REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202410311816
Deborah Cristina Pinheiro Ferreira¹
Jennifer Alves Rates Gomes²
RESUMO
O estudo investigou a ausência de uma legislação específica contra a revenda de ingressos a preços elevados, conhecida como cambismo, que ocorre em eventos musicais e culturais no Brasil. Embora o cambismo em eventos esportivos seja penalizado pela Lei Geral do Esporte e pelo Estatuto do Torcedor, a legislação não abrange eventos culturais e musicais, criando uma lacuna significativa. A pesquisa revelou que, enquanto a Lei nº 1.521/51 penaliza práticas especulativas de maneira geral, não há uma tipificação direta para a revenda abusiva de ingressos para shows e eventos culturais. O estudo também abordou a eficácia das propostas legislativas atuais, como o PL 3.115/23, que visa criminalizar o cambismo digital e estabelecer sanções para essa prática. Foi identificado que as práticas desleais dos cambistas, como o uso de bots e a compra massiva de ingressos, dificultam a fiscalização. A falta de regulamentação específica e a ineficácia dos controles existentes prejudicam os consumidores e distorcem o mercado. O estudo conclui que uma legislação mais robusta, combinada com mecanismos de fiscalização avançados e maior conscientização pública, é essencial para combater o cambismo e proteger os direitos dos consumidores.
Palavras chaves: cambismo; lei para cambismo; revenda de ingresso; cambismo é crime
ABSTRACT
The study investigated the lack of specific legislation against ticket scalping, a practice where event tickets are resold at prices above their original value, commonly seen at musical and cultural events in Brazil. While scalping at sports events is penalized under the General Sports Law and the Statute of the Fan, there is no direct legislation covering cultural and musical events, creating a significant legal gap. The research revealed that although Law No. 1.521/51 penalizes speculative practices in general, there is no direct provision for the abusive resale of tickets for concerts and cultural events. The study also examined the effectiveness of current legislative proposals, such as PL 3.115/23, which aims to criminalize digital scalping and impose penalties for such practices. It was identified that unfair practices by scalpers, such as using bots and mass purchasing tickets, complicate enforcement. The lack of specific regulation and ineffective controls harm consumers and distort the market. The study concludes that more robust legislation, combined with advanced enforcement mechanisms and increased public awareness, is essential to combat scalping and protect consumer rights.
Keywords: ticket scalping; ticket scalping regulation; ticket resale; ticket scalping is illegal
1 INTRODUÇÃO
O presente estudo se dedicou à análise da falta de legislação que proíba a revenda de ingressos de eventos musicais a preços que excedem os valores originais, no qual se caracteriza com o fenômeno conhecido como cambismo. Essa prática é uma ocorrência de longa data no Brasil e é amplamente observada durante turnês de artistas renomados, tanto nacionais quanto internacionais (Prado, 2023).
A respeito da legislação sobre a revenda de ingresso, destacou-se que conforme estabelecido na legislação brasileira, não havia uma tipificação específica para o crime de cambismo. Dentro dos crimes contra a economia popular, elencados na Lei nº 1.521, existe uma disposição que penaliza com detenção de seis meses a dois anos, além de multa, a prática de “obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos”. Esta informação foi fornecida por Mário Panseri Ferreira, sócio e coordenador da área penal do escritório Pinheiro Neto Advogados, à Splash. (Splash Uol, 2023).
Andreucci (2023), explica que a classificação do cambismo como venda de ingressos para eventos esportivos por um preço superior ao valor impresso no bilhete foi estabelecida inicialmente no Estatuto do Torcedor, e posteriormente mantida na nova Lei Geral do Esporte.
No entanto, essa tipificação se aplica exclusivamente aos “ingressos de evento esportivo”, excluindo todos os outros tipos de ingressos, tais como os de shows em geral, eventos artísticos, eventos carnavalescos, apresentações de artistas e músicos nacionais e internacionais, festas populares, entre outros.
A legislação brasileira não tipifica diretamente o crime de cambismo, mas a revenda de ingressos para eventos esportivos a preços superiores é criminalizada conforme previsto nos art. 166 da Lei n°14.597 de 14 de Junho de 2023: “vender ou portar para venda ingressos de evento esportivo, por preço superior ao estampado no bilhete: Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.” (Brasil,2023).
