ANÁLISE DAS ATUAIS CONDIÇÕES DE ACESSIBILIDADE DO ESTÁDIO MUNICIPAL ANTÔNIO CARLOS MAGALHÃES EM ITAPETINGA – BA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202411282106


Gustavo Souza Pereira1,
Philipe do Prado Santos2,
Rafael Andrade Bitencourt3


RESUMO

Diante da importância da garantia de direitos básicos para qualidade de vida dos cidadãos, independente de suas características, caucionar acessibilidade é um passo crucial para assegurar que todos tenham acesso igualitário aos diferentes ambientes e possam exercer sua cidadania de forma plena. Com base nesta premissa, o presente artigo traz uma análise qualitativa do Estádio Municipal Antônio Carlos Magalhães, localizado na cidade de Itapetinga- BA, no que diz respeito às condições de acessibilidade em que se encontra, objetivando avaliar sua adequação às normas vigentes e sua capacidade de proporcionar um espaço inclusivo e multifuncional. O estudo aborda a importância de eliminar barreiras físicas e culturais, promovendo a inclusão social de pessoas com deficiência por meio da acessibilidade arquitetônica. A pesquisa utilizou visitas exploratórias, técnicas de observação direta, e análise de documentos, planilhas e registros fotográficos, além de uma revisão bibliográfica com base em normas técnicas e artigos científicos. A acessibilidade é explorada a partir de suas categorias – orientação espacial, comunicação, deslocamento e uso – com o intuito de criar um ambiente que permita a participação plena de todos os cidadãos. A partir da análise das condições atuais do estádio e da legislação brasileira sobre acessibilidade, são sugeridas adaptações que podem transformar o espaço em um local mais democrático, promovendo saúde, inclusão e interação social, especialmente em atividades esportivas.

Palavras-chave: Inclusão Social. Mobilidade. Espaços Públicos. Arquitetura Esportiva. Estádios de Futebol

ABSTRACT

Given the importance of guaranteeing basic rights for the quality of life of citizens, regardless of their characteristics, ensuring accessibility is a crucial step in providing equal access to various environments and enabling individuals to exercise their citizenship fully. Based on this premise, this article presents a qualitative analysis of the Antônio Carlos Magalhães Municipal Stadium, located in the city of Itapetinga, Bahia, regarding its current accessibility conditions. The objective is to evaluate its compliance with current regulations and its ability to offer an inclusive and multifunctional space. The study highlights the importance of removing physical and cultural barriers to promote social inclusion for people with disabilities through architectural accessibility. The research employed exploratory visits, direct observation techniques, and analysis of documents, spreadsheets, and photographic records, as well as a literature review based on technical standards and scientific articles. Accessibility is explored through its categories—spatial orientation, communication, mobility, and usability—with the aim of creating an environment that allows the full participation of all citizens. Based on the analysis of the stadium’s current conditions and Brazilian accessibility legislation, adaptations are suggested that could transform the space into a more democratic venue, fostering health, inclusion, and social interaction, particularly through sports activities.

Keywords: Social Inclusion. Mobility. Public Spaces. Sports Architecture. Football Stadiums.

1 INTRODUÇÃO

Conforme Silva et al. (2019), um indivíduo é classificado como pessoa com deficiência quando se encontra condicionado a circunstâncias que, de alguma forma, limitam sua capacidade em níveis físicos, intelectuais ou sensoriais. Diante disso, estas impossibilidades dificultam de maneira expressiva sua participação efetiva no convívio social, devido à exorbitante quantidade de barreiras existentes desde a estrutura física dos espaços até os aspectos culturais que enraizam preconceitos e fomentam a exclusão, que, de acordo com Cassiano e Bressan (2019), se dirigem especialmente àqueles que, em menor número, possuem diferenças mais específicas, traçando um caminho segregador historicamente construído.

