REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202503112317
Luana de Godoy Cadete
RESUMO
A inclusão escolar de estudantes com deficiência é um tema de grande relevância na sociedade contemporânea, destacando-se como um aspecto fundamental para a construção de uma educação equitativa e acessível. Em um contexto em que os direitos humanos e a igualdade de oportunidades são temas centrais, a inclusão educativa oportuniza o acesso à educação, permanência e êxito na aprendizagem e o desenvolvimento integral de todos os indivíduos, independentemente de suas diferenças e necessidades, promovendo práticas pedagógicas inclusivas e equitativas. Este artigo articula os pressupostos da Pedagogia crítica com as perspectivas epistemológicas de Vygotsky, Paulo Freire, Henry Giroux, entre outros autores, e suas implicações na inclusão educativa de estudantes com deficiência. O objetivo é reflexionar sobre a relevância dessas posições epistemológicas no contexto da educação especial na perspectiva da educação inclusiva segundo as orientações pedagógicas da Secretaria de Educação do Distrito Federal.
Palavras-chave: Pedagogia Crítica; Vygotsky; Paulo Freire; Saviani.
ABSTRACT
The school inclusion of students with disabilities is a topic of great relevance in contemporary society, standing out as a fundamental aspect for the construction of an equitable and accessible education. In a context in which human rights and equal opportunities are central themes, educational inclusion provides access to education, permanence and success in learning, and the integral development of all individuals, regardless of their differences and needs, promoting inclusive and equitable pedagogical practices. This article articulates the assumptions of Critical Pedagogy with the epistemological perspectives of Vygotsky, Paulo Freire, Henry Giroux, among other authors, and their implications in the educational inclusion of students with disabilities. The objective is to reflect on the relevance of these epistemological positions in the context of special education from the perspective of inclusive education according to the pedagogical guidelines of the “Secretaria de Educação do Distrito Federal”.
Keywords: Critical Pedagogy; Vygotsky; Paulo Freire; Saviani.
1. INTRODUÇÃO
“A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF), enquanto órgão da Administração Direta do Governo do Distrito Federal, é responsável pelas políticas públicas educacionais, pelo gerenciamento da Rede Pública de Ensino, voltada para a oferta de educação pública, inclusiva, gratuita e democrática, assegurando a universalização do acesso e a permanência, com êxito, de todos os seus (…)”. (Distrito Federal, 2022)
Embora a inclusão educativa seja tema deste trabalho, não se convém abordar especificamente as questões relativas à educação especial nas escolas do Distrito Federal, mas reflexionar sobre as concepções de educação, segundo a Pedagogia Crítica, que fundamentam o trabalho pedagógico desta rede de ensino.
Com base nos pressupostos da Pedagogia Crítica que fundamentam a orientação pedagógica desta Secretaria de Educação (Distrito Federal, 2013), a Escola tem a função social de promover o desenvolvimento integral dos educandos, considerando as múltiplas dimensões que os constituem: cognitivas, afetivas, sociais, psicológicas, emocionais, físicas, capacitando-os a se tornarem cidadãos participativos na sociedade em que vivem. É função da escola oferecer uma educação para Diversidade, em e para os Direitos Humanos e para a Sustentabilidade, comprometida com a formação integral dos sujeitos históricos e sociais.
E ainda, a missão da escola é proporcionar uma educação pública, acessível, gratuita e democrática, voltada à formação integral do ser humano para que possa atuar como agente de transformação social e de construção científica, cultural e política da sociedade, assegurando a universalização do acesso à escola e da permanência com êxito no decorrer do percurso escolar de todos os estudantes, preparando-os para a vida.
A unidade escolar tem o objetivo de oportunizar condições de desenvolvimento e de aprendizagem capazes de atender às demandas individuais de todos os estudantes, segundo os princípios de respeito à dignidade humana, educabilidade de todos os seres humanos, independente de comprometimentos que possam apresentar, direito à igualdade de oportunidades educacionais, direito à liberdade de aprender e de se expressar e direito a ser diferente.
Nesta rede de ensino, toda a comunidade escolar prepara-se para receber o aluno com deficiência. A convivência entre alunos com deficiência e sem deficiência é extremamente positiva sob todos os aspectos e a escola procura contribuir para a igualdade de condições de acesso e permanência no ambiente escolar. Desse modo, a escola oferece a cada um do que precisa, de acordo com as características e necessidades individuais, pois tem uma cultura de inclusão.
Em relação ao acesso ao currículo, as escolas se empenham em garantir a acessibilidade curricular por meio de adaptações, pois constituem possibilidades educacionais de atuar frente às demandas de aprendizagem dos alunos. São elaboradas as adaptações, quando necessárias, para tornar o currículo apropriado às peculiaridades dos estudantes, tornando-o dinâmico, flexível, passível de ampliação e que atenda realmente a todos os educandos.
