USO INDISCRIMINADO DOS OPIOIDES POR PROFISSIONAIS DE SAÚDE: UMA REVISÃO INTEGRATIVA

INDISCRIMINATE USE OF OPIOIDS BY HEALTHCARE PROFESSIONALS: AN INTEGRATIVE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202411150740


Anna Carla Matias Maciel Teixeira;
Joice Candido Da Silva;
Orientadora: Rosa Caroline Mata Verçosa de Freitas


RESUMO

Introdução: A epidemia de opioides é uma crise de saúde pública global que afeta várias regiões, incluindo uma que nem sempre é considerada em destaque: os profissionais de saúde. Objetivo geral: analisar a complexidade do uso indiscriminado dos opioides por profissionais de saúde. Método: Trata-se de uma revisão integrativa de literatura, seguindo cinco etapas com busca nas bases de dados LILACS, BDENF, MEDLINE, E SciELO no período entre 2019 a 2024. Resultados: Foram encontrados 109 artigos, utilizou-se seis artigos para a elaboração do estudo. Discussão: De acordo com as diretrizes brasileiras sobre o uso abusivo de opioides, os pacientes com dores crônicas e os profissionais da área da saúde estão entre os grupos de maior risco para adquirir dependência de opiáceos. A preocupação com o uso abusivo de substâncias psicoativas por parte dos profissionais de saúde não é recente. Historicamente, a população de médicos e demais trabalhadores da área da saúde está mais exposta ao risco de abuso de substâncias psicoativas, dentre elas medicações prescritas, como benzodiazepínicos, opiáceos e anfetaminas. Conclusão: O uso desordenado de opioides por profissionais de saúde é um problema multifacetado que exige uma abordagem abrangente e colaborativa para ser combatido. Instituições de saúde, órgãos reguladores e a sociedade em geral têm um papel importante em promover um ambiente de trabalho mais seguro e de apoio. Enfatizar a importância da saúde mental e do bem-estar dos profissionais de saúde, além de implementar medidas preventivas e intervenções eficazes, é essencial para reduzir o uso de opioides e garantir que esses profissionais possam continuar oferecendo cuidados de qualidade, protegendo, ao mesmo tempo, sua própria saúde e segurança.

Descritores: Analgésicos Opioides; Epidemia de Opioides; Profissionais de saúde

ABSTRACT

Introduction: The opioid epidemic is a global public health crisis that affects several regions, including one that is not always highlighted: health professionals. General objective: to analyze the complexity of the indiscriminate use of opioids by health professionals. Method: This is an integrative literature review, following five stages with a search in the LILACS, BDENF, MEDLINE, and SciELO databases from 2019 to 2024. Results: 109 articles were found; 06 articles were used to prepare the study. Discussion: According to the Brazilian guidelines on opioid abuse, patients with chronic pain and healthcare professionals are among the groups most at risk of acquiring opioid dependence. Concern about the abuse of psychoactive substances by healthcare professionals is not new. Historically, the population of doctors and other healthcare workers has been more exposed to the risk of abusing psychoactive substances, including prescription drugs such as benzodiazepines, opiates and amphetamines. Conclusion: The disordered use of opioids by healthcare professionals is a multifaceted problem that requires a comprehensive and collaborative approach to combat. Healthcare institutions, regulatory bodies and society in general have an important role to play in promoting a safer and more supportive working environment. Emphasizing the importance of the mental health and well-being of healthcare professionals, as well as implementing preventive measures and effective interventions, is essential to reducing opioid use and ensuring that these professionals can continue to provide quality care while protecting their own health and safety. 

Keywords:  Analgesics, Opioid; Opioid Epidemic; Healthcare professionals

INTRODUÇÃO 

Esse estudo tem como objeto uso indiscriminado dos opioides por profissionais de saúde. O interesse pelo tema surgiu com a necessidade de compreender a complexidade da epidemia de opioides entre profissionais da área da saúde.

