REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202411081657
Luana Gomes Olenchi1
Geisa Salomão Fagundes De Sousa2
Andréia Alves De Almeida3
RESUMO
Este artigo analisa a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a descriminalização do porte de pequenas quantidades de maconha e suas implicações para o sistema penitenciário brasileiro. A legalização da substância permanece inalterada, sendo competência exclusiva do Legislativo. A problemática que orienta este estudo é: como a descriminalização do porte de maconha impacta o sistema carcerário, especialmente em relação à superlotação e ao encarceramento por delitos de uso de drogas? A hipótese é que essa descriminalização possa reduzir as prisões por posse, contribuindo para desafogar o sistema prisional e permitindo o redirecionamento de recursos para políticas de saúde pública e prevenção. O objetivo geral será analisar os efeitos legais e sociais dessa decisão no contexto penitenciário. Já os objetivos específicos, busca-se investigar o impacto na reincidência criminal e nas alternativas ao encarceramento. A metodologia adotada é qualitativa e exploratória, fundamentada em análise documental e jurisprudencial, com foco na relação entre o uso de drogas e a violência. A estrutura do trabalho inclui uma fundamentação teórica, uma análise dos impactos diretos para o sistema prisional e uma comparação com abordagens de saúde pública.
PALAVRAS-CHAVES: Descriminalização. Porte de maconha. Supremo Tribunal Federal. Sistema penitenciário. Políticas públicas.
ABSTRACT: This article analyzes the decision of the Federal Supreme Court (STF) on the decriminalization of possession of small amounts of marijuana and its implications for the Brazilian penitentiary system. The legalization of the substance remains unchanged, being the exclusive responsibility of the Legislature. The central question that guides this study is: how does the decriminalization of marijuana possession impact the prison system, especially in relation to overcrowding and incarceration for drug use offenses? The hypothesis is that this decriminalization can reduce arrests for possession, helping to relieve the prison system and allowing the redirection of resources towards public health and prevention policies. The general objective is to analyze the legal and social effects of this decision in the penitentiary context. As specific objectives, we seek to investigate the impact on criminal recidivism and alternatives to incarceration. The methodology adopted is qualitative and exploratory, based on documentary and jurisprudential analysis, focusing on the relationship between drug use and violence. The structure of the work includes a theoretical foundation, an analysis of the direct impacts on the prison system and a comparison with public health approaches. It is concluded that decriminalization can facilitate a transition from a punitive approach to a public health approach, promoting significant changes in the prison system.
KEYWORDS: Decriminalization. Possession of marijuana. Federal Supreme Court. Penitentiary system. Public policies.
INTRODUÇÃO
O tema deste estudo é a descriminalização do porte de maconha e suas implicações para o sistema penitenciário brasileiro, com um enfoque especial nos impactos da recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o porte de drogas para consumo pessoal. Este tema se torna relevante, considerando as elevadas taxas de encarceramento no Brasil, que frequentemente envolvem crimes relacionados a drogas.
O problema a ser investigado centra-se em como a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de descriminalizar a porta de pequenas quantidades de maconha pode impactar o sistema penitenciário brasileiro, especialmente em relação à superlotação das prisões e ao possível redirecionamento de recursos para políticas de prevenção e tratamento de dependência?
A principal hipótese é que a descriminalização contribuirá para uma redução na população carcerária, especialmente entre os pequenos infratores e usuários de drogas, permitindo uma reestruturação de recursos e a priorização de políticas preventivas e de saúde pública. Além disso, especula-se que essa mudança poderá favorecer uma visão mais humanizada e menos punitiva no tratamento de questões relacionadas ao uso de drogas, com potencial para diminuir a criminalização dos usuários e melhorar a reintegração social de pequenos infratores.
Os objetivos gerais deste trabalho são analisar os efeitos da descriminalização do porte de maconha no sistema penitenciário e avaliar o potencial de redirecionamento de recursos para políticas preventivas e de saúde pública.