Diante deste cenário excludente e pouco democrático, para que se consiga diminuir as desigualdades de acesso e realizar a inclusão de todo e qualquer indivíduo independente de suas características pessoais, Andrade (2016) traz à luz o conceito de acessibilidade, uma maneira de garantir a todas as pessoas acesso seguro, pleno e confortável aos espaços, sejam eles públicos ou privados, conseguindo dessa forma assegurar direitos que estão prescritos por lei, a exemplo do direito de ir e vir previsto no artigo 5º, inciso XV da Constituição Federal do Brasil. É pertinente destacar que, o termo acessibilidade possui inúmeros significados, entretanto, de modo sintético e amplo, Manzini (2005), traz uma definição na qual a acessibilidade tem como um princípio propiciar vivências cotidianas de modo concreto e digno, podendo ser observada, implementada, medida, legislada e avaliada, criando condições para que as pessoas possam ter acesso a todos os lugares (Manzini, 2005).

De acordo com Dischinger, Bins Ely e Piardi (2012), o conceito de acessibilidade pode ser subdividido em quatro categorias: orientação espacial, comunicação, deslocamento e uso. Cada categoria é fundamentada com diretrizes que objetivam extinguir condições que promovam a desigualdade de acesso, criando outras que ofereçam dignidade no uso de todos os espaços às pessoas com deficiências. Esse processo configura um cenário de inclusão social que, como evidenciado por Lucas Amaral (2019), se dá através de ações com foco em promover a participação de todos os sujeitos no laço social com equidade, suscitando na socialização que ocorrerá mediante integração à teia social, na qual, segundo Henrique Araújo (2023), as singularidades encontradas trazem o sujeito em sua forma secular para uma posição de parte de um grupo, uma condição indispensável para a construção social. É válido ressaltar que, inclusão e acessibilidade compõe uma mudança de estrutura e pensamento, como dito por Marcos Cezar Freitas (2023), a inclusão tem papel fundamental na modificação de comportamentos discriminatórios, enquanto a acessibilidade se trata da adequação das contingências ambientais visando favorecer o usufruto destes espaços por todos.

Como exposto por Yazigi et.al (2015), diante da necessidade de modificações para a garantia da acessibilidade a todas as pessoas, é preciso que sejam considerados parâmetros que possam padronizar as mudanças necessárias em espaços já existentes e fundamentar a construção de novos, levando em consideração as categorias anteriormente citadas, constituindo assim uma acessibilidade espacial. De acordo com Romeu Sassaki (1999), através destas modificações, a sociedade pode se adaptar e incluir as pessoas com deficiência, possibilitando que elas desempenhem qualquer função no âmbito social. Sendo assim, junto à promoção de informação e disponibilidade de equipamentos e programas inclusivos, as modificações arquitetônicas, através da eliminação de barreiras e criação de cenários mais adaptativos, auxiliam na promoção de uma acessibilidade de forma ampla.

Levando em consideração a inclusão plena através da acessibilidade, visando promover bem estar e dignidade aos indivíduos, se faz necessário expor que, a prática esportiva é uma das maiores dificuldades existentes no Brasil, país que possui em média 17 milhões de pessoas portadoras de deficiência (PNS, 2019). Compreendendo a importância da promoção de saúde e aspectos sociais abordados acima, atividades esportivas são parte fundamental do processo de construção do laço social, além de trazer inúmeros benefícios para a saúde física e psicológica, ou seja, a construção e adequação de espaços que promovam estas práticas é uma necessidade que se estende para além do aspecto estrutural, podendo ofertar à população uma ferramenta de inclusão e fortalecimento das relações construídas através da interação social, fatores de suma importância para a promoção de saúde em seu conceito amplo biopsicossocial.

O objeto de pesquisa do presente artigo fica localizado na cidade de Itapetinga, localizado no interior da Bahia. O município possui atualmente três principais instalações públicas de caráter esportivo, sendo elas: Parque Poliesportivo da Lagoa, Complexo Poliesportivo Educacional e Estádio Municipal de Itapetinga que, embora tenham sido feitas melhorias recentes, ainda existem desafios a serem superados. O Estádio Municipal de Itapetinga, objeto de estudo do trabalho em questão, é um dos principais palcos esportivos da cidade e região. Com capacidade para 12.000 pessoas, o estádio abriga os jogos da Seleção de Itapetinga, que participa do tradicional Campeonato Baiano Intermunicipal de Futebol, uma das competições mais relevantes do estado da Bahia, reunindo equipes amadoras de vários municípios. Além de seu papel esportivo, o “Primaverão” também sedia o Museu de Arte e Ciências de Itapetinga, reforçando seu caráter cultural e multifuncional para a comunidade.