 Os opioides são extraídos da semente da papoula (Papaver somniferum) e constituem uma classe de analgésicos que agem no sistema nervoso central (SNC), utilizados como sedativos e anestésicos. Além dos extratos naturais, existem também derivados sintéticos e semi-sintéticos. Entre os opioides notáveis, destacam-se a heroína, morfina, codeína, fentanil, metadona, tramadol e outras substâncias semelhantes (OMS, 2021).

Os opioides correspondem a uma das classes de medicamentos mais comumente usadas para o tratamento das dores agudas e crônica. As propriedades sedativas e analgésicas dos opioides são conhecidas há milhares de anos. Eles eram usados para combater ansiedade, fadiga, como calmante para bebês e para conter diarreia por contaminação com alimentos. Devido a todas essas utilidades, naturalmente o ópio se tornou um importante produto comercial (Torcato, 2016).

O termo opioide foi sugerido por Acheson para unir as substâncias com a mesma atuação da morfina, com estruturas químicas diversas, porém agora inclui todas as substâncias naturais (Morfina e Codeína), sintéticas (Meperidina, Metadona), semissintéticas (Heroína), que sejam antagonistas ou agonistas reagindo com os receptores opioides (Martins, 2012).

O uso do ópio foi introduzido na medicina durante o início do século XVI na Europa Ocidental. No século XIX, o alemão Friedrich Seturner, isolou o primeiro alcaloide extraído do ópio, a morfina, que levou cientistas a diversos estudos gerando o desenvolvimento de uma classe de substâncias altamente potentes. Na metade do século XIX, a relevância comercial e a capacidade viciante do ópio foram evidenciadas após desencadear um dos mais importantes conflitos da história da China e do colonialismo europeu, a denominada Guerra do ópio entre a China e a Grã-Bretanha (Afonso, 2018).

Atualmente, a prescrição destas substâncias deve ser extremamente rígida a fim de prevenir o uso indevido, o abuso, a dependência e a tolerância destas substâncias. Essas políticas podem incluir restrições ao número de comprimidos de opioides prescritos, limites à duração da prescrição e requisitos de monitoramento e avaliação do paciente, é importante encontrar um equilíbrio adequado entre o controle da prescrição e a garantia de que os pacientes com dor recebam o tratamento adequado (Mariuzzo, 2017).

Por outro lado, os opioides podem causar dependência e compromete a cognição, fazendo com que os indivíduos tomem decisões ruins e direcionadas à compulsão, como a busca repetitiva por drogas. Esse condicionamento decorre de efeitos recompensadores, ou devido ao alívio da dor, disforia e sintomas de abstinência. Através da exposição repetida aos opioides, essa condição se agrava, aumentando o desejo e motivação para consumir a droga em quantidades cada vez maiores (Wang, 2019). 

Ainda segundo Wang (2019), a dependência física a opioides é demonstrada por meio de sintomas de abstinência decorrentes da interrupção do uso, como: náuseas, insônia, cólicas abdominais, diarreia, vômitos e dores no corpo, disforia, ansiedade e irritabilidade. A intensidade desses sintomas pode variar em decorrência da cronicidade e potência do opioide em uso, se mais ou menos potente.

Com isso, a saúde pública tem enfrentado problemas significativos, principalmente relacionados a dependência e tolerância de opioides, que ocorre quando o corpo se adapta ao uso regular dessas substâncias e requer doses mais altas para obter o mesmo efeito. Isso ocorre porque o uso crônico destas substâncias pode resultar em mudanças no sistema nervoso central, incluindo a diminuição da sensibilidade dos receptores de opioides, a redução da produção de neurotransmissores e alterações nos processos bioquímicos e celulares envolvidos na transmissão de sinais de dor e prazer (Leal, 2020). 

Essa alta propensão em causar dependência nos seus usuários é o que torna o uso crônico de opioides, para o manejo da dor, uma preocupação entre a comunidade médica e demais profissionais da saúde. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 66% das mortes relacionados com o uso de drogas, foram causados por opioides, e aproximadamente 53 milhões de pessoas no mundo realizam o consumo dessas substâncias (UNODC, 2019). Vale destacar que, na América do Norte e Europa, houve um aumento no número de overdoses seguidas de morte causadas pelo uso de derivados de opioides sintéticos como o fentanil (Tiscione et al., 2018). 