1.1 Fundamentos teórico – metodológicos que embasam as práticas escolares desta rede de ensino
A orientação pedagógica da SEEDF (Distrito Federal, 2013) está arraigada nos pressupostos das teorias críticas e pós-críticas, na concepção e nos princípios de educação integral, na psicologia histórico-cultural e na pedagogia histórico-crítica, no currículo integrado, nos eixos transversais e na concepção da avaliação para as aprendizagens e não avaliação das aprendizagens.
A pedagogia histórico-crítica (Saviani, 2011) transcende a ideia de educação como simples transmissão de conteúdo. Propõe, em vez disso, uma abordagem dialógica de educação, centrada na interação entre os sujeitos, a fim de se oferecer uma educação de qualidade que favoreça o desenvolvimento pleno e integral dos estudantes. Nesse contexto, o professor valoriza a prática social do aluno, buscando resgatar seus conhecimentos prévios para, a partir deles, integrar os saberes popularmente construídos (senso comum) com os conhecimentos científicos, por meio de um processo dialético de práxis pedagógica. A prática social, elemento fundamental da pedagogia histórico-crítica, é compreendida como o conjunto de saberes, experiências e percepções construídas pelo estudante em sua trajetória pessoal e acadêmica.
Na prática, a pedagogia Histórico-Crítica pode ser desenvolvida na escola por meio de projetos e sequências didáticas com objetivos bem definidos, visando a construção de conhecimentos, elaboração de conceitos, partindo do espontâneo para o complexo. A pesquisa e a participação dos estudantes nos projetos fazem com que os alunos se envolvam e apropriem-se do conteúdo. Nesse processo, o estudante entende o “como”, o “o quê” e o “porquê” de estar estudando um assunto, atuando como protagonista do processo educativo.
A Psicologia Histórico-Cultural (Vygotsky, 2001) compreende a educação como fenômeno de experiências significativas, organizadas intencional e didaticamente pela escola, e privilegia a importância das interações sociais para o desenvolvimento do indivíduo. Essa psicologia é aplicada na escola, garantindo processos dialógicos de produção de conhecimentos e oferecendo pistas de contextualização para poder intervir na zona de desenvolvimento proximal. Em sala de aula, a roda de conversa e os diálogos expositivos oportunizam a acolhida e desenvolvimento do estudante.
Nessa perspectiva, o planejamento ganha importância, pois precisa ter uma organização que acompanhe os processos de construção de conhecimento que estão ocorrendo com os estudantes. A escuta atenta e sensível do aluno é fundamental, pois é necessário ouvir atentamente o que ele está expressando para, a partir disso, dar continuidade ao processo de aprendizagem. Um exemplo dessa abordagem ocorre quando os conhecimentos dos alunos são utilizados na elaboração e implementação de projetos pedagógicos, um processo que exige, de forma impreterível, uma intencionalidade pedagógica clara.”
O trabalho com projetos favorece o desenvolvimento de um trabalho interdisciplinar, tornando os conhecimentos mais significativos e contextualizados, rompendo com a prática de atividades desconectadas. Dessa forma, a abordagem de temas contemporâneos contribui para a construção de uma sociedade mais justa, pois tais estudos permitem a apropriação de conceitos, mudanças de atitudes e procedimentos onde cada estudante participa de forma autônoma na construção e melhorias da comunidade em que vive. Ressalta-se a importância do trabalho coletivo, pois a mediação é fundamental para que o professor (ou qualquer outro profissional da escola) olhe o aluno de forma integral e compreenda o meio social e cultural no qual ele está inserido.
Durante o desenvolvimento dos projetos, tendo a Sustentabilidade como matriz de conhecimento, há a reflexão sobre como as ações positivas do dia a dia contribuem para a sustentabilidade ampla, não só ambiental, mas também cultural e social. O protagonismo e a autonomia dos estudantes são estimuladas por meio de ações de construção dos conhecimentos com pesquisas socializadas em situações diversas no decorrer do ano. Nesse momento, os estudantes assumem o protagonismo do seu processo de aprendizagem e problematizam fatos da realidade próxima, pesquisando os fatores inter-relacionados a um problema identificado. Desse modo, o estudante, partindo de conceitos do cotidiano, avança para conceitos científicos, fazendo cumprir, assim, o papel social da escola. O papel da escola neste mundo que se transforma deve estar equilibrado entre uma função sistêmica de preparar os alunos para desenvolver as suas qualidades e viver dentro do contexto social, refletindo as questões contemporâneas e atuando para apontar soluções.
“A escola é feita de gente, de eu e de nós. Não se trata apenas de espaço físico, de salas de aula, de quadras, refeitórios ou sequer de seu conteúdo. A escola é um lugar de instrução e socialização, de expectativas e contradições, de chegadas e partidas, de encontros e desencontros, ou seja, um ambiente onde as diversas dimensões humanas se revelam e são reveladas” (Distrito Federal, 2013).
