DESAFIANDO BARREIRAS: O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA EM ESCOLAS PÚBLICAS E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA EDUCACIONAL

CHALLENGING BARRIERS: AUTISTIC SPECTRUM DISORDER IN PUBLIC SCHOOLS AND ITS IMPLICATIONS FOR EDUCATIONAL PRACTICE

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202502191655


Ana Maria Vasconcelos da Silva1
Jaqueline Mendes Bastos2


RESUMO:

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) representa um dos principais obstáculos à efetivação da educação inclusiva nas escolas públicas do Brasil. Este estudo busca examinar as dificuldades enfrentadas por alunos com TEA, educadores e gestores, além de identificar as ações necessárias para a criação de uma educação inclusiva que realmente funcione. É fundamental destacar a necessidade de formação continuada para os professores, a adequação do currículo e o desenvolvimento de políticas públicas que promovam a equidade e o respeito à diversidade. objetivo discutir práticas pedagógicas inclusivas voltadas para alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e apresentar estratégias de ensino eficazes que promovam a participação e o desenvolvimento integral desses estudantes. São abordados os desafios da inclusão escolar, a importância de uma formação continuada para os docentes e o papel das tecnologias assistivas no processo de ensino-aprendizagem. Com base em referências teóricas e práticas, o artigo oferece um panorama sobre a necessidade de uma educação mais inclusiva e equitativa. A metodologia utilizada é baseada na pesquisa bibliográfica, permitindo uma análise teórica aprofundada sobre o tema e suas questões. Os resultados demonstram que as práticas pedagógicas para alunos com TEA estão intimamente relacionadas à qualidade da formação dos educadores. Além disso, é crucial que existam programas de formação continuada que capacitem os professores a lidar com os desafios próprios do ensino para esses alunos. A criação de condições adequadas para uma prática inclusiva requer uma abordagem que vá além da simples integração, garantindo, de fato, a participação plena e equitativa dos alunos com TEA no contexto escolar.

Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista, Políticas. Práticas pedagógicas.

ABSTRACT:

Autism Spectrum Disorder (ASD) represents one of the main obstacles to the implementation of inclusive education in public schools in Brazil. This study seeks to examine the difficulties faced by students with ASD, educators and managers, in addition to identifying the actions necessary to create an inclusive education that really works. It is essential to highlight the need for continued training for teachers, the adaptation of the curriculum and the development of public policies that promote equity and respect for diversity. The objective is to discuss inclusive pedagogical practices aimed at students with Autism Spectrum Disorder (ASD) and present effective teaching strategies that promote the participation and integral development of these students. The challenges of school inclusion, the importance of continued training for teachers and the role of assistive technologies in the teaching-learning process are addressed. Based on theoretical and practical references, the article offers an overview of the need for a more inclusive and equitable education. The methodology used is based on bibliographical research, allowing an in-depth theoretical analysis of the topic and its issues. The results demonstrate that pedagogical practices for students with ASD are closely related to the quality of educator training. Furthermore, it is crucial that there are continuing training programs that enable teachers to deal with the challenges of teaching these students. Creating adequate conditions for inclusive practice requires an approach that goes beyond simple integration, actually guaranteeing the full and equitable participation of students with ASD in the school context.

Keywords: Autism Spectrum Disorder, Policies. Pedagogical practices.

1. INTRODUÇÃO

A educação inclusiva é um direito fundamental garantido pela legislação brasileira, como o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/1996). Contudo, a inclusão efetiva de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) ainda enfrenta barreiras significativas no cotidiano escolar, tanto no que diz respeito à formação docente quanto à adaptação de práticas pedagógicas, o Autismo é uma condição que impacta o desenvolvimento neuropsicológico, especialmente nas áreas de comunicação, interação social e comportamento, apresentando-se de forma diversa em cada indivíduo, o que exige abordagens pedagógicas diferenciadas e personalizadas. No Brasil, a Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146/2015) e a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva promovem a inclusão, mas ainda enfrentamos barreiras significativas que desafiam a prática educacional.