Estima-se 12 a 21 milhões de usuários no mundo inteiro, sendo que três quartos deles usam heroína e 80% dos consumidores são americanos. As vendas dessas medicações cresceram cerca de 149% em 10 anos. Já no Brasil, um levantamento revelou que 1,3% da população faz uso de opioides e a incidência de heroína é de 0,09%. O país é o maior consumidor de analgésicos opioides da América do Sul. O risco de uso e dependência está limitado a pessoas que desenvolvem dependência após tratamento médico e aos profissionais de saúde que possuem acesso à droga. A taxa do uso nocivo entre médicos é estimada em 4% e a dependência em 22,7% (Bicca, 2012). 

Vale destacar ainda que o presente estudo tem relevância para a sociedade em geral, uma vez que, ao aprofundar-se sobre o tema, pretende-se fornecer subsídios para compreender a complexidade da epidemia de opioides entre profissionais da saúde. Diante disso, pretende-se responder a seguinte pergunta norteadora: O que se tem produzido na literatura cientifica sobre o uso indiscriminado dos opioides por profissionais da saúde?  Assim, o objetivo desta pesquisa é analisar o uso indiscriminado dos opioides por profissionais da saúde.

2 METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura (RIL), que tem como principal objetivo a realização de busca e análise das pesquisas mais significativas, possibilitando um suporte para execução da seleção de estudos. 

Realiza-se, desta forma, uma síntese sobre as ampliações dos conhecimentos colhidos do determinado assinto, além de compreender as lacunas e impasses que se tem do conhecimento e que necessitam serem finalizadas com o incentivo da realização de recentes estudos (Mendes; Silveira; Galvão, 2019). 

Esse estudo seguirá as etapas preconizadas pelo método definido por Cochrane, sendo as seguintes: 1. Formulação da pergunta; 2. Localização e seleção dos estudos em bases de dados; 3. Avaliação crítica dos estudos; 4. Coleta de dados; 5. Análise e apresentação dos dados; 6. Interpretação dos dados; e, 7. Aperfeiçoamento e atualização da revisão (Higgins; Green, 2008).

Para orientar o desenvolvimento desta revisão, utilizou-se a estratégia PICo (Sousa et al., 2018) para a elaboração do problema de pesquisa da seguinte maneira: População (P):profissionais da saúde; Interesse (I):opioides; Contexto (Co) uso indiscriminado. Dessa maneira, a questão norteadora que possibilitou realizar o estudo foi: O que se tem produzido na literatura cientifica sobre o uso indiscriminado dos opioides por profissionais de saúde? 

Foi realizado uma busca sistemática nas bases de dados de enfermagem (BDENF), Medical Literature Analysis and Retrievel system online (MEDLINE) e Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) para identificar estudos que relatem o uso indiscriminado de opioides por profissionais de saúde. As publicações foram identificadas através dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), a saber: “analgésicos opióides and epidemia de opioides and enfermagem and profissionais de saúde”. A estratégia de busca eletrônica completa está ilustrada no Quadro 1.

A busca foi realizada entre os meses de julho e setembro de 2024. As listas de referência de todos os estudos e análises elegíveis foram digitalizadas manualmente para identificar estudos adicionais para inclusão. 

Quadro 1. Estratégias de busca, Maceió, AL, Brasil, 2024.

Base de DadosEstratégia de BuscaQuantidade de artigos identificados
BDENF“epidemia de opioides and enfermagem and analgésicos opioides”22
LILACS
“epidemia de opioides and enfermagem and profissionais de saúde and analgésicos opioides”
36
MEDLINE“epidemia de opioides and enfermagem and profissionais de saúde and analgésicos opioides”31
SciELO“epidemia de opioides and enfermagem and profissionais de saúde and analgésicos opioides”20

Fonte: Autoras (2024).

