CHALLENGES AND PERSPECTIVES TOWARDS THE VALUATION OF BLACK PEOPLE IN TEACHING HISTORY IN THE INITIAL GRADES OF ELEMENTARY EDUCATION
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202502281458
Eliel Pompeu Rodrigues1,
Orientadora: Jaqueline Mendes Bastos2
RESUMO
Este artigo investigou a aplicação da Lei 10.639/2003, que institui a obrigatoriedade da temática afro-brasileira no currículo escolar. Nosso foco de análise foi a Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Terezinha, em Cametá, Pará. A pesquisa, de cunho qualitativo e etnográfico, utilizou entrevistas semiestruturadas com cinco professores e análise documental para coletar dados. Realizada em 2013, como requisito final de avaliação em forma de monografia no curso de Especialização em História Afro-Brasileira e Indígena da Universidade Federal do Pará (UFPA), Campus Universitário do Tocantins/Cametá. Os resultados indicam que a escola enfrenta desafios na implementação da Lei 10.639/2003, como falta de formação docente, carência de materiais didáticos específicos e resistência cultural. Apesar disso, destacam-se perspectivas positivas: professores engajados, parcerias com instituições externas e crescente conscientização sobre a representatividade negra na educação.
Palavras-chave: Ensino; Cultura afro-brasileira; Racismo.
ABSTRACT
This article investigated the application of Law 10.639/2003, which establishes the mandatory inclusion of Afro-Brazilian themes in the school curriculum. Our focus of analysis was the Santa Terezinha Municipal Elementary School, in Cametá, Pará. The qualitative and ethnographic research used semi-structured interviews with five teachers and document analysis to collect data. It was conducted in 2013 as a final assessment requirement in the form of a monograph in the Specialization Course in Afro-Brazilian and Indigenous History at the Federal University of Pará (UFPA), Campus Universitário do Tocantins/Cametá. The results indicate that the school faces challenges in implementing Law 10.639/2003, such as lack of teacher training, lack of specific teaching materials, and cultural resistance. Despite this, positive perspectives stand out: engaged teachers, partnerships with external institutions, and growing awareness of black representation in education.
Keywords: Education; Afro-Brazilian culture; Racism.
RESUMEN
Este artículo investigó la aplicación de la Ley 10.639/2003, que establece la inclusión obligatoria de temas afrobrasileños en el currículo escolar. Nuestro foco de análisis fue la Escuela Municipal de Enseñanza Primaria Santa Terezinha, en Cametá, Pará. La investigación, de naturaleza cualitativa y etnográfica, utilizó entrevistas semiestructuradas con cinco docentes y análisis documental para recolectar datos. Realizado en 2013, como requisito de evaluación final en forma de monografía en el curso de Especialización en Historia Afrobrasileña e Indígena de la Universidad Federal de Pará (UFPA), Campus Universitario Tocantins/Cametá. Los resultados indican que la escuela enfrenta desafíos en la implementación de la Ley 10.639/2003, como falta de formación docente, falta de material didáctico específico y resistencia cultural. A pesar de ello, destacan perspectivas positivas: profesores comprometidos, alianzas con instituciones externas y una creciente conciencia de la representación negra en la educación.
Palabras clave: Enseñanza; cultura afrobrasileña; Racismo.
1 INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como tema “Desafios e Perspectivas em Direção à Valorização do Negro no Ensino de História nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental – Lei 10.639/2003: Um Estudo da Realidade Educativa da Escola Municipal De Ensino Fundamental Santa Terezinha, na Cidade de Cametá/PA”. Teve como objetivo analisar a aplicabilidade da referida lei no currículo escolar dessa instituição.
Sancionada pelo então Presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 9 de janeiro de 2003, a Lei 10.639/2003 (Brasil, 2003) altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabelecendo diretrizes para a educação das relações étnico-raciais e para o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana. A regulamentação ocorreu através do Parecer CNE /CP n° 003/2004 (Brasil, 2004), determinando a inclusão obrigatória dessas temáticas no currículo oficial das escolas.
Para a implementação pedagógica da Lei 10.639/2003, foi lançado, em 13 de maio de 2009, o Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (Ministério da Educação, 2013), tornando-se uma política educacional em todas as esferas do poder público. Dessa forma, a lei tornou obrigatório o ensino da cultura africana e afro-brasileira nas escolas.
Ademais, Munanga K (2005) destaca que o resgate da memória coletiva e da história da comunidade negra é relevante não apenas para alunos de ascendência negra, mas também para aqueles de outras etnias, especialmente brancos. Isso ocorre porque preconceitos afetam a formação psíquica de todos os jovens. A memória histórica da comunidade negra pertence a toda a sociedade, uma vez que a cultura brasileira é moldada pelas contribuições de diversos grupos étnicos, mesmo em condições desiguais. Assim, reconhecer e valorizar essa história é uma responsabilidade compartilhada, que enriquece o entendimento cultural e promove uma sociedade mais justa e inclusiva.
