REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202502112232
Débora Nenci de Oliveira Nagatomo1
Natalie Correa Lima1
Paula Pimentel Valente2
Resumo
A bovinocultura é um pilar fundamental para a economia e cultura do Brasil, porém, vem sendo responsabilizada por 19% das emissões totais de gases de efeito estufa (GEE) do país, em função da fermentação entérica do gado. Para mitigar os GEE, principalmente o metano emitido pelos bovinos, a Embrapa desenvolveu o Selo Carne Carbono Neutro (CCN), representando um avanço importante na busca pela sustentabilidade na bovinocultura brasileira. A presença do selo CCN certifica a carne proveniente de sistemas integrados silvipastoris ou agrossilvipastoris, que contribuem para diminuir os GEE, melhorar a qualidade do solo e conservar a biodiversidade. Além de propiciar um ambiente mais enriquecido para os animais, com melhor conforto térmico devido ao sombreamento das árvores, reduzindo o estresse e garantindo um melhor status de bem-estar animal. Com o objetivo de avaliar o conhecimento do consumidor sobre o Selo CCN e implementar uma ação educativa, foi realizado um estudo em duas etapas. Na primeira, o consumidor respondia a um questionário pelo Google Forms, e na segunda, foi elaborado um texto ilustrativo e um vídeo informativo sobre os impactos ambientais da pecuária, a representação do selo e os resultados positivos alcançados com os sistemas integrados. Na análise sobre o impacto do selo CCN na decisão de compra de 87 consumidores que participaram da pesquisa, observou-se que, após a conscientização, a aquisição seria de 71,8% pela carne bovina com o selo, enquanto 20% permaneceram indecisos e 8,2% não comprariam, sugerindo a necessidade de informações adicionais sobre as vantagens ambientais. E, devido ao custo superior da carne com o selo CCN, 50,6% dos consumidores optariam por adquirir a carne contemplada com o referido selo, enquanto o restante não o faria devido ao custo. Portanto, pode-se concluir que promover efetivamente a carne sustentável exige aumentar a conscientização, levando em conta aspectos econômicos e educacionais.
Palavras-chave: Selo Carne Carbono Neutro; Sustentabilidade; Bovinocultura
Introdução
A bovinocultura é um pilar fundamental na economia e cultura do Brasil, mas também é um significativo emissor de gases de efeito estufa (GEE), sendo que 19% das emissões totais do país são atribuídas à fermentação entérica do gado. Este desafio foi documentado pela “Quarta Comunicação Nacional do Brasil à UNFCCC”, que registrou 1.467 teragramas de CO2e emitidos em 2016. (BRASIL, MCTI, 2020). Em resposta, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) desenvolveu o Selo Carne Carbono Neutro, uma inovação que certifica sistemas produtivos agroflorestais que integram pastagem, lavoura e floresta, conhecidos como sistemas silvipastoris e agrossilvipastoris. Estes sistemas não apenas mitigam as emissões de metano, mas também promovem um aumento na produtividade e rentabilidade agrícola, ao mesmo tempo em que contribuem para a conservação ambiental.
O Selo Carne Carbono Neutro, iniciativa da Embrapa, visa valorizar a carne bovina produzida em sistemas que buscam o equilíbrio entre as emissões de metano dos animais e a absorção de carbono pelas árvores, com o intuito de neutralizar essas emissões — daí o termo “neutro”. Espécies de rápido crescimento, como eucalipto e pinus, são preferenciais neste contexto devido à sua eficiência em sequestrar carbono. As pastagens, especialmente as variedades de braquiária brizantha, são selecionadas pela sua capacidade de tolerar sombreamento, um aspecto vital do sistema.
A abordagem da Embrapa não foca apenas na neutralização do carbono, mas busca também enfatizar a sustentabilidade geral, a eficiência produtiva e a qualidade, trazendo outros benefícios inerentes a estes sistemas integrados de produção. Ao comparar essa iniciativa com outras ações globais, percebe-se uma variedade de estratégias adotadas em diferentes partes do mundo, como a Certificação Low-Carbon Beef nos Estados Unidos, aprovada pelo USDA. Essa certificação exige que os produtores de carne reduzam suas emissões de GEE em pelo menos 10% em relação a uma média padrão da indústria (LOW CARBON BEEF, 2021; MODERN FARMER, 2021).
Contudo, a eficácia dessas iniciativas esbarra em um desafio primordial: a conscientização dos consumidores. A crescente consciência sobre as mudanças climáticas tem elevado a procura por alimentos produzidos de maneira sustentável. No entanto, a falta de informação detalhada e a dificuldade de acesso a produtos com selos ambientais ainda representam barreiras significativas a serem superadas.
