OVERSHARENTING: A EXPOSIÇÃO EXCESSIVA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NAS PLATAFORMAS SOCIAIS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202412201534


Letícia Cardoso Nojosa


RESUMO 

Este artigo realiza um aprofundamento acerca do chamado “oversharenting”, termo de origem americana utilizado para descrever o excesso de compartilhamento de dados e imagens de crianças e adolescentes nas redes sociais de seus tutores, afim de revelar as implicações jurídico-sociais que o permeiam. Aborda, primeiramente, o caráter social do instituto, examinando, com o auxílio de estudos e pesquisas, as motivações, os riscos e as consequências do excesso de exposição, como transtornos mentais e o cyberbullying, para em seguida, o analisar juridicamente, estudando, com o auxílio da doutrina, a evolução do reconhecimento de crianças e adolescentes como sujeitos de direito no mundo e no Brasil, realizando um breve estudo também sobre as principais garantias existentes na legislação brasileira que se relacionam ao oversharenting, como o direito à imagem, à privacidade e a segurança. Por fim, traz alguns casos de exposição julgados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, averiguando em seguida as saídas e soluções que possam ser implementadas para a proteção da população infantojuvenil, contra o excesso de compartilhamento de suas vidas em ambiente virtual.

Palavras-chave: superexposição; direito; responsabilidade; redes sociais.

ABSTRACT 

This article takes an in-depth look at the so-called “oversharenting”, a term of American origin used to describe the excessive sharing of data and images of children and adolescents on their guardians’ social networks, in order to reveal the legal-social implications that permeate it. It first addresses the social nature of the institute, examining, with the help of studies and research, the motivations, risks and consequences of excessive exposure, such as mental disorders and cyberbullying, and then analyzing it legally, studying, with the help of the doctrine, the evolution of the recognition of children and adolescents as subjects of law in the world and in Brazil, also carrying out a brief study on the main guarantees existing in Brazilian legislation that relate to oversharenting, such as the right to image, privacy and security. Finally, it brings some exposition cases judged by the Court of Justice of São Paulo, then investigating the solutions and solutions that can be implemented to protect the children and youth population, against the excessive sharing of their lives in a virtual environment.

Keywords: overexposure; right; responsibility; social media.

1 INTRODUÇÃO

O ser humano é por sua natureza um ser social, segundo o filósofo grego Aristóteles, é na convivência humana que ele encontra a felicidade (Aristóteles, 384-322 a.C). Nesse sentido, surgem as redes sociais, plataformas de interação virtual que possibilitam a conexão instantânea entre milhares de pessoas em todo o mundo.

Atualmente, as redes sociais podem ser consideradas como o maior instrumento de comunicação humana, uma vez que permitem que, através de um perfil, se compartilhe experiências e informações de forma rápida e eficaz, de modo que fotos, vídeos e textos sobre algo, alguém ou pessoas que fazem parte de um mesmo círculo social são a todo momento publicados. 

Apesar disso, pouco se fala sobre o impacto das redes sociais na vida de quem é exposto por elas ou sobre a responsabilidade pelo que é compartilhado dentro das plataformas, uma vez considerado seu grande alcance. Contexto em que nasce o oversharenting.

Oversharenting, é um termo de origem americana, resultado da junção de três palavras: over, share e parenting, e se traduz como a problemática da falta de moderação ou do excesso de compartilhamento, por parte de pais e mães, de imagens e dados de seus filhos nas redes sociais.

A quantidade de pais que expõem seus filhos de forma exaustiva na internet tem crescido exponencialmente nos últimos anos (Tiches, 2023, online), contudo, embora muitos não vejam mal em compartilhar a rotina e a imagem de seus filhos nas plataformas, essa exposição pode trazer consequências e riscos, como transtornos psicológicos e alimentares.

Este trabalho, vem, assim, examinar as implicações jurídicas e sociais que envolvem o oversharenting, propondo um estudo do instituto, afim de refletir sobre a evolução dos direitos das crianças e dos adolescentes no mundo e no Brasil, bem como sobre possíveis soluções a serem aplicadas, que os assegurem uma melhor proteção de seus direitos dentro das plataformas sociais.

2. A ORIGEM DO OVERSHARENTING

A exposição da imagem e a exploração de crianças e adolescentes na mídia tradicional não é algo recente, isto porque, desde sua criação, a televisão os  tem apresentado como fonte de entretenimento aos telespectadores, sem questionar, entretanto, as consequências que os podem sobrevir em razão disso.

Como foi o caso de Shirley Temple e Judy Garland, atrizes mirins que se destacaram em Hollywood na década de 1930. Garland, iniciou a carreira de atriz aos dois anos e meio de idade, atuando em filmes como “O Mágico de Oz”. Temple, por sua vez, acendeu a fama aos três, protagonizando os filmes “Heidi” e “A Princesinha”. 

Apesar do sucesso que ostentavam, ambas posteriormente demonstraram arrependimento quanto ao passado. Garland devido aos abusos físicos e psicológicos que sofreu na adolescência, Temple, pelos trabalhos terem sido em suas palavras: “uma exploração cínica de nossa inocência infantil, que ocasionalmente era racista e sexista.” (Barreiros, 2020, online).

Embora tenha havido grande progresso jurídico no que concerne aos direitos das crianças e dos adolescentes desde então, a exposição de suas imagens continua a se repetir nos tempos atuais, dessa vez, pelo surgimento de uma nova fonte de exploração, que para além das mídias tradicionais, tem também se mostrado prejudicial a estes: as mídias sociais.

Com a criação da internet nos anos 60, durante a Guerra Fria, afim de facilitar o compartilhamento de informações à distância, o mundo passou a viver o que é conhecido como “revolução tecnológica”, que expandiu o uso da rede a nível global e levou a sociedade a utilizar a ferramenta como instrumento de trabalho, comunicação e informação. 

Cenário que resultou, nos anos 90, no surgimento das mídias sociais, plataformas de interação que, com o avanço da tecnologia, se mostraram um meio rápido e eficaz de se relacionar virtualmente, o que atraiu grande quantidade de usuários e nos trouxe ao momento atual, onde as redes sociais compõem a vida e rotina de mais da metade da população mundial. 

Dessa forma, nos dias atuais, as mídias – ou redes – sociais se manifestam como uma das principais fontes de socialização humana, permitindo a conexão de usuários em todo o mundo, que utilizam seus perfis para compartilhar histórias e experiências uns com os outros, através da publicação de fotos, vídeos, áudios e textos. 