Considerando isso, propomo-nos, por meio deste estudo, realizado em 2013 quando a Lei completou dez anos: conhecer, naquele momento, como a EMEF Santa Terezinha organizava seu currículo para incorporar a cultura afro-brasileira em sua prática pedagógica; averiguar a introdução dos princípios defendidos pela lei no Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola; identificar os impactos da lei no cotidiano escolar, especialmente no processo ensino-aprendizagem; e desvelar a relação entre a prática docente e os desafios de trabalhar a cultura afro-brasileira como forma de vencer o racismo, a discriminação e o preconceito.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA OU REVISÃO DA LITERATURA
2.1 LEGISLAÇÕES CONTEXTUAIS ANTERIORES À LEI 10.639/2003
A luta contra a discriminação racial no Brasil possui uma longa trajetória histórica. Antes da promulgação da Lei 10.639/2003, várias legislações e movimentos sociais ajudaram a abrir caminho para a igualdade racial e a valorização da cultura afro-brasileira. Desde a criação da Carta das Nações Unidas em 1945 até a promulgação da Constituição Federal Brasileira em 1988, passando por leis como a Lei Afonso Arinos de 1951 e a Lei Caó de 1989, essas normas refletem um esforço constante no combate ao racismo e na promoção de direitos iguais. A seguir, apresentamos um resumo dessas legislações:
– 1945: Reconhecimento dos direitos do povo negro pela Organização das Nações Unidas (ONU). De acordo com Goes (2013):
O principal instrumento internacional com este objetivo foi a Carta das Nações Unidas (ONU, 1945). No preâmbulo, a carta foi sensível aos direitos humanos quando reafirma a igualdade entre homens e mulheres e a prática da tolerância. O segundo instrumento com caráter geral relacionado à temática dos direitos humanos foi a Declaração Universal de Direitos Humanos (ONU, 1948), que confirmou o princípio da igualdade estabelecido na carta. No Artigo 2º da declaração, defendem-se o direito e as liberdades sem qualquer discriminação (GOES FL e SILVA TD, 2013, p.10).
– 1948: Lançamento da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
– 1951: Aprovação da Lei Afonso Arinos no Brasil, que combate o racismo e considera a discriminação racial uma contraversão penal. A referida lei surgiu de uma necessidade político-social de apaziguamento das relações inter-raciais e de manutenção de uma imagem positiva do Brasil perante a comunidade internacional e, nesse sentido, ela desempenhou um papel de legislação simbólica (CAMPOS WO, 2015).
– 1988: Promulgação da Constituição Federal Brasileira (BRASIL, 1988):
i. Art. 3º, inciso IV: Garante a promoção de todos os cidadãos sem discriminação.
ii. Art. 5º, inciso 42: Define o racismo como crime inafiançável e imprescritível.
iii. Art. 215, § 1º: Protege as manifestações culturais.
– 1989: Publicação da Lei nº 7.716/1989 (Lei Caó), que define crimes decorrentes de discriminação por raça ou cor.
– 1996: Decreto 1.904, que assegura a presença histórica das lutas dos negros na constituição do país.
– 1999: Regulamentação da Lei 7.716 sobre crimes de preconceito de raça e cor, estabelecendo penas para atos discriminatórios.
– Anos 1989-1996: Vários municípios criam leis específicas para combater a discriminação racial, como exemplos: Salvador, Belo Horizonte, Porto Alegre.
– 1997: O Ministério da Educação-MEC disponibiliza os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) com a temática de Pluralidade Cultural, mas sem força obrigatória nas escolas (BONAMINO A e MARTÍNEZ SA, 2002).
– Movimentos Sociais: As lutas dos movimentos sociais, especialmente dos movimentos negros brasileiros – Movimento Negro Unificado (MNU), a Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN), a União de Negros pela Igualdade (UNEGRO), os Agentes de Pastoral Negros (APN’s), O Fórum Nacional de Entidades Negras, o Fórum de Mulheres Negras, as Comunidades Rurais Negras, o Geledés, o Criola, entre outros (ARAUJO LF, 2021), são fundamentais para implementar uma educação que valorize a história e a cultura do povo negro.
3 METODOLOGIA
Trata-se de um estudo descritivo-exploratório, com abordagem qualitativa focado na observação, no registro e na análise das interações reais entre pessoas e sistemas. Na pesquisa qualitativa, o estudo exploratório busca compreender um fenômeno em sua manifestação natural dentro do seu ambiente. Nas Ciências Humanas e Sociais, essa abordagem oferece um caminho para um entendimento mais profundo das ações humanas e do ambiente social no qual ocorrem (LÖSCH S, et al., 2023).
Além disso, buscou-se apreender o cerne do objeto do estudo, possibilitando ao pesquisador observar e examinar o desenrolar das situações em seu contexto natural. Isso se alinha à perspectiva de Cardoso MB, et al. (2021), ao sustentar que a pesquisa qualitativa se fundamenta no entendimento de que a realidade é construída através das interações com o meio e pelas complexas teias das relações humanas e sociais.