Essa dimensão da escola vai ao encontro do que expõe Biesta (2012), que declara que a teleologia educativa geralmente desempenha três funções diferentes, mas relacionadas, quais sejam, qualificação, socialização e subjetivação. Toda prática educativa é teleológica. O desafio é trabalhar as 3 dimensões simultaneamente, mantendo um equilíbrio entre eles: contribuir para a qualificação e socialização do sujeito e, ao mesmo tempo, para que esse sujeito se afirme como singular e único no mundo. Esse é o grande desafio da educação na contemporaneidade, especialmente na educação inclusiva: fazer uma educação mais humanista, em detrimento de uma educação que privilegia somente a qualificação.
2. EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
A temática relacionada à inclusão educativa de estudantes com deficiência desempenha um papel crucial na sociedade contemporânea, refletindo os valores, as políticas e as atitudes em relação à diversidade e à inclusão social. Em um contexto em que os direitos humanos e a igualdade de oportunidades são temas centrais, a educação especial é um campo que oportuniza o acesso à educação, permanência e êxito na aprendizagem e o desenvolvimento integral de todos os indivíduos, independentemente de suas diferenças e necessidades, promovendo práticas pedagógicas inclusivas e equitativas.
A educação não pode mais reduzir a condição humana à racionalidade instrumental, que suprime o direito fundamental de o sujeito agir em sua própria história. Segundo Mantoan (2015), a inclusão é sistema aberto, que intenciona fazer uma educação plural, democrática e transgressora. O ensino mecanizado, fundamentado na padronização, na objetividade, que atende à lógica neoliberal não serve mais às novas concepções sociais, pois nega a educação como processo relacional e dialógico. “As ações educativas têm como eixos o convívio com a diferença e a aprendizagem como experiência relacional, participativa, que produz sentido para o aluno, pois contempla a sua subjetividade” (Mantoan, 2015, p.35).
Numa perspectiva crítica e libertadora, não se fala em inclusão escolar se não for pela ótica da democracia e do direito social. Essa ótica requer a ruptura com padrões sociais excludentes estabelecidos culturalmente. O paradigma da inclusão visa o desenvolvimento humano preconizado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) e a construção de uma humanidade pacífica e múltipla que leve à superação de toda desigualdade e de toda injustiça social para se atuar politicamente de forma cidadã e crítica. A inclusão de alunos com deficiência, nas escolas comuns, se constitui, no Brasil, em um movimento ético sustentado pela assunção da Educação como um direito público e subjetivo.
A democratização da educação se efetiva com a Constituição Federal Brasileira de 1988 (Brasil, 1988) que deu ênfase nos processos democráticos e trouxe a educação como direito fundamental social, pois passa a instituir como princípio do ensino o binômio acesso e permanência na rede regular de ensino. Assim, os alunos com deficiência deixam de ser atendidos exclusivamente pelas instituições assistencialistas e filantrópicas e passam a adentrar a escola comum. A partir da Constituição Federal (Brasil, 1988), o Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 1990), a Declaração de Salamanca (Brasil, 1994), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Brasil, 1996), entre outros, também passaram a assegurar em seus textos que “todos possuem direito à educação”, baseada na inclusão e equidade social, com igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.
A Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008) instaura um novo marco teórico e organizacional na educação brasileira e traz a inclusão escolar como um imperativo do Estado. Assim, a escola comum passa a ser o lócus da escolarização de todos os alunos (Brasil, 1996). No âmbito do Distrito Federal, a Orientação Pedagógica para a Educação Especial (Distrito Federal, 2010) preconiza que o pressuposto básico da Educação Especial no DF é o acesso do estudante com deficiência a uma educação de qualidade, preferencialmente em escolas comuns e inclusivas. A escola comum é um ambiente que se propõe acolhedor da diversidade humana e que respeita as diferenças entre si (Deleuze, 2009).
Nos últimos anos, tem-se observado um crescimento expressivo na presença de alunos com deficiência incluídos em classes comuns das escolas regulares nas escolas do Distrito Federal. Segundo o Painel de Indicadores do Instituto Rodrigo Mendes (2024), em 10 anos, de 2013 a 2023, o índice de matrículas do público-alvo da educação especial em classes comuns subiu de 74,3% para 93,5%. Esse aumento está relacionado tanto ao fortalecimento das normativas que asseguram a inclusão quanto à maior conscientização das famílias sobre seus direitos educacionais.
Esse contexto impõe desafios ao sistema de ensino, que precisa desenvolver estratégias eficazes para garantir a participação e a aprendizagem desses estudantes de maneira equitativa e acessível. No entanto, essa inclusão tem gerado desassossegos entre os professores, uma vez que nem sempre conseguem atender às demandas de todos os alunos de forma inclusiva, respeitando as diferenças individuais de todos os alunos.
Moreira (2019) compactua desse desassossego quando diz:
“É inimaginável a realidade de uma sala cheia, com diversas demandas simultâneas e um estudante incluído que necessite de suporte constante com apenas um único profissional em sala para atender a todas as solicitações. Não é possível atender a todas as demandas, essa questão precisa ser encarada como política de educação e não como boa vontade. ”
Dito isso, a cultura escolar precisa ser pensada dentro da política da inclusão, envolvendo todos os atores e legitimando a participação de quem foi historicamente segregado. O caminho está posto pela legislação vigente, o desafio é comprometer-se em implementá-lo. Garantir um sistema educacional inclusivo é uma reparação histórica e um modo de construirmos outra escola e outra sociedade possíveis – com justiça. Pretende-se superar a dicotomização da educação especial x escola comum, pensando o estudante em sua totalidade, inserido no lócus social.
