais severos advindos do abuso destas substâncias.

No presente estudo, os estudantes foram questionados quanto aos sentimentos e à disposição deles para as aulas no último mês. Como respostas, o estudante pode escolher mais de uma alternativa ao mesmo tempo e as respostas que mais se destacaram foram sonolento(a) (57%), ansioso(a) (51%) e desconcentrado(a) (48%) (Figura 7). Uma pesquisa realizada com 116 estudantes do curso de medicina da PUC-Goiás analisou a correlação entre a sonolência diurna excessiva e o desempenho dos alunos e observou-se uma grande insatisfação dos acadêmicos com o seu próprio rendimento, havendo falta de atenção/concentração, baixa autoestima e humor variável (Vaz et al., 2020).

Figura 7: Percentual do sentimento e disposição do estudante para as aulas na universidade no último mês.

 Fonte: Autores, 2024.

No decorrer de um curso universitário, as pressões às quais os estudantes estão sujeitos, principalmente associadas ao estresse e à ansiedade, a exigência de um bom rendimento acadêmico, ao tempo integral de estudo e a necessidade de complementar o currículo com atividades extracurriculares contribuem para o estabelecimento de um perfil de sono irregular, o que pode impactar na deterioração mental, psicológica e física (Cardoso et al., 2009; Ribeiro et al., 2014). Ainda, essa alta demanda contribui para que o estudante tenha um estilo de vida preocupante, como alimentação inadequada, inatividade fisica e consumo regular de substâncias psicoativas (como tabaco, álcool e café), alterando consequentemente os padrões de sono (Araujo et al., 2021; Barrinha et al., 2023).

Embora evidências apontam que hábitos de vida pouco saudáveis estejam fortemente presentes no cotidiano de universitários e podem influenciar nos padrões do sono, não identificamos associação com essas variávies entre os nossos participantes. A maioria deles consideraram o sono como regular, bom ou excelente, sendo que 66% foram considerados sedentários ou insuficientemente ativos (praticam alguma atividade apenas uma ou duas vezes na semana) (Figura 8) e 78% relataram não consumir bebida alcoólica. Este elevado nível de sedentarismo corrobora com os achados de Zierer et al. (2024) sobre o nível de atividade física e suas barreiras realizada com 394 estudantes da UFPI em 2023.

Similarmente, outros estudos com universitários não identificaram associação significativa entre exercícios físicos regulares ou uso abusivo de álcool com qualidade do sono (Araújo et al., 2014; Lopes et al., 2018; Maciel et al., 2023; Marques et al., 2024). Diferentemente, o grupo de estudantes avaliados por Barrinha et al. (2023) que praticava atividade física e ainda não utilizava dispositivos eletrônicos antes de dormir apresentou melhor qualidade de sono em comparação com o grupo oposto.

Figura 8: Percentual da frequência da prática de atividade física semanalmente.

Fonte: Autores, 2024.

4. CONCLUSÃO

A maioria dos estudantes universitários que participaram da pesquisa considerou a qualidade do sono de regular a excelente, porém apresentou uma sonolência diurna excessiva e quase metade dos participantes relatou que sempre usa o celular até antes de dormir. Ainda, mais da metade da amostra foi considerada sedentária ou insuficientemente ativa, embora não visualizamos a associação dessa variável com os padrões do sono. Por outro lado, parcela substancial dos participantes não usa quaisquer substâncias psicoativas, como medicamentos ou bebida alcoólica, para induzir o sono.

Não podemos desconsiderar a parcela de participantes que afirmaram ter qualidade de sono prejudicada e esse fato pode ser influenciado, dentre outros motivos, pela alta demanda acadêmica e social imposta aos estudantes. É importante o planejamento de atividades no decorrer da graduação, como as psicossociais em grupo dentro da universidade, que instruam os alunos a aproveitarem adequadamente o tempo de sono disponível ao adotarem medidas eficazes de higiene do sono, contribuindo assim para o melhor desempenho acadêmico e melhor qualidade de vida.

Sugere-se que mais estudos sejam realizados a fim de analisar os acadêmicos de outras áreas do conhecimento, para uma melhor compreensão dos fatores que influenciam a qualidade do sono desse público.

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1Docente do Departamento de Bioquímica e Farmacologia da Universidade Federal do Piauí