Objetivo
Este estudo visa investigar o nível de conhecimento dos consumidores acerca do Selo Carne Carbono Neutro e sua relevância para a bovinocultura. O objetivo é duplo: primeiro, educar e informar o público sobre o significado e a importância do selo, esclarecendo de que maneira ele contribui para a sustentabilidade ambiental e o bem-estar dos animais; segundo ilustrar como a adoção do selo pode melhorar a responsabilidade e a consciência na produção de carne bovina. Além disso, pretende-se evidenciar o potencial do selo em agregar valor à carne bovina brasileira no mercado internacional, enfatizando a inovação e ocomprometimento do Brasil com práticas agropecuárias sustentáveis e alinhadas com as demandas contemporâneas por sustentabilidade.
Materiais e Métodos
Para este estudo, empregamos a plataforma Google Forms para desenvolver um questionário destinado a mensurar o nível de conhecimento e a conscientização dos participantes a respeito do Selo Carne Carbono Neutro. O instrumento foi projetado para educar os indivíduos não familiarizados com o tema, além de facilitar a coleta de feedback subsequente às sessões de esclarecimento. Complementarmente, procedemos com uma revisão sistemática de literatura, consultando bases de dados reconhecidas, incluindo a Embrapa, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e a CNA SENAR. Adicionalmente, examinamos outras publicações relevantes que abordavam a temática do carbono neutro e sua relação com a certificação em questão. A partir desta pesquisa, selecionamos publicações cruciais para uma avaliação crítica, visando a discussão aprofundada sobre as consequências, limitações e os desafios associados às práticas sustentáveis e à mitigação dos impactos ambientais na agropecuária.
Desenvolvimento do Questionário
O questionário foi estruturado incluindo questões objetivas e discursivas, destinadas a investigar áreas específicas como o grau de familiaridade com o Selo Carne Carbono Neutro, a valorização da sustentabilidade na produção de carne bovina e a predisposição dos consumidores a optarem por produtos certificados sob o referido selo.
Resultados e discussão
A amostra abrangeu 87 participantes, selecionados aleatoriamente, com o critério de inclusão sendo o consumo de carne bovina, sem restrições de idade, gênero ou localização geográfica. Os resultados obtidos foram os seguintes:
Gráfico I – Percentual de Pessoas Informadas sobre a Produção de Carne
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Gráfico II – Conhecimento sobre o ‘Selo Carne Carbono Neutro’ entre os Respondentes
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Gráfico III – Interesse em Aprender sobre Produção de Carne Sustentável
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Gráfico IV – Distribuição de Respostas por Estado de Residência
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Os gráficos I, II, III e IV apresentam dados sobre o conhecimento e interesse dos indivíduos em relação à produção de carne e sua sustentabilidade. No primeiro gráfico, vemos que 49,4% dos respondentes se consideram mais ou menos informados sobre como a carne é produzida, enquanto 16,5% afirmam estar bem-informados, e 34,1% não se consideram bem-informados. O segundo gráfico indica que a maioria dos entrevistados, 80%, não sabe o que é o “Selo Carne Carbono Neutro”, um indicativo de que há uma lacuna de conhecimento significativa sobre essa certificação ambiental. Notavelmente, o terceiro gráfico mostra que quase a totalidade dos participantes, 98,8%, gostaria de saber mais sobre como a carne pode ser produzida de uma maneira melhor para o planeta, refletindo um grande interesse em práticas sustentáveis. Por fim, o quarto gráfico distribui os respondentes por estado de residência, com a grande maioria, 73 pessoas, morando em São Paulo, seguido por 4 no Rio Grande do Sul, 2 em Santa Catarina, 2 em Sergipe, e 1 em cada um dos seguintes estados: Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará e Bahia, ilustrando uma amostra ilustrando uma amostra geograficamente diversificada, porém com uma concentração significativa no estado de São Paulo.
Gráfico V – Áreas de Estudo dos Respondentes
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Gráfico VI – Áreas de Atuação Profissional dos Respondentes
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Gráfico VII – Conhecimento sobre a Emissão de Metano por Bovinos e seu Impacto no Aquecimento Global
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Gráfico VIII – Conhecimento sobrea Capacidade das Árvores em Absorver Carbono e Mitigar Emissões de Metano
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Gráfico IX – Reconhecimento do Selo ‘Carne Carbono Neutro’ em Embalagens de Carne
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Gráfico X – Percepção dos Consumidores sobrea Influência do ‘Selo Carne Carbono Neutro’ na Decisão de Compra
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Gráfico XI – Preferência dos Consumidores ao Escolher Carne Com ou Sem o Selo ‘Carne Carbono Neutro’ na Loja
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Gráfico XII – Influência do ‘Selo Carne Carbono Neutro’ na Decisão de Compra de Carne pelos Consumidores a Partir do Conhecimento do seu Significado
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Os dados apresentados nas imagens revelam uma visão ambígua e em evolução dos consumidores brasileiros em relação ao “Selo Carne Carbono Neutro”. Uma porcentagem significativa de consumidores (69,4% somando as categorias “Muito provavelmente” e “Provavelmente”) indica que a presença do selo influenciaria positivamente sua decisão de compra. Isto sugere que há uma crescente conscientização sobre questões de sustentabilidade e impactos ambientais na escolha de produtos.
