REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202412031031
Giovanna Kaylla Garcia Martins
Shelria Ramos dos Santos Pontes
Orientadora: Profa. Esp. Trinit Di Lu Soares Germano
RESUMO
A frenectomia lingual é um procedimento cirúrgico utilizado para corrigir a anquiloglossia, condição também conhecida como “língua presa”. Essa condição é caracterizada por uma limitação na mobilidade da língua devido a um freio lingual encurtado ou espesso, o que pode impactar diversas funções orais, como a fala, a deglutição, a mastigação e, em recém-nascidos, a amamentação. Quando não tratada, a anquiloglossia pode prejudicar o desenvolvimento da criança e comprometer aspectos importantes para a sua qualidade de vida. Nesse contexto, este trabalho tem como objetivo não apenas relatar um caso clínico do tratamento da anquiloglossia, mas também as dificuldades no desenvolvimento funcional da língua e no bem-estar geral do paciente. Além de descrever o diagnóstico e o tratamento realizados, a pesquisa procura abordar os resultados alcançados, com atenção à melhoria da funcionalidade da língua. O estudo será realizado na Clínica Odontológica da Faculdade Metropolitana de Rondônia, onde será analisado o caso de um paciente pediátrico que será submetido à frenectomia, com acompanhamento dos pais e supervisão de uma equipe interdisciplinar de profissionais. Espera-se que a cirurgia proporcione melhorias anatômicas e funcionais, mas, para que esses benefícios sejam plenos e duradouros, o acompanhamento fonoaudiológico será parte essencial do processo de recuperação. Em síntese, os resultados esperados indicam que a frenectomia deve proporcionar ganhos significativos na funcionalidade da língua. Contudo, em muitos casos, o tratamento multidisciplinar é crucial para otimizar esses resultados, especialmente em termos de desenvolvimento da fala e adaptação completa às novas funções orais.
Palavras-chave: Odontopediatria; Freio Lingual; Criança.
ABSTRACT
Lingual frenectomy is a surgical procedure commonly used to correct ankyloglossia, a condition also known as “tongue-tie”. This condition is characterized by limited tongue mobility due to a shortened or thickened lingual frenulum, which can impact several oral functions, such as speech, swallowing, chewing and, in newborns, breastfeeding. When left untreated, ankyloglossia can impair a child’s development and compromise important aspects of their quality of life. In this context, this study aims not only to report a clinical case of ankyloglossia treatment, but also to analyze the impact of frenectomy on the functional development of the tongue and the patient’s general well-being. In addition to describing the diagnosis and treatment performed, the research seeks to address the results achieved, with special attention to improving tongue functionality. The study will be conducted at the Dental Clinic of the Metropolitan College of Rondônia, where the case of a pediatric patient who will undergo frenectomy will be analyzed, with parental supervision and supervision by an interdisciplinary team of professionals. Surgery is expected to provide anatomical and functional improvements, but for these benefits to be full and lasting, speech therapy will be an essential part of the recovery process. In summary, the expected results indicate that frenectomy should provide significant gains in tongue functionality. However, in many cases, multidisciplinary treatment is crucial to optimize these results, especially in terms of speech development and complete adaptation to new oral functions.
Keywords: Pediatric dentistry; Lingual Frenulum; Child.
1. INTRODUÇÃO
O frênulo lingual é uma membrana de tecido conjuntivo fibroso e denso que conecta a língua ao assoalho da boca. Quando essa estrutura apresenta alterações em sua inserção, espessura ou rigidez, a mobilidade da língua fica comprometida, condição chamada anquiloglossia, ou “língua presa”. Para corrigir, realiza-se a frenectomia ou frenotomia lingual, um procedimento cirúrgico que visa reposicionar ou remover o frênulo alterado, restabelecendo a amplitude dos movimentos da língua (COTA et al.; 2019).
O frênulo lingual alterado apresenta-se com uma inserção mais próxima à ponta da língua. Em situações normais, o frênulo está posicionado na metade da face inferior da língua até o assoalho da boca de forma a permitir o livre movimento, contudo, quando encurtado, espessado ou posicionado de maneira inadequada, pode limitar movimentos fundamentais. Essa alteração anatômica dificulta a elevação e o avanço da língua, o que pode interferir na articulação de sons, na mastigação e na deglutição, além de afetar a capacidade de sucção nos recém-nascidos, impactando diretamente o processo de amamentação (RIBEIRO et al.; 2016).