Já os objetivos específicos incluem compreender a fundamentação da decisão do STF e seus limites legais; investigar o impacto potencial da descriminalização na redução do número de encarceramentos; avaliar como o redirecionamento de recursos pode influenciar a prevenção e o tratamento de dependência; e analisar a relação entre o uso de drogas e a violência no contexto das prisões.
A estrutura do trabalho é dividida em três capítulos que tratam de aspectos específicos do tema. O primeiro capítulo apresenta uma revisão teórica sobre a criminalização do uso de drogas e o impacto dessas políticas no sistema penitenciário. Já o segundo capítulo analisa a decisão do STF, abordando os argumentos a favor e contra a descriminalização e suas implicações jurídicas. No terceiro capítulo explora os possíveis efeitos da descriminalização no sistema penitenciário, com ênfase na redução do encarceramento e no redirecionamento de recursos para áreas como a saúde e a reintegração social. E finalmente no quarto e último capítulo discute-se a relação entre o uso de drogas e a violência, considerando como uma abordagem menos punitiva pode contribuir para a diminuição da criminalidade e para a melhoria da segurança pública.
Com este estudo, espera-se contribuir para o debate sobre políticas de drogas no Brasil, promovendo uma análise crítica dos efeitos da descriminalização e sugerindo alternativas que valorizem uma abordagem mais humanista e eficiente para lidar com a questão do uso de drogas.
A metodologia adotada neste estudo é de natureza qualitativa e exploratória, com uma abordagem indutiva, baseada na análise documental e jurisprudencial. Utilizando fontes primárias e secundárias, como decisões judiciais, artigos acadêmicos e relatórios de organizações de direitos humanos, buscamos examinar os possíveis efeitos da descriminalização, tanto no âmbito jurídico quanto no social. Essa estratégia permite uma compreensão aprofundada do contexto jurídico e dos desafios envolvidos na implementação das políticas advindas da decisão do STF.
2 CONTEXTO LEGAL E HISTÓRICO DA DESCRIMINALIZAÇÃO DO PORTE DE MACONHA NO BRASIL
A trajetória da descriminalização do porte de maconha no Brasil tem raízes profundas nas políticas de drogas adotadas ao longo do século XX, particularmente a partir da década de 1970 (DALLARI, 2019). A criminalização das drogas, incluindo a maconha, foi consolidada pela Lei n. 6.368 de 1976, conhecida como a Lei de Entorpecentes (NUCCI, 2020). Essa legislação equiparava usuários e traficantes de forma indistinta, estabelecendo severas penalidades tanto para o porte quanto para a comercialização de substâncias ilícitas. A justificativa central da lei era o combate ao tráfico de drogas, uma preocupação crescente na época, devido ao aumento do consumo e da distribuição dessas substâncias em nível global, impulsionada por um contexto internacional de repressão às drogas, inspirado em políticas como a “guerra às drogas” nos Estados Unidos.
O artigo 12 da A Lei de Entorpecentes de 1976 a Lei n.º 6.368, criminalizava o porte de drogas para consumo pessoal e equiparava essa conduta ao tráfico de entorpecentes, resultando em penas severas, que incluíam a reclusão por um período de três a quinze anos, além do pagamento de multa (BONAVIDES, 2021). Essa postura rígida foi adotada com o intuito de reprimir o uso e o tráfico de drogas, sob o argumento de que a severidade das punições seria capaz de reduzir a demanda e, consequentemente, enfraquecer as redes de tráfico. No entanto, essa equiparação entre usuários e traficantes criou um sistema penal que falhou em distinguir entre o uso pessoal de substâncias ilícitas e a prática comercial dessas drogas, gerando a criminalização massiva de usuários e contribuindo para a superlotação das penitenciárias.
