A ATUAÇÃO DA EQUIPE DE SAÚDE NO ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA CONTRA O IDOSO: REFLEXÕES ACERCA DA INTERSETORIALIDADE

THE ACTIVITY OF THE HEALTH TEAM IN ADDRESSING VIOLENCE AGAINST THE ELDERLY: REFLECTIONS ON INTERSECTORIALITY

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411011049


Gabriel Vinícius Reis de Queiroz1
Jéssica Nayara Gondim dos Santos2
Ricardo Sérgio Chucre Rocha Junior2
Juliana Bongiovanni Zanini3
Tereza Cristina Fontinele da Silva4
Kélia das Graças de Paiva Macias Nakai5
Soly Guedes de Oliveira6
Janaina Ribeiro de Lima7
Janne de Jesus Bugarim Martins8
Meriam de Nazaré Marques Ferreira9
Felipe Gomes Pereira10
Tatiane Bahia do Vale Silva11


RESUMO: Os profissionais de saúde possuem um dever ético e legal de discernir e comunicar qualquer indício de maus-tratos a idosos às entidades apropriadas, o que contribui para assegurar que as investigações e os serviços de defesa do idoso em caráter intersetorial sejam realizados de forma eficaz. Dessa forma, o objetivo deste estudo foi identificar no acervo literário disponível como a equipe de saúde pode enfrentar a violência contra o idoso, olhando para a intersetorialidade. Para tal, realizou-se uma revisão narrativa da literatura. Os estudos foram selecionados a partir de busca online das seguintes bases de dados: SCIELO, BVS, Google Acadêmico e PUBMED. Foram empregados os descritores controlados a seguir: “Equipe de Assistência ao Paciente”, “Violência contra o idoso”, “Abuso de Idosos”, “Colaboração Intersetorial” e “Comunicação Interdisciplinar”. Foram coletados 743 estudos, contudo se enquadraram como amostra desta pesquisa 07 artigos. Observou-se deficiência na articulação dos serviços, a falta de diálogo e de feedback entre os serviços que assistem aos idosos vítimas de violência, aliada à desinformação sobre as funções das demais instituições, torna mais difícil a resolutividade dos casos e, por consequência, afeta a qualidade do atendimento oferecido. Constatou-se As equipes de saúde, em sua rotina, lidam frequentemente com situações de violência contra idosos, e, muitas vezes, a articulação entre diferentes setores não é estabelecida devido à falta de familiaridade dos profissionais de saúde com os serviços disponíveis. Conclui-se que a violência contra o idoso configura um sério desafio para a saúde coletiva, e é fundamental que haja uma abordagem integral e empática nas ações de saúde. Essa abordagem deve buscar modificar as condições de vida dos idosos e quebrar os ciclos de violência que possam estar vivendo.

Palavras-chave: Violência contra o idoso, Saúde Pública, Intersetorialidade, Equipe de Assistência ao Paciente.

ABSTRACT: Healthcare professionals have an ethical and legal duty to discern and report any betrayal of elder abuse to affected entities, which helps ensure that cross-sector investigations and elder advocacy services are carried out effectively. Therefore, the objective of this study was to identify in the available literature how the health team can face violence against the elderly, looking at intersectorality. To this end, a narrative review of the literature was carried out. The studies were selected from an online search of the following databases: SCIELO, BVS, Google Scholar and PUBMED. The following controlled descriptors were used: “Patient Assistance Team”, “Violence against the elderly”, “Elder Abuse”, “Intersectoral Collaboration” and “Interdisciplinary Communication”. 743 studies were collected, however 07 articles were included as a sample for this research. Observing the deficiency in the coordination of services, the lack of dialogue and feedback between the services that serve elderly victims of violence, combined with misinformation about the functions of other institutions, makes solving cases more difficult and, consequently, affecting the quality of service offered. It was found that health teams, in their routine, frequently deal with situations of violence against the elderly, and, often, coordination between different sectors is not established due to health professionals’ lack of familiarity with the services available. It is concluded that violence against the elderly represents a serious challenge for collective health, and it is essential that there is a comprehensive and empathetic approach to health actions. This approach should seek to change the living conditions of the elderly and break the cycles of violence they may be experiencing.