A pesquisa de campo foi realizada na Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Terezinha, onde se buscou identificar o impacto da Lei 10.639/2003 nas relações cotidianas da escola. Essa instituição de grande porte pertence à Secretaria Municipal de Educação (SEMED), localizada no município de Cametá, norte do Brasil. Os sujeitos da pesquisa incluíram cinco professores, os quais foram submetidos a entrevista semiestruturada como técnica de coleta de dados, processo que permitiu um diálogo aberto entre pesquisador e entrevistados.
A entrevista semiestruturada é uma abordagem de coleta de dados qualitativos que se distingue pela sua adaptabilidade, reunindo aspectos tanto estruturados quanto não estruturados. Em essência, o entrevistador conta com um conjunto de perguntas estabelecidas previamente, ao mesmo tempo em que o entrevistador pode aprofundar-se em outros assuntos que possam emergir durante o diálogo. De acordo com Lakatos EM e Marconi MM (2010), trata-se de uma conversa realizada “cara a cara”, de forma sistemática, que fornece ao entrevistador as informações necessárias, permitindo assim uma abordagem mais flexível das questões.
Além da entrevista, foi realizada uma análise crítica dos documentos escolares relacionados à Lei 10.639/2003. Os dados coletados foram analisados criticamente, relacionando a teoria com os professores entrevistados. Os métodos de investigação proporcionaram clareza e compreensão dos pontos de vista coletivo e individual dos informantes sobre as ações pedagógicas na EMEF Santa Terezinha.
Assim, esta pesquisa surge de uma prática educacional antirracista, problematizando a prática pedagógica-curricular dos professores da periferia cametaense e a aplicação da Lei 10.639/2003. A história oficial do Brasil e do Pará revela a influência africana em nossa cultura, especialmente devido ao período colonial e à escravidão. No Pará, a importação de escravos africanos foi uma solução para a mão-de-obra, devido à defesa dos indígenas pelos missionários. A exploração dos negros nas lavouras e engenhos perpetuou a ideologia racista, justificando a superexploração e marginalização dos afrodescendentes (GÓES WL, 2018).
A Lei 10.639/2003, apesar de sua promulgação há mais de duas décadas, ainda enfrenta desafios na formação de professores e na aplicabilidade de seus princípios. Grupos de educadores lutam pela superação do racismo e pela efetivação dos ideais da lei nas salas de aula, combatendo a ideologia histórica e racista presente na educação brasileira.
Como método para embasar esta pesquisa, optamos por realizar uma revisão bibliográfica ampla sobre essa temática, uma vez que esse tipo de estudo é essencial à investigação acadêmica. Segundo Cavalcante LTC e Oliveira AAS (2020), a pesquisa bibliográfica tem como objetivo investigar e examinar a produção cultural ou científica preexistente acerca de um tópico ou questão específica.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS
Na semana de 17 a 21 de junho de 2013, iniciamos nossa pesquisa na Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Terezinha. Apresentamo-nos à equipe gestora e ao corpo técnico-administrativo, explicando nosso projeto, objetivos e métodos, além de justificar a escolha da escola. No primeiro dia, visitamos as instalações e conversamos informalmente com alguns docentes e alunos, agendando entrevistas conforme a disponibilidade.
Apresentamos uma cópia da Lei para apreciação dos entrevistados, que eram cinco docentes do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, todas do sexo feminino, declaradas de etnia “parda” e com experiência de 10 a 15 anos no sistema público municipal de ensino da cidade de Cametá/PA.
Abrindo o bloco de entrevistas, como questionamento inicial comum a todas as entrevistadas: 1) Existe atualmente no Sistema Educacional Brasileiro a Lei 10.639/2003 modificando a Lei 9.394/1996, tornando obrigatório o ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira nas escolas de Ensino Fundamental e Médio. Você poderia comentar sobre os dispositivos da Lei destacando os que considera mais importantes?
É louvável, mas acredito que todo professor já tem obrigação ‘natural’ de trabalhar o assunto, pois não tem como fugir da história a colaboração, a influência dessa cultura. Sempre falo que o mais importante é a herança cultural e a contribuição econômica, e o menos importante: a cor da pele (Professora A).
Levando em consideração a importância dos negros da [sic] construção da história brasileira, concluo que a inclusão da história e cultura afro-brasileira no currículo como disciplina faz com que possamos refletir acerca das nossas raízes (Professora B)
A Lei coloca o racismo como primordial entrave para a aprendizagem, implicando na exclusão social. A Lei explicita o reconhecimento e a valorização da cultura afro-brasileira e a urgência em se promover a educação das relações étnico raciais como forma de combater o racismo (Professora C)
Esta modificação na Lei 9.394/96 é de grande importância, visto que nos coloca como sendo obrigatório o ensino de História e Cultura Africana (Professora D)
Essa disciplina vem resgatar a cultura afro-brasileiro [sic] para que não seja esquecido [sic] pelo [sic] outros povos (Professora E)
As respostas demonstram um reconhecimento significativo do papel da Lei 10.639/2003 na promoção de uma educação mais inclusiva e atenta às questões raciais no Brasil. Cada ponto de vista enriquece o debate sobre as inseguranças, as incertezas, o modo vago de interpretar um dispositivo de política educacional e a constante necessidade de lutar contra o racismo e celebrar a diversidade cultural. É essencial manter esses diálogos sempre em andamento, procurando constantemente maneiras de aplicar essas orientações de forma eficaz nas instituições de ensino.