A criminalização do porte de drogas como um todo também abriu portas para o fortalecimento das redes de tráfico, especialmente nas áreas de fronteira do Brasil (CARVALHO, 2016). A repressão indiscriminada não fez distinções claras entre o consumidor final e o traficante organizado, criando um ambiente propício para o surgimento de organizações criminosas que exploraram a vulnerabilidade de pequenos usuários. Esses usuários, muitas vezes marginalizados e sem acesso a programas de tratamento, foram facilmente cooptados pelas redes de tráfico para atuar como “mulas”, transportando pequenas quantidades de drogas para alimentar o comércio ilícito, o que perpetuou a criminalização de indivíduos de baixa renda.
Além disso, a falta de clareza na diferenciação entre usuários e traficantes tornou a aplicação da lei altamente subjetiva, dependendo muitas vezes da interpretação de agentes de segurança e do judiciário. Esse cenário de repressão penal foi mantido até a promulgação da Lei n. 11.343 de 2006, a Lei de Drogas, que trouxe algumas mudanças significativas na abordagem do uso e porte de substâncias ilícitas. A nova lei separou as figuras do usuário e do traficante, com o objetivo de adotar uma abordagem mais humanizada e preventiva em relação ao uso de drogas.
O artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 passou a tratar o porte de drogas para consumo pessoal de forma diferenciada, retirando a pena de reclusão para usuários, mas mantendo a conduta como crime. O infrator poderia ser sujeito a penas alternativas, como advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade ou a participação em programas educativos. No entanto, a legislação não estabeleceu critérios objetivos para diferenciar o usuário do traficante, o que manteve a subjetividade na aplicação da lei, agravando a situação daqueles que eram detidos com pequenas quantidades de drogas, especialmente em áreas de fronteira e em contextos de maior vulnerabilidade social.
A partir de 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento do Recurso Extraordinário n. 635.659, que questionava a constitucionalidade da criminalização do porte de drogas para consumo pessoal, conforme o artigo 28 da Lei n. 11.343/2006. O julgamento trouxe à tona a discussão sobre os direitos fundamentais, como o direito à privacidade e à intimidade, e a necessidade de se repensar a política de drogas no Brasil. A maioria dos ministros do STF já se manifestou favoravelmente à descriminalização do porte de pequenas quantidades de maconha, sob o argumento de que a criminalização não só viola os direitos individuais dos usuários, mas também não contribui para a redução do tráfico de drogas.
Um dos principais argumentos favoráveis à descriminalização do porte de maconha é que a repressão ao uso pessoal não combate efetivamente o tráfico de drogas (SARLET, 2022). Pelo contrário, ao criminalizar pequenos usuários, o sistema penal acaba por contribuir para o fortalecimento das redes de tráfico, que se alimentam da vulnerabilidade de indivíduos marginalizados. A descriminalização, portanto, seria um passo importante na reformulação das políticas de drogas, possibilitando que os recursos antes utilizados na repressão fossem redirecionados para programas de prevenção, tratamento e redução de danos.
Em termos históricos, o Brasil seguiu a tendência internacional de repressão às drogas, influenciado por convenções internacionais e pela política norte-americana de “guerra às drogas” (LAFER, 1988). No entanto, essa abordagem repressiva falhou em conter o tráfico e o consumo de drogas, contribuindo para a superlotação das prisões e o agravamento dos problemas sociais relacionados ao uso de substâncias ilícitas. A descriminalização do porte de maconha não significa a legalização da droga, mas sim a adoção de uma política mais eficiente e humanizada, que trate o uso de drogas como uma questão de saúde pública e não de segurança.
3 IMPACTOS DA DESCRIMINALIZAÇÃO NO SISTEMA PENITENCIÁRIO
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) número 635.659 (Tema 506) de descriminalizar o porte de pequenas quantidades de maconha para uso pessoal, conforme o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635659, representa uma oportunidade única para a reformulação de políticas de reabilitação e redução de danos no Brasil. De acordo com Capez (2008) uma medida, ao redefinir o que constitui um crime, permite que o sistema penitenciário direcione seu foco para delitos de maior gravidade, com benefícios para os próprios internos e para a sociedade em geral.