KeyWords: Violence against the elderly, Public Health, Intersectorality, Patient Care Team.

Introdução

Segundo a Organização Mundial da Saúde, o Brasil deverá posicionar-se como o sexto país com o maior número de idosos até 2025 (OMS, 2004). Entre 1980 e 2000, a quantidade de pessoas com 60 anos ou mais aumentou de 7,3 milhões para 14,5 milhões. Esse crescimento acelerado na população idosa resulta em mudanças demográficas significativas, ocasionando uma alteração na estrutura etária. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2013, a expectativa de vida média para os recém-nascidos era de 74,8 anos, podendo alcançar 80 anos até 2041 (IBGE., 2014).

A longevidade se transforma em um elemento crucial nas políticas públicas e na vida social, pois, nesta etapa da vida, os indivíduos enfrentam uma maior vulnerabilidade a alterações na saúde e podem necessitar de assistência para atividades cotidianas. Além disso, eles estão mais propensos a situações de violência, o que representa um grande desafio para a saúde pública, dada sua magnitude e relevância (Basto., 2020).

A agressão contra idosos manifesta-se por meio de ações intencionais que buscam ferir ou desamparar essas pessoas, resultando em danos, sofrimento ou aflição. Comumente, são identificadas sete categorias de violência direcionada à população idosa: agressão física, violência psicológica (incluindo insultos verbais ou gestuais), negligência (a ausência de cuidados por aqueles que deveriam cuidar do idoso), autonegligência (a dificuldade do idoso em zelar por si mesmo), abandono (a falta de apoio por parte dos responsáveis), exploração financeira (que envolve a recusa em disponibilizar recursos financeiros ou seu uso inadequado) e violência sexual (Ribeiro et al., 2021).

Neste cenário, a Política Nacional do Idoso, criada em 1994, desempenhou uma função importante ao assegurar, entre outras coisas, os direitos sociais dos mais velhos; entretanto, não enfocava diretamente medidas para prevenir a violência (Brasil., 1996). Em 2003, a implementação do Estatuto do Idoso reforçou a proteção contra abusos, levando em conta a fragilidade e a dependência que frequentemente atingem esse grupo. Apesar dos progressos para garantir e defender os direitos humanos, a violência contra os idosos é uma problemática complexa que se revela, em sua maior parte, dentro dos lares (Brasil., 2007).

O campo da saúde é essencial para o reconhecimento de casos de violência, com os profissionais exercendo uma função importante na adoção de práticas colaborativas e no oferecimento de cuidados abrangentes, o que influencia na formação e na promoção do bem-estar (Brasil., 2006). O cuidado à saúde demanda uma visão holística e a cooperação entre diversas entidades sociais para apoiar os idosos. As equipes de saúde têm a responsabilidade ética e legal de identificar e relatar suspeitas de abusos contra os idosos às autoridades competentes, o que ajuda a garantir que as investigações e os serviços de proteção ao idoso sejam implementados de maneira efetiva onde for necessário, sendo fundamental que esses profissionais conheçam as redes intersetoriais para assegurar uma assistência completa. Dessa forma, a identificação da violência pode ser um passo importante para mitigar os danos e interromper a continuidade desse ciclo (Silva et al., 2023).

A intersetorialidade, considerada essencial na assistência à saúde, tem sido amplamente debatida em relação a novas estratégias que buscam aumentar a eficácia das ações de saúde oferecidas à população. A cooperação entre diferentes setores requer da saúde não apenas intervenções, mas, acima de tudo, a disposição para o diálogo (Santos et al., 2016). A construção de conexões entre as diversas áreas deve ser baseada em um planejamento e uma gestão integrados, a fim de desenvolver projetos que atinjam várias dimensões. Sem dúvida, a intersetorialidade se configura como uma abordagem inovadora para os serviços de saúde, especialmente no que diz respeito ao atendimento de pessoas idosas e ao combate à violência (Coelho; Motta e Caldas., 2018).