Essa concepção de educação inclusiva ancora-se nos princípios da Pedagogia Crítica, defendida Paulo Freire (1987), Saviani (2011) e Henry Giroux (2016), cuja abordagem educacional enfatiza a análise crítica das estruturas sociais e culturais que perpetuam a desigualdade e a exclusão na educação e busca capacitar os alunos a compreenderem criticamente o mundo ao seu redor e a se tornarem agentes de mudança social.
Partindo desse pressuposto, Boaventura de Sousa Santos (2006) enfatiza que a inclusão efetiva desses alunos requer uma transformação profunda nos sistemas educacionais, bem como nas atitudes e práticas sociais. Ele ressalta a necessidade de promover uma cultura escolar que valorize a diversidade e que reconheça o potencial de cada aluno, respeitando suas singularidades e necessidades individuais. Nesse contexto, a inclusão de alunos com deficiência é vista como um imperativo ético e político. Especificamente, a Pedagogia Crítica enfatiza que a inclusão não se trata apenas de colocar fisicamente os alunos com deficiência na mesma sala de aula que os demais, mas sim de criar condições efetivas para que esses alunos tenham acesso pleno ao currículo, às interações sociais e aos recursos educacionais. É preciso garantir que ele seja incluído e tenha sua acessibilidade pedagógica respeitada, enquanto caminho que viabiliza a sua plena participação, acesso e aprendizagem.
A inclusão, idealmente, orienta a adaptação do sistema educacional às necessidades e potencialidades dos alunos, proporcionando a eles situações de aprendizagens significativas. É processo que deve ser alicerçado nas dimensões do ser, do fazer, do conhecer e do conviver (Delors, 1998), considerando o estudante com deficiência um sujeito pleno e historicamente situado (Vygotsky, 2001).
Para atender às demandas dos estudantes com deficiência que chegam à classe comum, surge um novo personagem na tentativa de facilitar o processo de inclusão dos alunos nas turmas heterogêneas da escola regular: o profissional de apoio. Segundo Silva (2018), a atuação do profissional de apoio traz repercussão na efetivação do direito à educação dos estudantes com deficiência. Corroboram com essa ideia, as autoras Prause e Szymanski (2019) que defendem que a presença deste profissional provoca interações que favorecem a aprendizagem dos estudantes com deficiência.
3. TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL DE VYGOTSKY E A PEDAGOCIA CRÍTICA SEGUNDO PAULO FREIRE
Um dos pilares da teoria de Vygotsky (2001) é a ênfase na interação social: nem o indivíduo, nem o contexto, mas a interação entre eles. É na interação que se dá o desenvolvimento dos processos mentais superiores2 e a aprendizagem acontece pela mediação de outros sujeitos, numa experiência social. Para ele, desenvolvimento cognitivo é a conversão de relações sociais em relações mentais. A mediação, como conceito, surgiu no começo do século XX, com o psicólogo Vygotsky, na elaboração de sua Teoria Histórico-Cultural, sendo retomada no início do século XXI para referenciar o profissional que auxilia o processo de inclusão educativa dos estudantes com deficiência nas escolas regulares. É pela mediação que se dá a internalização de construções sócio-históricas e culturais e, através da interação social, o sujeito se desenvolve cognitivamente. Dessa maneira, a aprendizagem evolui do plano social para o individual, pois, segundo o autor, todas as funções mentais superiores se originam como relações entre os seres humanos.
A escola assume o papel de instância mediadora entre sujeito e sociedade. Sob essa perspectiva, a inclusão escolar possui um caráter sócio interacionista. Os estudantes com deficiência participam ativamente dessa teia pedagógica para que todos os envolvidos se beneficiem dessas experiências diversas, plurais, e, assim, todo o aluno, independentemente de ter ou não deficiência, é visto e respeitado enquanto sujeito socialmente inserido num meio historicamente constituído. A pessoa com deficiência se vê parte constituída e constituinte dessas construções sociais. Educar é um processo em que a criança ou o adulto convive com o outro e, ao conviver com o outro, transforma-se espontaneamente, de maneira que seu modo de vida se faz progressivamente mais congruente com o do outro no espaço de convivência”. (Maturana, 1999, p. 29)
A escola, numa perspectiva inclusiva, se envolve com o processo de escolarização do aluno, num trabalho colaborativo entre os diversos atores do contexto escolar. Ribeiro (2020) afirma que “é necessária uma prática coletiva, dialógica e disponível”. O compromisso com a inclusão dos estudantes com deficiência não pode ser delegado exclusivamente ao professor. Essa tessitura pedagógica da inclusão é (ou deveria ser) imperativo de todos. A saber, Zerbato e Mendes (2018) ratificam:
“Entretanto, sabe-se que a criação de um ambiente verdadeiramente inclusivo exige muito mais e não depende exclusivamente das ações dos professores de ensino comum dentro da sala de aula. Uma escola inclusiva requer, entre vários aspectos, a construção de uma cultura colaborativa que vise a parceria com professores de Educação Especial e profissionais especializados, a fim de elaborar e implementar práticas pedagógicas inclusivas.”
