REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411081324
Ana Paula Brasil1
Osmar Moreira de Souza Júnior2
RESUMO
O I Encontro Interseccional dos Núcleos NEABI, NAPNE e NEPGENS do Ifes campus Vitória, realizado em maio de 2023, destacou-se pela promoção da diversidade e inclusão na educação técnica. O evento abordou a intersecção de raça, deficiência e gênero, e como esses fatores influenciam a educação técnica. Ao integrar as questões discutidas, o encontro ampliou a visão de como a educação técnica pode ser transformada para ser mais inclusiva e equitativa. Também ressaltou a urgência de abordar as complexidades sociais na educação, promovendo reflexão crítica e ação transformadora. Foi um espaço crucial para diálogos sobre essas interseccionalidades, fornecendo uma base teórica e prática para futuras iniciativas no Ifes. Este relato de experiências reflete a importância de eventos como este para fomentar um ambiente educativo mais inclusivo e atento às diversas realidades dos estudantes.
INTRODUÇÃO
“A interseccionalidade é uma ferramenta que nos permite entender as sobreposições e interações entre diferentes formas de opressão, como raça, gênero e deficiência, e como elas afetam a vida das pessoas.”
Carla Akotirene
Vivemos em uma era onde as discussões sobre diversidade e inclusão estão no centro dos debates educacionais e sociais. No entanto, compreender e implementar essas questões em ambientes técnicos e profissionais permanece um desafio. É nesse contexto que se insere o I Encontro Interseccional dos Núcleos NEABI (Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas), NAPNE (Núcleo de Apoio às Pessoas com Necessidades Específicas) e NEPGENS (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Diversidade Sexual) do Ifes campus Vitória, um marco significativo na promoção da diversidade e inclusão em ambientes educacionais. O evento abordou como as categorias de raça, deficiência e gênero se entrelaçaram e influenciam a educação técnica, criando um espaço para diálogos importantes sobre essas interseccionalidades.
O evento, realizado em maio de 2023, foi projetado para não apenas discutir, mas também expandir os horizontes sobre como as categorias de raça, capacitismo e gênero se entrelaçam e influenciam a educação técnica. Apoiados pelo Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (SINASEFE), os/as organizadores/as buscaram criar um ambiente no qual vozes diversas pudessem dialogar sobre questões cruciais, como o trabalho e a educação, dentro de um contexto de interseccionalidade.
As mesas temáticas e minicursos promovidos durante o encontro serviram como plataformas para que indivíduos marcados por diferentes identidades pudessem compartilhar suas experiências e reflexões. Estes debates destacaram a necessidade de reconhecer e valorizar a multiplicidade das identidades dos/das estudantes e profissionais técnicos/as, e de enfrentar as diversas formas de opressão que surgem das interseções entre raça, deficiência e gênero.
Esta é uma compilação dessas discussões e reflexões que visa não apenas documentar as atividades e diálogos ocorridos durante o evento, mas também fornecer uma base teórica e prática para futuros encontros e iniciativas dentro e fora do Ifes. Através dos textos que se seguem, exploraremos os desafios e oportunidades que a interseccionalidade traz para a educação técnica, apresentando estratégias e perspectivas que podem ajudar a construir um futuro mais inclusivo e equitativo.
Convidamos todos/as os/as leitores/as a mergulharem nesta jornada de aprendizado e reflexão, reconhecendo que a interseccionalidade não é apenas uma lente para analisar a sociedade, mas também um chamado à ação para transformar as práticas educativas e promover a verdadeira inclusão em todos os níveis.
Fundamentos da Interseccionalidade: Reflexão e Ação
A interseccionalidade é uma ferramenta analítica que examina como diferentes categorias sociais e identidades – como raça, gênero, classe, sexualidade e deficiência – se cruzam e se sobrepõem, produzindo experiências únicas de opressão e privilégio, promovendo desigualdades e discriminação. Esse conceito, cunhado por Kimberlé Crenshaw, tem suas raízes no feminismo negro, que evidencia as discriminações específicas enfrentadas por mulheres negras, distintas das vivenciadas por homens negros e mulheres brancas. Desde o final da década de 1980, tem sido mostrada como uma poderosa ferramenta nas ciências sociais para analisar desigualdades e discriminações (Pereira, 2021).