Contudo, é evidente a existência de uma lacuna na legislação vigente, visto que esta não se trata de maneira específica a questão da revenda de ingressos para eventos musicais. Em decorrência da crescente demanda por shows internacionais no território brasileiro nos últimos anos, tem-se verificado um substancial aumento da presença de cambistas nas filas destinadas à venda de ingressos para apresentações de artistas renomados, como da artista Taylor Swift. (Lima, 2024).
Dessa forma, a problemática a ser abordada no presente artigo é: Quais os procedimentos legais que podem ser adotados para punir as atividades dos cambistas, buscando garantir a segurança dos consumidores na aquisição de ingressos provenientes de terceiros?
Para responder essa pergunta o estudo analisou os desafios jurídicos e as consequências da atuação dos cambistas em eventos no Brasil, em virtude da ausência de legislação específica que vise coibir tal prática, proporcionando uma visão abrangente sobre o tema.
Adicionalmente, foram avaliadas a eficácia potencial das medidas legislativas em tramitação para reduzir a revenda de ingressos a preços superiores aos valores originais, com destaque para o Projeto de Lei nº 3.115/23.
O artigo abordou, ainda, as práticas desleais frequentemente adotadas pelos cambistas, como a quebra de filas e a revenda de ingressos por meio de plataformas online específicas. Por fim, foi analisado o impacto da crescente presença dos cambistas nas filas de vendas de ingressos para shows musicais e eventos esportivos de grande notoriedade no Brasil.
Diante dessas considerações, são propostas as seguintes hipóteses: A implementação de medidas de controle e fiscalização mais rigorosas dentro das plataformas de venda de ingressos online, incluindo a limitação do número de ingressos adquiridos por CPF conforme proposto no PL 2.942/22, bem como a aprovação e execução do PL 3120/2023 que proíbe a comercialização de ingressos por valores maiores que o estipulado e o PL 3.115/23, que criminaliza o cambismo digital e estabelece sanções para essa prática e alteração da Lei n° 1.521, que exercerá um impacto significativo na redução da revenda de ingressos por valores superiores ao original, tanto em eventos esportivos quanto em shows musicais, promovendo uma maior proteção ao consumidor e desestimulando os cambistas.
Isso se justifica ao fato do notável aumento da realização de shows internacionais no país e a consequente alta demanda por ingressos e observa-se que é comum que os ingressos disponibilizados nos sites sejam adquiridos em grande volume por cambistas, privando os consumidores de opções viáveis de compra.
A ausência de uma legislação específica para regular a atuação dos cambistas permite que estes adquiram ingressos em grande quantidade e os revendam a preços elevados, sem a devida fiscalização das autoridades competentes. Embora existam diversos riscos associados à compra de ingressos por meio de terceiros, como a falta de garantias de autenticidade, a possibilidade de fraudes e a elevação dos preços, os consumidores frequentemente se veem sem alternativas viáveis de aquisição, permanecendo desprotegidos e sem impedimentos legais que os dissuadam de realizar essas compras em tais circunstâncias.
Assim, o artigo científico concentrou-se na análise dos desafios jurídicos e das possibilidades legais para sancionar a conduta dos cambistas, com o objetivo de proteger os direitos dos consumidores. Sob a perspectiva jurídica, abordar essa temática requer a promoção de clareza e fundamentação para as decisões judiciais, além de contribuir para a disseminação de conhecimento na sociedade.
2 MATERIAL E MÉTODOS
Este estudo adotou uma abordagem aplicada, baseada em fontes bibliográficas e documentais, com uma orientação explicativa e qualitativa. A escolha da metodologia aplicada tem como objetivo gerar conhecimentos com aplicabilidade prática, direcionando-se à solução de problemas específicos relacionados ao cambismo em eventos no Brasil. Nesse sentido, a pesquisa examinou a eficácia das legislações e práticas atuais, bem como as propostas legislativas em tramitação destinadas a enfrentar o problema. Esta abordagem permitiu a formulação de recomendações práticas voltadas para a melhoria da regulamentação e da fiscalização no contexto da revenda ilegal de ingressos.