Os autores Cubero e Luque (2004) defendem que construir conhecimento é ação partilhada, num processo de mediação entre sujeitos. É na relação com o outro que o indivíduo internaliza o conhecimento. A internalização, ou seja, a transição de uma atividade social, externa, interpsicológica, para uma operação individual, interna, intrapsicológica decorre de uma interação ativa entre os participantes do processo. Por isso, em sua teoria é relevante o papel do mediador3 que serve como intermediário do conhecimento e responsável pela estimulação cognitiva no desenvolvimento humano dos estudantes. (Vygotsky, 2001).
Vygotsky (2001) enfatizou que a aprendizagem é vista como uma construção compartilhada, em um processo social no qual a interação com outros indivíduos é condição indispensável à aprendizagem. Dessa forma, a mediação desempenha um papel ativo na promoção da aprendizagem, possibilitando a elaboração de estratégias, e fornecendo suporte e orientação para que o estudante transite da zona de desenvolvimento proximal para a zona de desenvolvimento real4. Como afirmam Marques e Marques (2006), a aprendizagem, dentro dessa concepção relacional, “implica uma dialética interação-em-colaboração”, na qual uma zona de desenvolvimento proximal pode ser estabelecida.
“Sem interação social, ou sem intercâmbio de significados, dentro da zona de desenvolvimento proximal do aprendiz, não há ensino, não há aprendizagem e não há desenvolvimento cognitivo. Interação e intercâmbio implicam, necessariamente, que todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem devam falar e tenham oportunidade de falar” (Moreira, 1995).
Ainda, sobre o processo de mediação, Tébar (2011) destaca que esta deve ser compreendida como uma posição humanizadora e potencializadora da relação educativa. Nessa perspectiva, a mediação pedagógica, para Vygotsky (2001), é um processo relacional, que ocorre num contexto social e cultural e favorece aprendizagens, que, consequentemente, impulsionam o desenvolvimento do estudante. Freire (1987) também compartilha a ideia de que a ação pedagógica deve ser dialógica, estruturada na interação colaborativa entre os sujeitos. Para ele, a educação deve acontecer numa relação horizontal entre os sujeitos envolvidos na ação, de forma a livrar-se da opressão e promover a inclusão, uma vez que a exclusão social constitui uma forma de opressão. Como afirma: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo” (Freire, 1987). Tanto Freire quanto Vygotsky compreendem o indivíduo como sujeito histórico e cultural, cuja aprendizagem se dá em interação com o outro.
Segundo Biesta (2012), a educação, tendo em vista o desenvolvimento das competências interpessoais e sociais, não é atividade neutra, mas é ato relacional, que considera a experiência subjetiva do estudante. A mediação, como prática escolar inclusiva, perpassa diferentes aspectos constituintes do ato educativo, sejam eles no campo pedagógico, no campo do cuidado ou no campo relacional (Machado, 2022) e se tece no encontro com a singularidade de cada sujeito (Kaufman; Tabak, 2016).
Aqui cabe trazer a contribuição de Galeffi (2020): a prática educativa deve favorecer a formação de um sujeito transdisciplinar, capaz de responder aos desafios complexos da vida contemporânea. Para o autor, educar transdisciplinar significa romper com paradigmas reducionistas e adotar abordagens dialógicas e multirreferenciais. Corroborando, ainda, com as ideias expostas, a formação do sujeito transdisciplinar acontece nas relações horizontais e dialógicas em que os sujeitos são aprendentes, igualmente constituídos e o método transdisciplinar se dá de forma coletiva e emancipatória.
Retomando, a mediação pedagógica de Vygotsky, com ênfase na interação social e na cultura, complementa os princípios da Pedagogia Crítica, fornecendo uma base teórica sólida para uma prática educativa que visa à transformação social, a valorização da diversidade cultural e à promoção da justiça educacional. Segundo Barbosa (2018), tanto Vygotsky quanto Saviani ressaltam que a escola deve olhar as capacidades presentes em cada indivíduo, buscando despertar o potencial do desenvolvimento e a capacidade de aprendizagem.
“Para tanto, é necessário traçar estratégias na prática pedagógica como procedimento de educação, removendo barreiras para a aprendizagem, bem como contribuindo para melhorias na qualidade de ensino dos alunos com Transtorno do espectro autista e da turma em geral, já que estas estratégias, se devidamente gerenciadas em um processo que venha a convergir para a melhoria da educação como um todo, tende a elevar a condição educacional do grupo envolvido” (Brasil, 2023).