É também devido ao alto alcance que possuem, que muitos acabam por utilizar as redes como fonte de renda, uma vez que as plataformas monetizam as contas que possuem alta visibilidade, fazendo emergir os chamados “influenciadores digitais”, que assim como os demais usuários, compartilham diariamente suas vidas pessoais com seus seguidores. 

Não obstante, a relação das mídias sociais com a exposição da imagem de crianças e adolescentes, se dá somente a partir do momento em que, por meio de seus perfis os pais ou tutores deixam de expor apenas a si mesmos e passam a expor também a imagem e a vida de seus filhos, que não possuem completa capacidade de compreender a dimensão das plataformas.

Contexto em que surge o oversharenting, termo de origem americana, criado em 2012 por Steven Leckart, manifestado primeiramente na revista eletrônica do “The Wall Street Jornal”, onde Steven escreveu matéria sob o título: “Você é um Pai ou Mãe culpado de Oversharenting? A Cura Pode Estar em Não Compartilhar nada.” (Leckart, 2012, online, tradução nossa).

A expressão é um neologismo resultado da junção de três outras palavras: over, share e parenting, traduzidas respectivamente como “excesso”, “compartilhamento” e “poder parental.” Segundo Steven “a prática consiste no hábito de pais ou responsáveis legais postarem informações, fotos e dados dos menores que estão sob a sua tutela em aplicações de internet.” (Leckart, 2012, online).

Pouco tempo depois a expressão passou a se popularizar, ganhando até mesmo definição no dicionário, o que evidenciou a necessidade de discussão do assunto, de forma que o oversharenting se tornou objeto de estudo e discussão em todo mundo, alertando a sociedade sobre os riscos de se expor excessivamente crianças e adolescentes na internet, promovendo a ideia de que toda exposição deve ser consciente, não cabendo aos pais tomar a decisão por seus filhos, que devem ser protegidos contra o uso indevido de suas imagens.

2.1 AS MOTIVAÇÕES DO OVERSHARENTING

É na atualidade o momento em que o sharenting tem tomado maior proporção, de forma que tem crescido a quantidade de pais que postam ou publicam a imagem de seus filhos reiteradamente na internet, contudo, pouco se questiona a respeito do que leva os pais a não estabelecerem para si mesmos um limite quanto a essa exposição.

Uma pesquisa realizada pela empresa britânica Nominet, responsável pelo domínio .uk, revelou que, desde o nascimento até os cinco anos de idade, as crianças de hoje terão em média novecentas e setenta e três fotos publicadas nas redes sociais de seus pais, o que equivale a cerca de cento e noventa e cinco fotos por ano. 

A pesquisa revelou também as principais plataformas utilizadas para tanto: 

O Facebook domina a forma como os pais compartilham as imagens de seus filhos, com 53% do pais afirmando carregaram as fotos pela rede social. O Instagram veio em seguida com 14%, enquanto mais de uma em cada dez, 12%, carregam as fotos pelo Twitter. (Nominet, 2015, online)

Percebe-se com estes dados, quão ordinário é a exposição da vida de crianças e adolescentes nas redes sociais. Ademais, acontecimentos como o nascimento, os primeiros passos, palavras e brincadeiras são memórias importantes para os pais, que podem querer retê-las em seus perfis, bem como as compartilhar com seus seguidores, geralmente compostos de amigos e familiares. 

Não obstante, a exposição excessiva de um filho em plataformas sociais, pode trazer consequências a curto e a longo em suas vidas, o que nos leva a questionar quais as motivações que levam à pratica do oversharenting. 

De um modo geral, podemos considerar a validação pessoal, o suporte emocional e a monetização das plataformas como as principais razões para qualquer excesso de exposição em redes sociais. Aplicando esse entendimento ao oversharenting,é possível obter uma melhor compreensão sobre quem o pratica:

A idéia da aprovação ou validação pessoal nas redes sociais se dá a partir do momento em que estas passam a ser para o indivíduo sua principal fonte de afirmação. Isto se deve ao fato de que uma das principais características das redes sociais é a capacidade de projetar em seus usuários um sentimento de reconhecimento e validação. 

Neste sentido, compartilhar a imagem de um filho e receber comentários que elogiam ou afirmam uma boa parentalidade pode fazer com que os pais se sintam mais seguros, o que os pode levar ao excesso de postagens.

De forma diferente, contudo, ocorre para os pais que utilizam as plataformas como suporte emocional, uma vez que estes buscam não a validação de sua boa parentalidade, mas sim o suporte de outros pais na criação de seus filhos, tendo em vista às dificuldades inerentes à criação de uma criança ou de um adolescente. 

Motivo também da existência de diversas páginas dentro das plataformas, criadas e administradas por psicólogos e educadores com o objetivo de auxiliá-los no exercício da parentalidade, a exemplo dos perfis “mãe fora da caixa”, “disciplina sem drama” e inspire outras, que, contudo, não conseguem eximir a quantidade de pais que acabam expondo excessivamente a vida de seus filhos no intuito de obter suporte alheio.

É possível, por fim, apontar também, a monetização das plataformas como fonte de motivação ao oversharenting, que neste caso é conhecida como “monetização infantil” e transforma crianças e adolescentes em verdadeiros “influenciadores digitais mirins.”  Trata-se de pais que recordam e publicam cada momento da vida de seus filhos, com o único propósito de lucrar através do engajamento de seus perfis.

Dessa forma, a criança é exposta constantemente, gerando renda a cada publicação. Ademais, seja qual for a razão, vídeos e fotos de crianças e adolescentes frequentemente viralizam nas redes sociais. É também em decorrência desta monetização, que muitos pais criam os perfis de seus filhos antes mesmo de seus nascimentos, compartilhando informações sobre o desenvolvimento e evolução da criança quando ainda no útero de suas mães.

2.2 AS CONSEQUÊNCIAS DO OVERSHARENTING

Ter a imagem exposta de maneira excessiva pode desencadear problemas físicos e psicológicos em que é vítima dessa exposição, dentre as consequências mais notáveis, podemos elencar a perca da noção de identidade e privacidade, além de transtornos físicos e mentais, como informa a psicanalista Claudia Pretti, vice-diretora de Relações Interdisciplinares do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM:

A restrição ou apagamento da privacidade e a excessiva exposição afetam a imagem que a criança precisa construir de si, podendo levar a quadros de ansiedade excessiva, transtornos alimentares, insegurança e distorção da imagem, e ainda depressão, entre tantos outros.” (Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2023, online)

Neste sentido, é natural que as crianças e os adolescentes, à medida que amadurecem, passam a se preocupar mais com a repercussão da própria imagem. Ademais, as consequências do oversharenting não surgem de forma imediata, mas com o decurso do tempo. Como explica Isabella Paranaguá, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Piauí – IBDFAM-PI.