Na educação técnica, a interseccionalidade se revela crucial para entender e abordar as desigualdades enfrentadas por estudantes com múltiplas identidades marginalizadas. Ao desenvolver políticas educacionais, é fundamental considerar como as diferentes identidades dos/das estudantes podem impactar seu acesso e sucesso na educação técnica. Isso inclui garantir que currículos, materiais didáticos e práticas pedagógicas sejam inclusivos e representativos das diversas experiências dos discentes.
Estudantes com identidades interseccionais podem enfrentar desafios únicos que requerem suporte específico. Recursos acadêmicos que levem em conta essas complexidades podem fazer uma diferença significativa no sucesso desses/as estudantes. Promover um ambiente de aprendizagem que respeite e valorize a diversidade é essencial. Isso pode incluir treinamento para educadores/as sobre questões de interseccionalidade e a implementação de práticas antidiscriminatórias no cotidiano escolar.
Um currículo que incorpore a interseccionalidade ajuda alunos/as a entenderem as complexidades das dinâmicas sociais e a desenvolverem uma consciência crítica. Isso não só enriquece o aprendizado, mas também prepara os/as alunos/as para lidar com a diversidade no mercado de trabalho e na sociedade como um todo. Além disso, incorporar as vozes e experiências dos/das estudantes nas discussões e no desenvolvimento de políticas ajuda a garantir que as medidas adotadas sejam realmente eficazes e relevantes. Isso pode ser feito através de encontros, fóruns, grupos de discussão e pesquisas participativas, uma vez que pesquisadores/as enfatizam a importância de ir além da identidade individual para incluir dimensões simbólicas e estruturais da sociedade em análises interseccionais (Carvalho, 2020). A aplicação da interseccionalidade na pesquisa educacional tem esclarecido questões como relações étnico-raciais, violência contra as mulheres e dinâmicas de gênero no ensino, demonstrando seu potencial para enriquecer nossa compreensão de fenômenos sociais complexos em ambientes educacionais (Santos; Antonio, 2023; Carvalho, 2020).
Neste sentido, em maio de 2023, o Ifes campus Vitória sediou o I Encontro Interseccional dos Núcleos NEABI, NAPNE e NEPGENS, um evento que teve como objetivo ampliar as perspectivas sobre diversidades e suas interseções entre trabalho e educação. Apoiado pelo Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (SINASEFE), o encontro promoveu mesas temáticas e minicursos onde se discutiram questões cruciais para a contemporaneidade.
O evento visou principalmente proporcionar um espaço de diálogo entre sujeitos marcados pelas categorias de raça, deficiência e/ou gênero. Este encontro foi especialmente significativo no contexto da educação técnica do Ifes, que muitas vezes não aborda de forma integrada essas questões. Embora as temáticas de raça, deficiência e gênero sejam abordadas individualmente pelos respectivos núcleos – NEABI, NAPNE e NEPGENS – a proposta deste encontro foi integrá-las sob a ótica da interseccionalidade.
O encontro contou com uma mesa de abertura: “Educação e trabalho: desafios para o acesso e a permanência de corpos atravessados por raça, capacitismo e gênero” e uma mesa temática: “Políticas de cotas para PCD, PPI e pessoas Trans”; foram oferecidos dois minicursos, com as temáticas: “A heteroidentificação como princípio educativo” e “Construções e des(construções) socioculturais dos conceitos de gênero e identidade de gênero e suas relações com as políticas de inclusão de pessoas trans[1] no/pelo Ifes” e finalizando o evento, a conferência de encerramento, abordou “Reflexões sobre a interseccionalidade na educação pública”.