Segundo escreveu Alexandre (2020), é nesse sentido que a pedagogia crítica e a psicologia histórico-cultural irão se aproximar e contribuir, uma com a outra, para a educação escolar das pessoas com e sem deficiência. A educação é entendida como mediação no seio da prática social global. A prática social põe-se, portanto, como o ponto de partida e o ponto de chegada da prática educativa. Para Saviani, o trabalho educativo deve ser compreendido enquanto, “ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (Saviani, 2008, p.13 apud Alexandre, 2020).
Padilha e Silva (2020) constataram que boa parte dos alunos com deficiência inseridos na sala de aula comum da escola regular não recebem suporte adequado à escolarização, caracterizando o fenômeno que Kuenzer (2005) intitulou de “inclusão-excludente” para se referir à lógica perversa que se esconde nas políticas de universalização da Educação Básica. Pinheiro (2020) diz que a escola é espaço acessível para a manifestação da diversidade e, que, portanto, precisa estar ancorada no princípio inclusivo que assegure o compromisso com o reconhecimento, a possibilidade e o direito de todos os sujeitos. O movimento da inclusão, em sua essência, busca assegurar uma educação para todos, considerando que o acesso à educação é um direito constitucional tanto do aluno com deficiência quanto de todos os cidadãos.
A discussão sobre pedagogia crítica e inclusão escolar traz à tona a importância de superarmos a concepção médica da deficiência como lesão ou impedimento físico e caminharmos em direção a uma concepção social da deficiência, reconhecendo a deficiência como identidade e parte constitutiva dos sujeitos. Nessa abordagem, os contextos e tramas sociais pouco sensíveis à diversidade humana são os responsáveis pela exclusão social de pessoas com deficiência. Adotar essa concepção social de deficiência implica considerar as particularidades dos alunos, além de promover mudanças estruturais nos sistemas de ensino, exigindo a desconstrução de concepções e práticas cristalizadas no âmbito escolar. Nesse sentido, a Teoria da Desconstrução de Derrida, citada por Silva (2019), propõe uma educação que não seja endereçada ao outro tematizado e circunscrito como “sendo deficiente”, mas sim Outro que é différance – Educação que oferece hospitalidade incondicional ao Outro, não o moldando em nossa estrutura de formação e de escola, mas acolhe-o para além das “deficiências” (Silva, 2019).
4. CONTRIBUIÇÕES DE BIESTA, GIROUX, SÍVERES E BUBER, A PEDAGOGIA CRÍTICA E A INCLUSÃO ESCOLAR: O QUE ELES TÊM EM COMUM?
As contribuições de Biesta, Giroux, Síveres, Buber, os pressupostos da Pedagogia Crítica e a Inclusão Escolar estão interligados na busca por uma educação que vá além da simples transmissão de conteúdo. Todos compartilham a ideia de que a educação deve ser um espaço de transformação social, reflexão crítica e inclusão, visando à formação de sujeitos autônomos, críticos e participantes de uma sociedade mais justa e democrática. No contexto da inclusão escolar, as ideias de Biesta, Giroux, Síveres e Buber convergem para a necessidade de uma escola acolhedora, dialógica e que valorize as diferenças como parte fundamental do processo educativo.
Segundo Biesta (2012), o conceito de educação, como prática social, não é atividade neutra e sempre implica relação, portanto não há educação sem envolvimento da subjetividade dos sujeitos. Mais uma vez, o conceito de relação aparece como mola precursora do processo educativo. Segundo o autor, a ênfase que se tem dado à aprendizagem prejudica sobremaneira o processo educativo inclusivo, indo quase que na contramão. Essa mudança paradigmática de educação, enquanto processo de libertação e emancipação, para aprendizagem, enquanto condição de perfeição individual, tira a atenção da importância das relações nos processos e práticas educativas e desconsidera a multidimensionalidade do processo educativo, bem como suas finalidades (Biesta, 2019). A crítica à instrumentalização da educação está presente nas ideias do autor e coadunam-se com os princípios da Pedagogia Crítica.
Biesta (2012) argumenta que a educação não deve se limitar à aquisição de habilidades e competências, mas também promover a subjetivação, ou seja, permitir que os estudantes se tornem agentes ativos na sociedade. Esse conceito dialoga diretamente com a inclusão escolar, pois implica garantir condições para que todos os sujeitos, independentemente de suas particularidades, possam participar ativamente do processo educativo.
Considerar a unicidade do sujeito em direção a uma existência plural e interdependente é um ponto convergente entre as ideias de Biesta e da Pedagogia Crítica (Guilherme e De Freitas, 2017). Aqui o professor também atua como protagonista do processo, pautado por intencionalidade pedagógica que lhe cabe. Tanto Giroux quanto Biesta valorizam o papel do professor como um intelectual transformador que não apenas transmite conhecimento, mas também estimula o pensamento crítico, promove a reflexão e desafia as normas estabelecidas. Biesta e os defensores da pedagogia criticam a ênfase excessiva na padronização e na homogeneização da educação, que tende a desconsiderar as necessidades individuais dos alunos e a restringir sua liberdade e criatividade. Defendem uma abordagem mais plural e diversificada da educação, que reconheça e valorize a singularidade de cada aluno.