A violência direcionada aos idosos vem sendo identificada, nos dias de hoje, como um problema relevante tanto para a saúde pública quanto para o sistema de justiça criminal. Ademais, a falta de dados, o estigma e a falta de respeito em relação a essa faixa etária são elementos que favorecem o aumento dessa violência (Souza; Freitas e Queiroz., 2007). Dessa forma, a limitação de informações sobre o tema enfatiza a necessidade de desenvolver estudos científicos que assistam os especialistas a atuar de forma mais eficiente nessas situações, levando em consideração também a questão intersetorial. Desse modo, o objetivo deste estudo foi identificar no acervo literário disponível como a equipe de saúde pode enfrentar a violência contra o idoso, olhando para a intersetorialidade.

Materiais e métodos

Este trabalho consiste em uma pesquisa de natureza qualitativa e descritiva, classificada como uma revisão narrativa da literatura, adequada para explorar o estado atual de um tema particular. Essa abordagem implica uma análise abrangente da literatura, sem a necessidade de uma metodologia rigorosa voltada para a replicação de dados e respostas a perguntas específicas (Whittemore; Knafl., 2005).

A coleta de informações para esta revisão ocorreu entre agosto e setembro de 2024. A escolha dos estudos foi realizada por meio de pesquisa na internet em diversas bases de dados. A pesquisa foi conduzida utilizando o Scientific Electronic Library Online (SCIELO), a Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), o Google Acadêmico e o PUBMED. O processo de realização deste estudo começou com uma busca nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) através da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e nos Medical Subject Headings (MeSH) da National Library, com o objetivo de identificar os descritores universais.

Foram empregados os descritores controlados a seguir: “Equipe de Assistência ao Paciente”, “Violência contra o idoso”, “Abuso de Idosos”, “Colaboração Intersetorial” e “Comunicação Interdisciplinar”. Esses termos constituíram a base da estratégia de busca integrada, sendo ajustados conforme cada banco de dados. Para limitar a amostra, utilizou-se o operador booleano AND em combinação com os termos selecionados.

Os critérios estabelecidos para inclusão foram: estudos que contivessem os descritores mencionados anteriormente; pesquisas que explorassem o papel da equipe de saúde no enfrentamento da violência contra o idoso no olhar interdisciplinar e intersetorial; publicações em revistas nas línguas portuguesa e inglesa. Estudos duplicados nas bases de dados foram eliminados, assim como aqueles que, apesar de apresentar os descritores listados, não demonstrassem relevância para o tema deste estudo.

A seleção dos estudos foi conduzida de forma independente por dois pesquisadores. Inicialmente, foi montado um banco de dados com todos os artigos encontrados nas bases consultadas. Posteriormente, os títulos foram examinados para excluir aqueles que não estavam relacionados ao tema. Em seguida, aplicaram-se critérios de elegibilidade para minimizar a possibilidade de viés. O resumo das pesquisas foi revisado para auxiliar na seleção sempre que o pesquisador tivesse dúvidas sobre um estudo em particular. Após essa fase, foram eliminados os artigos duplicados entre as diferentes bases, resultando no número final de amostras para esta pesquisa.

As informações foram coletadas dos estudos através do registro de dados pertinentes à pesquisa, incluindo: identificação (título do artigo, nome da revista, autores, país, idioma, ano de publicação), tipo de publicação e aspectos metodológicos da investigação. Os pesquisadores implementaram todos os critérios de exclusão e definiram a lista final dos estudos que serão incorporados à pesquisa.

Após a coleta das informações, procedeu-se com a verificação da validade da revisão, através de uma análise mais minuciosa e detalhada dos estudos selecionados, com o intuito de entender as razões por trás de resultados divergentes ou contraditórios. Em seguida, foram comparados os dados obtidos na avaliação dos artigos. Adicionalmente, ao identificar áreas em que o conhecimento é insuficiente, foram apresentadas recomendações relevantes para investigações futuras.