Raça, Gênero, Educação e Trabalho: Desafios e Avanços – Perspectivas de Equidade e Representatividade
A mesa de abertura “Educação e trabalho: desafios para o acesso e a permanência de corpos atravessados por raça, capacitismo e gênero” focou na influência da raça, gênero e capacitismo sobre as oportunidades e desafios no mercado de trabalho. Essa temática dialoga profundamente com a pedagogia engajada de bell hooks (2013), que defende uma educação além da transmissão de conhecimento, promovendo a conscientização crítica e o engajamento dos/das estudantes. Ela argumenta que a educação deve enfrentar e desafiar as injustiças sociais, reconhecendo as interseções entre diferentes formas de opressão.
Os/As palestrantes[2] compartilharam experiências e dados, destacando a importância de políticas afirmativas e de inclusão, e os desafios enfrentados por pessoas afetadas por estigmas ligados aos marcadores de raça, gênero e deficiência. A pedagogia engajada de hooks enfatiza a necessidade de desenvolver uma consciência crítica sobre essas realidades, capacitando para o questionamento e transformação das estruturas opressoras.
A mesa, ao discutir o acesso e a permanência no mercado de trabalho para pessoas racializadas, com deficiências ou de diferentes gêneros, ecoa a visão de hooks (2013) sobre uma educação inclusiva e diversa, que acolhe todas as identidades e experiências. A autora vê a educação como um caminho para a transformação social, preparando as pessoas para serem agentes de mudança. As abordagens da mesa ressaltaram a importância de entender e enfrentar as interseções das diferentes formas de opressão e discriminação, promovendo uma prática educativa verdadeiramente libertadora e transformadora.
Estudos enfatizam a necessidade de ampliar as discussões sobre as inter-relações entre trabalho e identidade de gênero em instituições de educação profissional e tecnológica (Cavalcante et al., 2021). Pesquisas têm explorado como conceitos de trabalho, educação, gênero e sexualidade são abordados na formação profissional, propondo intervenções educacionais para promover um ambiente mais inclusivo (Inocêncio et al., 2021). Podemos citar como exemplo a representação de mulheres no ensino superior, particularmente em programas de pós-graduação, e sua inserção no mercado de trabalho, que têm sido examinadas criticamente, revelando desigualdades persistentes (Lenoir et al., 2022). Adicionalmente, estudos têm se concentrado nos desafios enfrentados por estudantes LGBTQIA+ em ambientes educacionais e profissionais, enfatizando o papel das escolas na desconstrução de estereótipos de gênero e na preparação dos/das estudantes para o mercado de trabalho (Medeiros; Santos, 2020). Esses estudos ressaltam a importância do desenvolvimento de discussões e ações envolvendo gênero em contextos educacionais e profissionais.
Pesquisas indicam que questões raciais impactam significativamente a educação técnica no Brasil. Estudos destacam os desafios na implementação das Leis 10.639/03 e 11.645/08, que determinam a inclusão da história e cultura afro-brasileira e indígena nos currículos (Santos et al., 2024). Há uma falta de conscientização entre os professores sobre essas leis, particularmente em programas de Educação de Jovens e Adultos (EJA). A relação entre a questão étnico-racial e a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é crucial para promover inclusão e enfrentar desigualdades educacionais. A implementação das leis influencia essas práticas, destacando a importância de abordagens que valorizem as culturas afro-brasileira e indígena. Isso é essencial para criar um ambiente educacional mais justo e representativo, capacitando indivíduos historicamente marginalizados a contribuir plenamente para a sociedade (Oliveira; Ferreira, 2019). No entanto, ações afirmativas como sistemas de cotas e o estabelecimento dos NEABIs (Núcleos de Estudos Negros e Indígenas) têm promovido a igualdade racial na educação técnica (Santos et al., 2024). Enquanto a incorporação de discussões étnico-raciais em aulas de inglês usando tecnologias digitais demonstrou aumentar o envolvimento dos estudantes e promover a educação emancipatória em cursos técnicos (Mota; Thompson, 2020).