As ideias de Giroux (1997), um dos principais expoentes da Pedagogia Crítica, alinham-se com os conceitos desenvolvidos por Paulo Freire (Silva e Campos, 2021). Giroux crítica a racionalidade técnica presente nas políticas educacionais neoliberais que frequentemente reduzem a educação a um mecanismo de reprodução das desigualdades sociais e defende uma escola comprometida com a justiça social. O autor acredita que as escolas e o ensino não devem ser vistos apenas como algo instrucional, porque a racionalidade burocrática negligencia o social, o histórico, o ético e o conhecimento. Giroux (2016) e Freire defendem que a educação é instrumento de transformação social, capaz de promover a igualdade de oportunidades, o respeito pela diversidade e a dignidade humana.
Giroux argumenta que a inclusão de alunos com deficiência na escola comum é essencial para promover a justiça social e a democracia dentro do sistema educacional. Ele acredita que a exclusão desses alunos das escolas regulares perpetua formas de discriminação e desigualdade que são inaceitáveis em uma sociedade democrática, tal qual defende Freire. No contexto da inclusão escolar, essa abordagem implica criar condições para que os estudantes com deficiência tenham acesso não apenas à escolarização, mas a uma educação de qualidade que reconheça e valorize a diversidade dos alunos. O autor argumenta que a inclusão não se trata apenas de integrar esses alunos às salas de aula regulares, mas também de criar ambientes educacionais que atendam às suas necessidades individuais e promovam sua participação plena e igualitária. A inclusão, nesse sentido, é entendida como um processo de superação das barreiras educacionais e sociais.
Giroux (1997) reforça a ideia de que a educação é um ato político e que os professores devem assumir o papel de intelectuais transformadores. Sob tal perspectiva, Giroux e Freire acreditam que uma das tarefas fundamentais dos educadores – sob a lógica da pedagogia crítica – é promover a reflexão crítica sobre as desigualdades sociais e culturais, permitindo que os estudantes questionem, reflitam e atuem sobre essas questões, contribuindo com a construção de um mundo socialmente justo.
Síveres (2015), com a Pedagogia da Presença, dá continuidade às reflexões sobre a educação inclusiva ao enfatizar a necessidade de uma prática pedagógica libertadora, inspirada em Paulo Freire. A Pedagogia da Presença articula aspectos constitutivos nas dimensões antropológica (ser), epistemológica (saber) e pedagógica (agir). Desse modo, a escolarização é tida como processo lógico, intelectual, afetivo e social e mantém como fio condutor a noção de encontro (energia dialogal) como relação entre os sujeitos, como integração dos saberes e como interação numa ação reflexiva. Para ele, a inclusão escolar não deve ser apenas um processo burocrático ou normativo, mas sim efetivo, assegurando que todos os estudantes tenham acesso ao conhecimento e possam interagir em condições de equidade. Sua perspectiva pedagógica propõe que a escola deve ser um espaço de acolhimento e valorização da diversidade, criando um ambiente no qual todos os estudantes, independentemente de suas características individuais, possam se desenvolver de maneira equitativa, permitindo que se sintam pertencentes ao ambiente escolar.
E ainda, Buber (2001), filósofo do diálogo, também oferece contribuições valiosas para o debate sobre a educação inclusiva, especialmente por meio de sua teoria do “Eu-Tu”. O autor traz que “a vida humana é encontro, é relação”. Pena (2019), parafraseando Buber, diz que a essência de toda atividade educativa está na busca pela formação humana e que todo ato educativo é um ato de inclusão, que requer uma interação dialógica, na práxis cotidiana; é uma experiência que provoca o encontro da pessoa consigo mesma e com os outros, cada um com os seus sentimentos, num ato de reciprocidade.
Buber sublinha a importância das relações interpessoais no processo educativo, destacando o valor da experiência do outro e a construção do conhecimento em um ambiente de diálogo e reciprocidade. No contexto da inclusão escolar, essa abordagem enfatiza a necessidade de uma educação que reconheça e valorize a diversidade, promova o respeito às diferenças e fomente interações genuínas entre todos os sujeitos. Para Buber, a educação inclusiva é uma educação humanizadora, que respeita a individualidade de cada aluno e cria um ambiente de acolhimento e pertencimento, promovendo uma educação baseada no respeito e na ética.
Em comum, as contribuições de Biesta, Giroux, Síveres e Buber destacam-se pela valorização da diversidade e da inclusão. A educação, para esses autores, deve ser um espaço onde as diferenças são respeitadas e todos os alunos, independentemente de suas características, são considerados sujeitos ativos do processo de aprendizagem. Além disso, todos defendem uma educação transformadora, que vai além da mera reprodução de saberes e se compromete com a promoção da justiça social. A reflexão crítica sobre as estruturas de poder, desigualdade e exclusão presentes na sociedade é uma constante na obra desses autores, que veem a educação como um meio para questionar e subverter as barreiras sociais. Por fim, a pedagogia crítica e inclusiva proposta por esses pensadores privilegia o respeito mútuo, o reconhecimento do outro e a construção do conhecimento por meio do diálogo e da interação.