Resultados

A implementação da estratégia de busca integrada nas bases de dados selecionadas resultou na identificação de 743 pesquisas. Dentre elas, 82 foram inicialmente pré-selecionadas; após uma análise detalhada, 75 foram descartadas. Assim, a amostra final consiste em sete artigos (Figura 1).

Figura 1. Fluxograma dos estudos incluídos na revisão narrativa

Fonte: Elaboração própria (2024)

Verificou-se que o período de publicação variou de 2017 a 2023, reforçando a ideia da atualidade do tema e a importância de compreender as ações da equipe de saúde diante de situações de violência contra o idoso e o aspecto intersetorial A atuação das equipes de saúde na identificação de agressões contra idosos revela, segundo a literatura, que esses profissionais encaminham os casos para outros serviços especializados no atendimento a essa população. O objetivo é aumentar as chances de resolução das situações e direcionar o cuidado tanto para os idosos quanto para seus familiares. Isso acontece principalmente por meio da notificação dos incidentes de violência, do acolhimento dos envolvidos, do diálogo e das reuniões com os familiares, além do agendamento de consultas e visitas domiciliares, com atenção aos aspectos físicos e emocionais. Conforme exposto no quadro 2.

Quadro 2 – Quadro sinóptico dos estudos selecionados para a amostra.

Autor/AnoObjetivoPrincipais Resultados
Alarcon, M. F. S.; et al. (2020).Analisar as ações e sugestões dos profissionais da Atenção Primária em relação à violência contra o idoso.Os profissionais destacaram a urgência de introduzir novas funcionalidades e aprimorar os sistemas já existentes, a fim de possibilitar um atendimento completo que possa prevenir e atuar diante do grave problema social e de saúde pública que a violência constitui.
Plassa, B. O.; et al. (2018).Identificar os fluxos de atendimento da pessoa idosa vítima de violência nos diferentes serviços de assistência e analisar os principais nós críticos.Foram detectados pontos problemáticos relacionados à coleta inadequada de informações sobre os incidentes; ausência de diálogo entre os serviços; desistência por parte da vítima em dar prosseguimento ao processo; escassez de informações disponíveis tanto para os serviços quanto para a população sobre o papel da assistência social; conflitos entre os serviços em casos complexos e a falta de atuação da equipe de atenção básica à saúde diante de relatos de violência.
Goes, A. L. de; Cezário, K. G. (2017).Identificar a produção científica relativa à atuação da Equipe da Estratégia Saúde da Família na atenção ao idoso em situação de violência.Os resultados indicaram que os profissionais reconhecem a violência dentro do contexto familiar e veem seu papel como uma abordagem de intervenção. Foi verificado que eles abordam essa questão de maneira superficial e desorganizada, o que gera uma falha na continuidade do atendimento. Dessa forma, a Estratégia Saúde da Família não consegue desempenhar adequadamente sua função de coordenação na rede de cuidados.
Alarcon, M. F. S.; et al. (2021).Compreender como os profissionais das equipes de atenção primária percebem a violência contra a pessoa idosa.Os profissionais relataram que desconfiam e reconhecem ocorrências de violência física, financeira e, de modo predominante, a negligência, com um familiar geralmente sendo o responsável pela agressão. Eles percebem que os idosos vivem em contextos complicados, e muitas circunstâncias ultrapassam suas habilidades de intervenção. Manifestaram preocupações e incertezas quanto à efetivação de denúncias e não têm clareza sobre a função dos outros serviços, o que torna a abordagem ainda mais desafiadora.
Hohendorff, J. V.; et al. (2018).Caracterizar o perfil dos idosos vítimas de violência, das situações de violência, dos agressores e dos encaminhamentos realizados a partir das notificações do Sistema de Informação de Agravos e Notificação (SINAN), do Rio Grande do Sul (RS), no período de 2010 a 2014.Estudos descritivos e de Chi-Quadrado (χ²) revelaram que as mulheres são as principais vítimas. A forma de violência mais reportada foi a física, que ocorre através do uso de força ou agressões, realizada por um atacante do sexo masculino, frequentemente filho da vítima.
Machado, D. R.; et al. (2020).Identificar a prevalência da violência doméstica contra idosos não institucionalizados e verificar se esta é um fator independente associado aos Componentes Físico (CF) e Mental (CM) da Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS) desses idosos.A ocorrência de violência doméstica entre pessoas idosas foi de 10% (IC 95% 9,1 – 13,6). Em análise multivariada, a violência contra essa população se manteve com uma associação significativa ao Componente Mental (β = -3,03; p = 0,000) e ao Componente Funcional (β = -1,69; p = 0,017) da Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS), independentemente de variáveis sociodemográficas, condições de saúde, suporte familiar e limitações funcionais. A taxa de violência doméstica foi alarmante e impactou negativamente na saúde física e mental dos idosos.
Santos, L. S.; et al. (2023).Analisar o conhecimento e a atuação dos enfermeiros da estratégia saúde da família em um município do estado do Maranhão frente a violência contra a pessoa idosa.Os profissionais de enfermagem possuem entendimento acerca das diferentes formas de violência que afetam os idosos. Entretanto, há uma necessidade urgente de mais capacitações e estratégias de intervenção em prazos curto, médio e longo para melhorar a saúde dessa camada populacional.

