REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202411302149
Ana Victoria Edinê de Souza1
Polyanne Souza Diniz1
Lucas Roberto de Carvalho2
RESUMO: A produção de geleias de frutas tem se mostrado uma alternativa viável para a agregação de valor à produção agrícola, especialmente em contextos de agricultura familiar. Este estudo teve como objetivo propor estratégias para a produção e comercialização de geleias, considerando aspectos técnicos, econômicos e sociais. Foram elaboradas geleias de manga, manga com pimenta, abacaxi com cebola, abacaxi com cebola e pimenta, tamarindo e tamarindo com pimenta, que foram submetidas a um teste sensorial avaliando textura, doçura, acidez, sabor e intenção de compra. Os resultados revelaram diferenças significativas na aceitação das geleias, com destaque para a geleia de tamarindo, que apresentou maior intenção de compra, enquanto as versões com pimenta foram menos aceitas. Conclui-se que a produção de geleias tem potencial para diversificação da renda de pequenos produtores, desde que sejam consideradas as preferências do mercado consumidor.
Palavras-chave: Agregação de valor. Agricultura familiar. Processamento de alimentos. Teste Sensorial.
ABSTRACT: The production of fruit jams has proven to be a viable alternative for adding value to agricultural production, particularly in the context of family farming. This study aimed to propose strategies for the production and commercialization of jams, considering technical, economic, and social aspects. Jams made from mango, mango with chili, pineapple with onion, pineapple with onion and chili, tamarind, and tamarind with chili were prepared and subjected to a sensory test evaluating texture, sweetness, acidity, flavor, and purchase intention. The results revealed significant differences in the acceptance of the jams, with tamarind jam standing out for having the highest purchase intention, while the chili-flavored versions were less well-received. It is concluded that jam production has the potential to diversify the income of small-scale producers, provided that consumer market preferences are taken into account..
Key words: Value addition. Family farming. Food processing. Sensory testing.
1. INTRODUÇÃO
A produção de geleias de frutas tem se consolidado como uma estratégia eficaz para agregar valor à produção agrícola, especialmente no âmbito da agricultura familiar. No Brasil, a agricultura familiar representa cerca de 70% dos alimentos consumidos no país e constitui um setor essencial para o abastecimento alimentar e a preservação de práticas produtivas tradicionais (MDA, 2018). No entanto, agricultores familiares enfrentam desafios relacionados à baixa valorização de seus produtos in natura, perdas pós-colheita e dificuldades de inserção em mercados mais competitivos. Nesse contexto, o processamento de frutas, como a produção de geleias, surge como uma alternativa viável para a diversificação de renda e o fortalecimento econômico das pequenas propriedades rurais.
Segundo Silva et al. (2018), o processamento de frutas em geleias permite o aproveitamento de excedentes de produção e a redução de perdas, sobretudo em períodos de safra, quando há maior oferta e queda nos preços de frutas frescas. Além disso, esse tipo de processamento promove a ampliação da vida útil dos produtos e possibilita a criação de itens diferenciados que atendem às demandas de mercados específicos, como o de alimentos artesanais, orgânicos e gourmet. Essas características tornam as geleias um produto estratégico para pequenos produtores que buscam agregar valor e explorar nichos de mercado com maior lucratividade.
O mercado de alimentos artesanais tem apresentado crescimento constante nos últimos anos, impulsionado por consumidores que valorizam produtos regionais, sustentáveis e com menor grau de industrialização (SANTOS; OLIVEIRA, 2019). Além disso, a busca por alimentos com sabores diferenciados e combinações inusitadas, como frutas com especiarias ou ervas, tem ganhado destaque, possibilitando a diversificação de produtos e a conquista de novos consumidores.
Moura et al. (2020) ressaltam que, nesse contexto, o uso de ingredientes adicionais, como pimenta, cebola ou especiarias, em receitas de geleias pode agregar um valor sensorial e cultural significativo, criando produtos únicos e atrativos para o mercado.