Diante desse contexto, este estudo tem o objetivo de realizar uma análise detalhada da acessibilidade no Estádio Municipal Antônio Carlos Magalhães, visando compreender como a infraestrutura atual atende às normas de acessibilidade e às demandas da sociedade por um espaço inclusivo e multifuncional. O foco está em avaliar como o estádio, um patrimônio histórico e cultural de Itapetinga-BA, pode proporcionar condições adequadas para o uso de pessoas com diferentes necessidades de mobilidade e acessibilidade através de uma pesquisa que examinará o estado atual das instalações do estádio por meio de uma análise qualitativa, utilizando documentos, planilhas, registros fotográficos e normativas técnicas. O levantamento junto ao setor público será fundamental para atender o uso recente do estádio e identificar possíveis barreiras que impactam a acessibilidade em eventos e atividades realizadas no local.

2 METODOLOGIA

A visita exploratória foi adotada como um método central para a análise da funcionalidade do ambiente construído no estudo do Estádio Municipal Antônio Carlos Magalhães, em Itapetinga-BA. Esse método é crucial para proporcionar uma compreensão inicial do espaço tanto ao avaliador quanto aos futuros usuários. Conforme Gosling et al. (2016), a experiência dos visitantes em um ambiente não é fixa, mas sim um processo dinâmico, que abrange as fases antes, durante e após a visita, sendo influenciada por diversos fatores contextuais.

De acordo com Rodeghiero Neto et al.(2020), quando aplicada de forma adequada, essa metodologia permite comparar as condições observadas no local com as normas e legislações vigentes, identificando tanto as potencialidades quanto as desconformidades do ambiente. Isso se torna fundamental no diagnóstico e requalificação, onde a acessibilidade e a conformidade legal desempenham um papel importante na criação de espaços inclusivos. Desta forma, ao seguir rigorosamente as normas vigentes, garante-se que os espaços reformados ofereçam acesso igualitário aos usuários.

No contexto deste estudo, as visitas exploratórias foram complementadas com técnicas de observação direta do ambiente, incluindo levantamentos métricos e fotográficos detalhados, além do preenchimento de planilhas para registrar as análises e informações técnicas do local. Essas atividades foram conduzidas com o objetivo de obter uma visão ampla e precisa das condições do estádio, a fim de identificar eventuais inconformidades de acordo às normas de acessibilidade.

O presente artigo, trata-se de uma pesquisa bibliográfica e coleta de dados de artigos científicos, relatórios, revistas, e informativos disponíveis em plataformas de pesquisa como Google Scholar, Scielo e Google Acadêmico, além da Norma Brasileira de Acessibilidade 9050 (2015). Conforme Caldas (1986), a pesquisa bibliográfica envolve a coleta e armazenagem de dados de entrada para a revisão, processando-se mediante levantamento das publicações existentes sobre o assunto ou problema em estudo, seleção, leitura e fichamento das informações relevantes.

Os materiais científicos foram selecionados com base nas palavras-chave “arquitetura esportiva”, “acessibilidade” e “estádios de futebol”. Em consonância com a temática da pesquisa, o termo “pessoa com deficiência” foi utilizado de acordo com as diretrizes da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, substituindo expressões como “portador de deficiência” e “portadores de necessidades especiais”.

A análise e síntese do material coletado foram realizadas por meio de leitura exploratória, com o objetivo de identificar o grau de relevância do conteúdo para a pesquisa. Os critérios preestabelecidos determinaram a exclusão de materiais que não abordassem a acessibilidade em estádios esportivos ou que não contribuíssem diretamente para a compreensão do estudo da infraestrutura do Estádio Municipal Antônio Carlos Magalhães. Paralelamente, foram buscados artigos que exploram políticas públicas e normas técnicas relacionadas à acessibilidade em espaços públicos, com foco nos aspectos arquitetônicos e legais que influenciam a inclusão e o acesso universal.