Os critérios de inclusão foram os seguintes: estudos realizados nos últimos cinco anos, de 2019 a 2024; artigos que abordem a temática desejada que é uso indiscriminado de opioides por profissionais multidisciplinares da área da saúde; artigos publicados nos bancos de dados LILACS, MEDLINE, BDENF; e artigos publicados na íntegra em português. Já os critérios de exclusão foram: pesquisas que não atendem a necessidade da problemática da pesquisa e pesquisas em outro idioma.

Para seleção dos estudos, as pesquisadoras, de forma independente, examinaram as pesquisas com base no título e no resumo; quando estes não deixaram claro se entravam nos critérios de elegibilidade adotados, o artigo completo era lido. Os estudos relevantes foram lidos em texto completo e selecionados de acordo com os critérios de elegibilidade. 

Esta revisão foi sistematizada seguindo as recomendações do Preferred Reporting Items For Systematic Reviews and MetaAnalyses – PRISMA (Page et al., 2020). O processo completo pode ser visualizado no fluxograma da Figura 1.

Figura 1 – Fluxograma PRISMA de seleção da amostra dos artigos, Maceió, AL, Brasil, 2024.

Fonte: Autoras (2024).

Para extração dos dados, as investigadoras independentes, extraíram informações dos artigos publicados utilizando um protocolo predefinido. Para a extração dos dados qualitativos foram checadas informações sobre o autor, revista, ano de publicação, desenho do estudo, população, critérios de inclusão e exclusão, tipo de instrumento de coleta de dados, variáveis estudadas e principais desfechos. 

Os estudos foram analisados qualitativamente e agrupados em planilha no Microsoft Excel®. Analisou a autoria, ano de publicação, local de estudo, intervalo de idade, objetivos, nível da evidência e principais resultados.  

Para análise do nível de evidência será utilizada a seguinte classificação:  1) revisões sistemáticas ou metanálises; 2) Revisão sistemática de estudos qualitativos e descritivos; 3) Estudos qualitativos e descritivos. Os resultados serão organizados e apresentados através de quadros, e seu conteúdo será discutido à luz da literatura científica sobre a temática. 

3. RESULTADOS

Os dados foram selecionados obedecendo ao grau e importância para o desenvolvimento da pesquisa, e para isso, foi feita uma análise minuciosa referente ao objeto de estudo de cada artigo catalogado. A quadro 2 apresenta os artigos utilizados para discussão teórica, destacando o nome do autor e ano de publicação dos artigos, metodologia, resultados e conclusão de cada artigo. Para a seção da discussão foram usados seis artigos, como pode ser conferido nas tabelas 2 e 3, respectivamente.

Quadro 2 – Artigos mais relevantes utilizados no desenvolvimento da pesquisa, destacando o autor, ano e objetivos pela ordem de citação no estudo.