Muitos pais não imaginam que os filhos podem se sentir preocupados e terem problemas de imagem e aprovação, alguns podem, no futuro, se sentir constrangidos por não quererem tantos detalhes íntimos de suas vidas compartilhados publicamente sem seu consentimento (Paranaguá, 2023, online)

Concernente a esse assunto, uma pesquisa feita pela Universidade de Washington-EUA, revelou como as crianças se sentem em relação ao sharenting, bem como a forma com que gostariam que seus pais se comportassem na internet. Como resultado, os pesquisadores chegaram à conclusão de que elas desejam mais autonomia no uso das plataformas e acreditam que os pais não deveriam compartilhar suas imagens sem que haja prévio consentimento. (Langston, 2026, online)

Dessa forma, percebe-se como o Oversharenting atinge a saúde mental de suas vítimas, ademais a alta repercussão das publicações e as consequentes opiniões, críticas e comentários os afetam, principalmente aos adolescentes, naturalmente sujeitos a crises de identidade e baixa autoestima durante essa fase da vida.

2.3 OS RISCOS DO OVERSHARENTING

Não obstante, o oversharenting não gera riscos apenas à saúde psicológica das crianças e dos adolescentes, mas também tem o poder de os expor a situações de real perigo e insegurança, uma vez que as redes sociais possuem alto alcance e uma publicação pode ser facilmente encontrada e acessada por pessoas mal-intencionadas.

Ademais, as redes sociais ainda não se configuram como um local seguro para qualquer excesso de exposição, isto porque, embora possuam mecanismos de segurança e privacidade, estes têm se mostrados ineficazes diante da quantidade de usuários existentes, o que as tornam de difícil controle.

Como demonstra o caso de JinMiram, criança coreana que viralizou em 2019 após ter tido sua imagem publicada no perfil de sua mãe. A mãe de JinMiram não conseguiu impedir que as fotos da criança se propagassem em todo o mundo, apesar de ter acionado as plataformas para que retirassem a imagem de sua filha de circulação. (Lícia, 2022, online)

Desta forma, postagens que contenham a imagem de crianças ou adolescentes em situações constrangedoras, vulneráveis ou que revelem informações como a localização, a rotina e os horários de um menor, podem alcançar um número indeterminado de pessoas, se tornando um valioso instrumento nas mãos de criminosos que as podem usar para planejar e executar seus ilícitos, como o cyberbullying e a pedofilia.

Nesse sentido, os dados digitais armazenados pelas plataformas tornam o oversharenting ainda mais arriscado, afetando diretamente a privacidade e a segurança de quem é exposto, como explica a advogada Isabella Paranaguá, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Piauí – IBDFAM-PI:

Com a excessiva divulgação de detalhes da vida pessoal, o cotidiano fica exposto, ficando fácil de identificar os locais frequentados pela criança ou adolescente. Por isso que pode haver exploração indevida de fotos e informações por terceiros com finalidades criminosas dentro e fora da internet (Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2023, online)

Os principais delitos de que são vítimas as crianças e os adolescentes sujeitos ao oversharenting são o cyberbullying e a pedofilia. Um estudo realizado pela Ouvidoria Nacional de Direito Humanos apontou uma alta nos últimos registros de crimes sexuais contra crianças e adolescentes no Brasil em ambiente virtual:

Apenas no primeiro semestre de 2022, mais de 78 mil denúncias foram registradas pela Ouvidoria. Deste total, 1,1 mil estão ligados a crimes de violência sexual que afetam a liberdade física ou psíquica da população infantojuvenil. Em comparação a 2020, os números do primeiro semestre do ano passado indicam alta de 97,6%. Em relação a 2021, o aumento foi de 80,1%. (Nazar, 2023, online)

O delito consiste em produzir, publicar, vender ou armazenar pornografia infantil na rede mundial de computadores, sua relação com o oversharenting se dá a partir do momento em que os pais expõem a fotos de crianças nuas ou seminuas em seus perfis, ainda que de forma não intencional, correndo o risco de ter a imagem de seus filhos publicadas em sites de pornografia infantil.

O fenômeno também pode ser percebido em redes sociais como o TikTok e Instagram, onde pais que publicam vídeos de seus filhos têm seus posts salvos e compartilhados por perfis desconhecidos, possivelmente para fins ilícitos. Além do mais, com o avanço da tecnologia, muitos criminosos tem utilizado o recurso do “DeepFake”, técnica que permite alterar imagens com o uso da inteligência artificial, produzindo e simulando cenas pornográficas com as fotos publicadas nas plataformas.

Da mesma forma, o cyberbullying também se manifesta como um mal atrelado ao oversharenting. Uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde – OMS, constatou que uma a cada seis crianças são vítimas de cyberbullying (Lorenzo, 2024, online). Já a última pesquisa global que trata a respeito das agressões registradas na internet, apontou que o Brasil é o segundo país em que as ofensas em meio digitais são mais frequentes. (Garcia, 2024, online).

O delito se caracteriza pela prática de perseguição e intimidação por meio de ofensas e difamações em ambiente virtual, de forma a comprometer a segurança e a autoestima da vítima, afetando por isso, as crianças e os adolescente exposto dentro das plataformas.

3. CRIANÇAS E ADOLESCENTES COMO SUJEITOS DE DIREITO

Partindo para a análise jurídica do instituto, tem-se como inevitável a ideia de que, para se compreender as implicações jurídicas do oversharenting, se permeie a história afim de entender o momento em que as crianças e os adolescentes passaram de meros objetos de “tutela” e “proteção” para serem reconhecidas como sujeitos de direito. Para tanto, este artigo empregará o uso da doutrina.