Segundo Góes WL, (2018), para combater o racismo de forma eficaz, é imprescindível que as escolas compreendam e examinem as experiências substanciais de diversidade étnico-racial que ocorrem dentro delas. Além disso, é preciso desenvolver pesquisas sobre o tema, entender as reivindicações dos movimentos sociais e elaborar metodologias educacionais que superem o racismo, unindo o saber acadêmico ao conhecimento gerado pelos movimentos sociais.
Realizamos, em seguida, um segundo questionamento ao grupo de professoras: No parágrafo 1º do Artigo 26-A, é tratado brevemente o conteúdo programático, que depois do parecer 003/2004 do CNE, foi aprofundado. Como adequá-lo para a efetivação dos objetivos para os quais a Lei foi criada? Nesse questionamento, os professores foram instigados a compartilhar suas sugestões curriculares e metodológicas para abordar a temática africana, conforme o que está escrito na Lei 10.639/2003, art. 26-A:
Parágrafo 1º – O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
Ressaltamos que as entrevistas tiveram uma abordagem semiestruturada, onde os questionamentos poderiam ser alterados no decorrer da entrevista e um diálogo franco e aberto com o entrevistado foi estabelecido. Todavia, as respostas foram bem interessantes. Vejamos:
Escola pública tem prioridades e adequar conteúdo para atender objetivos de Lei, na minha opinião, não convém. Devemos adequá-lo para atingir os objetivos da escola, dentro da proposta da Lei. É obrigação do profissional da educação tentar mudar a visão que o negro era escravo, vivia acorrentado, ia para o tronco, rever toda essa história (Professora A).
Na nossa realidade educacional se torna necessário fazer a adequação de conteúdos, neste caso, não foge à regra. Tenta-se adequá-los visando a conscientização de nossos alunos acerca da contribuição dos negros na nossa história (Professora B).
Contribuindo de forma positiva para ultrapassar o quadro da desigualdade social, fazendo com que os negros nos conteúdos escolares deixem de ser vistos apenas como escravos, sem passado, incapazes, mostrando que foi um grupo atuante em sua história (Professora C).
Fazendo que seja cumprido os conteúdos para o fortalecimento da sociedade desse povo (Professora E).
As respostas dos professores à pergunta sobre como adaptar o currículo para atender às demandas da Lei 10.639/2003 revelam uma preocupação comum com a inclusão e a conscientização sobre a história e a contribuição dos negros na sociedade. A professora D não emitiu respostas. A Professora B enfatizou a necessidade de adequar os conteúdos educacionais para conscientizar os alunos sobre a importância da contribuição dos negros na história, sugerindo um enfoque pedagógico que promova reflexão e valorização dessas contribuições.
Já a Professora C trouxe uma perspectiva crítica ao destacar a necessidade de mudar a narrativa histórica, afirmando que os negros não devem ser retratados apenas como vítimas da escravidão, mas reconhecidos como um grupo ativo e relevante em sua própria história. Essa abordagem, segundo ela, busca combater estereótipos e promover uma visão mais completa e justa. Por fim, a Professora E mencionou o cumprimento dos conteúdos como uma forma de fortalecer a sociedade negra, sugerindo que a educação deve ser um meio de empoderamento e valorização dessa população.
A Professora A destoou dos demais ao afirmar que caberia ao educador adequá-lo nos diferentes níveis de ensino em termos de proposta curricular e nível de linguagem, adaptando, por conseguinte, até as propostas dos livros didáticos. Neste sentido, a Professora A alegou não ser conveniente que a escola se adeque à Lei, ao considerar informalmente, que a escola teria seu Projeto Político Pedagógico (PPP), teria sua filosofia, seu Plano Diretor e que deveriam ser seguidos. Assim, todo e qualquer conteúdo deveria ser adequado para cumprir as metas estabelecidas pela escola dentro da proposta da Lei.
Com base neste contexto, percebe-se que certas instituições de ensino, amparando-se em seus regulamentos internos ou em seus PPPs, consideram desnecessário abordar a temática racial. Algumas alegam não ter a obrigação de fazê-lo, enquanto outras afirmam que o assunto não se alinha à proposta pedagógica da escola. Essa postura levanta questionamentos sobre a presença de uma sociedade brasileira racista e discriminatória, que falha em reconhecer a igualdade entre todos os grupos (GOMES, NL, 2023).
Como vimos, essa postura de algumas escolas que decidem não abordar a cultura afro-brasileira em seus PPP reflete uma resistência cultural que pode perpetuar o racismo e a discriminação. Essa ausência de inclusão não só desconsidera uma parte importante da história do Brasil, mas também contribui para a invisibilidade de grupos marginalizados. Frente a isso, Pereira AA (2012) traz um pouco de luz a essa problemática ao sugerir que os obstáculos que dificultam a implementação prática da legislação nas salas de aula do Brasil também se confrontam com as orientações acerca da diversidade étnica e racial, que promovem a desconstrução da ideia do mito da Democracia Racial.