3 REFERENCIAL TEÓRICO

Neste capítulo serão abordados os conceitos que fundamentam este artigo, tendo em vista a importância de se compreender a construção temporal dos construtos que sustentam práticas culturalmente construídas, além de propiciar uma análise com embasamento teórico e legal. As informações estão dispostas em dois tópicos sendo no primeiro explorados os conceitos de acessibilidade e inclusão, compreendendo de que forma os espaços podem auxiliar nos processos sociais e na reafirmação de direitos garantidos por lei, além de evidenciar a importância da acessibilidade plena em confronto à discriminação culturalmente estruturada. Ademais, no segundo tópico deste capítulo, o estádio Antônio Carlos Magalhães é trazido como foco principal, conhecendo a história por trás de sua criação, as condições na qual foi construído, além de sua importância para o esporte na cidade e região.

3.1 ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO SOCIAL DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA FÍSICA

É sabido que, a construção histórica da humanidade é fundamentada em práticas que exigiam a adaptação dos seres ao ambiente, sem cogitar a possibilidade contrária. Diante disso, a invisibilidade se tornou um pilar no que diz respeito aos obstáculos enfrentados na inclusão das pessoas com deficiência por meio da acessibilidade. A startup IIGUAL1, uma empresa voltada ao recrutamento de pessoas com ênfase em comunicação inclusiva no mercado de trabalho, ressalta que dentre os maiores entraves à inclusão das pessoas com deficiência do meio social encontram-se a falta de integração, os direitos sociais limitados, barreiras físicas, ausência de informações, além da discriminação e do preconceito, havendo a necessidade de uma movimentação coletiva focada na conscientização e educação da sociedade como um todo.

De acordo com o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 2015), uma pessoa com deficiência é aquela que possui impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que dificultam sua participação plena na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. A discriminação, que faz parte da realidade dessas pessoas, é uma forma de preconceito baseada na exclusão ou restrição em razão de sua deficiência, diante dessa prática emerge o termo “capacitismo”, definindo essa barreira social, onde a pessoa com deficiência é vista como incapaz de participar ou se envolver ativamente na sociedade. Esse preconceito desvaloriza o potencial das pessoas com deficiência ao subestimar sua capacidade física e/ou cognitiva, além de fomentar a exclusão e desigualdade de oportunidades para estas pessoas no campo social.

No Brasil, mais de 18 milhões de pessoas possuem algum tipo de deficiência, representando 8,9% da população com dois anos ou mais de idade. Um estudo da Universidade Federal de Goiás aponta que as barreiras arquitetônicas são as mais significativas para pessoas com deficiência física, sendo observadas em 80% dos casos, enquanto 66,67% das pessoas com deficiência visual e 16,67% das com deficiência auditiva enfrentam dificuldades específicas relacionadas às suas condições (IBGE, 2022). O problema da acessibilidade no Brasil não está relacionado apenas à ausência de direitos, mas à falta de efetivação das leis no cotidiano, o que implica de forma direta na execução de melhorias estruturais, limitando o acesso dessas pessoas aos espaços e serviços.

A Constituição Federal de 1988 foi um marco no reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiência, promovendo a adoção de medidas eficazes para garantir sua plena participação social. Entre as principais normas que regulam esses direitos estão: o Decreto nº 10.088 de 2019, o Decreto nº 3.956 de 2001, o Decreto nº 6.949 de 2009, o Decreto nº 11.063 de 2022, e a Lei nº 13.146 de 2015, conhecida como a Lei Brasileira de Inclusão (LBI). Essa legislação estabelece diretrizes para promover a acessibilidade e combater a discriminação, garantindo às pessoas com deficiência o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com os demais. Assegurar legalmente condições que auxiliem na promoção da inclusão social fomenta a efetividade da acessibilidade plena, levando em consideração aspectos sociais e estruturais, propiciando a participação das pessoas com deficiência na construção dos laços sociais.