Após a mesa de abertura, os/as participantes puderam escolher entre os dois minicursos ofertados. O minicurso “A Heteroidentificação como Princípio Educativo” justificou-se pelo potencial educativo da heteroidentificação, atuando além do controle da política de cotas. Considerou-se a competência social das instituições de educação, que têm o poder/dever de educar em todas as suas ações. A heteroidentificação foi vista como uma oportunidade para trabalhar conceitos importantes para a luta antirracista, como ações afirmativas, cotas, miscigenação, fenótipo, raça e racismo.
Os/As participantes da oficina conheceram a estrutura do Método Colhetear, proposto pela pesquisadora Ignêz Pina/Ifes, e tiveram a oportunidade de dialogar e refletir sobre as diversas formas de utilizar a heteroidentificação como ferramenta educativa em diversos contextos sociais e educacionais.
Foi possível reconhecer que as relações humanas são complexas e multifacetadas, influenciadas pelos acontecimentos sócio-históricos e pelos territórios onde ocorrem. As relações raciais são afetadas pelos sujeitos, tempos, espaços e experiências que as permeiam, e pelas forças intrínsecas ao processo de civilização da sociedade. Considerando essas especificidades e a necessidade de difusão das práticas antirracistas, a proposta foi apresentada como um instrumento para diálogos, reflexões, construção de conhecimentos e fortalecimento da educação para as relações étnico-raciais.
O procedimento de heteroidentificação foi destacado por seu robusto potencial educativo, capaz de atuar além do controle da política de cotas. Nessa perspectiva, a oficina se apresentou como um instrumento para fomentar a temática e estimular reflexões sobre as possibilidades técnico-pedagógicas da Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER).
A heteroidentificação, verificação por terceiros da condição autodeclarada, no Ifes representou o momento em que a instituição exerceu sua competência social, educando não somente os/as candidatos/as às cotas raciais, mas toda a sociedade. Os conceitos de ações afirmativas, cotas, miscigenação, fenótipo, raça e racismo foram debatidos.
O outro minicurso, “Construções e Des(construções) Socioculturais dos Conceitos de Gênero e Identidade de Gênero e suas Relações com as Políticas de Inclusão de Pessoas Trans no/pelo Ifes” discutiu como os conceitos de gênero e identidade de gênero são construções socioculturais que variam conforme a cultura, tradições, normas e valores. Isso está alinhado com as políticas do Ifes, que promovem a equidade de gênero e a inclusão de pessoas trans. Foi abordada também a violência contra pessoas trans no Brasil, destacando a necessidade urgente de políticas inclusivas e de proteção. Além disso, foi enfatizado que o Ifes implementa ações contra o sexismo, machismo, transfobia e discursos de ódio, ajudando a promoção de um ambiente seguro e inclusivo.
O minicurso, ao tratar das construções socioculturais de gênero e identidade de gênero e as políticas de inclusão do Ifes apresenta uma forte conexão com os conceitos de bell hooks (2013) em “Uma Revolução de Valores” e “Abraçar a Mudança” no livro “Ensinando a Transgredir: A Educação como Prática da Liberdade”. A autora argumenta que uma revolução de valores é necessária para abordar questões de raça, gênero e classe de maneira inclusiva. O minicurso discutiu exatamente isso, ao destacar a importância de políticas inclusivas que respeitem e promovam a diversidade de gênero. A ênfase na urgência de políticas efetivas de inclusão e proteção para pessoas trans no Brasil se alinha com a chamada para uma transformação profunda nos valores sociais, visando uma educação e uma sociedade mais justa. bell hooks encoraja a aceitação e promoção da mudança como parte integral da prática educacional. O Ifes, ao implementar ações concretas para criar um ambiente seguro e inclusivo, exemplifica o que hooks chama de “abraçar a mudança”. A promoção de um ambiente educativo que acolha todas as identidades e experiências está em linha direta com a visão da autora de uma educação que não apenas transmite conhecimento, mas também transforma a sociedade.
Ambos os textos de hooks destacam a importância de uma abordagem educacional transformadora que enfrenta e desafia as estruturas opressivas. O minicurso, ao abordar a inclusão e a proteção de pessoas trans, exemplifica a aplicação prática dessas ideias, promovendo uma revolução de valores e abraçando a mudança necessária para construir uma sociedade mais equitativa e respeitosa.