O terceiro questionamento que apresentamos às docentes foi: “Tem havido de sua parte algum acompanhamento dos debates sobre o conteúdo e a prática educativa proposta pela Lei? De que maneira?”
Buscou-se, com isso, investigar se elas estavam atentas e envolvidas com os debates relacionados ao conteúdo e à prática educativa estabelecida pela Lei 10.639/2003, que trata da obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas. O nível de atualização dos professores em relação a essa lei específica. Se eles tinham conhecimentos sobre os princípios e diretrizes que a Lei estabelece, além de verificar se estão acompanhando discussões públicas e pedagógicas que possam surgir em torno desse tema.
Não, em virtude de a escola não ter ofertado esse tipo de debate ou se a secretaria ofertou não é de meu conhecimento. Na escola nos reunimos os professores de séries afins e discutimos por nossa conta (Professora A).
Bom, o meu acompanhamento se dá pelos jornais e revistas que falam sobre o assunto, bem como também a busca em livros referentes ao assunto (Professora B).
Participando de cursos de formações e fóruns que discutem sobre o assunto, lendo artigos e reportagens (Professora C).
Da minha parte tem havido acompanhamento pelos telejornais que divulgam estes temas com bastante clareza. Nas minhas aulas trato estas questões com abertura com os alunos, principalmente quando acontece dentro de sala atitudes que caracterizam racismo e/ou bullying (Professora D).
Não, pois a universidade tem oferecido oportunidades, mas as vagas são limitadas (Professora E).
Analisando as respostas, notamos que a Professora “A” mencionou uma falta de apoio institucional para o debate sobre o tema, o que pode ser um obstáculo significativo para a atualização dos professores. O fato de ela mencionar que as discussões ocorrem apenas entre colegas de maneira informal, sugere uma iniciativa pessoal, mas também revela uma lacuna na formação continuada promovida pela escola ou pela secretaria. A Professora B, por sua vez, demonstra um esforço individual para se manter informada através de jornais, revistas e livros. Essa abordagem é válida, mas pode indicar que ela não está participando ativamente de discussões mais amplas ou formais sobre a implementação da lei, o que poderia enriquecer sua prática pedagógica.
Já a Professora C informou participação em cursos de formação e fóruns indicando um comprometimento significativo com a atualização profissional. Isso sugere que ela busca ativamente meios para se aperfeiçoar e contribuir para uma educação mais inclusiva, refletindo um engajamento positivo em relação à lei. A resposta da Professora D revelou uma boa prática pedagógica ao abordar questões de racismo e bullying em sala de aula. O acompanhamento por telejornais mostra que ela está atenta ao que acontece no mundo ao seu redor, o que pode enriquecer suas aulas.
A disposição para discutir esses temas com os alunos é crucial para promover um ambiente educativo mais consciente e crítico. Finalmente a Professora E, embora reconheça as oportunidades oferecidas pela universidade, aponta que a limitação das vagas é um desafio significativo. Isso sugere que, apesar do interesse em se atualizar, fatores externos, como a disponibilidade de cursos, podem estar impedindo seu avanço.
Outrossim, Delors J (2003) explica que a necessidade de atualização de conhecimentos e competências também se aplica aos docentes. A organização de sua vida profissional deve proporcionar oportunidades, ou melhor, incentivá-los a aprimorar suas práticas pedagógicas e a se beneficiar de experiências em diferentes âmbitos da vida econômica, social e cultural. Frente a isso, é fundamental que as instituições de ensino apoiem seus educadores nesse processo de formação contínua e atualização de conhecimentos, oferecendo recursos, tempo e espaços para o desenvolvimento profissional.
Essa valorização do professor não só beneficia o próprio educador, mas impacta positivamente toda a comunidade escolar. Os educadores desempenham um papel crucial na formação das futuras gerações, e, para isso, é essencial que estejam sempre em sintonia com as novas metodologias, legislações educacionais, tecnologias e abordagens pedagógicas. A vida profissional do professor não deve ser estática; ao contrário, deve ser um espaço dinâmico onde o aprendizado contínuo deve ser valorizado e incentivado.
O quarto questionamento que realizamos foi de maneira sequencial, aproveitando a liberdade do tipo de entrevista (semiestruturada), onde perguntamos acerca do engajamento profissional: “Como o professor participa desse processo?” Na ocasião somente quatro das cinco entrevistadas responderam:
Com certeza não sendo imposto, mas discutido e verificada a forma de trabalhar uma vez que não vejo nenhuma dificuldade nas disciplinas (Professora A).
Acredito que a minha participação é na prática de sala de aula, levando para os alunos os assuntos propostos em forma de debates (Professora B).