Em se tratando de mudanças legais que podem ser vistas como conquistas, é possível citar a reformulação do sistema de curatela pela LBI, um mecanismo de proteção que visa auxiliar pessoas com deficiência que, devido a limitações, não conseguem exercer plenamente suas atividades de vida civil, como tomar decisões sobre questões patrimoniais ou de saúde, por exemplo, anteriormente previsto no Código Civil, que agora visa assegurar mais direitos e autonomia ao curatelado. Além disso, no que se refere à acessibilidade e à mobilidade, a Lei nº 10.098 de 2000 estabelece normas para a adaptação de espaços públicos e privados, visando garantir o direito de ir e vir das pessoas com deficiência. Ademais, a criminalização da discriminação contra essas pessoas, com pena de reclusão e multa, também simboliza um importante avanço na luta por igualdade de direitos. É pertinente destacar que, é possível realizar denúncias quanto a violações dos direitos das pessoas com deficiência, buscando apoio no Ministério Público ou nos serviços de assistência social dos municípios.

Embora exista um amplo arcabouço legal voltado à promoção da igualdade e da dignidade das pessoas com deficiência, os resultados práticos ainda são tímidos. Predominam os marcos regulatórios, mas a efetiva mudança nas condutas sociais ainda é incipiente, dadas as práticas segregatórias estruturadas durante a história que são perpetuadas na atualidade. Entretanto, algumas práticas podem auxiliar na mudança deste cenário, a exemplo do debate sobre a necessidade de inclusão, um passo fundamental para o início de uma nova era de transformação. As leis, embora importantes, não têm sido suficientes para mudar as posturas culturais que perpetuam a exclusão, é necessário informar e instruir para que, pesquisasque ainda apontam as pessoas com deficiência enquanto representantes das maiores taxas de desemprego, analfabetismo e baixa renda no país, reflexo da discriminação que pode ser vista como a raiz destes problemas, se tornem apenas dados históricos que possam ser substituídos por uma realidade onde todos consigam exercer seu direito à cidadania.

3.2 ESTÁDIO “PRIMAVERÃO”

Com base no livro “Espinheira, O Mito”, de Maurício Gomes (2006), escritor da cidade de Itapetinga, o estádio Antônio Carlos Magalhães é fruto do idealismo de um amante da prática esportiva. Gomes (2006) afirma que, José Vaz Espinheira, enquanto prefeito da cidade de Itapetinga, BA dá início a construção do “Primaverão” entre os anos de 1959 a 1963. As obras foram instauradas em terras doadas por ele, se tratando de um projeto inovador, mediante a pouca presença de espaços como esse na região. Sendo assim, frente a grandiosidade do projeto e alta demanda por mão de obra, o então prefeito, com aprovação da maioria dos vereadores, coloca presos da cadeia pública para realizarem a construção dos estádio, pagando-lhes um salário com desconto apenas de suas despesas alimentares, entregando o valor restante às famílias dos detentos (Gomes, 2006).

Figura 1- Imagem da construção da arquibancada do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Gomes, 2006.

Do ponto de vista de Gomes (2006), diante da magnitude da obra almejada por Espinheira, muitas pessoas consideravam uma ideia impossível de se tornar real, desencadeando críticas que objetivavam a obra como uma estratégia para impressionar que jamais se concretizaria, uma vez que Itapetinga se tratava de uma cidade pequena e recentemente emancipada, a qual não teria condições de arcar com uma construção tão grandiosa. Entretanto, conhecido por suas habilidades de comunicação e influência, Espinheira conseguiu apoios importantes como o convênio com o governo Estadual e empréstimos de máquinas no DERBA, possibilitando oneração mínima ao município. Ou seja, não havia despesas com terreno, muitos materiais e a mão de obra gerava poder de compra além de reintegrar socialmente indivíduos que haviam transgredido leis (Gomes, 2006).