A análise do frênulo lingual é realizada por meio de uma avaliação clínica e fonoaudiológica, fundamental para o diagnóstico da anquiloglossia. A inserção inadequada do frênulo pode se apresentar como um frênulo curto ou localizado muito próximo à ponta da língua (TERCEIRO et al,.2022).
Quando a anquiloglossia é diagnosticada precocemente em recém-nascidos, o procedimento mais simples e indicado é a frenotomia, popularmente conhecida como “pique”, que tem o objetivo de liberar o frênulo. Esse procedimento envolve um corte pequeno e rápido no frênulo lingual, sendo recomendado que o bebê realize a sucção do leite materno imediatamente após o procedimento (GOMES et al.; 2021).
A frenotomia é indicada para recém-nascidos quando a mãe relata dificuldades na amamentação, muitas vezes causadas pela restrição do movimento livre da língua do bebê. Essa limitação na mobilidade da língua impede uma pega adequada, dificultando a sucção eficiente do leite, causando ferimentos e dor nos mamilos da mãe, além de levar à perda de peso do bebê ou à amamentação insuficiente (ALMEIDA et al.; 2018).
Nas triagens neonatais, realizadas nas primeiras 48 horas após o nascimento do bebê, é possível diagnosticar dificuldades de amamentação e avaliar o frênulo lingual por meio do teste da linguinha, consistindo em uma avaliação clínica que inclui a observação da sucção do leite materno. Caso haja restrições na mobilidade da língua que possam interferir na amamentação, o bebê pode ser encaminhado para uma frenotomia (SAVIAN et al.; 2018). O teste da linguinha se tornou um protocolo obrigatório em hospitais e maternidades do Brasil, lei que foi sancionada em 2014 (PINTO et al; 2019).
Conforme relacionado por Pompéia et al. (2017), quando o recém-nascido não recebe o estímulo do aleitamento materno natural devido à dificuldade de amamentação causada pela anquiloglossia, o desenvolvimento e o crescimento craniofacial podem ser comprometidos, pois o aleitamento materno promove estímulos essenciais para a maturação de músculos faciais, como o temporal, o pterigoideo lateral e os masseteres, além de outros envolvidos na sucção, destacando a importância de um diagnóstico precoce.
Por outro lado, quando a anquiloglossia é identificada em estágios mais avançados ou em pacientes mais velhos, a frenectomia é indicada, exigindo técnicas cirúrgicas mais elaboradas, realizando a incisão completa do freio lingual com o uso de bisturi ou laser, após isso, efetua a divulsão das fibras internas para não houver recidiva além de finalizar com sutura, assim, o manejo da anquiloglossia deve ser cuidadosamente individualizado, levando em consideração fatores como a idade do paciente, a gravidade da condição e os impactos na qualidade de vida (LEITE et al.; 2024).
A principal diferença entre a frenotomia e a frenectomia está na abordagem e na extensão do tecido manipulado, enquanto a frenotomia consiste apenas em um corte pequeno no frênulo, a frenectomia envolve a remoção completa do tecido (BISTAFFA, GIFFONI, FRANZIN; 2017).
A anquiloglossia, ou língua presa, possui uma causa hereditária, geralmente associada ao cromossomo X com maior incidência no gênero masculino, o que explica sua prevalência em famílias. Além da predisposição genética, outros fatores de risco incluem o uso de drogas durante a gestação, que pode interferir no desenvolvimento normal do frênulo lingual (FERREIRA et al., 2018; DA SILVA COSTA, 2016).
A incidência de casos neonatais varia entre 4% e 16%. Além disso, estima-se que, entre 10 mil crianças, cerca de 2200 apresentem anquiloglossia, uma condição que pode afetar a amamentação e o desenvolvimento da fala se não tratada adequadamente (MORAES et al., 2023).
Considerando a importância da movimentação adequada da língua para a execução de diversas funções no sistema estomatognático, como a fala, a deglutição e a mastigação, é fundamental que sua mobilidade não sofra. Diante disso, o objetivo deste trabalho é relatar um caso clínico de anquiloglossia, abordando o diagnóstico, o tratamento realizado e os resultados alcançados, com ênfase na melhoria da funcionalidade da língua e no bem-estar do paciente.
2. METODOLOGIA
O local escolhido para a realização deste caso clínico foi a Clínica Odontológica da Faculdade Metropolitana localizada na Rua Ararás, 241 – Eldorado, Porto Velho – RO, 76811-678.