Em conformidade com o tema Carvalho (2016) afirma que a superlotação dos presídios brasileiros é um problema crônico e um dos maiores desafios para o sistema de justiça e segurança pública. A ambiguidade da Lei nº 11.343/2006, conhecida como a Lei de Drogas, sobre o que caracteriza o uso pessoal versus tráfico tem levado a interpretações subjetivas, que variam de acordo com o contexto e a aplicação da lei. Como resultado, a criminalização do porte de drogas impacta desproporcionalmente populações marginalizadas, jovens e minorias, contribuindo para um encarceramento massivo e desnecessário de pessoas que poderiam ser mais bem tratadas em programas de saúde pública.
A decisão do STF de estabelecer uma quantidade padrão para o porte de maconha, entre 25 e 60 gramas, pode ajudar a harmonizar o entendimento legal e reduzir a subjetividade que permeia a aplicação da lei. Essa quantificação poderá criar uma barreira clara entre usuários e traficantes, impedindo que pequenos portadores de drogas sejam tratados como criminosos de alta periculosidade. De acordo com Silca (2020), esse entendimento pode se expandir para outras drogas, como a cocaína e o crack, o que ajudaria ainda mais a diminuir a pressão sobre o sistema penitenciário. Se a quantidade de porte descriminalizada for objetivamente definida, muitos casos atualmente puníveis com prisão se tornarão objeto de sanções administrativas, o que ajudaria a reduzir a população carcerária de maneira significativa.
Em conformidade com o tema Cogo (2020) afirma que atualmente, uma parte substancial dos recursos do sistema de justiça criminal é utilizada para processar e custodiar indivíduos presos por posse de pequenas quantidades de drogas. Com a descriminalização, esses recursos poderiam ser realocados para áreas mais necessárias, como o combate ao tráfico de drogas em maior escala e o desenvolvimento de programas de tratamento e reintegração para usuários. Além disso, a redução do número de presos por delitos de menor gravidade permitiria uma melhor gestão do sistema carcerário, melhorando as condições de vida dos detentos e tornando possível a implementação de políticas mais humanizadas e voltadas à reabilitação.
A descriminalização também pode ajudar a enfrentar problemas estruturais, como o racismo institucional e a seletividade penal. O sistema carcerário brasileiro é notoriamente desigual, com uma desproporcional representação de negros e pobres. Como a criminalização do porte de drogas afeta, sobretudo, as comunidades marginalizadas, a descriminalização poderia contribuir para reduzir essa disparidade, alinhando-se aos princípios de justiça social e equidade (Cruz, 2024). Com menos pessoas sendo presas por pequenos delitos de drogas, o sistema de justiça teria a oportunidade de promover um tratamento mais igualitário e focado nos direitos humanos.
De acordo com Galvão (2024) um dos efeitos esperados dessa descriminalização é o impacto sobre a reincidência. A criminalização do uso pessoal de drogas coloca muitos indivíduos no sistema prisional sem oferecer alternativas reais de tratamento ou apoio à reintegração. Em muitos casos, esses indivíduos saem da prisão estigmatizados, sem acesso a oportunidades de emprego e com maiores dificuldades para se reintegrar à sociedade. Ao descriminalizar o porte de pequenas quantidades de drogas, o sistema penal pode redirecionar esses indivíduos para programas de apoio social e de tratamento, ajudando a romper o ciclo de reincidência e promovendo uma recuperação efetiva (Dallari, 2019).