Figura 2- Imagem da construção do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Gomes, 2006.

Evidentemente, a construção deste estádio perpassou por várias outras gestões, de modo que, Espinheira esperou por mais quatro anos para dar continuidade ao projeto do “Primaverão”, o qual seria adiantado no governo de José Mendonça Luna, que esteve à frente da gestão da cidade de 1963 a 1967. O estádio Antônio Carlos Magalhães é um obra emblemática da cidade de Itapetinga e tem importância regional, uma vez que, até hoje é um dos poucos estádios de arena no interior da Bahia, historicamente sendo palco para exibição de grandes clubes da elite do futebol brasileiro, a exemplo do Flamengo.

Figura 3- Imagem aérea do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Gomes, 2006.

Diante das informações descritas, fica evidente a relevância deste espaço enquanto objeto de pesquisa, pois, o “Primaverão” está para além de um local para práticas esportivas, sendo um cenário de grandes conquistas e alegrias para o povo itapetinguense. Sendo assim, é pertinente que este seja valorizado e restaurado visando a inclusão de toda a população, proporcionando acessibilidade ao lazer, comunicação e desempenho de papeis sociais, e a continuação da história esportiva da cidade. Desse modo, a escolha do estádio municipal de Itapetinga para desenvolvimento desta pesquisa tem relevância estrutural, cultural e social, podendo fundamentar projetos que modifiquem a constituição física do espaço, além de perpetuar práticas culturais esportivas de forma mais democrática e acessível.

Figura 4- Imagem aérea do Estádio “Primaverão” em dia de jogo do Campeonato Baiano Intermunicipal, 2019.

Fonte: Prefeitura de Itapetinga, 2019.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise da acessibilidade do Estádio Municipal Antônio Carlos Magalhães foi realizada em etapas, que incluíram visitas exploratórias, levantamento fotográfico e consultas a documentos e normas técnicas vigentes, destacando-se a NBR 9050 (2020), norma que estabelece critérios e parâmetros técnicos que se aplicam a projeto, construção, instalação e adaptação de edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos às condições de acessibilidade. O diagnóstico resultou na identificação de diversas deficiências que comprometem a acessibilidade da estrutura, evidenciando, assim, a urgência de intervenções para adequar o espaço. Embora o estádio possua um valor histórico e cultural significativo, as condições observadas indicam que ele não atende plenamente às normas de acessibilidade estabelecidas pela legislação brasileira.

Durante as visitas exploratórias, foi possível observar que o Estádio Municipal Antônio Carlos Magalhães não oferece condições adequadas para a mobilidade de pessoas com deficiência física, especialmente pessoas em cadeira de rodas, sendo uma das principais falhas constatadas, a ausência de rampas devidamente dimensionadas e posicionadas, o que impossibilita o deslocamento seguro e autônomo dessas pessoas.

Figura 5- Imagem externa do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Autor, 2024.

Embora existam rampas em algumas áreas, elas não estão em conformidade com a NBR 9050 (2020), que especifica requisitos fundamentais de inclinação, largura e corrimãos. Essa inadequação das rampas compromete o acesso, tornando-o irregular e, em alguns casos, perigoso, visto que, segundo as Normas de Acessibilidade, as rampas não podem ter uma inclinação superior a 8% e devem ser sinalizadas e dotadas de corrimãos em ambos os lados. A falta desses elementos agrava a precariedade do acesso, resultando em um espaço que se mostra pouco inclusivo e que carece de equipamentos para garantir a acessibilidade e a segurança de todos os usuários.

Figura 6- Imagem interna da rampa de acesso as arquibancadas do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Autor, 2024.

Outro ponto crítico identificado foi a ausência de sinalização adequada para pessoas com deficiência visual, uma questão que se tornou evidente tanto pela análise da planta do estádio quanto pela observação direta. Foi constatada a falta de pisos táteis nas áreas externas e internas, especialmente em locais estratégicos como entradas, escadas e rampas, em desacordo com o que prevê a NBR 9050. Além disso, a sinalização em braille é inexistente, o que dificulta a orientação de pessoas com deficiência visual em relação a setores, banheiros e saídas de emergência. Essa lacuna impede que essas pessoas se orientem de maneira independente, comprometendo sua segurança e bem-estar.