Outro aspecto fundamental no desenvolvimento de geleias é a avaliação sensorial, que permite compreender a percepção do consumidor em relação a características como textura, doçura, acidez, sabor e intenção de compra. Estudos mostram que esses atributos desempenham um papel central na aceitação de produtos alimentícios e influenciam diretamente o comportamento de compra do consumidor (FREITAS et al., 2021). Enquanto sabores mais tradicionais, como geleias doces e frutadas, possuem ampla aceitação, combinações exóticas, como frutas com pimenta ou ervas, enfrentam maior resistência inicial, mas podem conquistar mercados específicos ao longo do tempo (ALMEIDA et al., 2022).
Além das vantagens econômicas, a produção de geleias tem implicações ambientais e sociais importantes. A transformação de frutas subutilizadas ou consideradas de segunda categoria em produtos de maior valor agregado contribui para a sustentabilidade ao reduzir o desperdício e melhorar o aproveitamento dos recursos naturais (RODRIGUES et al., 2020). No âmbito social, a produção de geleias pode fomentar a geração de emprego e renda em comunidades rurais, promover o empoderamento de pequenos produtores e incentivar o resgate de práticas produtivas tradicionais e regionais.
Por fim, a comercialização de geleias exige estratégias de mercado bem definidas, que considerem não apenas os atributos sensoriais dos produtos, mas também aspectos como embalagem, rotulagem e apelo cultural. Conforme Silva e Santos (2021), consumidores de produtos artesanais valorizam não apenas a qualidade intrínseca dos alimentos, mas também elementos simbólicos, como a origem local, o caráter artesanal e a sustentabilidade da produção. Assim, ao alinhar a elaboração de geleias às preferências do público-alvo e às tendências de consumo, os agricultores familiares podem conquistar maior competitividade e visibilidade no mercado.
Este estudo busca contribuir para o desenvolvimento de estratégias voltadas à produção e comercialização de geleias de frutas no contexto da agricultura familiar, considerando tanto aspectos técnicos e sensoriais quanto às preferências do mercado consumidor. A pesquisa se concentra na elaboração de receitas diferenciadas e na análise de sua aceitação sensorial, com o objetivo de oferecer subsídios para a valorização dos produtos da agricultura familiar e a diversificação da renda dos pequenos produtores.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1. Introdução à Agricultura Familiar e Valorização Econômica
A agricultura familiar desempenha um papel fundamental na economia rural, contribuindo para a produção de alimentos e para a manutenção da biodiversidade. No Brasil, cerca de 77% dos estabelecimentos agrícolas são classificados como familiares, respondendo por uma parte significativa da produção de alimentos básicos (IBGE, 2022). Apesar de sua relevância, muitos agricultores familiares enfrentam desafios relacionados à baixa rentabilidade, dificuldade de acesso a mercados e precariedade tecnológica. Nesse contexto, a diversificação produtiva, como a produção de geleias de frutas, emerge como uma alternativa viável para agregar valor aos produtos e aumentar a renda das famílias rurais.
2.2. Produção de Geleias: Potencial e Sustentabilidade
As geleias de frutas são produtos de alto valor agregado, com forte apelo no mercado devido à tendência de consumo de alimentos artesanais e naturais. Segundo estudos de Silva et al. (2020), a produção de geleias utilizando frutas nativas ou sazonais reduz o desperdício e promove a sustentabilidade, alinhando-se aos princípios da economia circular. Além disso, o processamento local dessas frutas fortalece as cadeias produtivas regionais e contribui para a redução de emissões relacionadas ao transporte.
2.3. Tecnologias de Produção e Qualidade
A produção de geleias requer técnicas que garantam segurança alimentar, sabor e conservação do produto. Estudos apontam que tecnologias simples, como a pasteurização e o uso de pectinas naturais, podem ser adaptadas para pequenos produtores (Almeida e Santos, 2021). Além disso, a capacitação em boas práticas de fabricação (BPF) é essencial para assegurar a qualidade e a competitividade do produto no mercado.