Poderá contribuir com a permanência do aluno na escola, desmistificar mitos, inserindo as diferenças, pluralizando o acesso as histórias de outras origens. Trabalhar a multiculturalidade e educar para a igualdade. O professor será o mediador neste processo, cabe a ele respeitar todos os seus alunos, independentemente de raça e de cor buscando trabalhar a diversidade cultural que existe na escola (Professora C).
Me vejo participando deste processo no momento que trago o debate para os limites da escola e conduzo os alunos ao pensamento crítico com relação a vinda dos negros para o Brasil e como estes, fazem hoje, parte da sociedade brasileira (Professora D).
A Professora A enfatizou a importância da discussão e reflexão sobre como abordar os temas relacionados à história e cultura afro-brasileira, ao invés de impor um currículo rígido. Essa abordagem sugere uma pedagogia mais colaborativa, onde os educadores são encorajados a adaptar os conteúdos de acordo com as necessidades e contextos específicos de suas turmas. Isso é vital, pois permite que o ensino seja mais relevante e significativo para os alunos.
Na sequência, a Professora B enfatizou a prática de sala de aula e a condução de debates como fundamental para engajar os alunos. O debate é uma ferramenta poderosa que não só estimula o pensamento crítico, mas também promove um ambiente onde os estudantes podem expressar suas opiniões e questionar preconceitos. Essa abordagem ativa pode ajudar a internalizar os conceitos discutidos, tornando-os mais impactantes.
A Professora C, na visão dela, o papel do professor como mediador é essencial. Ao desmistificar mitos e pluralizar o acesso às histórias de diferentes origens, ela destaca a importância da educação multicultural. O foco na diversidade cultural e no respeito às diferenças reforça a ideia de que todos os alunos merecem ser valorizados e reconhecidos em sua individualidade, contribuindo para um ambiente escolar mais inclusivo.
Por fim, a Professora D mencionou a importância de trazer debates sobre a contribuição dos negros para a sociedade brasileira, o que é crucial para promover uma compreensão mais profunda da história nacional. Ao conduzir os alunos ao pensamento crítico, ela não só enriquece seu conhecimento sobre o passado, mas também incita reflexões sobre questões contemporâneas relacionadas à raça e identidade.
A partir dos retados descritos acima, outras evidências destacam que uma abordagem pedagógica em que os professores destaquem a contribuição da população negra na formação social e cultural do Brasil. O objetivo é desconstruir a visão estereotipada e depreciativa do negro como “coitadinho”, frequentemente perpetuada pela sociedade, bem como combater outras expressões presentes em materiais didáticos que ridicularizam e inferiorizam o povo negro (CASAROTO K e SANTOS AJ, 2008).
Pelo que vimos, é fundamental que os professores, em geral, reconheçam e valorizem a contribuição dos negros na formação social e cultural do Brasil. Na práxis do dia a dia, na sala de aula, é essencial essa postura para combater a visão negativa e estereotipada que retrata os negros como “sujeitos passivos”, uma ideia que ainda persiste na sociedade. Além disso, é importante que os educadores critiquem as representações nos livros didáticos que desvalorizam e ridicularizam a população negra. Assim, os professores têm um papel crucial na promoção de uma compreensão mais justa e respeitosa da história e das contribuições dos negros, contribuindo para uma educação mais inclusiva e antirracista.
O 5º questionamento que realizamos foi “Como o estudante participa desse processo?” Na primeira etapa procuramos conhecer a forma com a qual o professor se engaja no processo dos debates acerca da Lei 10.639/2003. Na sequência procuramos também compreender como o professor vê o engajamento ou participação do educando neste processo.
Nas propostas didáticas do seu professor, textos, teatros, músicas, alimentação etc. Não haveria ou não há necessidades de debates ou outras ações além das propostas no plano de curso (Professora A).
Os alunos, quando solicitados, participam com participação [sic] nos debates e no aprofundamento [sic] do assunto (Professora B).
Participando de ações voltadas para atender as demandas da Lei em prol da cultura e da desmistificação da cultura afro-brasileira em sala de aula (Professora C).No que tange a participação do educando, vejo de forma ainda pouco ativa. Principalmente quando é para se expressar dentro de um debate (Professora D).
Um sexto questionamento foi dirigido aos professores: “Você considera que houve mudanças na prática educativa de sua escola ou na sua prática a partir da promulgação dessa lei?” As respostas revelaram uma percepção coletiva de que, apesar da existência da legislação, as mudanças efetivas são lentas e limitadas.
O Professor A mencionou que, após três meses de trabalho, não observou ações coletivas, indicando uma prática isolada dos docentes; O Professor B expressou frustração, afirmando que muitas diretrizes permanecem apenas no papel e que sua própria evolução está ligada ao conhecimento adquirido; O Professor C, por sua vez, destacou a lentidão do processo de inclusão da diversidade nas atividades diárias, enquanto o Professor D reforçou que os princípios da lei ainda não são plenamente aplicados em sua escola.