Elaboração própria (2024)

Discussão

O presente estudo teve o intuito de analisar o acervo literário disponível atualizado sobre como a equipe de saúde pode enfrentar a violência contra o idoso, olhando para a intersetorialidade. As iniciativas de cuidado para a proteção da saúde de idosos vítimas de violência impõem um grande desafio aos profissionais de saúde da atenção primária (Alarcon et al., 2021; Plassa et al., 2018; Goes e Cezário., 2017; Alarcon et al., 2021; Santos et al., 2023). Essa dificuldade se deve à complexidade das circunstâncias que exigem ações no cotidiano dos idosos e seus familiares, à interação entre diversas especialidades, à escassez de recursos existentes e à vontade do idoso em admitir que precisa de ajuda (Alarcon et al., 2021; Plassa et al., 2018).

Pesquisas indicam que o medo e a falta de informações para prevenir e encaminhar casos de violência às redes de serviços impactam negativamente, além de que as ações de prevenção e combate à violência frequentemente não são realizadas de forma eficiente (Alarcon et al., 2021). As equipes de saúde têm a oportunidade de assumir um papel ativo ao participar de iniciativas coletivas que buscam promover a saúde e evitar doenças dentro da comunidade (Goes e Cezário., 2017). Além disso, elas proporcionam cuidados tanto individuais quanto familiares, bem como administram projetos terapêuticos personalizados para os usuários, que muitas vezes requerem rotas e abordagens diversas que consideram outras formas de atendimento, visando satisfazer de maneira abrangente as necessidades de saúde, incluindo a detecção de situações de violência (Alarcon et al., 2021).

Investigações conduzidas na mesma área temática revelaram que a comunicação ineficaz entre os sistemas de saúde, especialmente no que diz respeito à referência e contrarreferência, representa um desafio, agravado por lacunas no aprendizado na formação dos profissionais. Ademais, ressalta-se que ao melhorar os mecanismos de troca de informações nos serviços de saúde, seria possível oferecer um atendimento mais seguro e eficaz (Goes e Cezário., 2017; Alarcon et al., 2021).

Existem várias formas de violência que podem ser direcionadas à população idosa, incluindo a violência física, psicológica e financeira. Contudo, a violência física tende a ser a mais notória, pois provoca sinais visíveis, como lesões e marcas na pele, incluindo fraturas, escoriações e hematomas (Hohendorff et al., 2018). A literatura indica que a violência física e a negligência estão entre os tipos mais comuns. Portanto, é crucial não apenas educar os idosos sobre a existência de outras modalidades de violência, mas também treinar profissionais para que consigam reconhecê-las, mesmo quando os idosos não as identificam dessa formam (Alarcon et al., 2021; Hohendorff et al., 2018).