Ano/Estado/País PeriódicoTítulo do artigoAutoresObjetivos
012024/ Porto Alegre/ BrasilHospital de clínicas de Porto Alegre/programa de residência médica em psiquiatriaA crise dos opioides e o uso por profissionais da saúde: uma revisão narrativaPEDRO, CristineColetar dados sobre a crise de opióides nos Estados Unidos da América, identificar o uso deles no contexto brasileiro e buscar dados sobre a exposição dos profissionais da saúde à administração não terapêutica desses fármacos
022023/ Rio de Janeiro/ BrasilRev. Cient. Fac. Med. CamposCrise dos opioides e gerenciamento eficaz de sua dependência:Uma revisão bibliográficaGICOVATE, AnaO presente estudo tem como objetivo evidenciar os mecanismos fisiológicos e farmacológicos relacionados à síndrome de retirada e possíveis alternativas terapêuticas para minimizar a incidência e os efeitos deste quadro, bem como aspectos históricos, sociais e econômicos implicados no desenvolvimento da atual crise dos opioides, tendo como finalidade a conscientização geral para melhorias da perspectiva social e médica sobre o uso abusivo de fármacos opioides.
032019/ EUA Pub MedArtigo de revisão: Gestão eficaz dos sintomas de abstinência de opioides: uma porta de entrada para o tratamento da dependência de opioidesKOSTEN, Thomas; BAXTER, LouisA crise dos opioides causou um imenso prejuízo nos Estados Unidos. Em média, cinco vidas são perdidas por overdose de opioides a cada hora do dia; os custos estimados associados ao uso indevido de opioides excedem US$ 500 bilhões anualmente. A descontinuação ilícita de opioides é o primeiro passo no tratamento do transtorno do uso de opioides (OUD), e a transição para um agonista opioide pode iniciar o tratamento. No entanto, a descontinuação para abstinência de OUD diretamente ou após o tratamento com agonista resulta em sintomas de abstinência de opioides (OWS) extremamente angustiantes
042020/ Curitiba/ BrasilBraz. J. of Develop.RETIRADA DE OPIOIDES: uma revisão bibliográficaMELO, Andressa et al.Realizar uma coleta de dados sistematizada, análise reflexiva e atualizações a respeito do uso de opioides e as alternativas para a atenuação de seus efeitos relacionados a tolerância e vício no mundo
052017/ Recife/ BrasilRev. enferm. UFPE on lineUso de medicamentos psicoativos entre profissionais de saúdeMACIEL, Maria da PiedadeAnalisar o uso de medicamentos psicoativos entre profissionais da saúde.
062021/ São Paulo/ BrasilRevista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e EducaçãoDependência e síndrome de abstinência dos opioides: uma revisão narrativa para identificar os riscos relacionados ao uso indevido e/ou prolongado dessa classeOLIVEIRA, JulianeApresentar evidências teóricas sobre a dependência e a síndrome de abstinência como riscos potenciais relacionados ao uso indevido e/ou prolongado de medicamentos opioides por usuários crônicos deste princípio ativo

Fonte: Autoras (2024).

A seguir, no quadro 3, está sendo exposto os principais resultados dos artigos utilizados na discussão do trabalho, além da metodologia utilizada e conclusão dos referidos estudos.

Quadro 3 – Resumo dos principais resultados, metodologia e materiais e conclusão dos artigos utilizados.