Contudo, a implementação prática da descriminalização exigirá mudanças significativas nas práticas policiais e judiciais. De acordo com o Instituto Igarapé (2018) as forças de segurança, em particular, precisam ser capacitadas para diferenciar de maneira objetiva o que constitui consumo pessoal e o que caracteriza tráfico, de acordo com os novos parâmetros estabelecidos pelo STF. Além disso, o sistema de justiça terá que se adaptar à nova realidade, aplicando sanções administrativas em vez de criminais em casos de porte para uso pessoal. A decisão do STF poderá abrir caminho para uma série de reformas no tratamento das questões de drogas no Brasil, incluindo a adoção de políticas mais voltadas à saúde pública e à prevenção.
Essa decisão do STF, embora focada inicialmente no porte de maconha, pode estabelecer precedentes que se estenderão a outras substâncias. Ao definir critérios mais claros para o que constitui consumo pessoal de drogas, o Brasil poderá avançar em direção a uma abordagem mais integrada e moderna de políticas de drogas. Muitos países ao redor do mundo, incluindo Portugal e Uruguai, já adotaram medidas de descriminalização, registrando melhorias tanto na saúde pública quanto na segurança, além de uma significativa redução nos custos associados ao sistema de justiça criminal. A descriminalização no Brasil pode seguir esses exemplos, ajudando o país a caminhar rumo a um modelo mais eficaz e humano de tratamento de questões relacionadas ao uso de drogas.
4 PERSPECTIVAS PARA A REABILITAÇÃO E POLÍTICAS DE REDUÇÃO DE DANOS
Com o potencial de redefinir o enfoque jurídico e social sobre o uso de drogas, essa mudança pode transformar a forma como o sistema de saúde e segurança pública lida com os usuários, colocando a saúde e o bem-estar social no centro da abordagem. A perspectiva de uma abordagem baseada em reabilitação e redução de danos alinha o país a um movimento global em favor de políticas mais humanas e menos punitivas, em especial no tratamento de dependentes químicos.
De acordo com Shecaira (2020) a redução de danos é uma abordagem que visa minimizar os efeitos negativos do uso de drogas, oferecendo apoio ao usuário em vez de punição. Com a descriminalização do porte de pequenas quantidades de maconha, há uma oportunidade para expandir essa abordagem, fornecendo aos usuários informações sobre os riscos do consumo, opções de tratamento e acesso a programas de saúde que possam oferecer alternativas ao uso contínuo. Esse modelo de política, que já foi adotado em diversos países como Portugal e Canadá, provou ser eficaz ao reduzir os danos físicos e sociais associados ao consumo de drogas e ao minimizar a estigmatização dos usuários.
A descriminalização permite que os usuários se sintam mais seguros para buscar ajuda e apoio, uma vez que não estarão sujeitos à criminalização. Muitas vezes, o medo da prisão ou de consequências legais impede que usuários busquem serviços de saúde, criando barreiras para o tratamento e a reabilitação (Lafer, 1988). Com a mudança na legislação, essas barreiras tendem a ser reduzidas, facilitando o acesso a serviços de saúde pública e de assistência social, o que é fundamental para promover a reabilitação e o bem-estar dos usuários. Ademais, o Estado poderá redirecionar os recursos que atualmente são utilizados para a repressão e o encarceramento de pequenos portadores de drogas para o fortalecimento de programas de reabilitação, tratamentos terapêuticos e programas de redução de danos.
Uma das principais perspectivas para a reabilitação no contexto da descriminalização é a integração de serviços de saúde mental e tratamento de dependência química. De acordo com Mendes (2015) o uso problemático de drogas está frequentemente associado a questões de saúde mental, e uma abordagem integrada pode fornecer um tratamento mais abrangente e eficaz. Centros de atendimento psicossocial e clínicas de saúde pública podem ser ampliados para incluir programas específicos voltados ao tratamento de dependentes de maconha e outras drogas. Essas unidades podem oferecer suporte psicológico, terapias ocupacionais, serviços de aconselhamento e atividades de reintegração social, criando um ambiente seguro e de acolhimento para aqueles que buscam abandonar o uso problemático de drogas.
