OS POSSÍVEIS IMPACTOS DA RESOLUÇÃO Nº 1, 27 DE OUTUBRO DE 2020 NA FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

THE POSSIBLE IMPACTS OF RESOLUTION Nº 1, OCTOBER 27, 2020 ON THE CONTINUING EDUCATION OF TEACHERS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102410071623


Camila Suiane Guimarães da Conceição de Azevedo1
Valdete Barra Pantoja da Silva2
Jeruzalem Martins de sá3
Daniel Verçoza Vale4
Bryna Rafaela Albuquerque de Siqueira5
Núbia Miranda Pereira Bezerra 6
                                           Euda Ramos Albuquerque Gonçalves7
Jocymar Silva Sales8


Resumo

O presente artigo traz à tona a discussão sobre as atuais políticas de formação docente, em especial os direcionamentos que vêm sendo dados à formação continuada. Para tanto, seguimos com a metodologia de análise documental; onde nos debruçaremos sobre a Resolução CNE/CP Nº1, 27 de outubro de 2020, que dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para formação continuada de professores da educação básica. Nesse sentido, o objetivo do estudo é verificar quais os possíveis impactos que essa resolução pode causar na formação de professores. Para tanto, realizamos a análise na referida Resolução, no que tange à formação continuada dos professores, e as diretrizes que ao longo dos anos direcionaram a elaboração das estruturas curriculares dos profissionais docentes. Sendo assim, percebemos que há um interesse político envolvido na instituição da mesma, que não se coaduna com os interesses da classe dos profissionais em educação e isso tem gerado insatisfação entre os docentes. Esclarecemos a necessidade de divulgação desta discussão, pois são poucos os artigos e debates que tem fomentado a revisão deste documento. Uma vez que, o mesmo não partiu de diálogo com representação nacional massiva das classes interessadas. Para tanto, elucidamos neste artigo pontos de vista manifestados por pesquisadores e consideramos a necessidade de revisitarmos esta legislação.

Palavras-chave: Formação de Professores, Formação Continuada, Diretrizes Curriculares, Educação.

1 INTRODUÇÃO

As discussões acerca da formação de professores têm sido recorrentes em congressos e pautas que visam a melhoria da educação em nosso país. Para tanto, outras temáticas contribuem com a discussão, tais como a importância e necessidade primária de políticas públicas eficientes para formação de professores, seja ela continuada ou inicial. No tocante aos professores que atuam na educação básica a atenção tem sido em maior escala, porém não de forma satisfatória e, em muitas das vezes, sem a participação ativa dos profissionais que irão participar dos cursos de formação. Nesse sentido Dourado (2015) esclarece alguns pontos que devem ser considerados a respeito da formação de professores.

Neste artigo esclarecemos aspectos relevantes de uma breve trajetória a respeito da formação deste profissional docente. Para isto, algumas legislações foram usadas com o intuito de demonstrar as mudanças que foram ocorrendo de acordo com a necessidade social e educacional que se apresentava em determinada conjuntura social. Diante da clareza de que a escola é vista, e é ainda utilizada, como preparação de mão de obra qualificada; levantamos pontos neste artigo quanto a formação pessoal e a valorização das experiências vividas por este professor que, antes de tudo, é um humano exercendo a função de contribuir com a formação de outros futuros profissionais que serão antes de tudo humano.

Para garantir a implementação de uma base que atendesse diretamente aos interesses do capitalismo e as estruturas do Estado/governo, as ações foram apressadas em aprovar a Resolução nº 1/2020. Com a aprovação de tal resolução os cursos de licenciatura precisam passar por uma reformulação que adeque os cursos as exigências formativas postas na Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC – Formação).

Este estudo é tipificado como qualitativo, de caráter bibliográfico e documental. Para embasarmos nossa construção utilizamos autores como Dourado (2015), Tardif (2014), Gatti (2013) e Geglio (2015). Ademais, pautamos nossas colocações em artigos e discussões recentes baseadas na análise dos impactos desta resolução na formação dos professores, e posteriormente na Educação Básica como um todo.