Este artigo tem como objetivo explorar as práticas pedagógicas inclusivas que podem ser implementadas por educadores para atender às necessidades específicas de alunos com TEA. Através de uma metodologia qualitativa, fundamentada em uma revisão bibliográfica, buscamos mapear as principais discussões e estratégias que promovam a inclusão efetiva desses alunos no ambiente escolar. A formação continuada dos professores, a adaptação do currículo e o uso de tecnologias assistivas são aspectos cruciais para a construção de um ambiente educacional que respeite e valorize a diversidade. 

Ao abordar os desafios da inclusão escolar e a importância de uma formação docente adequada, este estudo pretende contribuir para a reflexão sobre como as instituições educacionais podem se adaptar para oferecer um espaço verdadeiramente inclusivo, onde todos os alunos, independentemente de suas particularidades, possam aprender e se desenvolver plenamente.

 A luta por uma educação inclusiva é, portanto, uma questão de justiça social, que requer um compromisso coletivo para superar as barreiras que ainda persistem no sistema educacional. A metodologia adotada é de cunho qualitativo, com base em revisão bibliográfica fundamentada em autores como Amaral e Santos (2019), Souza e Almeida (2021), Oliveira et al. (2012), Oliveira; Tomaz; Silva, 2017, além de diretrizes legais como a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e a Declaração de Salamanca, esses referenciais teóricos e normativos possibilitam uma análise aprofundada das práticas inclusivas e dos desafios enfrentados pelas instituições escolares.

A inclusão de estudantes com TEA em escolas regulares exige a compreensão das especificidades do processo de ensino-aprendizagem desses alunos. Para autores como Mantoan (2003) e Silva (2017), a escola tem um papel crucial na construção de uma educação equitativa e de qualidade, promovendo um ambiente acolhedor e respeitando as singularidades de cada aluno. Assim, é essencial investigar como as instituições têm adaptado suas práticas e estruturado suas políticas para oferecer um espaço verdadeiramente inclusivo, considerando as demandas de alunos com TEA e os desafios enfrentados por educadores na implementação de práticas efetivas.

2. DEFINIÇÃO DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA): PERSPECTIVAS E IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição neurodesenvolvimental que afeta as áreas de comunicação, interação social e comportamento. Segundo o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-5), o TEA é caracterizado por dificuldades persistentes na comunicação social e pela presença de padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses ou atividades. A gravidade dos sintomas varia amplamente, configurando um espectro que inclui desde indivíduos com grandes necessidades de suporte até aqueles altamente funcionais (APA, 2013).

As principais manifestações do TEA incluem:

  1. Dificuldades de interação social: indivíduos com TEA podem apresentar dificuldade em compreender pistas sociais, manter conversas ou desenvolver relações interpessoais.
  2. Padrões de comportamento repetitivos: estereotipias motoras, adesão a rotinas rígidas e interesses altamente focados são característicos frequentes.
  3. Alterações sensoriais: hipersensibilidade ou hipossensibilidade a estímulos sensoriais, como sons, luzes ou texturas, também são comuns.

Estudos apontam que o Autismo tem origem multifatorial, envolvendo aspectos genéticos e ambientais. Apesar de não haver cura, intervenções precoces e bem planejadas podem melhorar significativamente a qualidade de vida desses indivíduos (Lord et al., 2020).

Nos últimos anos, a incidência de casos tem aumentado globalmente, o que demonstra ser um problema social que transcende barreiras econômicas e culturais. Essa questão tem mobilizado discussões no campo educacional, acentuando a preocupação com a inclusão de estudantes com TEA (Almeida; Boinh; Heber, 2016).