A paciente foi estabelecida após avaliações na clínica odontológica da Faculdade Metropolitana. Foi realizada a cirurgia na paciente com todas as informações esclarecidas aos pais e que aceitaram fazer o procedimento com os alunos e professores em supervisão.
Foi realizado o procedimento do paciente cadastrado na Clínica Odontológica após avaliação, protocolos de anamnese e encaminhamentos multidisciplinares e com todos os termos de aceitamento dos pais, incluindo termos de imagem e contenção física.
3. RELATO DE CASO
Paciente D.V.A.F, do gênero feminino, 5 anos de idade, compareceu à clínica de odontopediatria da Faculdade Metropolitana, acompanhada por seus pais, apresentando um encaminhamento da unidade de saúde básica (Figura 1) para avaliação de frenectomia lingual. Após a análise clínica, foi diagnosticada com anquiloglossia e iniciou-se a organização para o procedimento cirúrgico.
Antes de iniciar o procedimento cirúrgico, a receita foi prescrita e as orientações pós-operatórias foram detalhadamente explicadas aos pais, tudo foi documentado e devidamente assinado para que, após o procedimento, a criança e os responsáveis pudessem ir embora, sem a necessidade de permanecer mais tempo na clínica após o procedimento.
Figura 1– encaminhamento para avaliação para frenectomia lingual e tratamento endodôntico.
Fonte – Elaborada pela autora.
Para o início do procedimento, a primeira fase é a avaliação clínica, no qual se realizou uma avaliação cuidadosa do frênulo pela inspeção da região (Figura 2). Nesta fase, todos os materiais e instrumentos necessários devem estar de fácil acesso, incluindo uma agulha curta, tubete de anestésico lidocaína 2% com epinefrina 1:100.000, lidocaína em gel a 5%, pinça Kelly, tesouras íris reta e Metzembaum, fio de sutura de nylon 4,0, porta-agulha, pinça Dietrich, gaze, roletes de algodão e soro fisiológico a 0,9%.
Figura 2 – Frênulo lingual apresentando anquiloglossia.
Fonte – Elaborada pela autora.
A segunda fase consistiu na anestesia, que começou com um anestésico tópico aplicado com roletes de algodão sobre a área previamente seca, ajudando a reduzir o desconforto do paciente ao anestesiar a superfície antes da infiltração profunda. Em seguida, realizou-se a anestesia infiltrativa no tecido conjuntivo ao redor do freio e na mucosa bilateralmente, garantindo um bloqueio completo e eficaz da área.
Na fase técnica, que é o momento principal do procedimento, a língua do paciente foi imobilizada e levemente tracionada para expor o frênulo realizado por uma auxiliar. Em seguida, o freio foi pinçado com a pinça Kelly e segmentado utilizando uma tesoura íris reta. Após essa incisão, realizou a divulsão cuidadosa dos tecidos ao redor e concluiu com uma sutura (Figura 3) que estabiliza os tecidos e favorece a cicatrização.
Figura 3 – Sutura realizada na prega.
Fonte – Elaborada pela autora.
Por fim, na fase de cuidados pós-operatórios, os pais receberam orientações para a recuperação adequada, sendo informado de manter uma boa higiene oral, respeitar o repouso adequado, adotar uma dieta com alimentos macios e em baixa temperatura, além disso, foi realizado prescrição medicamentosa, composta por ibuprofeno 100 mg e dipirona 500 mg, orientações essenciais para favorecer o processo de cicatrização.
O procedimento realizado transcorreu de forma tranquila e sem intercorrências, a paciente apresentou comportamento cooperativo durante toda a intervenção, permanecendo calmo e sem sinais de desconforto. Notavelmente, houve episódios de choro e histeria no momento da anestesia, mas a paciente foi acalmada, o que permitiu a conclusão do procedimento de maneira rápida e eficaz. Após 1 mês pós procedimento a paciente retornou para verificar cicatrização e modificações após a frenectomia (Figura 4).
Figura 4 – cicatrização da prega.
Fonte – Elaborada pela autora.
4. DISCUSSÃO
Os freios bucais são essenciais para as funções estomatognáticas, que envolvem a sucção, mastigação, deglutição, respiração e fonação. No entanto, quando essa membrana apresenta alterações, torna-se imprescindível que haja intervenção odontológica, em que, o tratamento consiste na frenectomia lingual (DANELON et al.; 2020).