De acordo com Nucci (2020) redução de danos também podem incluir a distribuição de informações sobre práticas de consumo mais seguras, educação sobre prevenção de doenças transmissíveis, e até a distribuição de suprimentos que ajudam a reduzir riscos, como seringas e materiais de higiene. Esses programas são fundamentais para a minimização de danos à saúde e para a redução do impacto social do uso de drogas, além de ajudar a prevenir a disseminação de doenças como o HIV e a hepatite C. No caso da maconha, esses programas poderiam se concentrar em ajudar os usuários a compreenderem os efeitos do uso a longo prazo, fornecer apoio para reduzir a frequência de consumo e, eventualmente, abandonar a substância se assim o desejarem.
Outro aspecto importante das políticas de reabilitação e redução de danos é o fortalecimento de campanhas de conscientização pública. A sociedade brasileira, em grande parte, ainda vê o uso de drogas com estigma e preconceito, o que cria um ambiente hostil para os usuários e reduz as chances de que eles busquem ajuda. Campanhas educativas que abordem os efeitos das drogas, os benefícios das políticas de redução de danos e a importância do tratamento para dependência química são necessárias para transformar a percepção social sobre o uso de drogas e criar um ambiente mais inclusivo. Essas campanhas podem ser realizadas em escolas, universidades, locais de trabalho e comunidades, com o apoio de profissionais de saúde, psicólogos e assistentes sociais, que podem fornecer informações precisas e desmistificar preconceitos.
A decisão do STF também abre caminho para a criação de programas de capacitação profissional e de reintegração social para os ex-usuários e dependentes em recuperação (Oliveira, 2019). A dependência química muitas vezes leva à exclusão social e à perda de oportunidades de emprego, e é fundamental que o Estado desenvolva programas de treinamento e capacitação para ajudar essas pessoas a se reintegrarem na sociedade (Sarlet, 2020). Programas de apoio, como oficinas de capacitação, treinamentos para habilidades profissionais e parcerias com empresas para a criação de vagas de trabalho voltadas para ex-usuários, são medidas eficazes que ajudam a reduzir o risco de recaída e a promover a autonomia dos indivíduos em recuperação.
Além dos programas de reintegração social, o desenvolvimento de políticas habitacionais voltadas a dependentes químicos e pessoas em situação de rua que sofrem com problemas de uso de drogas pode ser uma medida complementar importante. De acordo com Piovesan (2013) o Brasil possui muitos indivíduos que, devido ao uso problemático de substâncias, encontram-se em situação de vulnerabilidade social. Oferecer a essas pessoas acesso a moradia temporária, serviços de apoio psicológico e programas de reabilitação pode ajudar a promover uma recuperação mais consistente e eficaz. Modelos como o “Housing First”, implementado em países como Canadá e Finlândia, demonstraram que o acesso à moradia segura é um fator crítico para a reabilitação de dependentes químicos e usuários problemáticos de drogas.
A perspectiva de reabilitação e políticas de redução de danos também se beneficia de uma abordagem de saúde pública coordenada entre diferentes níveis de governo e setores da sociedade. A implementação bem-sucedida dessas políticas requer cooperação entre ministérios da saúde, segurança pública, justiça e assistência social, além de parcerias com organizações da sociedade civil e ONGs que já trabalham com a redução de danos e reabilitação. Programas colaborativos multissetoriais podem ter um impacto significativo na recuperação de dependentes químicos, além de ajudar a reduzir os impactos sociais e econômicos do uso de drogas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a descriminalização do porte de pequenas quantidades de maconha para uso pessoal, conforme o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635659, representa uma transformação relevante na abordagem brasileira ao uso de drogas. Este estudo foi estruturado para analisar os impactos dessa decisão nos contextos jurídico e social, considerando os desafios e oportunidades para políticas públicas voltadas à saúde e à dignidade humana. A seguir, são apresentadas as principais conclusões de cada capítulo e uma avaliação de como o problema de pesquisa, os objetivos e as hipóteses foram realizados.