A pesquisa foi realizada por meio de uma revisão bibliográfica extensiva, abrangendo artigos acadêmicos, revistas eletrônicas e recursos disponíveis na internet que abordam o tema dos cambistas em eventos no Brasil. Além disso, foi efetuada uma pesquisa documental que incluiu a análise das leis vigentes, da jurisprudência e de documentos relevantes sobre o assunto. Este processo possibilitou a coleta de dados essenciais para desenvolver uma compreensão abrangente do problema em questão e fundamentar as análises propostas.
Os dados obtidos foram analisados qualitativamente, com o objetivo de identificar lacunas na legislação brasileira relacionadas à revenda de ingressos para eventos musicais a preços elevados, bem como as práticas desleais empregadas pelos cambistas e as consequências da ausência de uma regulamentação eficaz.
A análise foi direcionada para explicar os desafios legais e as implicações decorrentes da atuação dos cambistas em eventos no Brasil. A metodologia deste estudo visa, primordialmente, esclarecer as hipóteses formuladas, com o propósito de oferecer uma compreensão aprofundada dos desafios legais e das consequências associadas à prática dos cambistas em eventos no Brasil.
3 RESULTADOS
O estudo mostrou que a falta de uma legislação específica para impedir a revenda de ingressos para eventos musicais a preços superiores ao valor original — conhecida como cambismo — representa um problema jurídico recorrente no Brasil. Essa prática, comum em shows de grandes artistas nacionais e internacionais, evidencia uma importante fragilidade na legislação atual.
A pesquisa demonstrou que, embora o cambismo seja uma prática consolidada no país, não existe uma tipificação penal específica que o aborda em eventos musicais e culturais. Enquanto o cambismo em eventos esportivos foi criminalizado pelo Estatuto do Torcedor, e sua previsão legal foi mantida na nova Lei Geral do Esporte, tal regulamentação não se estende a outros tipos de eventos. Isso gerou uma lacuna normativa, permitindo que cambistas continuem atuando em shows e espetáculos artísticos, sem sofrerem sanções penais específicas sob a legislação vigente.
A análise revelou que a maioria das normas existentes não cobre adequadamente as práticas contemporâneas de cambismo, como a revenda online, e carece de mecanismos de fiscalização robustos. A revisão das propostas legislativas em tramitação, como os Projetos de Lei nº 3.115/23, nº 2.942/22 e nº 3.120, indicou que há esforços em andamento para reforçar a regulamentação, mas as lacunas permanecem, especialmente em relação à implementação e fiscalização dessas normas.
O estudo também abordou as práticas frequentemente adotadas pelos cambistas, como a quebra de filas e o uso de bots em plataformas online para adquirir grandes quantidades de ingressos. Segundo Pavan (2022), muitos fãs enfrentaram dificuldades na aquisição de ingressos para esses eventos, os quais frequentemente se esgotam em questão de minutos. Apesar da demanda elevada, há indícios que sugerem a existência de um obstáculo adicional que interfere na realização dessas compras: a intervenção de bots nos sites das empresas responsáveis pela comercialização desses ingressos.
De acordo com Possa (2023), Ken Lowson, um ex-fraudador, relatou em entrevista ao site Olhar Digital que robôs, como os utilizados para o show do RBD realizado em 2023, possuem a capacidade de preencher formulários em frações de segundo e localizar ingressos no exato momento em que são disponibilizados para venda. Segundo Lowson, é viável adquirir até 20 mil ingressos em poucos minutos.
A intervenção tecnológica ilustra a magnitude do problema, prejudicando milhões de fãs que enfrentam dificuldades para adquirir ingressos de maneira legítima. A capacidade dos bots de manipular o sistema de vendas, adquirindo milhares de ingressos em questão de minutos, revela a urgência de medidas legislativas e tecnológicas mais eficazes. A modernização dos mecanismos de fiscalização, aliada à conscientização do público e à punição rigorosa dos cambistas, é fundamental para garantir a equidade no acesso a eventos culturais e esportivos no Brasil.
O impacto da atuação dos cambistas em eventos de grande notoriedade, como shows musicais e eventos esportivos, mostrou-se significativo. Os consumidores enfrentam dificuldades para adquirir ingressos a preços justos, enquanto o mercado sofre distorções devido à especulação de preços, o que afeta tanto a arrecadação tributária quanto a credibilidade das vendas oficiais.