AutoresResultadosMetodologiaConclusão
01PEDRO, CristineNos últimos anos, acompanhamos a epidemia do uso de opióides nos Estados Unidos e o crescimento vertiginoso da morbimortalidade devido a isso. O aumento do uso de opiáceos prescritos e não prescritos no mundo, bem como no Brasilia acende um alerta à comunidade de saúde.Para isso foi acessada a National Library of Medicine nas bases de dados PUBMED e na biblioteca SciELO.A literatura apresentada nesta revisão mostra que apesar de estarmos distantes dos dados de prevalência evidenciados no mundo e nos EUA, possível observar uma similaridade com o princípio da trajetória americana que culminou na crise atual dos opioides, vistos os dados brasileiros de incremento no número de prescrições de medicações opiáceas, assim como o comportamento abusivo frente a esses fármacos e, até mesmo, o transtorno por uso de substâncias.
02GICOVATE, AnaForam localizados 184 artigos, sendo excluídos 170 por não se adequarem aos critérios de inclusão propostos por esta revisão. Dessa forma, foram selecionados e analisados 14 artigos para constituição deste trabalho.Este estudo teve como base o monitoramento da dependência do uso de opioides como medicamentos para alívio da dor e o papel do mercado na sua disseminação.  Foram utilizadas as bases de dados Google Acadêmico, Pubmed e livros durante o intervalo de junho a agosto de 2021.Assim, fica evidente que o controle de uma epidemia de dependência aos opioides depende da correlação de forças entre a indústria farmacêutica e a capacidade fiscalizadora dos órgãos de saúde governamentais, além da conduta médica dentro do padrão ético que a profissão exige.
03KOSTEN, Thomas, BAXTER, LouisA hiperatividade noradrenérgica gera muitas OWS. Essas OWS podem causar recaídas nos pacientes durante a descontinuação precoce de opioides. Embora as terapias agonistas sejam geralmente de primeira linha para OUD moderado ou grave e reduzam a OWS, as restrições de prescrição podem limitar sua disponibilidade.Esta revisão avaliou estudos sobre etiologia, carga e manejo da OWS.Medicamentos não opioides para tratar OWS fornecem uma porta de entrada para tratamento de longo prazo com naltrexona ou terapias psicossociais. Para pacientes dependentes de opioides sem OUD, tratamentos não opioides como agonistas adrenérgicos α-2 podem facilitar a redução gradual de opioides.
04MELO, Andressa et al.No Brasil, os dados epidemiológicos são escassos, porém sabe-se que existe um alto consumo de analgésicos opioides. Após a revisão ficou constatado que é necessária a retirada supervisionada dos opioides envolvendo medicamentos com segurança.Trata-se de uma revisão de literatura sobre o tratamento assistido por medicação de opioides utilizando a base de dados PubMed e ScieloTanto a metadona quanto a buprenorfina são úteis no tratamento da síndrome de abstinência de opioides pois diminuem os sintomas de desejo e abstinência, além de impedir a ação de outros opioides. São necessárias mais pesquisas e estudos clínicos para avaliar essas terapias e demonstrar a viabilidade para a implementação em ambientes clínicos no Brasil.
05MACIEL, Maria da Piedade et al.entre os participantes, 37,4% tinham 16 ou mais anos de atuação na área; 14,6% consideravam-se estressados; 13% sofriam de insônia; 9,76% alegaram que o uso de medicamentos psicoativos tinha relação com o trabalho; na categoria tranquilizantes e ansiolíticos, 37,4% faziam uso desse tipo de medicamento e, na categoria dos opiáceos, 23,5%estudo descritivo, de abordagem quantitativa, com 123 trabalhadores de dois hospitais públicos, utilizando um questionário para a coleta de dados.  a carga horária excessiva de trabalho, o estresse, más condições de trabalho e noites em claro foram mostrados como motivos para o uso desses medicamentos. Descritores: Saúde Mental; Saúde; Psicoativos; Profissionais da Saúde.
06OLIVEIRA, JulianeA partir da análise dos materiais selecionados para a pesquisa, foram encontradas evidências teóricas de que a dependência e a síndrome de abstinência figuram como riscos potenciais relacionados ao uso indevido e/ou prolongado de medicamentos opioides por usuários crônicos deste princípio ativoNo presente trabalho foi realizada uma revisão bibliográfica utilizando de estudos científicos publicados nos últimos 15 anos relacionados ao tema propostoEntre os riscos oferecidos pelo uso indevido de opioides, as evidências teóricas apontam a dependência e a síndrome de abstinência, entre outros, tais como a tolerância, o vício, a overdose e até mesmo o óbito. Desta forma, cabe a reflexão da necessidade de mais pesquisas sobre o fenômeno da dor e sobre o uso dos opioides bem como o reforço constante na educação de quem os prescreve, garantindo a segurança do tratamento proposto.

Fonte: Autoras (2024).

4. DISCUSSÃO

O transtorno por uso de opiáceos é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um problema internacional e responsável por mais de 8.000 mortes por overdose na Europa, além de 62% das mortes por uso de drogas na Austrália, nos últimos anos. Dentro desse fenômeno, os Estados Unidos da América (EUA), maior consumidor de opiáceos do mundo, têm vivenciado um dos principais agravos de saúde pública da sua história. Frente à multiplicidade das causas e à gravidade dos resultados adversos, o uso indevido de opiáceos não só conduz à morte, como também leva ao sofrimento, com consequências devastadoras à saúde física, social e econômica do indivíduo (Pedro, 2024).