A escolarização de pessoas com TEA é um dos desafios contemporâneos enfrentados por educadores e famílias, considerando que as alterações neuropsiquiátricas impactam diretamente as áreas de comunicação e comportamento (Almeida; Felizardo, 2015). O isolamento característico do espectro autista foi evidenciado por Leo Kanner em 1943, no artigo Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo, onde descreveu o autismo como um distúrbio inato presente desde os primeiros anos de vida (Guareschi; Alves; Naujorks, 2016). A motivação para este estudo surgiu da convivência com crianças dentro do espectro e da observação de suas dificuldades no ambiente escolar. Desde a década de 1990, diversos movimentos têm promovido a inclusão de crianças com Necessidades Educativas Especiais (NEE) na escola. Documentos como a Declaração Mundial de Educação para Todos (UNESCO, 1990), a Convenção sobre os Direitos da Criança (UNESCO, 1988) e a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) estabeleceram que toda pessoa – criança, jovem ou adulta – tem direito à educação e à plena participação na sociedade. No Brasil, esse direito é garantido pelo Ministério da Educação, que reconhece a igualdade de acesso à educação básica (Almeida; felizardo, 2015; De Araujo Nogueira et al., 2016). Com base na estimativa mais recente, aproximadamente 1% População brasileira apresenta critérios para o diagnóstico de TEA, o que corresponde a cerca de 1 a 2 milhões de pessoas, sendo entre 400 a 600 mil com menos de 20 anos e 120 a 200 mil com menos de cinco anos (IBGE, 2000). Nos Estados Unidos, a média de idade para diagnóstico é entre três e quatro anos. Embora a tecnologia educacional tenha avançado, criando dispositivos e ferramentas que abrem novas possibilidades para o ensino, crianças com necessidades especiais ainda enfrentam muitos desafios, assim como seus professores (De Paula Nunes; Azevedo; Schmidt, 2013; Almeida; Felizardo, 2015).

No Brasil, políticas públicas e diretrizes foram criadas para garantir o acesso a espaços e recursos pedagógicos adaptados às necessidades dos alunos com deficiência. Materiais como quebra-cabeças, jogos numéricos de madeira e recursos visuais são amplamente utilizados, e os professores têm flexibilidade para desenvolver recursos específicos com base nas demandas dos estudantes, essas políticas também incentivam a formação docente especializada, além de fomentar a participação ativa das famílias e comunidades no ambiente escolar (Brasil, 2013). 

Indivíduos com TEA apresentam comprometimentos no desenvolvimento social, na comunicação e um repertório restrito de interesses e atividades, dificultando a aprendizagem e a interação, por isso, é essencial que os professores compreendam as características de cada aluno para planejar aulas inclusivas. Este estudo tem como objetivo realizar uma revisão sistemática da literatura publicada nos últimos dez anos sobre a inclusão de crianças com Autismo, reunindo informações que possam subsidiar futuras pesquisas e práticas educacionais. O diagnóstico e acompanhamento de crianças com suspeita de TEA são fundamentais para determinar o tratamento mais adequado para cada caso. Esse processo permite implementar mudanças que favoreçam o desenvolvimento individual e forneça um retorno significativo para os familiares. No entanto, é importante considerar que nem sempre o psicodiagnóstico garante saúde, podendo gerar efeitos iatrogênicos que devem ser monitorados.

Na perspectiva educacional, a inclusão de estudantes representa um desafio e uma oportunidade, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) e a Política Nacional de Educação Especial (2008) reforçam o direito à educação inclusiva, exigindo adaptações curriculares e formação docente, a literatura acadêmica destaca a importância de uma abordagem pedagógica personalizada, que leve em consideração as particularidades de cada aluno.

3. AS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA 

No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva estabelecem princípios que visam não apenas a inserção, mas também a permanência e o sucesso acadêmico dos alunos com TEA. As pessoas com deficiência enfrentam historicamente um cenário de exclusão total e negação de direitos básicos, incluindo o acesso à educação. Segundo Mazzotta (2001), no século XIX, alguns brasileiros iniciaram a organização de serviços voltados para pessoas cegas, surdas e com deficiências físicas e intelectuais. Em 1854, sob a liderança de Benjamin Constant, foi criado o Instituto dos Meninos Cegos, inspirado em experiências europeias. Posteriormente, no início do século XX, deram-se os primeiros passos rumo à educação inclusiva com a criação do Instituto dos Surdos-Mudos, atualmente conhecido como Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), no Rio de Janeiro.

No âmbito mundial, no final da década de 1940, surgiram as primeiras discussões sobre a participação de todas as pessoas em seus direitos, considerando suas diferenças. Esse contexto culminou na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que afirma em seu Artigo 1º que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos, destacando ainda que toda pessoa tem direito à educação (Unesco, 1994).