Ao contemplarmos o período da Idade Antiga (3.500 a.C – 476 d.C), precisamente a época do Império Romano, vemos que as crianças e os adolescentes – assim como os demais membros familiares – se viam submetidos a estrutura do “pater familiae”, segundo a qual, a figura paterna representava o sacerdote, o senhor e o magistrado do lar, como denota Aurea Pimentel Pereira:

Sob a auctoritas do pater familias, que, como anota Rui Barbosa, era o sacerdote, o senhor e o magistrado, estavam, portanto, os membros da primitiva família romana (esposa, filhos, escravos) sobre os quais o pater exercia os poderes espiritual e temporal, à época unificados. No exercício do poder temporal, o pater julgava os próprios membros da família, sobre os quais tinha poder de vida e de morte (jus vitae et necis), agindo, em tais ocasiões, como verdadeiro magistrado. Como sacerdote, submetia o pater os membros da família à religião que elegia (PEREIRA, 1991. p. 23)

O pater era, portanto, responsável por exercer poder absoluto sobre a vida de seus filhos, de forma que estes não possuíam qualquer direito que os diferenciassem dos adultos, sendo vistos como mera propriedade, condição que os deixavam expostos à grande insegurança, principalmente aos nascidos com algum tipo de comorbidade. 

As crianças eram, portanto, “patrimônio” do Estado. No Oriente, era comum o sacrifício religioso de crianças, em razão de sua pureza. Também era corrente, entre os antigos, sacrificarem crianças doentes, deficientes, malformadas, jogando-as de despenhadeiros; desfazia-se de um peso morto para a sociedade. A exceção ficava a cargo dos hebreus, que proibiam o aborto ou o sacrifício dos filhos, apesar de permitirem sua venda como escravos. (Maciel, 2024, p.25).

Olhando para a Idade Medieval, por sua vez, vemos que as crianças e os adolescentes passaram a ser tratados como verdadeiros adultos, aprendendo a realizar as tarefas do dia a dia e a trabalhar, contribuindo para a economia familiar. Além disso, esse período foi marcado pelo crescimento do cristianismo, que trouxe tanto benefícios como malefícios à população infantojuvenil, como explica Katia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel:

Por meio de diversos concílios, a Igreja foi outorgando certa proteção aos menores, prevendo e aplicando penas corporais e espirituais para os pais que abandonavam ou expunham os filhos. Em contrapartida, os filhos nascidos fora do manto sagrado do matrimônio (um dos sete sacramentos do catolicismo) eram discriminados, pois indiretamente atentavam contra a instituição sagrada, àquela época única forma de se constituir família, base de toda sociedade. (Maciel, 2024, p.25).

O período moderno, contudo, trouxe mudanças significativas para a civilização como um todo, isto porque foi marcado pelas ideias do iluminismo, que desencadeou as conhecidas revoluções liberais do século XVIII e resultou em uma profunda transformação política, social e cultural no mundo ocidental, abrindo margens para o reconhecimento de direitos fundamentais como a igualdade e a liberdade dos indivíduos:

O reconhecimento da igualdade e liberdade dos indivíduos constituirá a base das primeiras declarações de direitos (a exemplo da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, na Revolução Francesa em 1789, ou a Declaração de Direitos de Virgínia, de 1776), as quais por sua vez formarão os pilares jurídicos do poder republicano. (Zapater, 2023, p.11).

Nesse contexto, como resultado do enfraquecimento da monarquia, a família passou a ser vista como a base natural da sociedade, momento em que a criança ganhou maior importância na sociedade, sob o discurso de que deve ser preservada e cuidada em razão de sua força de trabalho, surgindo a partir de então uma melhor ideia do que seria a responsabilidade parental.

Progressivamente, forma-se uma ideia de responsabilidade parental, pela qual os pais passam a ser considerados cada vez mais responsáveis pela felicidade e a infelicidade dos filhos, embora ainda não reconhecida sequer como pessoa … a criança ganha importância na sociedade, com contribuição de um discurso econômico segundo o qual ela passa a ser vista como força de trabalho, o que justifica ser preservada e cuidada pela família (e especialmente por sua mãe, como mencionado) para que sobrevivesse à infância. (Zapater, 2023, p.11).

Na segunda metade deste mesmo século, em decorrência da Revolução Industrial, as crianças que trabalhavam em zona rural, passavam agora a integrar as grandes indústrias, exercendo trabalhos repetitivos e com cargas exaustivas, situação que se manteve até o início do século XX, onde começou a emergir na sociedade uma maior consciência e preocupação a respeito das crianças e dos adolescentes, que não podiam mais ser vistos e tratados de maneira idêntica aos adultos.

Preocupação que resultou, em 1924, na Declaração Dos Direitos das Crianças de Genebra, adotada pela Assembleia da Ligas das Nações, reconhecendo que a humanidade deve dar à criança o melhor que tem, afirmando seus deveres, independentemente de qualquer consideração de raça, nacionalidade ou credo, bem como que as crianças ser protegidas contra todo tipo de exploração.

Não obstante, foi somente após a Segunda Guerra Mundial, que as crianças e os adolescentes – especialmente aquelas nascidas nos países vencedores – deixaram de ser vistas como mera fonte de auxílio no sustento familiar e passaram a ser melhor diferenciadas dos adultos, principalmente os adolescentes, que agora passavam mais tempo fora da escola. 

É somente após a Segunda Guerra Mundial que se dá a “invenção da infância e da adolescência” em um formato mais próximo do que concebemos nessas primeiras décadas do século XXI. Nesse período, a chamada “Era de Ouro” vivida pelos países vencedores do conflito (em especial os EUA) contava com uma realidade de prosperidade econômica e pleno emprego, o que possibilitou às novas gerações de jovens com idades entre 14 e 20 anos usufruir de tempo livre fora da escola (onde passaram a poder permanecer por mais anos do que ocorrera com seus pais) e de seus salários para gastos individuais (e não sustento da família) (Zapater, 2023, p.13)

Foi também neste momento, em que se reconheceu a universalidade dos direitos humanos e que a discussão a respeito dos países de “Terceiro Mundo” ganhou força, o que atraiu os olhares às crianças em situação de vulnerabilidade social e aumentou o debate a respeito da pobreza e das altas taxas de natalidade desses países, resultando na produção de dois documentos que impactaram a história no que tange à proteção das crianças e dos adolescentes:

Dois documentos modificaram o entendimento a respeito de crianças e adolescentes, impactando o percurso histórico das instituições sociais: “Declaração Universal dos Direitos da Criança promulgada pela Organização das Nações Unidas” – ONU –, em 1959, e a publicação do livro de Philippe Ariès (1961), L’enfant et la vie familiale sous l’ancien régime. Apesar de críticas que lhes foram feitas, ambos os textos instalaram discursos e práticas sobre a infância e as crianças contemporâneas. (Rosemberg, 2010, apud, Zapater, 2023, p.14).