2.4. Mercado e Comercialização
A comercialização de geleias de frutas por agricultores familiares enfrentam desafios, como a ausência de canais eficientes de distribuição e a competição com produtos industrializados. Por outro lado, o fortalecimento de mercados locais, feiras agroecológicas e vendas online tem ampliado as oportunidades de acesso ao consumidor final (Moura et al., 2022). Estratégias de branding, que destacam a origem artesanal e sustentável dos produtos, têm se mostrado eficazes para atrair consumidores que valorizam alimentos com histórias únicas e impactos sociais positivos.
2.5. Políticas Públicas e Apoio Institucional
Iniciativas governamentais e programas de fomento, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), têm potencial para integrar os produtos da agricultura familiar, como geleias, em suas cadeias de suprimento (Brasil, 2023). Além disso, o acesso a linhas de crédito específicas e a certificações de qualidade, como o selo de produto artesanal, são fundamentais para consolidar a produção e ampliar o mercado.
2.6. Estudos de Caso e Experiências Bem-Sucedidas
Diversos exemplos de sucesso destacam o impacto positivo da produção de geleias na agricultura familiar. O estudo de Oliveira et al. (2021) mostrou como cooperativas em regiões do semiárido brasileiro aumentaram em 40% a renda média dos agricultores ao introduzir geleias de frutas típicas como umbu e maracujá da caatinga. Esses casos evidenciam a importância do associativismo e da inovação na comercialização, como o uso de plataformas digitais para vendas diretas ao consumidor.
3. MATERIAL E MÉTODOS
Para contribuir de forma prática ao estudo, foram elaboradas seis receitas distintas de geleias:
• Geleia de manga;
• Geleia de manga com pimenta;
• Geleia de abacaxi com cebola;
• Geleia de abacaxi com cebola e pimenta;
• Geleia de tamarindo;
• Geleia de tamarindo com pimenta.
As geleias foram produzidas seguindo técnicas artesanais: seleção e higienização das frutas, preparo da polpa, cocção com açúcar e outros ingredientes, e envase em potes esterilizados. Segue abaixo as receitas:
3.1. Geleia de manga e manga com pimenta
3.1.1. Ingredientes
1 kl de manga
350g de açúcar
150 ml de água
1 pimenta malagueta pequena
3.1.2. Modo de preparo
As mangas foram picadas e batidas no liquidificador juntamente com a água. Em seguida, a mistura foi peneirada e transferida para uma panela em fogo alto. Acrescentamos o açúcar e mexemos até atingir o ponto de fervura. Assim que a geleia adquiriu consistência, caindo em blocos da concha, dividimos o preparo em dois potes: um de geleia de manga tradicional e o outro de geleia de manga com pimenta.
3.2. Geleia de abacaxi com cebola e abacaxi, cebola e pimenta
3.2.1. Ingredientes
1 abacaxi grande
1 cebola de cabeça grande (picada em pedaços pequenos)
350g de açúcar
150ml de água
1 pimenta malagueta pequena
3.2.2. Modo de preparo
O abacaxi foi batido no liquidificador com água e, em seguida, colocado em uma panela em fogo alto. Acrescentamos o açúcar e mexemos continuamente até atingir o ponto de geleia, que é quando a mistura cai em blocos da colher. Reservamos e caramelizamos a cebola com duas colheres de açúcar. Logo após, misturamos a cebola caramelizada à geleia de abacaxi. A preparação foi dividida em dois potes: um com geleia de abacaxi com cebola e o outro com geleia de abacaxi, cebola e pimenta-malagueta
3.3. Geleia de tamarindo e tamarindo com pimenta
3.3.1. Ingredientes
1 kl de polpa de tamarindo
350g de açúcar
150 ml de água
1 pimenta malagueta pequena
3.3.2. Modo de preparo
Batemos a polpa com a água no liquidificador e, em seguida, colocamos a mistura em uma panela juntamente com o açúcar, mexendo até atingir o ponto de fervura. Após alcançar o ponto de caimento da concha em blocos, a receita foi dividida em dois potes: um com geleia de tamarindo e o outro com geleia de tamarindo acrescida de pimenta-malagueta.