Um marco importante para a educação especial foi a Declaração de Salamanca, publicada em 1994 pela UNESCO, na Espanha. Esse documento estabeleceu princípios fundamentais para a consolidação de políticas públicas voltadas para estudantes com deficiência, destacando que cada criança possui características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem únicas. Reforça-se que os sistemas educacionais devem ser projetados para atender à diversidade dessas necessidades (Unesco, 1994).

Em 1995, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, foi implementada a Política Nacional de Educação Especial (1994), que introduziu modalidades iniciais de atendimento educacional para o público da educação especial, como classes especializadas, atendimento domiciliar, oficinas pedagógicas, classes comuns e professores itinerantes. Em 1999, foi promulgada a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas com Deficiência, conhecida como Convenção de Guatemala.

No início do governo Lula, em 2003, foi implementado o Programa de Formação de Multiplicadores para Educadores – Educação Inclusiva: Direito à Diversidade. Esse programa tornou-se um marco na educação inclusiva no país, promovendo um aumento significativo no número de estudantes da educação especial em classes regulares. Em 2006, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) reforçou a perspectiva social sobre as pessoas com deficiência.

Esses avanços refletiram-se em dados significativos: entre 2002 e 2010, as matrículas em classes comuns aumentaram de 110.704 para 484.332; as matrículas em classes especiais reduziram de 78.353 para 46.255; e, nas escolas especiais, houve uma queda de 259.544 para 172.016 matrículas (Kassar, Rebelo e Oliveira, 2019).

A promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9.394/1996 consolidou a compreensão da educação especial como uma modalidade oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, voltada para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. O Plano Nacional de Educação 2014-2024 incorporou a educação especial inclusiva como um dos eixos centrais, com a meta de universalizar a educação básica e o atendimento educacional especializado (AEE). A Lei Brasileira de Inclusão (LBI), promulgada em 2015, foi um marco para a efetivação dos direitos das pessoas com deficiência, incluindo diretrizes claras e assertivas para a inclusão educacional. Essa legislação consolidou princípios fundamentais para o desenvolvimento de uma educação equitativa e acessível a todas e todos.

Assim, segundo a LBI no Art. 2º: 

Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Brasil, 2015).

Também, no artigo 27, a educação como um direito da pessoa com deficiência, sendo assegurada por um sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem como, o seu aprendizado durante toda a vida, desenvolvendo seus talentos, habilidades físicas, sensoriais, sociais e intelectuais, de acordo com as suas necessidades de aprendizagem e interesses próprios (Brasil, 2015). 

Com tais avanços no cenário da Gestão Educacional, a Educação Especial alcançou novos rumos com a aprovação de decretos e leis que suscitaram em mais ascensão e desenvolvimento para a inclusão. O Gráfico abaixo destaca que, embora tenhamos avançado significativamente em aspectos legislativos e na conscientização pública, os retrocessos refletem fragilidades estruturais no sistema educacional. Para consolidar os direitos dos alunos com TEA, é necessário alinhar esforços entre sociedade civil, governo e instituições de ensino, priorizando a equidade no acesso à educação inclusiva.

Avanços e Retrocessos na Educação Inclusiva (2012–2025)
Fonte: Criado pela autora

Tendências Identificadas

Períodos de Avanços Significativos:

2012: A Lei 12.764/2012 reconheceu o autismo como deficiência, garantindo direitos básicos e promovendo visibilidade e proteção legal.

2015: A BNCC consolidou diretrizes para a educação inclusiva, adaptando práticas pedagógicas às necessidades de todos os alunos, incluindo aqueles com TEA.

2020: Durante a pandemia, a Lei 13.977/2020 assegurou adaptações no ensino remoto para atender alunos com deficiência.

2023: A formação continuada de professores representou um avanço na qualificação profissional para práticas pedagógicas voltadas ao atendimento de alunos com TEA.

Períodos de Retrocessos:

2012: O desconhecimento sobre a aplicação da Lei 12.764/2012 comprometeu sua eficácia.

2018: Houve redução de investimentos em programas de inclusão, gerando lacunas na implementação de políticas públicas.

2020: A pandemia evidenciou desigualdades no ensino remoto, prejudicando alunos com TEA dependentes de suporte presencial.

2023: Relatos de cortes orçamentários em áreas de inclusão comprometeram avanços previamente alcançados.