Os dados analisados indicam que a ausência de uma regulamentação eficaz permite que cambistas adquiram grandes quantidades de ingressos, revendendo-os a preços abusivos, o que compromete o acesso justo dos consumidores aos eventos. De acordo com David (2023), estudos evidenciados pela pesquisa conduzida pela Associação pela Indústria e Comércio Esportivo (Ápice) em 2021, o Estado registrou uma perda de arrecadação tributária da ordem de R$ 2 bilhões, enquanto as empresas do setor enfrentaram um impacto financeiro negativo de aproximadamente R$ 9 bilhões.
Ademais, o fenômeno gera consequências diretas para os consumidores, que enfrentam obstáculos crescentes na aquisição legítima de ingressos, devido à atuação de bots nas plataformas de venda. Há relatos de que esses programas automatizados conseguem comprar milhares de ingressos em poucos minutos, restringindo o acesso de fãs regulares e elevando os preços no mercado paralelo.
4 DISCUSSÃO
Nesta seção, discutiremos os resultados do estudo sobre falta de legislação para punir a ação dos cambistas e os desafios legais e as consequências da atuação dos cambistas em eventos no Brasil. Observa-se que a problemática da revenda de ingressos por cambistas em eventos culturais e esportivos no Brasil é uma questão multifacetada, que envolve desafios legislativos, econômicos e sociais. A análise apresentada evidencia a existência de lacunas normativas que permitem a perpetuação dessa prática, apesar dos prejuízos diretos e indiretos que ela acarreta para o mercado, o Estado e os consumidores.
4.1 Efetividade da Limitação por CPF
Ao analisar os dados, nota-se a limitação do número de ingressos por CPF é uma estratégia que pode dificultar a ação de cambistas que adquirem grandes quantidades de ingressos para revenda a preços inflacionados. A discussão indica que essa medida tem potencial para desestimular a especulação e tornar a distribuição de ingressos mais equitativa, proporcionando aos consumidores maior oportunidade de adquirir ingressos a preços justos.
No entanto, a eficácia dessa medida dependerá diretamente da capacidade das plataformas de vendas de implementarem sistemas robustos de verificação de identidade e de monitorarem possíveis fraudes, como o uso de CPFs falsos ou a criação de múltiplas contas. Visto que os cambistas utilizam mais de um CPF para efetuar a compra, resultando na aquisição de um grande número de ingressos em uma única transação (Rangel e Bohnenberger, 2023).
O Projeto de Lei nº 2.942/22, de autoria do deputado Gilberto Abramo (Republicanos-MG), estabelece limites para a aquisição de ingressos pela internet para eventos abertos ao público. De acordo com o texto, a venda de mais de quatro ingressos por CPF e mais de 12 ingressos por CNPJ, por data de realização do evento, é expressamente proibida (Exame, 2023).
Ao restringir o volume de ingressos que podem ser adquiridos por pessoa física e jurídica, a legislação busca democratizar o acesso aos eventos, garantindo maior equidade para o consumidor final. Contudo, a efetividade dessa estratégia dependerá da implementação de sistemas robustos de controle e verificação por parte das plataformas de vendas, capazes de identificar e coibir fraudes, como o uso de CPFs falsos ou a multiplicação de contas.
4.2 Impacto das Sanções Previstas no PL 3.115/23
O Projeto de Lei 3.115/23, que visa criminalizar o cambismo digital e impor sanções mais rígidas à prática, exerce um impacto relevante no combate à revenda ilegal de ingressos no Brasil. Dentre as principais disposições, destacam-se a proibição da comercialização de ingressos por valores superiores aos preços originalmente estabelecidos, bem como a aplicação de penalidades severas para aqueles que participarem da revenda abusiva.
Paz (2024), explica que o texto foi apelidado de “Lei Taylor Swift”, devido ao fato de ter sido apresentado durante a controvérsia gerada durante a venda de ingressos para os shows da cantora norte-americana no Brasil, em junho do ano passado.