4. A EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO DIREITO BRASILEIRO

Aproximando o estudo feito no capítulo anterior, acerca da evolução do reconhecimento das crianças e dos adolescentes como sujeitos de direito à realidade brasileira, podemos compreender como aqui esse reconhecimento se manifestou.  

Uns dos primeiros marcos de proteção às crianças a ser instituído no Brasil, ocorreu em 1726, quando foi implementada pela Santa Casa da Bahia a primeira “roda dos expostos”. A estrutura geralmente ficava em conventos era utilizada para abrigar bebês abandonados, que ali eram colocados anonimamente. Assim que recolhida, a criança recebia um registro, um nome e uma ama de leite, podendo permanecer na congregação até sua adoção ou independência.

Mais adiante, em 1890, foi promulgado o Código Criminal da República, que permitiu a penalização de crianças entre 9 e 14 anos, que tenham “obrado com discernimento”. Já no ano de 1923, foi criado o primeiro juizado de menores, localizado no Rio de Janeiro. 

Um marco importante também para a história brasileira no que tange à proteção infantojuvenil, foi o caso do menino Bernadino, que em 1926, sofreu abusos físicos e sexuais após ser preso e obrigado a dividir uma cela com mais 20 homens. O fato gerou grande debate a respeito da maioridade penal e levou o então presidente Whashington Luiz a assinar o Código de Menores de 1927, que trouxe como 18 anos a idade mínima para ser punido no Brasil.

Já em 1942 foi criado o “Sistema de Assistência aos Menores.” No ano de 1964, por sua vez, foi criada a Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor, regulada pela Lei 4.513/64.  Em 1974 foi instituído a Lei 5.274, determinando em 14 anos a idade mínima para se tornar um aprendiz profissional e no ano de 1979 foi aprovado o 2º Código de Menores.

Por fim, foi promulgada a Constituição Federal de 1988, bem como o Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, legislações que trouxeram novos e importantes direitos a serem abordados posteriormente neste artigo. Cabe, contudo, mencionar, que a proteção às crianças e os adolescentes não foi admitida apenas na Constituição de 1988, mas também esteve presente em outras Constituições, como a de 1934 que destinava à União o amparo à maternidade e a infância.

5. PROTEÇÃO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A Constituição Federal de 1988 – CRFB/88 (Brasil, 1988) também conhecida como “Constituição Cidadã”, diferentemente das demais, trouxe em seu rol inúmeros direitos e garantia sociais às crianças e aos adolescentes, isto porque sua promulgação se deu logo após ao período ditatorial vivido pelo país desde 1964 e contou com a participação de alguns movimentos protetivos à infância e juventude, como explica Maira Cardoso Zapater:

Será somente durante a transição para a democracia, após os 21 anos da ditadura militar, que se realizarão no Brasil os debates sobre o reconhecimento legal da garantia dos direitos e da proteção da criança e do adolescente. A Assembleia Nacional Constituinte, realizada entre 1987 e 1988, contará com a participação de movimentos sociais como o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, trazendo suas principais reivindicações, e também com campanhas como a Campanha Criança e Constituinte (Pinheiro, 2024, p.344, apud, Zapater, 2023, p.22)

O Movimento Nacional de Meninos e Meninas de rua surgiu em razão de uma mobilização de pessoas em todo o território nacional que tinham em comum o objetivo de defesa aos direitos de crianças e adolescentes rotulados como “abandonados” ou “de rua”. O movimento se reuniu pela primeira vez em 1984 e foi de grande importância para a inclusão dos direitos infanto-juvenis na Constituição de 1988, como assinala Maciel:

O MNMMR foi um dos mais importantes polos de mobilização nacional na busca de uma participação ativa de diversos segmentos da sociedade atuantes na área da infância e juventude. O objetivo a ser alcançado era uma Constituição que garantisse e ampliasse os direitos sociais e individuais de nossas crianças e adolescentes.” (Maciel, 2024, p.27).

Assim, rompendo com a tradição anterior, que enxergava as crianças e os adolescentes apenas como meros objetos de “tutela”, a Constituição de 1988 trouxe a eles uma proteção integral, os enxergando como verdadeiros sujeitos titulares de direito.

Nesse sentido passou a obrigar não somente a família, mas também a sociedade e o Estado à proteção infantojuvenil, o que colocou Brasil na posição de uma das nações mais avançadas na defesa de seus direitos.

Dessa forma, pela primeira vez, uma constituição brasileira passou a possuir dispositivos próprios, especificamente voltados à proteção de crianças e adolescentes, assegurando seus direitos a vida, a saúde, a alimentação, a educação, ao lazer, a profissionalização, a cultura, a dignidade, ao respeito, a liberdade e a convivência familiar e comunitária, se opondo a toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Tais disposições são encontradas no Título VII, Capítulo VII da Carta, que trata sobre a família, a criança, o adolescente e o idoso, bem como nos arts. 227 a 229 que tratam dos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes e dos deveres da família, da sociedade e do Estado perante aqueles:

CAPÍTULO VII Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Além disso, é neste mesmo artigo que a Constituição estabelece padrões orçamentários para que o Estado cumpra com suas obrigações perante as crianças e aos adolescentes (Art.227, §1), bem como estabelece a proteção contra o trabalho infantil, passando a adotar a idade de quatorze anos, como a mínima para o exercício laboral (Art. 227, §3, I)

Cabe mencionar também, dentre o extenso rol dos direitos e determinações com teor infantojuvenil tragos pela Carta Magna de 1988, a inimputabilidade penal de crianças e adolescentes menores de dezoito anos, estabelecido no artigo 228, bem como a reciprocidade no dever de assistência entre pais e filhos, que tem o dever de amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, conforme estabelece o artigo 229:

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.

Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

6 PRINCÍPIOS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Brasil, 1990), foi promulgado em 13 de Julho de 1990 e assim como a Constituição de 1988, teve sua criação influenciada por movimentos de defesa aos direitos infanto-juvenis, aumentado, portanto, a capacidade de proteção daquilo que já estava estabelecido pela Carta Magna.

Não obstante, o Estatuto da Criança e do Adolescente, é atualmente reconhecido como o maior marco da história de proteção às crianças e adolescentes no país, trazendo um conjunto de normas que buscam preservar e garantir seus direitos, sendo totalmente inspirado na Declaração Universal dos Direitos da Criança – 1979 e na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança – 1989.