Figura 7- Imagem de áreas internas e externas em locais como entradas e acessos do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Autor, 2024.

No que diz respeito às áreas de assento, foi verificado que os espaços reservados para pessoas com mobilidade reduzida não são devidamente identificados e estão mal posicionados, uma situação que contraria as normas de acessibilidade. De acordo com essas normas, os assentos especiais devem ser localizados em locais de fácil acesso e proporcionar boa visibilidade do campo de jogo; no entanto, os assentos disponíveis no estádio consistem em estruturas de concreto sem cadeiras, situadas em áreas afastadas do campo, o que compromete a visibilidade em alguns pontos devido à presença de postes de iluminação entre o campo e a arquibancada.

Figura 8- Imagem da arquibancada do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Autor, 2024.

Além disso, a quantidade de assentos reservados para esse público não atende ao mínimo exigido pelas normas, que estipulam a reserva de 4% dos lugares para pessoas com deficiência, sendo 2% destinados a cadeirantes e 2% para pessoas com mobilidade reduzida ou deficiência visual.

Figura 9- Imagem da arquibancada vista da região do campo do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Autor, 2024.

Outro aspecto relevante identificado foi a ausência de sanitários adaptados, pois durante as visitas foi constatado que os banheiros existentes não possuem as adaptações necessárias para atender pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida e apresentam situação precária de abandono e falta de manutenção. As cabines são estreitas, os vasos sanitários estão posicionados em uma altura inadequada e, além disso, não há barras de apoio nas paredes, elementos essenciais que garantiriam a autonomia dos usuários.

Figura 10- Imagem do acesso aos sanitários do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Autor, 2024.

Essa falta de adaptações compromete significativamente a acessibilidade do estádio e a dignidade dos usuários, uma vez que, de acordo com as Normas de Acessibilidade, os banheiros acessíveis devem ter uma entrada independente com dimensões mínimas de 1,5 metro por 1,7 metro e portas com abertura de 80 centímetros. Ademais, é necessária a instalação de campainhas ou alarmes a 40 centímetros do chão, para possibilitar o acionamento em caso de quedas.

Figura 11- Imagem do interior dos sanitários do Estádio “Primaverão”.

Fonte: Autor, 2024.

Além da carência de sanitários adequados, também foi identificada a ausência de áreas de apoio apropriadas, como espaços reservados para a troca de fraldas e cuidados especiais, que deveriam ser previstos em uma estrutura acessível. Essa falta de infraestrutura destaca a necessidade de ações corretivas para garantir um ambiente inclusivo e seguro para todos os usuários. Com base na NBR 9050, recomenda-se a criação de vagas preferenciais no estacionamento externo, e adequações nas bilheterias, incluindo filas preferenciais e sinalização clara. Internamente, é necessário ajustes nas rampas com corrimãos e sinalização adequada, instalação de barras de apoio e corrimãos nas escadas das arquibancadas, além de melhor sinalização nas saídas de emergência, e o acesso ao campo a partir das arquibancadas, atualmente obstruído por uma vala, deve ser readequado com passarelas ou rampas seguras. Por fim, é imprescindível adaptar os sanitários com identificação adequada e infraestrutura compatível com as necessidades de pessoas com deficiência, garantindo que o estádio se torne um espaço acessível, funcional e seguro para todos os públicos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo sobre a acessibilidade do Estádio Municipal Antônio Carlos Magalhães cumpriu seu objetivo de identificar e analisar as barreiras existentes em sua estrutura, que dificultam o acesso democrático aos benefícios que este espaço pode promover à sociedade como um todo. A metodologia adotada possibilitou uma avaliação detalhada das condições atuais e revelou as principais deficiências presentes no estádio em termos de acessibilidade, obtendo-se resultados que, embora esteja desempenhando um papel importante na vida cultural e esportiva da comunidade, ainda demonstram a inadequação do espaço no que diz respeito às normas de acessibilidade, visto que, a identificação dessas limitações é essencial para promover mudanças que melhorem a inclusão e a segurança dos frequentadores.