Dentre as alterações introduzidas, destaca-se a obrigatoriedade de constar nos ingressos a data de sua aquisição e o valor final pago, incluindo eventuais taxas aplicáveis. A proposta segue agora para apreciação no Senado Federal (Piovesan, Miranda, 2024).
Silveira (2024), explica que a aprovação pela Câmara dos Deputados representa um avanço significativo na luta contra o cambismo digital no Brasil. Ao criminalizar essa prática, a legislação busca restabelecer a equidade no mercado de ingressos, assegurando a proteção dos consumidores e a acessibilidade aos eventos para todos os interessados. À medida que o projeto segue para apreciação pelo Senado, muitos observadores estarão atentos ao potencial impacto que essa lei poderá exercer na indústria do entretenimento e na experiência do consumidor brasileiro.
O impacto das sanções propostas no PL 3.115/23 pode ser analisado sob várias perspectivas, dentre elas a proteção ao consumidor, pois tais medidas têm como propósito desencorajar práticas abusivas, punir os infratores e reprimir a exploração financeira nos eventos de entretenimento e lazer (Aihara, 2023).
Outro impacto que projeto estabelece é que indivíduos em posições privilegiadas que participem desses atos ilícitos terão suas penas aumentadas. Isso inclui servidores públicos, diretores, administradores, gerentes ou funcionários de empresas que promovam, emitam, distribuam ou vendam ingressos. Se forem flagrados, a pena será aumentada de um terço até a metade (Castro, 2024).
Segundo Julião (2024), os ingressos apreendidos em decorrência de atividades ilícitas serão reintegrados à bilheteria oficial do evento, e os valores provenientes dessa reintegração serão destinados à execução de políticas públicas. De acordo com o texto, 50% do montante recuperado será alocado ao Fundo de Defesa dos Direitos do Consumidor, enquanto os outros 50% serão destinados ao Fundo Nacional de Segurança Pública. O objetivo é promover políticas de educação, conscientização e proteção dos direitos dos consumidores, além de fortalecer a segurança pública no contexto de eventos abertos ao público.
Ao impor limites rígidos, como a proibição da venda acima do valor original e o aumento das penalidades para os envolvidos, a medida visa proteger os consumidores e reprimir abusos financeiros. As sanções propostas, aliadas à destinação dos valores apreendidos para políticas públicas e fundos de segurança, demonstram o potencial da lei para desestimular práticas ilícitas e fortalecer a integridade na comercialização de ingressos.
4.3 Alteração da Lei n° 1.521 de 26 de dezembro de 1951
A Lei nº 1.521, de 26 de dezembro de 1951, conhecida como Lei de Crimes contra a Economia Popular, foi criada para combater práticas consideradas abusivas e prejudiciais ao mercado, como a especulação e o monopólio. Ao longo do tempo, diversas propostas de alteração dessa lei têm surgido, buscando adaptá-la às novas dinâmicas econômicas e sociais, especialmente em contextos como o comércio digital e a venda de ingressos para eventos.
A alteração da Lei nº 1.521 busca incluir, de forma mais clara, o cambismo como uma prática a ser penalizada, uma vez que esta não estava contemplada diretamente na redação original da lei. Serão introduzidos três novos tipos penais, o relator, deputado Luiz Gastão, enfatizou a importância de expandir a legislação, que atualmente se restringe a eventos esportivos, para abranger todas as ocasiões que envolvam a comercialização de ingresso ((Rhaissa, 2024).
Neiva (2024), explicou que durante a votação da referida Lei, o relator, em seu parecer, ressaltou o prejuízo causado pelo cambismo digital à economia popular: “A venda de ingressos por preços superiores aos fixados pelas entidades promotoras do evento cria uma situação de desigualdade econômica na qual apenas aqueles que podem arcar com altos custos têm acesso a essas experiências culturais e esportivas. Isso compromete a democratização do acesso à cultura e ao lazer, ferindo princípios básicos de justiça social e equidade”, apontou.