3.4. Teste Sensorial
Um total de 40 participantes avaliou as geleias. Os quesitos avaliados foram:
1. Textura: consistência da geleia;
2. Doçura: equilíbrio do açúcar em relação aos demais sabores;
3. Acidez: intensidade do sabor ácido;
4. Sabor: harmonização geral dos ingredientes;
5. Intenção de compra: se comprariam a geleia.
Os dados foram registrados em questionários e analisados para identificar padrões de aceitação.
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO
6.1. Resultados do Teste Sensorial
Os resultados do teste sensorial estão detalhados na Tabela 1.
Tabela 1. Avaliação sensorial das geleias produzidas
6.2. Discussão dos Resultados
A geleia de manga apresentou boa aceitação em textura, sabor e acidez, mas a intenção de compra foi dividida, com apenas 19 pessoas afirmando que comprariam. A versão com pimenta teve baixa aceitação geral, especialmente na textura e no sabor, indicando que a adição de pimenta não agradou ao público neste caso.
A geleia de abacaxi com cebola também enfrentou resistência, especialmente na doçura e acidez, mas sua versão com pimenta apresentou maior aceitação na intenção de compra, com 22 pessoas dispostas a adquiri-la. A combinação de sabores pareceu atrair um público específico.
A geleia de tamarindo destacou-se pela alta aceitação da acidez e do sabor, com 30 participantes afirmando que a comprariam. No entanto, a versão com pimenta foi amplamente rejeitada, principalmente quanto ao sabor e intenção de compra, com apenas uma pessoa demonstrando interesse.
7. CONCLUSÃO
Os resultados do teste sensorial indicaram que a produção de geleias é uma alternativa promissora para agregar valor às frutas produzidas por agricultores familiares, mas sua aceitação está diretamente relacionada ao perfil sensorial de cada formulação. A geleia de tamarindo destacou-se como a mais bem avaliada, especialmente pela acidez equilibrada e o sabor característico, com uma alta intenção de compra (30 pessoas). Por outro lado, as geleias com adição de pimenta, de maneira geral, enfrentaram maior rejeição, com a versão tamarindo com pimenta apresentando a menor aceitação. Esses resultados demonstram que, embora exista um mercado potencial para produtos diferenciados, é fundamental compreender as preferências dos consumidores e adaptar as formulações de acordo com essas demandas.
As análises sensoriais também destacaram a importância de fatores específicos, como textura, doçura e acidez, na decisão de compra dos consumidores. Enquanto algumas geleias, como a de manga, apresentaram bom equilíbrio nesses atributos, outras, como as de abacaxi com cebola, enfrentaram resistência devido à doçura inadequada e à acidez pronunciada. A geleia de abacaxi com cebola e pimenta teve uma aceitação mais balanceada, sugerindo que a combinação de sabores, embora inusitada, pode atrair nichos específicos de mercado. Isso reforça a necessidade de realizar testes sensoriais regulares durante o desenvolvimento de novos produtos, de modo a ajustar as características sensoriais para atingir maior aceitação.
Por fim, a comercialização de geleias diferenciadas requer não apenas o desenvolvimento de produtos que agradem ao paladar dos consumidores, mas também estratégias eficazes de marketing que valorizem sua origem artesanal e a singularidade das combinações de sabores. As versões menos aceitas podem ser reformuladas ou direcionadas a públicos específicos que busquem experiências gastronômicas diferenciadas. Além disso, a capacitação dos produtores e o investimento em pesquisa e inovação são indispensáveis para aumentar a competitividade desses produtos no mercado. Assim, a produção de geleias artesanais mostra-se uma alternativa viável para diversificar a renda e promover a sustentabilidade econômica na agricultura familiar.
Referências
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1Graduandas em Engenharia Agronômica, Centro Universitário Brasília de Goiás, e-mail: anavictoriaesd06@gmail.com e polyannediniz@icloud.com
2Mestre, Docente do curso de Engenharia Agronômica, Centro Universitário Brasília de Goiás, e-mail: lucas.carvalho@braseducacional.com.br