Ao depararmos com um cenário onde a inclusão de alunos com Transtorno do Espectro Autista as instituições de ensino representam um importante desafio e compromisso social. As legislações e políticas públicas desempenham um papel fundamental na criação de diretrizes que promovam essa inclusão efetiva, garantindo o direito à educação de todos os estudantes, independentemente de suas particularidades. 

A efetiva inclusão escolar de alunos Autistas requer uma abordagem colaborativa, envolvendo educadores, familiares e profissionais de apoio. Segundo Amaral e Santos (2019), “a capacitação docente é um elemento chave para a promoção de práticas inclusivas de sucesso”. Além disso, recursos como tecnologias assistivas e adaptações no ambiente escolar contribuem para a superação de barreiras ao aprendizado.

Art. 3º São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista:

I – a vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer;
II – a proteção contra qualquer forma de abuso e exploração;
III – o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde, incluindo:
a) o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo;
b) o atendimento multiprofissional;

Ao instituir a Política de Educação Especial e Inclusiva, o Projeto de Lei 3035/20 busca assegurar direitos e garantir que alunos com transtornos do espectro autista e outras deficiências tenham acesso à educação de qualidade, promovendo um ambiente que respeite e valorize suas necessidades e potencialidades.

Além disso, enfatiza a importância do reconhecimento e respeito à diversidade das pessoas com autismo, visando a eliminação de preconceitos e a valorização de suas potencialidades, com isso, busca-se proporcionar uma melhor qualidade de vida e inclusão dessas pessoas na sociedade, no Art. 3º o IV – refere-se ao acesso:

a) à educação e ao ensino profissionalizante;
b) à moradia, inclusive à residência protegida;
c) ao mercado de trabalho;
d) à previdência social e à assistência social.
Parágrafo único. Em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá direito a acompanhante especializado (BRASIL, 2012).

Da aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece 20 metas a serem cumpridas pelo país em um período de dez anos, uma das principais polêmicas girou em torno da possibilidade de matrícula de crianças e jovens com deficiência em escolas especiais, sem a obrigatoriedade de inclusão na rede regular de ensino. Essa opção foi preservada na redação final da meta, que foi aprovada em 2014. Organizações especializadas na questão argumentam que o conteúdo do PNE violaria tratados internacionais sobre o assunto que o Brasil já havia ratificado. 

O Plano Nacional de Educação – PNE, Lei nº 10.172/2001, destaca que “o grande avanço que a educação deveria produzir seria a construção de uma escola inclusiva que garanta o atendimento à diversidade humana”. Ao estabelecer objetivos e metas para que os sistemas de ensino favoreçam o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, aponta um déficit referente à oferta de matrículas para alunos com deficiência nas classes comuns do ensino regular, à formação docente, à acessibilidade física e ao atendimento educacional especializado (BRASIL/MEC, 2007).

Compreender o Transtorno do Espectro Autista é essencial para promover uma educação verdadeiramente inclusiva e equitativa. Além de uma formação docente adequada, é necessário desenvolver uma cultura escolar que valorize a diversidade como um recurso para o crescimento coletivo. Como enfatiza Souza (2021), “a inclusão escolar não é apenas uma meta, mas um processo contínuo de aprendizagem e adaptação.”

Para Gómez e Terán, (2014, p. 446),  

O autismo é uma composição distinguida por uma alteração no contato com a realidade, onde o indivíduo tem grande dificuldade de se relacionar com outras pessoas. E essa dificuldade está vinculada ao processo de desenvolvimento da pessoa, desde a infância. 

Percebe-se, portanto, que os autores identificam o autismo como uma condição que influencia profundamente a maneira como os indivíduos percebem e se relacionam com o mundo e com os outros, e que essas dificuldades têm raízes no desenvolvimento inicial da pessoa. 