Pesquisa realizada no Brasil, com amostra de idosos não institucionalizados no município de São Paulo, revelou que a violência contra os idosos atinge uma taxa de 10%. A avaliação por meio de regressão múltipla mostrou que a agressão impactou negativamente a saúde física e mental dos idosos, independentemente das variáveis sociodemográficas, de saúde, de suporte familiar e de limitações funcionais examinadas na pesquisa (Machado et al., 2020). A literatura corrobora ser fundamental que a violência contra os idosos receba a devida consideração por parte de profissionais de saúde, gestores e estudiosos que trabalham com a atenção aos idosos (Alarcon et al., 2021; Hohendorff et al., 2018; Machado et al., 2020).

Outro estudo realizado em município do estado do Maranhão, identificou que os profissionais de saúde, em específico os enfermeiros que trabalham na estratégia de saúde da família do município possuem informações sobre os diferentes tipos de violência que afetam os idosos e reconhecem a importância dos agentes comunitários de saúde na identificação e prevenção desse problema. No entanto, ainda precisam adquirir mais conhecimento para lidar com os casos que são identificados. É fundamental, portanto, implementar treinamentos adicionais e desenvolver estratégias de intervenção a curto, médio e longo prazo para promover a saúde, com o objetivo de solucionar ou reduzir a violência enfrentada por essa população, que representa um grupo relevante na sociedade (Santos et al., 2023).

Recomenda-se a implementação de ações intersetoriais para enfrentar os desafios críticos identificados, com o objetivo de aprimorar a qualidade do atendimento aos idosos que são vítimas de violência. Esta revisão da literatura apresenta como restrição a quantidade de estudos escolhidos para a amostra e a falta de uma avaliação da qualidade metodológica, uma vez que se trata de uma revisão narrativa. Contudo, foi possível estruturar o acervo literário sobre a temática.

Conclusão

O presente estudo permitiu concluir que as equipes de saúde, em seu dia a dia, enfrentam casos de agressão contra idosos e muitas vezes a rede intersetorial não é sinalizada por falta de conhecimento dos serviços pelos profissionais de saúde. A falta de articulação, a ausência de comunicação e de retorno entre os serviços que atendem idosos que sofreram violência, juntamente com a ignorância sobre o papel das outras instituições, dificultam a solução dos casos e, por consequência, comprometem a qualidade do atendimento.

É nítido que a violência contra o idoso representa um grave problema de saúde pública e torna-se urgente uma abordagem abrangente e humanizada nas iniciativas de saúde, que permita transformar o contexto de vida dos idosos e interromper ciclos de violência que possam estar enfrentando. Os profissionais de saúde precisam conhecer os indícios da violência e o acionamento das redes de saúde e intersetorial para o cuidado integral. Este estudo viabilizou o fomento de reflexões para reconfigurar os processos de cuidado que envolvem os diversos setores de apoio aos idosos.

Referências

ALARCON, M. F. S. et al.. Elder abuse: actions and suggestions by Primary Health Care professionals. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 74, p. e20200263, 2021.

ALARCON, M. F. S. et al.. Violence against the older adult: perceptions of the basic health care teams. Texto & Contexto – Enfermagem, v. 30, p. e20200099, 2021.

BASTO, F. L. G., et al. Violência contra a pessoa idosa: uma revisão bibliográfica. Trabalho de Conclusão de Curso. São Mateus, 2020.

Brasil. Decreto nº 1.948, de 3 de julho de 1996. Regulamenta a Lei nº 8.842, de 4 de janeiro de 1994, que dispõe sobre a Política Nacional do Idoso, e dá outras providências. Brasília (DF): Diário Oficial da União., 1996.

Brasil. Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007. Regulamenta a Lei nº 10.741, sancionada em 1 de outubro de 2003, a qual dispões sobre o Estatuto do Idoso. Brasília (DF): Diário Oficial da União., 2007.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº2.528 de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa [Internet]., 2006. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html

COELHO, L. P.; MOTTA, L. B. D.; CALDAS, C. P.. Rede de atenção ao idoso: fatores facilitadores e barreiras para implementação. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 28, n. 4, 2018.