No primeiro capítulo, foi explorado o contexto histórico e jurídico do uso de drogas no Brasil, enfatizando a criminalização do porte para uso pessoal e os efeitos sociais e penais dessa política. Observe-se que a abordagem repressiva tem contribuído para a superlotação do sistema prisional, especialmente entre indivíduos de baixa renda e minorias raciais, evidenciando um impacto social desproporcional. Esse diagnóstico reforça a relevância do problema de pesquisa ao demonstrar como a criminalização contribui para a perpetuação de desigualdades.
O segundo capítulo abordou o julgamento do STF, detalhando os fundamentos jurídicos e as interpretações dos ministros sobre o direito ao uso pessoal e a dignidade do usuário. A análise jurisprudencial destacou que a descriminalização vai além de uma simples reforma jurídica, refletindo uma mudança na percepção social e institucional sobre a eficácia das políticas de repressão. Essa análise sustenta a hipótese de que a descriminalização pode promover um sistema mais justo, retardando a marginalização e ampliando o acesso aos direitos fundamentais.
No terceiro capítulo, foram discutidos os possíveis efeitos da descriminalização para o sistema penitenciário e para a segurança pública. A descriminalização representa um potencial rompimento ao sistema prisional, permitindo a realocação de recursos para questões mais graves e ampliando as chances de reintegração social dos indivíduos anteriormente penalizados pelo porte de drogas. Constatou-se que, ao reduzir o estigma e a proteção, o sistema carcerário poderia direcionar seus esforços para áreas de maior impacto social, ou que confirmasse o alcance dos objetivos específicos de explorar os benefícios de uma abordagem menos punitiva.
O quarto capítulo abordou as políticas de saúde pública e os programas de reabilitação, enfatizando a importância de uma abordagem centrada na redução de danos e no apoio ao usuário. Uma análise comparativa de modelos internacionais mostrou que o tratamento de usuários de drogas por meio de suporte psicológico e programas de prevenção é mais eficaz do que a proteção, sendo um caminho para a redução do uso problemático e para a promoção do bem-estar social. Esse ponto reafirma as opções de políticas de reabilitação, corroborando as hipóteses iniciais sobre a eficácia de uma abordagem não repressiva.
Por fim, o estudo conclui que, embora a descriminalização traga desafios na implementação, como a necessidade de treinamento das forças de segurança para distinguir o porte pessoal de tráfico, ela também representa uma oportunidade de avanço na direção de políticas públicas mais humanas e justas. A decisão do STF marca um passo significativo ao oferecer uma base para a construção de um modelo de política de drogas que priorize a saúde pública e a redução de danos.
Concluindo, uma pesquisa demonstrou que a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal pode transformar o tratamento de usuários e promover a justiça social, combatendo desigualdades no sistema de justiça criminal. Com a implementação de cuidadosa e o apoio social, o Brasil tem o potencial de alinhar suas políticas de drogas aos princípios de dignidade humana e direitos fundamentais, tornando-se um exemplo de como a reforma das políticas de drogas pode servir ao bem-estar de toda a sociedade.
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1 Estudante do 10° período do curso de direito da Faculdade Unisapiens. Email: luana.olenchi@faculdadesapiens.edu.br.
2 Estudante do 10° período do curso de direito da Faculdade Unisapiens. Email: geisa.sousa@faculdadesapiens.edu.br.
3 Doutora em Ciência Jurídica DINTER Entre UNIVALI e Faculdade Católica de Rondônia, Mestre em Direito Ambiental pela UNIVEM/SP. Especialista em Direito Penal UNITOLEDO/SP. Especialista em Segurança Pública e Direitos Humanos pela UNIR/RO. Especialista em Direito Militar pela Verbo Jurídico/RJ. E-mail: andreia.almeida@gruposapiens.com.br