Capacitismo e Inclusão: Práticas Educacionais no Ifes
Pesquisas recentes destacam os desafios e estratégias para promover a inclusão de pessoas com deficiência na educação técnica. O capacitismo, a discriminação contra pessoas com deficiência, é identificado como uma grande barreira à educação inclusiva. Para abordar isso, a pesquisa colaborativa com centros de apoio como o NAPNE é crucial para compreender e minimizar as barreiras capacitistas em instituições educacionais (Viana; Magalhães, 2023). A abordagem de capacidade oferece uma perspectiva não capacitista sobre autonomia e capacidade na educação inclusiva (Sanches et al., 2022). No entanto, políticas educacionais internacionais e
estratégias de educação especial no Brasil têm sido criticadas por promover diversificação, flexibilidade curricular e abordagens baseadas em competências que podem levar a padrões educacionais mais baixos e reforçar a desigualdade (Garcia; Michels, 2021). Para combater essas questões, adaptações curriculares são sugeridas como uma estratégia fundamental para a criação de escolas verdadeiramente inclusivas.
A mesa “Políticas de cotas para PCD, PPI e pessoas trans” abordou o capacitismo e as barreiras enfrentadas pelas pessoas com necessidades específicas no contexto educacional. A discussão girou em torno de práticas pedagógicas inclusivas e estratégias para um ensino mais acessível na educação técnica, incluindo exemplos de iniciativas e boas práticas. Nos formulários de inscrição, foi possível evidenciar a preocupação de perguntar aos participantes se eram “pessoas com deficiências, TEA ou mobilidade reduzida”, além de consultá-los/las se tinham necessidade ou não de suporte ou atendimento (Exemplo: “Sou pessoa cega e preciso de audiodescrição”/”Sou pessoa surda e preciso de intérprete de Libras”) para oportunizar uma participação efetiva e com qualidade.
Durante as discussões sobre políticas inclusivas, foi enfatizada a importância de desenvolver políticas afirmativas que considerem as especificidades das pessoas com deficiência, destacando que a educação deve ir além da inclusão física e promover um ambiente que respeite a diversidade em todas as suas formas. Os desafios identificados incluíram o capacitismo como uma barreira significativa à educação inclusiva, exigindo uma abordagem colaborativa entre instituições de ensino e centros de apoio para compreender e superar essas barreiras. Propostas de ação discutidas incluíram práticas pedagógicas inovadoras para criar um ambiente mais inclusivo, como a formação de educadores/as sobre questões relacionadas ao capacitismo e a inclusão das vozes dos/das estudantes com deficiência nas discussões sobre políticas educacionais.
Interseccionalidade em Ação: Relatos e Reflexões dos Participantes
A interseccionalidade surge como uma abordagem crucial para criar ambientes educacionais mais inclusivos, especialmente no Ensino Médio. Estudos destacam a importância de transformar experiências individuais em práticas coletivas para efetivar a inclusão escolar (Miranda; Del Pino, 2018). A discussão sobre gênero e a aplicação de uma educação feminista são fundamentais para promover a equidade e fortalecer o não silenciamento de mulheres na ciência, especialmente mulheres negras (Lara; Abreu, 2023). A troca de experiências em ambientes formais e informais é essencial para o aprendizado coletivo e para superar desafios na garantia dos direitos de alunos/as com deficiência (Souto; Almeida, 2024). Além disso, a interseccionalidade é proposta como ferramenta para compreender as desigualdades sociais de gênero e raça no ensino, promovendo uma educação antirracista e reflexiva sobre aspectos formativos, culturais e identitários (Fiuza et al., 2024).