A principal contribuição deste estudo é a evidência da necessidade de reformas para tornar o estádio mais acessível e inclusivo, além de possibilitar a elaboração de projetos que objetivem melhorias em espaços similares ao estádio, visando a inclusão das pessoas com deficiência e a garantia dos direitos básicos de todos os indivíduos. Dentre os pontos fortes do estudo estão a análise detalhada das condições atuais e a identificação precisa das barreiras existentes. No entanto, a falta de um projeto de revitalização limita a capacidade de apresentar soluções práticas imediatas, recomendando-se para futuras pesquisas, a realização de estudos que explorem a implementação de melhorias baseadas nas deficiências identificadas e avaliem o impacto das reformas na experiência dos usuários. A análise também poderia ser ampliada para incluir a comparação com outros estádios e espaços públicos, oferecendo uma visão mais abrangente sobre a acessibilidade em diferentes contextos.

Diante da importância da implementação de medidas que promovam acessibilidade, além do compromisso da arquitetura de garantir qualidade de vida a todas as pessoas em quaisquer espaços, tem-se como objeto de pesquisa para construção do presente artigo o estádio Antônio Carlos Magalhães, popularmente conhecido como “Primaverão”. Tendo em vista sua relevância para a população da cidade de Itapetinga, Ba fica evidente a importância da realização de melhorias que possam auxiliar na democratização do acesso a este espaço.

Sendo assim, com base na história da cidade de Itapetinga, Ba e da construção do estádio “Primaverão”, torna-se evidente a relevância da análise da estrutura deste espaço, uma vez que, o mesmo enfrenta grandes desafios com relação aos danos temporais e a inadequação às normas que regem o padrão atual de acessibilidade, uma realidade que compromete a preservação do patrimônio e sua capacidade de atender de maneira plena à comunidade, suportando o crescimento populacional e as diversas demandas emergentes para o esporte local. Ademais, há uma notável carência no que diz respeito à democratização de acesso ao estádio por meio da acessibilidade, pela ausência de rampas e corrimões adequados para pessoas com mobilidade reduzida, falta de sinalização tátil para deficienttes visuais e a limitação de banheiros acessíveis.

Com isso, diante dos resultados colhidos durante a pesquisa, pode-se concluir que, as deficiências estruturais presentes no estádio Antônio Carlos Magalhães são barreiras significativas para o uso igualitário desse espaço, evidenciando a necessidade de reformas que atendam às exigências legais e melhorem a experiência de todos os cidadãos que o frequentam. Sendo assim, mesmo que não seja realizado um projeto completo de revitalização, as melhorias básicas, como instalação de rampas, sinalização adequada e ampliação das áreas adaptadas, podem causar um impacto significativo na inclusão e conforto dos usuários com necessidades especiais. A realização de uma revisão detalhada das condições atuais do estádio bem como a identificação dessas barreiras, proporcionam uma visão clara das limitações presentes no local que dificultam o acesso das pessoas com deficiência, evidenciando a importância de adotar uma postura mais inclusiva na manutenção dos espaços públicos em todas as esferas, especialmente aqueles que, como os esportivos, promovem bem estar biopsicossocial.

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1Graduando em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade Independente do Nordeste. E-mail: guzinge10@gmail.com.

2Mestrando no Programa de Pós-graduação em Nível de Mestrado Acadêmico em Ensino na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – PPGEn/UESB. Pós-graduado em Gestão de Obras na Construção Civil. Graduado em Engenharia Civil, Administração, Arquitetura e Urbanismo. Licenciado em Pedagogia. Docente do curso de Arquitetura e Urbanismo na Faculdade Independente do Nordeste. E-mail: philipe.prado@hotmail.com.

3Graduado em Arquitetura e Urbanismo, especialista em Metodologia do Ensino de Artes. E-mail: rafaelbitencourt@fainor.com.br