4. PRÁTICAS PEDAGÓGICAS INCLUSIVAS: ESTRATÉGIAS DE ENSINO EFICAZES PARA ALUNOS COM TEA

O Transtorno é caracterizado por dificuldades na comunicação social e comportamentos repetitivos, podendo variar em gravidade e manifestação. A criação de um ambiente escolar inclusivo exige o envolvimento de todos os atores do processo educativo, garantindo que as estratégias de ensino sejam cuidadosamente planejadas e adaptadas às necessidades específicas de cada estudante, elementos como a adaptação curricular, o uso de tecnologias assistivas e a formação contínua dos educadores são indispensáveis para viabilizar uma inclusão efetiva. Conforme ressalta Souza e Almeida (2021), “a inclusão não é apenas um direito, mas também um compromisso ético com a diversidade e a equidade”. Contudo, as práticas pedagógicas inclusivas não apenas transformam a educação, mas também a tornam mais justa e acessível a todos. Pois, de acordo com Silva e Santos (2020), “a inclusão de alunos, exige que os professores compreendam as especificidades de cada aluno, adaptando não apenas o conteúdo, mas também a dinâmica da sala de aula”. Isso requer planejamento, formação continuada e suporte pedagógico.

Adaptações curriculares são fundamentais para garantir que os alunos tenham acesso ao conhecimento de forma equitativa. Isso pode incluir a simplificação de instruções, uso de materiais visuais e ajustes no ritmo de ensino. As tecnologias assistivas, também um importante aliado no processo de desenvolvimento e ao serem utilizadas como dispositivos de comunicação alternativa e aumentativa, aplicativos de organização e ferramentas educacionais interativas, têm se mostrado essenciais para apoiar o aprendizado. Segundo Oliveira (2019), “a tecnologia potencializa a inclusão ao permitir que alunos com necessidades específicas acessem o conteúdo de forma personalizada”.

Ambientes estruturados favorecem a previsibilidade, fundamental para os alunos, utilizarem rotinas visuais, como quadros de atividades diárias, pode reduzir a ansiedade e facilitar a compreensão das tarefas escolares.

A formação continuada dos professores desempenha um papel crucial na construção de uma educação inclusiva. Educadores bem preparados são essenciais para implementar práticas pedagógicas que promovam a inclusão, favorecendo interações sociais construtivas, fundamentais para o desenvolvimento das habilidades sociais de alunos com Transtorno. Estratégias como jogos cooperativos, trabalhos em pequenos grupos e dinâmicas de socialização são exemplos de abordagens que fortalecem o crescimento socioemocional desses alunos. 

Estudos realizados por Oliveira et al. (2012), muitos professores se sentem despreparados para lidar com a educação inclusiva. Passados dez anos do decreto de 2008, essa realidade se mantém, já que os docentes do ensino regular afirmam não saber como adaptar suas práticas pedagógicas para atender alunos com deficiência e dificuldades específicas de aprendizagem, essa falta de preparação cria uma barreira entre os professores e os alunos, dificultando ainda mais a implementação efetiva das práticas educacionais. Além disso, a situação é agravada pela grande demanda do currículo escolar, pelo elevado número de alunos por sala de aula e, principalmente, pela ausência de formação continuada destinada aos professores, especialmente no que diz respeito à inclusão e às estratégias pedagógicas para atender alunos com autismo. 

Algumas estratégias utilizadas para manter o sujeito com autismo em sala de aula são: privilegiar vínculos afetivos; utilizar linguagem objetiva; privilegiar as habilidades individuais; propor pequenas tarefas, mesmo que sejam diversas; incentivar sempre; propor atividades que estimulem o pensamento lógico; adaptar o currículo, as metodologias e o processo avaliativo; evitar atividades muito longas; utilizar jogos; explorar o cotidiano; utilizar abordagens sensoriais (visual, auditivo, cinestésico); propor atividades baseadas no interesse do aluno; utilizar o concreto e o lúdico, mesmo nos anos finais da Educação Básica.(OLIVEIRA; TOMAZ; SILVA, 2017, p.6)

Essas estratégias incluem criar laços afetivos, usar uma comunicação clara e objetiva, valorizar as habilidades individuais de cada aluno e dividir as atividades em tarefas menores

A formação de professores não apenas melhora suas habilidades pedagógicas, mas também os encoraja a se tornarem multiplicadores de ideias inclusivas. Além disso, enfatiza que, antes de se preocupar com a educação dos alunos, é fundamental que os próprios professores reconheçam a necessidade de um desenvolvimento pessoal e profissional contínuo. Essa reflexão e autoavaliação são essenciais para criar um ambiente educacional mais aberto e íntegro. 