Este capítulo, contudo, se aterá a fazer uma breve análise – com o auxílio da doutrina – a respeito de sua base principiológica, a saber: o princípio da proteção integral, da prioridade absoluta e do melhor interesse da criança, afim de posteriormente comentar os principais direitos infanto-juvenis contidos no Estatuto, que se relacionam diretamente à prática do Oversharenting.

A doutrina da proteção integral ou princípio da proteção integral, está disposta no artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente:

 Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Tal princípio se traduz na ideia de que as crianças e os adolescentes não devem ser considerados como meros objetos de tutela, mas sim como sujeitos de direito, destinatários de proteção integral pelo Estado, pela família e pela sociedade, que devem zelar pela sua vida, liberdade e segurança, como assinala Maira Cardoso Zapater:

O princípio da proteção integral consiste na consideração de crianças e adolescentes como pessoas em peculiar condição de desenvolvimento, a quem se atribui a qualidade de sujeitos de Direito, independentemente de exposição a situação de risco ou de eventual conflito com a lei49. Esta qualidade os torna titulares de direitos tais como a vida, a liberdade, a segurança, a saúde, a educação e todos os outros direitos fundamentais individuais e sociais, como todas as demais pessoas. (Zapater, 2023, p. 29).

O princípio da Prioridade Absoluta, por sua vez, está disciplinado no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente e consiste na ideia de que as políticas públicas que forem voltadas às crianças e adolescentes, devem ter prioridade absoluta em relação às demais, isto devido à condição de desenvolvimento e baixa autonomia que possuem, como assinala a mesma autora:

É um dos princípios informadores do Direito da Criança e do Adolescente, como reflexo do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e com âmbito reduzido de autonomia e ingerência de si próprio, que justifica a preferência a ser dada ao exercício de seus direitos” (Zapater, 2023, p. 29).

ECA, Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

O princípio do melhor interesse da criança ou do interesse superior, por sua vez, se encontra expresso na Declaração de Direitos da Criança (1959) e na Convenção dos Direitos da Criança (1989), ambas ratificadas pelo Brasil, sendo também disciplinado pelo Estatuto:

ECA 1990, Art. 100, parágrafo único, IV – interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;

Tal princípio, entretanto, é considerado genérico, razão pela qual enfrenta problemas e discussões ao ser aplicado, como aponta Katia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel:

O princípio, contudo, também é objeto de críticas. Sua imprecisão, seu conteúdo por demais vago, tornam difícil sua aplicação e lhe conferem enorme margem de discricionariedade, sujeitando-o a acepções e percepções pessoais. De fato, a redação do art. 100, parágrafo único, IV, que trata expressamente do interesse superior da criança e do adolescente, pouco esclarece. Destina-se mais a orientar aparente conflito entre interesses legítimos. (Maciel, 2024, p.36).

7 DIREITOS CONECTADOS AO OVERSHARENTING

7.1 DIREITO À IMAGEM

O direito à imagem, consiste na vedação da exposição ou utilização da imagem de alguém sem permissão, e integra o rol de direitos fundamentais expostos no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que o considera inviolável, razão pela qual também assegura indenização caso haja seja afrontado e seu uso indevido atinja a honra, a boa-ama ou o respeito do ofendido, ou ainda, que se destine a fins comerciais.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.

No Estatuto da Criança e do Adolescente, também podemos encontrar a proteção da imagem, previsto em seu artigo 17:

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.

Desta forma, a imagem é um direito indispensável às crianças e aos adolescentes, uma vez que está ligada diretamente a noção de dignidade do ser humano, sendo essencial que o Estado, a sociedade e os pais zelem pela imagem de suas crianças, principalmente durante o uso das plataformas sociais.

7.2 DIREITO À SEGURANÇA

O direito à segurança está previsto na Constituição Federal de 1988 e está intrinsicamente relacionado ao princípio da proteção integral, estabelecido no Estatuto da Criança e do Adolescente, de forma que cabe a todos – familia, sociedade e Estado – o dever de zelar pela segurança da população infantojuvenil.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão 

Nesse sentido, estabelece também a Carta Constitucional (Art. 227, § 4º) que cabe ao Estado a realização de políticas públicas que garantam às crianças e aos adolescentes a proteção de seus direitos e os resguardem de discriminações, violência, desigualdades e opressões, como dispõe também o artigo 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.

CF, 227 § 4º da Constituição: A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.

Assim, o direito à segurança busca a proteção solidária – familia, sociedade, Estado – da população infantojuvenil, assegurando a vida, a saúde e a moradia, afim de guardar a integridade física e psicológica das crianças e dos adolescentes, sendo imprescindível sua aplicação no estudo do oversharenting, em vista dos riscos que traz consigo.

7.3 DIREITO À PRIVACIDADE

As crianças e os adolescentes são pessoas naturais dotadas de personalidade, motivo pelo qual são titulares de direitos, como o direito à privacidade estabelecido no Artigo 5, X da Constituição Federal, que visa garantir sua liberdade individual, protegendo a vida privada:

Art. 5, X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Da mesma forma concorda o Estatuto da Criança e do Adolescente, assegurando que a promoção dos direitos infanto-juvenis deve ser efetuada como respeito a sua vida privada:

V – privacidade: a promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada

A privacidade, portanto, se associa à dignidade e ao respeito, de forma que cabe sobretudo aos pais assegurar o bem estar de seus filhos, guardando sua privacidade e intimidade, principalmente no uso das mídias sociais, uma vez que não possuem pleno discernimento e autonomia para autorizar a divulgação e a exposição de sua imagem.

7.4 DIREITO AO ESQUECIMENTO

Por fim, podemos elencar o direito ao esquecimento – ou direito de ser esquecido – intrinsecamente ligado à privacidade. É este, o direito que uma pessoa possui de não permitir que um fato ocorrido em determinado momento de sua vida seja perpetuamente lembrado ou repercutido, causando-lhe transtornos. Como assinala Anderson Schreiber:

O direito ao esquecimento é, portanto, um direito (a) exercido necessariamente por uma pessoa humana; (b) em face de agentes públicos ou privados que tenham a aptidão fática de promover representações daquela pessoa sobre a esfera pública (opinião social); incluindo veículos de imprensa, emissoras de TV, fornecedores de serviços de busca na internet etc.; (c) em oposição a uma recordação opressiva dos fatos, assim entendida a recordação que se caracteriza, a um só tempo, por ser desatual e recair sobre aspecto sensível da personalidade, comprometendo a plena realização da identidade daquela pessoa humana, ao apresenta-la sob falsas luzes à sociedade.(Screiber, 2019, p.376, apud, Cavalcante, online)

Embora tenha grande relevância ao se tratar do Oversharenting – a fim de que posteriormente possa ser determinado o apagamento dos dados coletados durante a infância ou adolescência de um menor – o direito ao esquecimento não está previsto na Constituição Federal, tampouco no ECA, razão pela qual é grande alvo de discussões. 