Durante o evento, a mesa de abertura discutiu a interseção entre raça, deficiência e gênero, destacando como o capacitismo impacta as oportunidades educacionais e profissionais de pessoas com deficiência. Palestrantes compartilharam experiências sobre as barreiras enfrentadas no acesso à educação e ao mercado de trabalho. Enquanto a conferência de encerramento: “Reflexões sobre a interseccionalidade na educação pública” abordou as questões de gênero no ambiente de trabalho, incluindo discussões sobre disparidade salarial, assédio e a importância da representatividade feminina e LGBTQ+ em posições de liderança. Ao final, os/as participantes do evento fizeram relatos e apresentaram reflexões, destacando experiências individuais e coletivas que ilustram a importância da interseccionalidade na criação de ambientes educacionais mais inclusivos.
Reflexões e Conclusões
Estudos recentes abordaram a interseccionalidade a contextos educacionais, explorando suas implicações para a pedagogia, ambientes escolares e experiências de professores/as. Neste sentido, as discussões promovidas pelo evento sublinharam a importância da interseccionalidade na compreensão e enfrentamento das múltiplas formas de opressão. Integrar as categorias de raça, deficiência e gênero não só enriquece o debate, mas também propõe soluções mais abrangentes e efetivas para os desafios contemporâneos.
Esperamos que as reflexões e conexões feitas durante o evento inspirem futuras iniciativas e políticas públicas que reconheçam e valorizem a diversidade em todas as suas formas. Essa abordagem proporciona espaços de conscientização sobre processos de dominação e desafia narrativas hegemônicas ocidentais.
O I Encontro Interseccional dos Núcleos NEABI, NAPNE e NEPGENS representa um passo importante na busca por uma educação mais inclusiva e equitativa, reconhecendo que a interseccionalidade não é apenas uma lente analítica, mas um chamado à ação para transformar práticas educativas. As discussões promovidas durante o encontro têm o potencial de inspirar futuras iniciativas que valorizem a diversidade em todas as suas formas.
O I Encontro Interseccional dos Núcleos NEABI, NAPNE e NEPGENS do Ifes campus Vitória abordou diversos desafios cruciais. O evento destacou as dificuldades de acesso e permanência enfrentadas por indivíduos marcados por raça, deficiência e gênero, evidenciando a necessidade de políticas afirmativas que considerem essas interseccionalidades. A importância de reconhecer e valorizar a multiplicidade das identidades dos/das estudantes foi enfatizada, mostrando como diferentes formas de opressão se interseccionam nas experiências educacionais.
A discriminação contra pessoas com deficiência foi identificada como uma barreira significativa para a educação inclusiva, apontando para a necessidade de maior conscientização e suporte adequado. A implementação de políticas que promovam a equidade de gênero e a inclusão de pessoas trans também foram discutidas como urgentes, especialmente para proteção contra violência e discriminação.
Por fim, destacamos a importância de se desenvolver uma consciência crítica entre educadores/as e estudantes sobre as injustiças sociais, enfatizando que a educação deve ir além da transmissão de conhecimento, mas também promover mudanças sociais. Esses desafios refletem a complexidade das interseccionalidades na educação técnica e a urgência de abordagens inclusivas que considerem as diversas realidades dos/das estudantes.
AGRADECIMENTOS
Ifes campus Vitória
Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica – seção sindical Ifes – SINASEFE seção Ifes.
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[1] “trans”, é um adjetivo usado para descrever a pessoa cuja identidade de gênero não corresponde ao sexo biológico. Fonte: BRASIL, Ana Paula. MPECM: Produto Educacional – E-book. 2018. Disponível em: https://educapes.capes.gov.br/bitstream/capes/564230/2/MPECM_%20Produto%20Educacional_%20E-book _%20Ana%20Paula%20Brasil_%20Turma%202015%20-%20TE_%20V%20Final%20em%2003.04.2018.p df. Acesso em: 05 nov. 2024.
[2] Os nomes de palestrantes e temas das atividades podem ser acessados no site do evento: https://sigeventos.ifes.edu.br/evento/EIDNNNNICVAPSDSIETE2.
[1] Técnica em Assuntos Educacionais no Ifes campus Vitória; doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São Carlos (PPGE-UFSCar).
[2] Professor do quadro permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSCar, na Linha de Pesquisa Práticas Sociais e Processos Educativos.