Os opioides são substâncias com grande potencial analgésico utilizados no tratamento de dor aguda e crônica, na analgesia intra e pós-operatória, em vítimas de trauma e em grandes queimados. Seus efeitos são atribuídos a sua atividade agonista dos receptores opioides, como os receptores Mu, Kappa e Delta, que estão presentes por todo o sistema nervoso central, mas cada um deles com suas características individuais. Os receptores Mu estão situados no córtex cerebral, no tálamo e na medula, além do trato gastrointestinal. Esses são os principais responsáveis pela ação analgésica dos opioides (GICOVATE, Ana, 2021).

 Melo et al. (2020) destacam que o grande desafio científico em relação ao uso dos opioides está na prescrição deste princípio ativo para que este atinja sua finalidade terapêutica,  ou  seja,  o  tratamento  de  dores  agudas  e  crônicas,  buscando  reduzir  ao máximo riscos como a tolerância a dependência (OLIVEIRA, Juliane, 2021).

Vale ressaltar que a tolerância aos opioides é a necessidade progressiva de doses mais altas para atingir o mesmo efeito e a dependência se caracteriza pela interrupção abrupta ou drástica redução da dosagem do medicamento, desencadeando sinais e sintomas de abstinência. Por essas razões, a crise de opioide corresponde atualmente a um dos maiores desafios da saúde pública mundial. O uso crônico de opioides promove alterações neurológicas importantes que são associadas aos sintomas de retirada. Esses sintomas estão relacionados às propriedades de cada um dos três tipos de receptores opioides e características individuais de cada fármaco. Tais fármacos induzem mudanças no sistema de recompensa da via mesolímbica, sendo essa a alteração atualmente aceita como a responsável pela dependência induzida por fármacos desta classe (Kosten; Baxter, 2019).

De acordo com as diretrizes brasileiras sobre o uso abusivo de opioides, divulgadas em 2012, os pacientes com dores crônicas e os profissionais da área da saúde estão entre os grupos de maior risco para adquirir dependência de opiáceos. A preocupação com o uso abusivo de substâncias psicoativas por parte dos profissionais de saúde não é recente. Desde 1833, a morbimortalidade na comunidade médica comparada aos dados na população em geral vem aumentando, em virtude, dentre outras causas, de complicações decorrentes de cirrose e de intoxicação medicamentosa. Historicamente, a população de médicos e demais trabalhadores da área da saúde está mais exposta ao risco de abuso de substâncias psicoativas, dentre elas medicações prescritas, como benzodiazepínicos, opiáceos e anfetaminas (Pedro, 2024).

Quanto ao uso de medicamentos psicoativos por profissionais da saúde, identificou-se que a maioria dos usuários desenvolvia uma segunda jornada de trabalho, não tinham atividades de lazer, não praticavam atividade física e considerava o ambiente de trabalho estressante. Sobre uso de opiáceos, 22,8% dos profissionais relataram já haver experimentado em algum momento da vida. O uso de analgésicos está ligado a dor sofrida pelo trabalhador da saúde. Ela pode estar relacionada ao perfil das unidades de trabalho, caracterizado pelo desgaste físico, pelo alto ritmo e cargas de trabalho exaustivas para os profissionais, podendo levar ao surgimento da ansiedade e do estresse. Alterações no padrão do sono também podem ocorrer devido à dor, quando tratada de maneira inadequada (Maciel et al., 2017). 

No estudo de Maciel et al. (2017) muitos participantes de saúde relataram que o uso de medicamentos tem relação com a atividade profissional. Eles alegaram que as más condições de trabalho, alta carga horária, várias noites de sono perdidas e estresse foram o motivo para o uso de medicamentos. Esse comportamento é justificado pelo ambiente de trabalho intensamente insalubre que esses profissionais são expostos, tanto no sentido material, quanto subjetivo e, por estarem submetidos a condições de trabalho precarizadas e à baixa qualidade de vida, levando a situações nas quais a manutenção da saúde é prejudicada.