Essas falas evidenciam que o trabalho com diversidade é reconhecido como necessário, mas ainda não se concretiza plenamente na prática educativa. Os professores têm autonomia para adaptar suas aulas às necessidades dos alunos, mas a transformação social esperada não deve ser imposta apenas pela lei, mas sim promovida como um compromisso diário dos educadores. A inclusão deve ser uma prática natural e não uma obrigação, buscando respeitar e valorizar a singularidade de cada estudante no ambiente escolar.
Os professores foram questionados, na sétima pergunta do questionário, sobre como lidam com conflitos étnico-raciais nas salas de aula. As respostas revelaram uma abordagem centrada no diálogo e na valorização da diversidade. O Professor A enfatizou a importância de discutir as diferenças individuais, enquanto o Professor B destacou a necessidade de explicar o valor de cada pessoa, independentemente de sua origem. O Professor “C” mencionou que a escola deve ser um espaço para compartilhar não apenas conhecimentos, mas também valores e crenças, buscando interromper a reprodução do racismo. O Professor “D” também ressaltou a importância do diálogo para resolver conflitos.
Todos os professores concordaram que o preconceito racial é uma realidade nas salas de aula e que é fundamental promover uma consciência crítica entre os alunos, respeitando a diversidade tanto dentro quanto fora do ambiente escolar. Destacou-se a necessidade de os educadores valorizarem a cultura afro-brasileira e reconhecerem os negros como sujeitos históricos. Para isso, é essencial que os professores tenham uma formação sólida e crítica que aborde a diversidade étnica e cultural da sociedade brasileira.
Contudo, muitos professores enfrentam desafios devido a uma formação tradicional e fragmentada, que muitas vezes ignora as mudanças sociais e históricas. Para um ensino de história mais inclusivo, é necessário utilizar o material didático de forma reflexiva, adaptando-o às realidades diversas dos alunos em sala de aula.
Como oitavo questionamento: Que livros didáticos você trabalha no que se refere ao ensino de História? Os entrevistados mencionam diferentes abordagens em relação ao uso de livros didáticos no ensino de História. O Professor A prefere a coleção “História e Geografia” de Cecília Passos e Leneida Silva, enquanto o Professor B utiliza os livros recomendados pelo MEC. O Professor C não tem um livro definido e pesquisa em várias fontes, enquanto o Professor D observa que novos livros foram disponibilizados na escola em 2013. A análise revelou que os professores ainda dependem bastante dos livros didáticos em suas aulas.
No que diz respeito aos conteúdos, um dos desafios mencionados por grande parte dos professores no ensino da cultura afro-brasileira e africana nas escolas é a seleção e a abordagem do material didático. Contudo, é necessário ressaltar que as Diretrizes Curriculares Nacionais já indicam quais conteúdos históricos e culturais de relevância para a população afro-brasileira devem ser contemplados no currículo da disciplina de História e, consequentemente, trabalhados em sala de aula. Essa determinação parte do princípio de que a mera inclusão do tema não é suficiente; é fundamental incorporar uma revisão historiográfica sobre a temática para abordá-la de forma apropriada no processo de ensino e aprendizagem (LIRA TA e BRETTAS ACF, 2022).
Como vimos, a responsabilidade recai sempre sobre a figura do professor, pois os educadores enfrentam desafios. Mesmo que as Diretrizes Curriculares já estabeleçam a priori quais temas devem ser incluídos no currículo de História, os professores também precisam revisar a historiografia relacionada para abordá-los. Portanto, a responsabilidade de ensinar de forma adequada e respeitosa sobre a cultura afro-brasileira é dos professores, pois, caso o conteúdo escolhido possua uma abordagem tendenciosa, discriminatória e racista, caberá ao professor adaptar uma forma de transmissão de conteúdos de forma coerente.
Entretanto, foi apenas a partir da segunda metade da década de 1990 que as demandas por intervenções contra a perpetuação do racismo no ambiente escolar começaram a ser atendidas. O governo federal, por exemplo, iniciou um processo de revisão do material didático utilizado pelas escolas, implementando restrições, solicitando reedições e até mesmo excluindo livros didáticos e paradidáticos que representavam a população negra e sua história com base em estereótipos e características negativas, como a falácia da inferioridade racial, a subserviência e a submissão histórica, equivocada e intencionalmente atribuídas a esse grupo social (SOUSA DM e RIBEIRO JOS, 2024).
Em continuidade, Sousa DM e Ribeiro JOS (2024) destacaram um considerável avanço nas políticas educacionais brasileiras ao abordar o racismo nas escolas na década de 1990. A revisão do material didático é essencial para garantir representações justas da população negra, eliminando livros que perpetuam estereótipos negativos. Essa mudança é importante para formar novas gerações com uma visão crítica e verdadeira sobre a história, contribuindo para uma sociedade mais igualitária e valorizando a identidade afro-brasileira.
Como nono questionamento, os professores foram desafiados a comentar sobre um tema deveras delicado: Você acha que existe racismo nesta escola? Como você observa isso?
Os depoimentos dos professores A, B, C e D trazem à tona a realidade do racismo nas escolas, mostrando como ele se manifesta através de apelidos e bullying, mesmo em contextos em que deveria haver respeito e valorização da diversidade.