Não obstante, alguns autores afirmam sua existência, que se dá também em decorrência da dignidade da pessoa humana, ou ainda da privacidade, intimidade e honra previstas na Carta Magna, o que, contudo, não impediu o STF de concluir sua incompatibilidade com a Constituição Federal. (RE1010606).

8 LEI DE PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS

A Lei de Proteção de Dados Pessoais – LGPD, instituída pela Lei nº 13.709/2018 foi promulgada em 14/08/2018 e se aplica a todos as organizações que processem dados de cidadãos brasileiros, promovendo a proteção dos dados físicos e digitais. Seu principal objetivo, é portanto, garantir a privacidade, conferindo a seus titulares o direito de acessar, corrigir e excluir dados.

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.

No que concerne às crianças e aos adolescentes, a Lei de Proteção de Dados Pessoais, possui ampla determinação, com seção específica, aplicando o princípio do melhor interesse aos dados coletados, que não poderão ser tratados sem o consentimento dos pais ou responsáveis legais.

Art. 14. O tratamento de dados pessoais de crianças e de adolescentes deverá ser realizado em seu melhor interesse, nos termos deste artigo e da legislação pertinente.

§ 1º O tratamento de dados pessoais de crianças deverá ser realizado com o consentimento específico e em destaque dado por pelo menos um dos pais ou pelo responsável legal.

Traz também em seu texto, que as informações fornecidas pelos controladores deverão ser claras e objetivas, adequadas ao entendimento dos pais e das crianças:

§ 6º As informações sobre o tratamento de dados referidas neste artigo deverão ser fornecidas de maneira simples, clara e acessível, consideradas as características físico-motoras, perceptivas, sensoriais, intelectuais e mentais do usuário, com uso de recursos audiovisuais quando adequado, de forma a proporcionar a informação necessária aos pais ou ao responsável legal e adequada ao entendimento da criança.

Essa preocupação demonstra a importância de se considerar sobre o tratamento de dados de crianças e adolescentes no Brasil, principalmente para aqueles que, em decorrência do oversharenting, acabam expostos excessivamente nas plataformas sociais, prejudicando sua atual e futura privacidade.

9 CASOS DE OVERSHARENTING NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Embora, a discussão a respeito do sharenting e do overhsarenting seja recente no Brasil, analisando a jurisprudência do Tribunal do Estado de São Paulo, podemos encontrar alguns casos que se relacionam diretamente ao instituto. 

A exemplo da ação civil de um genitor que ingressou em juízo em desfavor da mãe de seu filho, em razão da genitora ter divulgado nas redes sociais a foto da criança sem sua autorização, tornando pública sua condição de portador de Transtorno do Espectro Autista – TEA, pleiteando por isso a condenação da ré à remoção da postagem, além de indenização por danos morais. 

Na publicação em questão, a mãe descrevia sua reação e sentimento ao descobrir o transtorno da criança, contudo o Tribunal entendeu que a genitora estava apenas exercendo seu direito à liberdade de expressão, e que imagem não ofendia à dignidade do menor:

Direito de imagem. Postagem, pela mãe, em rede social, acerca da doença de seu filho (autismo). Contrariedade do pai. Não cabimento. Embora se deva evitar a superexposição dos filhos em redes sociais, privilegiando a proteção à imagem e à intimidade do incapaz, necessário balizar tais direitos fundamentais com a liberdade de expressão da genitora. Postagem que não ofende ou desmoraliza o infante. Teor do texto publicado que demonstra preocupação e afeto com o menor. Sentença mantida. Recurso desprovido.”. (TJSP, Ap. Civ. º 1015089-03.2019.8.26.0577, 6ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Vito Guglielmi, julg. 13.7.2020, grifo nosso)

Podemos apontar também o caso de um adolescente, que, representado por seu pai ajuizou ação cível contra o Facebook – responsável pelo Instagram – alegando que possuía conta na plataforma e que após publicar um vídeo no qual foi hostilizado em um jogo de futebol, no qual inclusive recebeu o apoio dos jogadores, teve sua conta banida, por ser menor de idade. Pela qual pugnou pela reativação da conta e por indenização a título de danos morais. 

Em defesa, a plataforma expôs suas regras, ressaltando a proibição de menores de 14 anos na plataforma. Em sua decisão, contudo, o juiz fundamentou que, ao contrário do que sustenta a plataforma, suas diretrizes autorizam a criação de contas para crianças, desde que supervisionadas por seus pais, além disso entendeu que não há indícios da prática sharenting:

Também não há indícios de publicações excessivas e irrazoáveis, comprometendo o bem estar da criança, no fenômeno conhecido como “sharenting”. Os elementos dos autos apontam que a conta é favorável ao desenvolvimento da criança, com participação em eventos construtivos para celebrar a união (fls. 54), inclusive gerando retornos financeiros, o que favorecerá o seu desenvolvimento sadio, sendo certo que sequer há alegação de prejuízos ao menor.