A exposição dos profissionais de saúde aos opioides, bem como a facilidade de acesso à substância e a vulnerabilidade desses profissionais contribuí para o aumento do uso não terapêutico dos opiáceos levando ao abuso e à dependência dessas substâncias. Associados à maior facilidade de acesso, o autodiagnóstico e a automedicação, comuns entre os profissionais da saúde, inclusive entre aqueles com transtorno por uso de substâncias, bem como, a maior prevalência de transtornos depressivos e ansiosos, são fatores de risco adicionais a essa população (Pedro, 2024).

Segundo Maciel et al. (2017), inúmeros fatores podem contribuir para esse comportamento, como a carga horária excessiva, uma rotina extenuante, conflitos emocionais e o convívio com cenas de sofrimento físico e emocional, bem como a dor e a morte. Ainda, outra causa possivelmente envolvida é a exposição e a facilidade de acesso a esses fármacos, pois, geralmente, são esses profissionais os responsáveis pelo controle do acesso a esses medicamentos. Além disso, uma barreira para a tomada de decisão de buscar algum auxílio ou tratamento para esses trabalhadores, é o fato de os profissionais terem que lidar com o estigma da doença crônica, permeado por moralismos e preconceitos até os dias de hoje. 

Em muitos hospitais, observa-se grande facilidade para a obtenção de psicoativos. Estes, que deveriam ser guardados e dispensados em momentos de necessidade do paciente, ficam expostos em balcões ou armários de trancas quebradas e sua dispensação não segue nenhum protocolo que pode ser considerado rígido. Assim, não há dificuldade alguma para que qualquer funcionário, querendo utilizar a medicação, pegue e faça uso no momento ou leve para fazê-lo em casa (Maciel et al., 2017).

5. CONCLUSÃO

A crise dos opioides é um problema de saúde pública global, o uso e abuso de medicamentos opioides prescritos e drogas ilícitas derivadas têm levado a altos índices de dependência, overdose e mortes. Esses medicamentos são eficazes no tratamento da dor, mas têm um alto potencial de causar dependência física e psicológica. Os profissionais da saúde estão em uma posição única e delicada em relação à crise dos opioides. Eles não só prescrevem esses medicamentos, mas também podem estar expostos a riscos relacionados ao uso dessas substâncias. 

As principais preocupações surgem desde a prescrição inadequada de opioides, onde muitos médicos enfrentam o desafio de equilibrar o tratamento eficaz da dor com a prevenção da dependência, a falta de treinamento específico sobre a prescrição segura de opioides, e as pressões para tratar a dor rapidamente podendo levar a prescrições inadequadas, até o uso de opioides por profissionais da saúde.

O uso indiscriminado de opioides entre profissionais de saúde é um problema complexo que exige uma abordagem equilibrada entre prevenção, suporte e controle. O bem-estar desses profissionais é crucial tanto para a saúde deles quanto para a segurança dos pacientes. Esse problema pode ter consequências graves, como erros, desgaste das capacidades cognitivas e físicas, além de colocar em risco a segurança dos pacientes. Para lidar com o problema, muitos hospitais e instituições de saúde implementam programas de monitoramento rigoroso, além de oferecer apoio psicológico e programas de reabilitação para os profissionais afetados. 

Dessa forma, o uso desordenado de opioides por profissionais de saúde é um problema multifacetado que exige uma abordagem abrangente e colaborativa para ser combatido. Instituições de saúde, órgãos reguladores e a sociedade em geral têm um papel importante em promover um ambiente de trabalho mais seguro e de apoio. Enfatizar a importância da saúde mental e do bem-estar dos profissionais de saúde, além de implementar medidas preventivas e intervenções eficazes, é essencial para reduzir o uso de opioides e garantir que esses profissionais possam continuar oferecendo cuidados de qualidade, protegendo, ao mesmo tempo, sua própria saúde e segurança.

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1Graduanda do Curso de Enfermagem do Centro Universitário Cesmac; enfaannatx@gmail.com;
2Graduanda do Curso de Enfermagem do Centro Universitário Cesmac; joycecandido882@gmail.com;
3Rosa Caroline Mata Verçosa de Freitas; Professora Mestra do Curso de Enfermagem do Centro Universitário Cesmac; rosamatavercosa@hotmail.com