No entanto, ao se deparar com uma escolha direta entre carne com o selo e carne mais barata, 17,6% optariam pela carne sem o selo e mais barata. Isto pode refletir preocupações econômicas imediatas, muitas vezes sobrepondo-se a considerações ambientais. Ainda assim, cerca de 50,6% dos entrevistados prefeririam a carne com o selo, mesmo que fosse mais cara, indicando um segmento de consumidores dispostos a pagar um prêmio por práticas sustentáveis.
Além disso, uma grande porcentagem (71,8%) dos entrevistados afirmou que a presença do “Selo Carne Carbono Neutro” influenciaria positivamente sua decisão de compra a partir de agora. Isso indica uma consciência significativa sobre a importância de práticas sustentáveis na produção de carne. No entanto, ainda há 20% dos participantes que estão indecisos, respondendo “Não sei”, o que aponta para a necessidade de mais informações e educação sobre o significado e os benefícios do selo para o meio ambiente. Apenas 8,2% afirmam que o selo não influenciaria sua decisão, o que sugere que uma minoria dos consumidores pode não considerar a sustentabilidade como um fator determinante em suas compras de carne.
O cenário acima realça a importância do objetivo delineado: educar e orientar a população. Parece evidente que, enquanto o “Selo Carne Carbono Neutro” é uma iniciativa louvável, ainda há muito trabalho a ser feito para informar o público sobre sua importância e benefícios. O fato de que a carne com selo pode ser percebida como mais cara sugere que os produtores e varejistas podem precisar reavaliar sua estratégia de preços ou, alternativamente, comunicar melhor o valor agregado desse tipo de carne em termos de benefícios ambientais e de bem-estar animal.
Por fim, a incorporação desses insights pode ajudar os interessados a moldar campanhas educacionais, iniciativas de marketing e políticas públicas para promover uma produção e consumo de carne mais sustentáveis no Brasil. A adoção e promoção do “Selo Carne Carbono Neutro” pode ser uma ferramenta eficaz nesse esforço, especialmente quando acompanhada de esforços de sensibilização e educação focados.
A abordagem interdisciplinar amplia nosso entendimento sobre a sustentabilidade na produção de carne bovina, com foco especial no Selo Carne Carbono Neutro. As áreas de Biotecnologia da Reprodução e Melhoramento Genético contribuem para o desenvolvimento de raças bovinas mais eficientes e com menor emissão de metano. Mesmo considerando animais como suínos e aves, a Criação de Não Ruminantes oferece práticas sustentáveis que podem ser comparadas à pecuária bovina. A Clínica Médica e Cirúrgica voltada para os Ruminantes destaca a importância da saúde animal para uma atividade sustentável, ao passo que a Inspeção e Tecnologia dos Produtos de Origem Animal garantem a qualidade e segurança dos produtos cárneos, além de minimizar o desperdício, otimizando assim a eficiência no setor – todos esses aspectos são valorizados pelo Selo Carne Carbono Neutro.
A iniciativa do “Selo Carne Carbono Neutro” na bovinocultura brasileira marca uma evolução rumo a práticas agrícolas mais sustentáveis e responsáveis. Integrando a plantação de árvores para neutralizar as emissões de metano dos bovinos, esta ação não só combate ativamente o aquecimento global, mas também carrega a utilização de boas práticas de manejo visando o bem-estar dos bovinos e a valorização da carne brasileira em cenários globais.
Conclusão
Contudo, os dados coletados apontam uma lacuna significativa na compreensão e valorização deste selo por parte dos consumidores. Muitos ainda dão primazia a fatores econômicos imediatos, relegando os benefícios ambientais de longo prazo, ou simplesmente carecem das informações necessárias para escolhas conscientes.
Considerações finais
Para atingir nossa meta de educar e guiar a comunidade, sugerimos as seguintes estratégias:
- Desenvolver campanhas educativas: Estas devem abordar tanto os benefícios diretos do selo para o meio ambiente quanto as vantagens econômicas de longo prazo para os consumidores e produtores.
- Promoção interativa: Utilizar plataformas de mídia social para engajar o público, realizando sessões de perguntas e respostas, webinars e demonstrações virtuais sobre o funcionamento e impacto do selo.
- Parcerias com escolas: Integrar o conceito do “Selo Carne Carbono Neutro” nos currículos escolares, garantindo que as gerações futuras estejam bem-informadas sobre suas escolhas de consumo.
- Colaborações com supermercados e pontos de venda: Estabelecer parcerias com supermercados e outros estabelecimentos de venda para promover o selo, incentivando a destacá-lo nas prateleiras e educando os clientes no ponto de compra sobre sua importância e benefícios.
Reforçando a educação e sensibilização, e posicionando-as como pilares centrais da promoção do selo, o Brasil não só solidificará sua reputação como líder em sustentabilidade agropecuária, mas também trilhará um caminho mais verde e consciente para as futuras gerações.
Referências Bibliográficas
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1 Discente do Curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário das Américas
2 Docente do Curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário das América