Logo, o bloqueio da conta foi absolutamente ilícito, contrário às previsões legais e ao próprio termo de uso da plataforma, de modo que a obrigação de fazer postulada na inicial deverá ser acolhida, com confirmação da liminar. (TJSP. Procedimento Comum Cível. Defeito, nulidade ou anulação. 100176717,2022.8.26.0477. 3º Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, grifo nosso)

Podemos trazer por fim, caso do mesmo Tribunal, onde entendeu-se que, embora determinada genitora possuísse a guarda unilateral de sua filha, o genitor também é detentor de poder familiar, de modo que estaria autorizado a tirar, postar e publicar fotos e vídeos sobre a  menor em suas redes sociais, sem que haja necessidade de consulta prévia ou autorização da mãe da criança:

PUBLICAÇÃO NÃO AUTORIZADA DE IMAGEM. PEDIDO DE REMOÇÃO. DANOS MORAIS. Insurgência da autora contra sentença de improcedência dos pedidos de remoção de publicação de imagem e de reparação por danos morais. Sentença mantida. Publicação de imagem da autora, menor incapaz, pela atual esposa de seu genitor. Ausente de qualquer ilegalidade. Desnecessidade de autorização da genitora guardiã para que se tire uma foto da criança e se publique em rede social. Genitor que, embora não tenha a guarda, também detém o poder familiar. Consentimento presumido para a atual esposa. Danos morais. Inocorrência. Ausência de ato ilícito. Não comprovado, ademais, suposto dano a qualquer direito da personalidade da autora, o que essencial na hipótese, tendo em vista não se tratar de publicação com finalidade comercial (Súmula 403 do STJ). Honorários de sucumbência na reconvenção. Não cabimento. Reconvenção extinta liminarmente, sem intimação para resposta da reconvinda. Recurso desprovido. (TJSP;  Apelação Cível 1006211-36.2017.8.26.0003; Relator (a): Carlos Alberto de Salles; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional III – Jabaquara – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 11/06/2019; Data de Registro: 11/06/2019, grifo nosso)

10. IMPLICAÇÕES JURÍDICAS E SOLUÇÕES AO OVERSHARENTING 

Dessa forma, se percebe a necessidade da existência de soluções jurídicas compatíveis ao ordenamento brasileiro que façam valer a determinação da busca pelo melhor interesse da população infantojuvenil, princípio essencial presente no Estatuto da criança e do adolescente – ECA.

10.1 RESPONSABILIDADE CIVIL

Como visto em análise jurisprudencial, é comum a busca pela responsabilidade civil daquele pratica o oversharenting, uma vez que o excesso de exposição de dados de um menor nas redes sociais pode prejudicar sua segurança, imagem e privacidade, se configurando por isto, ato ilícito evidente, passível de reparação, como se pode extrair da redação dos artigos 187  e 927 do Código Civil:

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.   

Não obstante, essa responsabilidade não deve recair somente sobre os pais ou responsáveis do menor exposto, mas também sobre as empresas provedoras. Apesar disso, no Brasil, essa responsabilidade só ocorre de fato, se houver determinação judicial para a retirada do conteúdo, conforme dispõe a Lei 12.965/2014, conhecida como “marco civil da internet” ao discorrer sobre a responsabilidade dos provedores pelos danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros:

Art, 19 § 3º As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.

10.2 REGULAMENTAÇÃO DAS REDES SOCIAIS

Com a alta da discussão a respeito do oversharenting, surgiu também o debate sobre a regulamentação das redes sociais. Dessa forma, cabe mencionar o projeto de Lei 2630/2020, conhecido como “Projeto de Lei das Fake News”, que se propõe a combater a disseminação de notícias falsas e a desinformação nas plataformas.

Ademais, um estudo internacional, realizado pela empresa Norte Americana Lake Research Partners, publicado pelo Jornal Hoje (Rede Globo, 2024) constatou que a maior parte dos brasileiros acredita que as plataformas de redes sociais não protegem a população de crimes como o racismo e contra crianças e adolescentes e mulheres, revelando que também que os brasileiros estão preocupados como as plataformas que lucram com a disseminação de notícias falsas. 

No entanto, o projeto tem enfrentado bastante críticas, pois embora se concorde que sobre a necessidade de regulamentação das redes afim de se inibir conteúdos ilegais, muitos usuários se vêm preocupados sobre seu possível impacto na liberdade de expressão na privacidade das redes, de forma que o projeto ainda não tem aprovação garantida

10.3 POLÍTICAS PÚBLICAS DE CONSCIENTIZAÇÃO

Compreendendo os aspectos jurídicos do oversharenting, bem como a determinação da proteção integral estabelecida no artigo 227 da Constituição Federal, segundo a qual incumbe não somente o Estado a mas toda sociedade e família a proteção das crianças e dos adolescentes, podemos concluir que o método mais eficaz de combate ao oversharenting é a conscientização da sociedade a respeito de seus riscos e consequências.

Isto porque, não obstante o papel fundamental do Estado de proteção às crianças, este deve contar com a mediação dos familiares e dos pais, que devem fazer um uso responsável das plataformas, de modo a assegurar o tratamento adequado dos dados e informações de suas crianças. Dessa forma, se faz imprescindível a adoção de políticas públicas que busquem alertar e melhorar a compreensão da população acerca do oversharenting.

11. CONCLUSÃO

O estudo proposto pelo presente artigo propôs, portanto, o debate a respeito dos aspectos sociais e jurídicos do oversharenting, analisando sua origem, desde à mídia tradicional até o uso das mídias sociais, com o advento da internet, bem como as motivações, os riscos e consequências que dele decorre. 

Com o auxílio da doutrina, investigou e estudou a história afim de se descobrir momento em que as crianças e os adolescentes deixaram de ser considerados objetos de mera “tutela” e “proteção” e passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direito, no Brasil e no Mundo, bem como a evolução da legislação brasileira no que tange a proteção de seus direitos.

Analisou também como a se dá a proteção dos menores no atual ordenamento jurídico, através da análise da Constituição Federal de 1988 e dos princípios contidos no Estatuto da Criança e do Adolescente, abordando posteriormente os direitos assegurados em ambos que mais se aproximam e mais possuem relevância no estudo do oversharenting.

Trouxe por fim, como se manifesta atualmente a existência do oversharenting na Justiça Brasileira, analisando casos, especificamente de decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça do Estado de São de Paulo, bem como abordou as possíveis e principais formas de se combater a o instituto, tais como a responsabilidade civil e a regulamentação das redes.

Assim, permitiu concluir pela importância de discussão e debate a respeito da proteção à imagem e privacidade das crianças e adolescentes, tendo em vista o aumento à pratica do oversharenting nos últimos anos, em decorrência da ascensão das plataformas sociais, evidente a necessidade de políticas públicas que conscientizem os pais, no uso moderado e equilibrado das plataformas, uma vez que são os únicos verdadeiramente capazes de impedir que os dados e as imagens de seus filhos circulem indevidamente pela internet.

É portanto o oversharenting, instituto prejudicial à população infantojuvenil, carente de maior atenção, regulamentação e conscientização tanto pelo Estado como pela sociedade, afim de se garantir às crianças e adolescentes uma integral proteção em ambiente virtual.

REFERÊNCIAS

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