A implementação da Lei 10.639/2003, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira, é um passo importante nessa luta. No entanto, como ressalta Carvalho L (2013), ainda é um desafio significativo para os educadores romperem com o preconceito que já está enraizado na sociedade. O papel do professor não é apenas transmitir conhecimento, mas também refletir sobre suas próprias crenças e atitudes em relação à diversidade.
Sobre essa questão, LIRA TA e BRETTAS ACF (2022) discutem como o professor lida com o racismo em sala de aula e como ele, em conjunto com a instituição escolar, aborda a história da cultura africana presente nos currículos. Considerando a percepção de uma sociedade moderna em constante e intensa transformação social, cultural e econômica, o docente pode ser o agente inicial na introdução de uma perspectiva diferenciada na formação do aluno que, muitas vezes, está familiarizado com comportamentos racistas. Através da conscientização desses estudantes, o professor pode apresentar um olhar diverso e respeitoso. O currículo escolar, por sua vez, deve abordar a cultura africana buscando erradicar comportamentos discriminatórios, modificando uma estrutura racista, com o objetivo de se pensar na constituição e formação de uma educação escolar democrática que contemple e valorize a história da África.
Os projetos educacionais que visam apresentar e valorizar a cultura afro-brasileira são essenciais para promover uma mudança real nas dinâmicas escolares. Para isso, é fundamental que todos os envolvidos na educação — professores, supervisores e alunos — participem ativamente desse processo de transformação. A escola deve ser um espaço onde a diversidade é celebrada, e onde todos se sintam respeitados e valorizados.
Finalizamos o questionário com: Existe alguma orientação prevista no PPP escolar ou da Supervisão Escolar ou ainda da Secretaria Municipal de Educação que direcione ou inspecione o cumprimento da Lei 10.639/2003 em sua práxis pedagógica?
A partir dos depoimentos dos professores A, B, C e D, fica evidente que há uma lacuna significativa na orientação e supervisão por parte das instâncias responsáveis, como a Supervisão Escolar e a Secretaria Municipal de Educação (SEMED).
Os relatos indicaram que os professores não receberam diretrizes claras ou suporte institucional para integrar efetivamente o ensino da cultura afro-brasileira em suas práticas pedagógicas. O Professor A menciona que o tema de cidadania é abordado naturalmente nas aulas, mas isso não parece ser suficiente para garantir que a diversidade cultural seja realmente explorada em profundidade. O Professor B expressa sua frustração com a falta de formação e suporte, enquanto os Professores C e D reforçam que não houve orientações recebidas até o momento.
Esse cenário sugere um descaso com uma legislação que já está em vigor há mais de 20 anos. É fundamental que haja uma mobilização por parte da SEMED e dos coordenadores pedagógicos para implementar ações concretas que incentivem o ensino da cultura afro-brasileira. Isso pode incluir formações continuadas para os docentes, elaboração de materiais didáticos específicos, e a promoção de um ambiente escolar que respeite e valorize a diversidade cultural.
A função da ‘supervisão’ foi ganhando destaque nos sistemas de ensino, englobando a organização administrativa e pedagógica, diretrizes, normas, inspeção, coordenação e organização de grupos escolares e de professores. Esse modelo, focado no controle, vigilância e padronização do conhecimento, perdurou por várias décadas. O supervisor atuava como um profissional que transmitia um conhecimento específico, definindo as diretrizes do trabalho por meio de ações e avaliações (Pastore SS, 2020).
Nota-se, com isso, que a supervisão escolar é um processo que organiza e fiscaliza o ensino, estabelecendo diretrizes e padronizando conhecimento. O supervisor atua como orientador, avaliador e gestor, transmitindo conhecimento e tomada de decisões. Ainda assim, a forma como é transmitido o currículo escolar e abordagem que se faz do papel social do negro ainda é muito subjetiva em nossas escolas, ou seja, varia de professor a professor.
O papel do coordenador pedagógico é crucial nesse processo que estamos discutindo, pois ele deve atuar como um facilitador e orientador, promovendo discussões sobre a importância da diversidade nas práticas educativas. Somente com um esforço conjunto entre as instituições educacionais e os educadores será possível cumprir efetivamente a Lei 10.639/2003 e enriquecer a formação dos alunos com uma compreensão mais ampla da nossa sociedade multicultural.
5 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS
A implementação da Lei 10.639/2003 na Escola Municipal Santa Terezinha, em Cametá/PA, enfrenta desafios como a falta de formação docente e materiais inadequados, além da resistência cultural e do baixo conhecimento sobre a história afro-brasileira. Para promover uma educação inclusiva e equitativa, é essencial investir na formação contínua dos educadores, incluir a história africana no currículo e valorizar a identidade negra, superando barreiras estruturais e culturais. Parcerias externas e o envolvimento da comunidade também são fundamentais para o sucesso da lei.
REFERÊNCIAS
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1Facultad Interamericana de Ciências Sociales (FICS). Cametá-Pará. *E-mail: elielpompeu83@gmail.com
2Facultad Interamericana de Ciências Sociales (FICS). Cametá-Pará.