No âmbito da inclusão escolar, essas ideias sustentam que a educação deve ser um espaço de acolhimento, respeito às diversidades e promoção de uma participação ativa e crítica de todos os alunos. Assim, os princípios da Pedagogia Crítica e da inclusão escolar se entrelaçam, propondo uma abordagem educacional que não apenas integra, mas também valoriza e potencializa as diferenças, criando um ambiente de aprendizagem mais justo e democrático.
5. DEVANEIOS PEDAGÓGICOS…
“Tudo o que a gente puder fazer no sentido de convocar os que vivem em torno da escola, e dentro da escola, no sentido de participarem, de tomarem um pouco o destino da escola na mão, também. Tudo o que a gente puder fazer nesse sentido é pouco ainda, considerando o trabalho imenso que se põe diante de nós que é o de assumir este país democraticamente […].
Paulo Freire
Concluindo, a educação, que é prática de liberdade e emancipação, o estudante se percebe um sujeito histórico e plural e aprende a conviver com outros sujeitos individuais e coletivos. À escola, cabe garantir as condições para que seja possível uma convivência cooperativa, democrática e solidária. Reflexionando sobre a minha prática docente, enquanto professora de educação especial, que se propõe inclusiva, trago as seguintes contribuições dos autores: de Vygotsky, me vejo mediadora do processo e incentivo os pares a também desempenharem esse papel; de Freire, enquanto educação que liberta, que ensina a pensar, problematizo as experiências em sala de aula, a partir de uma relação dialógica entre os atores do contexto escolar; já de Biesta, esforço-me para não privilegiar a qualificação em detrimento das dimensões de socialização e subjetivação. Essa proposta só se faz possível num constante movimento dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer (reflexão crítica sobre a prática).
A contribuição de Galeffi está na formação do sujeito transdisciplinar que se mostra como desafio diário, para que seja possível articular os âmbitos ontológico, epistemológico, metodológico e tecnológico do sujeito. De Síveres, a presença, que se faz no encontro é fio condutor de uma aprendizagem significativa que considera o sujeito nas dimensões antropológica (ser), epistemológica (saber) e pedagógica (agir). De Buber, “o essencial é vivido na presença” (Buber, 2001, p.13). Da Pedagogia histórico-crítica e de Giroux vem a intenção de promover uma educação que valorize a diversidade e promova o respeito e a igualdade de direitos para todos, como uma força enriquecedora para a aprendizagem de todos os estudantes, segundo a qual o aluno com deficiência é visto além da sua deficiência, visto com o direito de ser diferente.
Os autores supracitados todos, sem exceção, independentemente de serem defensores expressos de uma concepção crítica de educação, têm a mesma essência nas discussões a respeito da educação especial na perspectiva inclusiva. As ideias desses teóricos convergem em torno da promoção de uma educação inclusiva, democrática e crítica, que valorize a diversidade, promova o empoderamento dos alunos e trabalhe pela construção de uma sociedade mais justa e igualitária. A valorização da diversidade como forma de ser que celebra as identidades e pluralidade dos sujeitos é a ideia central dessa discussão. Eles defendem uma educação que não apenas transmita conhecimentos, mas também capacite os alunos a agir como agentes de mudança social e a trabalhar pela justiça e pela igualdade. Outro aspecto comum entre os autores é o fato de considerarem dialógico o ato educativo.
Concluindo, é preciso transformar a prática educativa propriamente dita por uma práxis que atenda e acolha a diversidade humana que compõe o campo educativo. A proposição de uma práxis comprometida com a educação para todos, de todos, com todos se faz urgente.
1Trabalho Final da Disciplina Actores Sociales y el Contexto Educativo, do Programa de Maestría en Educación da Facultad de Ciencias de la Educación da Universidad de la Empresa (UDE), sob a docência da Professora Dra. Ana Casnati Guberna.
2As Funções Mentais Superiores (FMS), segundo Vygotsky (2001), são habilidades mentais mais complexas que se desenvolvem através da interação social e da mediação cultural. Não são inatas, mas emergem e se aprimoram com a experiência e a interação com o ambiente. Incluem pensamento, linguagem, comportamento volitivo, memória, atenção, entre outras.
3Vygotsky (2001) não usa explicitamente o termo mediador da maneira que pode ser encontrado em discussões mais contemporâneas da teoria. No entanto, o conceito de mediação é implícito nas suas discussões.
4A Zona de Desenvolvimento Proximal é descrita como a distância entre o nível de desenvolvimento real, determinado pela capacidade de resolver tarefas de forma independente, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado por desempenhos possíveis, capaz de atingir com a ajuda de um mediador.
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