Na Lei de Crimes contra a Economia Popular, os três novos crimes, no qual se destaca a falsificação de ingressos para competições esportivas, espetáculos musicais, apresentações teatrais, eventos de Carnaval ou quaisquer outros eventos culturais, de lazer ou negócios. A pena prevista para esse crime é de detenção de 1 a 2 anos, além de multa correspondente a 100 vezes o valor do ingresso falsificado. Para o cambismo tradicional, que envolve a venda de ingressos fora dos pontos autorizados por preços superiores ao estipulado, o projeto estabelece pena de detenção de 1 a 2 anos, além de multa equivalente a 50 vezes o valor dos ingressos revendidos. No caso de quem facilitar, desviar ou fornecer ingressos para a prática do cambismo, o texto aprovado prevê uma pena de detenção de 1 a 3 anos, juntamente com multa de 100 vezes o valor dos ingressos envolvidos (MDB, 2024).
Como já mencionado, o projeto de lei estabelece um aumento de pena para indivíduos em posições privilegiadas que estejam envolvidos em atos ilícitos relacionados à revenda de ingressos. Essa medida aplica-se a servidores públicos, diretores, administradores, gerentes ou funcionários de empresas responsáveis pela promoção, emissão, distribuição ou comercialização de ingressos. Caso sejam condenados, a penalidade será acrescida de um terço até a metade da pena prevista (Estadão Conteúdo, 2024).
Contudo, nos dois últimos crimes, não haverá punição se a conduta for atípica ou realizada sem habitualidade. No caso de venda online, a empresa responsável pela comercialização dos ingressos deverá implementar um sistema de “gerenciamento de fila” para a compra e fornecer em seu site informações claras e completas sobre o evento, o valor dos ingressos e os procedimentos de devolução e reembolso (MDB, 2024).
A discussão dos resultados aponta para a necessidade urgente de uma abordagem mais rigorosa e abrangente para combater o cambismo em eventos no Brasil. O avanço das propostas legislativas e a modernização das ferramentas de fiscalização são passos importantes, mas a solução definitiva para o problema só será alcançada com a colaboração de todos os atores envolvidos: legisladores, empresas e consumidores.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise realizada ao longo deste estudo destaca a complexidade e os obstáculos jurídicos que o Brasil enfrenta no combate ao cambismo em eventos culturais e esportivos. A falta de uma regulamentação eficaz e a sofisticação das práticas ilegais, como o uso de bots e a revenda em grande escala de ingressos, têm comprometido a transparência e o acesso equitativo a esses eventos no país. A recente iniciativa legislativa, como o PL 3.115/23, representa avanços significativos no enfrentamento desse problema, ao introduzir penalidades mais severas e medidas de controle mais rígidas.
Contudo, para que essa legislação seja realmente eficaze, será necessário que sua aplicação seja consistente e rigorosa, além de serem imprescindíveis investimentos em tecnologias capazes de monitorar e reprimir práticas ilícitas. A colaboração ativa das plataformas de venda de ingressos, juntamente com a conscientização do público sobre os riscos de adquirir ingressos de fontes não autorizadas, também é essencial.
A introdução de novos tipos penais na Lei 1.521/51, que criminaliza a falsificação e a revenda abusiva de ingressos, reflete o esforço legislativo em adaptar-se às novas realidades econômicas e tecnológicas. Entretanto, o sucesso dessas medidas dependerá da coordenação entre os diferentes atores envolvidos no mercado de ingressos e na promoção de eventos.
Em suma, a reforma proposta representa um passo importante na proteção dos direitos dos consumidores e no combate à economia informal que tem prosperado em torno da revenda de ingressos, mas sua eficácia estará diretamente relacionada à fiscalização contínua e ao comprometimento de todos os agentes envolvidos.
Considerando as hipóteses apresentadas, conclui-se que a criação de uma legislação robusta, juntamente com mecanismos de fiscalização mais eficientes, pode não apenas reduzir a atuação de cambistas, mas também assegurar um ambiente mais justo e seguro para a aquisição de ingressos pelos consumidores. Por fim, esta pesquisa oferece uma contribuição relevante para o entendimento desse problema e para o desenvolvimento de políticas públicas que reforcem a proteção dos consumidores diante da prática do cambismo.
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1Acadêmico de Direito. E-mail: deborahcpf1@gmail.com. Artigo apresentado a Faculdade Sapiens, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2024.
2Professora e Mestre Planejamento e Desenvolvimento Regional. Professora do curso de Direito. Email: jennifer.gomes@gruposapiens.com.br