Além dessas intercorrências que o frênulo alterado pode causar, a dicção da criança também pode ser comprometida, impactando sua capacidade de comunicação, em que, pode gerar consequências emocionais, especialmente em idades em que a criança está iniciando a socialização escolar, e a dificuldade para se expressar pode levar a sentimento de frustração e insegurança, prejudicando sua interação com os colegas e afetando a formação de sua autoestima (COTA et al.; 2019).
Com o diagnóstico tardio da anquiloglossia, diversas alterações bucais podem surgir em decorrência do freio lingual curto, entre elas, problemas de oclusão dentária devido à falta de posicionamento adequado da língua no palato, o que leva à ausência de selamento labial e ao hábito de manter a boca aberta em repouso. Além disso, essa condição pode predispor ao desenvolvimento de diastemas entre os incisivos inferiores. (GOMES et al., 2021; DIAS et al. 2020).
A técnica de frenectomia realizada com laser apresenta menores chances de recidiva e reduz o desconforto pós-operatório, além de promover uma cicatrização mais rápida. Essa técnica minimamente invasiva também diminui o risco de sangramentos e infecções, proporcionando uma recuperação mais tranquila para o paciente (NETO, MOLELO, GOULART, 2014; SILVA, SILVA, ALMEIDA. 2018).
Para as recomendações do pós-operatório, é essencial seguir todas as recomendações para uma recuperação adequada, que incluem cuidados básicos de higiene, repouso, alimentos pastosos e gelados, assim como a administração de analgésicos e anti-inflamatórios, conforme orientações do cirurgião-dentista, sendo que, esses cuidados ajudam a prevenir infecções e a reduzir o desconforto, além de promover uma cicatrização adequada (DE ALMEIDA et al. 2020).
A reabilitação pós-cirúrgica é um momento crítico para o bom prognóstico da frenectomia, pois a paciente possui uma nova amplitude de movimento da língua, por isso, é imprescindível que a criança seja encaminhada a um fonoaudiólogo, que terá um papel importante no desenvolvimento de habilidades orais como a fala e a deglutição (DE OLIVEIRA et al.; 2019).
O fonoaudiólogo realiza exercícios terapêuticos que ajudam a fortalecer a musculatura da língua, reeducando-a para que se adapte à sua nova mobilidade e possa realizar movimentos que antes eram limitados, sendo que, é importante a paciente ser encaminhada para o fonoaudiólogo antes e depois da frenectomia para o profissional avaliar a progressão e os resultados obtidos (MARCHESAN, MARTINELLI, GUSMÃO; 2012).
Com isso, se observa a importância de uma equipe multidisciplinar, que normalmente compõe o fonoaudiólogo, pediatra, obstetra e cirurgião dentista para realizar o diagnóstico e tratamento (GOMES et al.; 2021).
Contudo, se tratando de um procedimento pediátrico é de suma importância ter um planejamento, assim como preparação adequada, incluindo disponibilidade de todos os instrumentos esterilizados e organizados na mesa auxiliar para garantir acesso rápido e reduzir possíveis interrupções, pois a criança tende a ficar ansiosa e estressada em cadeira odontológica (NASCIMENTO et al. 2020).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O caso clínico apresentado ilustra a importância da identificação e intervenção na anquiloglossia, uma condição que, quando não tratada, pode gerar impactos significativos na funcionalidade da língua e na qualidade de vida da criança. A frenectomia realizada na paciente que apresentava limitações em sua mobilidade lingual, demonstrou ser um procedimento eficaz e seguro, contribuindo para a melhoria de funções essenciais.
A avaliação clínica cuidadosa e o planejamento cirúrgico foram fundamentais para o sucesso do procedimento. A anestesia adequada, a técnica cirúrgica e os cuidados pós-operatórios garantiram uma recuperação tranquila, evidenciada pelo comportamento cooperativo da paciente durante e após a intervenção.
Os resultados obtidos reforçam a necessidade de uma abordagem multidisciplinar no diagnóstico e tratamento da anquiloglossia. A participação de profissionais de saúde bucal, pediatras e fonoaudiólogos é essencial para assegurar que as intervenções sejam realizadas de maneira integrada e que os pacientes recebam o suporte necessário para um desenvolvimento saudável.
Por fim, é evidente que a anquiloglossia pode ter consequências que vão além da esfera física, afetando o desenvolvimento emocional e social das crianças. Portanto, o acompanhamento contínuo e a atenção às necessidades individuais dos pacientes devem ser prioridades na prática clínica, garantindo não apenas a saúde bucal, mas também o bem-estar integral das crianças afetadas.
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