Para que o professor exerça ações pedagógicas que valorize as singularidades dos alunos e a inclusão de todos, é fundamental identificar quais são as percepções que o professor tem sobre seus alunos, aqui em específico, os alunos com autismo. Pois, diante da construção histórica do autismo e da relação da educação com a medicina, é comum encontrarmos professores sedentos e podemos dizer até estagnados à espera de um diagnóstico para o aluno que se apresenta como diferente (MACHADO, 2018, p. 17).

A necessidade de os professores compreenderem seus próprios preconceitos, percepções e expectativas sobre seus alunos, ela enfatiza como as práticas pedagógicas precisam valorizar as singularidades e se afastar de uma visão limitada pela dependência exclusiva de diagnósticos médicos.

Esse argumento é relevante porque aponta para a relação histórica entre educação e medicina, onde, muitas vezes, a educação tende a esperar por um diagnóstico como condição para agir ou adaptar práticas pedagógicas. Isso pode levar à estagnação do processo educativo, prejudicando a inclusão e o desenvolvimento pleno dos alunos com autismo, a busca por diagnósticos pode refletir uma insegurança docente frente às diferenças, tornando essencial investir na formação de professores para que desenvolvam uma postura mais proativa e flexível, isso inclui estratégias pedagógicas centradas na observação contínua, na escuta ativa e na adaptação de práticas que acolham as necessidades dos alunos, independentemente de um rótulo clínico. Portanto, a citação nos convida a refletir sobre como o professor pode ser agente de transformação ao substituir a espera por diagnósticos por uma ação pedagógica que priorize a empatia, a valorização das singularidades e o comprometimento com a inclusão real. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A inclusão de crianças com transtorno do espectro autista é uma tarefa complexa, pois esse transtorno impacta o desenvolvimento e limita a interação social, os desafios enfrentados por essas crianças podem variar em intensidade, o que exige uma atuação cuidadosa por parte do educador, que desempenha o papel de mediador fundamental nesse processo, para efetivar a inclusão, é essencial considerar ações específicas que possam ser implementadas de forma contínua, sempre levando em conta as capacidades e limitações de cada indivíduo. 

Deste modo, a inclusão de pessoas com deficiência na educação regular tem enfrentado grandes desafios nos últimos anos, especialmente após a aprovação do Estatuto da Pessoa com Deficiência em 2015, por meio da Lei 13.145/2015. É amplamente reconhecido que qualquer processo inclusivo, em particular no caso do Transtorno do Espectro Autista, demanda uma preparação abrangente dos espaços, dos profissionais e de todos aqueles envolvidos na convivência social e comunitária do autista, isso se deve ao fato de que crianças com Espectro Autista, enfrentam dificuldades em comunicação, interação e imaginação social. Portanto, para garantir uma inclusão efetiva, é imprescindível que todos estejam preparados e conscientes das particularidades que rodeiam essa realidade. 

Em suma, a inclusão de crianças com o Espectro, no ambiente escolar é um processo que exige uma abordagem multidimensional, que vai além da simples integração para alcançar uma verdadeira inclusão, esse desafio requer a adequação de práticas pedagógicas baseadas em evidências científicas, bem como uma formação docente contínua e de qualidade, que capacite os educadores a atenderem às necessidades específicas de cada aluno, reconhecer a heterogeneidade do espectro autista é essencial para planejar ações personalizadas, respeitando as particularidades e potencialidades de cada criança. A luta por uma educação inclusiva não é apenas uma questão pedagógica, mas também de justiça social, que demanda um compromisso coletivo com a transformação das práticas educacionais e sociais. Somente por meio de um esforço conjunto, envolvendo educadores, famílias e comunidade, será possível construir um ambiente escolar verdadeiramente acolhedor e que promova o pleno desenvolvimento e a participação dos alunos com TEA.

REFERÊNCIAS 

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1Mestranda, Programa de Pós- Graduação em Ciências da Educação- Faculdad Interamericana de Ciencias Sociales, FICS- PA/BR. E-mail: amvs-12@hotmail.com
2Doutora em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). E-mail: jaquelinebastos321@gmail.com