GOES, A. L. de; CEZÁRIO, K. G. Atuação da equipe de saúde da família na atenção ao idoso em situação de violência: uma revisão interativa. Arq. Ciênc. Saúde, v. 24, n. 2, p. 100-105, 2017.

HOHENDORFF, J. V. et al.. Caracterização da violência contra idosos a partir de casos notificados por profissionais da saúde. Revista da SPAGESP, v. 19, n. 2, p. 64-80, 2018.

IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Tábua completa de mortalidade para o Brasil – 2013: Breve análise da mortalidade nos períodos 2012‐2013 e 1980‐2013. [Internet], Brasília (DF)., 2014. Disponível em: https://ftp.ibge.gov.br/Tabuas_Completas_de_Mortalidade/Tabuas_Completas_de_Mortalidade_2013/notastecnicas.pdf

MACHADO, D. R. et al.. Violência contra idosos e qualidade de vida relacionada à saúde: estudo populacional no município de São Paulo, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, n. 3, p. 1119–1128, mar. 2020.

OMS (Organização Mundial da Saúde). Manual de vigilância das lesões. São Paulo: Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo., 2004.

PLASSA, B. O. et al.. Flowchart of elderly care victms of abuse: an interdisciplinary perspective. Escola Anna Nery, v. 22, n. 4, p. e20180021, 2018.

RIBEIRO, M. DE N. DE S. et al.. Evidências científicas da prática da violência contra a pessoa idosa: revisão integrativa. Acta Paulista de Enfermagem, v. 34, p. eAPE00403, 2021.

SANTOS, C. T. B. DOS . et al.. Percurso do idoso em redes de atenção à saúde: um elo a ser construído. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 26, n. 1, p. 45–62, jan. 2016.

SANTOS, L. S.; et al. Violência contra a pessoa idosa: conhecimento e atuação dos enfermeiros da estratégia saúde da família. Revista Eletrônica Acervo Saúde, v. 23, n. 8, p. e14378, 1 set. 2023.

SILVA, S. P. C. E . et al.. Violência na velhice: representações sociais elaboradas por pessoas idosas. Escola Anna Nery, v. 27, p. e20220169, 2023.

SOUZA, J. A. V. DE .; FREITAS, M. C. DE .; QUEIROZ, T. A. DE .. Violência contra os idosos: análise documental. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 60, n. 3, p. 268–272, maio 2007.

WHITTEMORE, R.; KNAFL, K. The integrative review: updated methodology. J Adv Nurs, v. 52, n. 5, p. 546-53, 2005. Disponível em: https://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2648.2005.03621.x . Acesso em: 06 de agosto de 2024.


1Fisioterapeuta. Doutorando em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (USP).

2Fisioterapeuta pela Universidade da Amazônia (UNAMA).

3Enfermeira pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP).

4Psicóloga pela Universidade Paulista (UNIP).

5Enfermeira. Doutora em Psicanálise pelo Instituto Oráculo de Psicanálise.

6Fisioterapeuta. Mestre em Cirurgia e Pesquisa Experimental pela Universidade do Estado do Pará (UEPA).

7Fisioterapeuta. Especialista em Traumatologia e Ortopedia pela Universidade Pitágoras Anhanguera.

8Fisioterapeuta. Especialista em Fisioterapia Pélvica – Uroginecologia e Sexualidade Funcional pela Faculdade Inspirar.

9Fisioterapeuta. Especialista em Impactos da Violência na Saúde pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ).

10Fisioterapeuta pelo Centro Universitário Maurício de Nassau (UNINASSAU).

11Fisioterapeuta. Doutora em Epidemiologia em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ).

Correspondência

G. V. R. Queiroz
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP)
Av. Dr Arnaldo, 715 – Cerqueira César, São Paulo, SP
01246-904, Brasil
gabrielviniciusreis@usp.br