2 A TRAJETÓRIA RECENTE DA FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DE PROFESSORES NO BRASIL.

[…] a formação continuada compreende dimensões coletivas, organizacionais e profissionais, bem como o repensar do processo pedagógico, dos saberes e valores, e envolve atividades de extensão, grupos de estudos, reuniões pedagógicas, cursos, programas e ações para além da formação mínima exigida ao exercício do magistério na educação básica, tendo como principal finalidade a reflexão sobre a prática educacional e a busca de aperfeiçoamento técnico, pedagógico, ético e político do profissional docente. (DOURADO 2015, p.14)

Sabe-se que o campo da educação é um terreno muito fértil para atuações políticas e conflitos de interesses, já com as políticas de formação de professores torna-se mais real a possibilidade de intervenção na educação com intuito de se alcançar os objetivos planejados. No entanto, esses objetivos podem não corroborar com os ideais educacionais pensados, após tantas conquistas e reformulações, para assegurar uma educação de qualidade com estimulo à autonomia e criticidade. Dessa forma, tiveram início os programas de formação e perpetuação de seus atropelos, conforme aponta Fiorentini (2008, p. 61).

Essa política de formação continuada acabou, em nossa avaliação, reproduzindo uma prática de formação descontínua dos professores. Descontínua em relação à sua prática docente na escola, pois não a toma como ponto de partida e objeto de estudo e problematização nos encontros de formação. Descontínua em relação à frequência, pois é oferecida de tempos em tempos, com grandes intervalos de interrupção. Descontínua também em relação à formação inicial do professor ou aos conhecimentos que o professor adquiriu anteriormente ou vem adquirindo a partir dos desafios de sua prática. (FIORENTINI 2008, p. 61)

Em 1996 fica instituída a Lei de Diretrizes e Bases que ditaria os rumos da educação a partir de então. Não é de surpreender que o modelo educacional a ser seguido agora seria condizente com a realidade do país e interesses do governo neoliberal, onde pontos fundamentais para o avanço da educação brasileira não foram comtemplados. Logo, é notória a fragilidade da mesma no que se refere aos profissionais da educação, uma vez que no Art.61 há uma flexibilidade muito grande dos profissionais habilitados para atuar como professores na educação básica, tal fragilidade perpetua o problema da formação de professores, pois segundo Pinto (2003), tais professores possuem uma trajetória social, escolar e profissional que se caracteriza pela falta de seu credenciamento para o exercício do magistério.

§ 1º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios, em regime de colaboração, deverão promover a formação inicial, a continuada e a capacitação dos profissionais de magistério. (Incluído pela Lei nº 12.056, de 2009). § 2º A formação continuada e a capacitação dos profissionais de magistério poderão utilizar recursos e tecnologias de educação a distância. (Incluído pela Lei nº 12.056, de 2009). (Brasil, 1996).

Por isso, no dizer de Pinto (2003, apud BRASILEIRO 1994) podemos atentar para o fato em que ele destaca a realidade de troca de favores políticos, meio pelo qual muitos professores conseguiram seus cargos e a efetivação destes, mesmo sem a devida qualificação em tempos onde a formação já era exigida para exercício do cargo.

O Art.87 traz um direcionamento da execução do plano de formação de professores, sendo assim ficou a cargo dos estados e municípios o cumprimento da determinação que estabelecia a formação dos professores em nível superior até o final da década da educação que ficou estabelecida nesta mesma lei. Desta forma, aspectos relacionados a formação de professores foram sendo postos de forma isolada e pontual, não articulando com o todo para oferecer um produto coeso no que diz respeito à formação. Sendo assim, diversas legislações menores e órgãos auxiliares adentraram o processo para se responsabilizarem por questões como recursos, contratos, licenças e diversos outros aspectos que eram colocados de forma vaga na Lei de Diretrizes e Bases. Um desses pontos foi a origem e utilização de recursos financeiros que seriam utilizados nos programas de formação de professores.

Para que houvesse possibilidade financeira e distribuição de recursos destinados a esse fim institui se o (FUNDEF) Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, no entanto fica explicito na nomenclatura do programa que ele se destinava a uma etapa da educação básica e não ao nível de ensino como um todo, deixando a margem os profissionais atuantes no ensino médio e na educação infantil. As orientações a respeito desta formação ficariam dispostas no decreto de nº3.276/1999, que dispõe sobre a formação em nível superior de professores para atuar na educação. A formação de professores em nível superior citada na LDB será realizada conforme o disposto neste decreto, tal documento traz em seu Art. 2º os requisitos que devem seguir os cursos de formação, conforme o disposto nos seus incisos III, e IV.III- Formação básica comum, com concepção curricular integrada, de modo a assegurar as especificidades do trabalho do professor na formação para atuação multidisciplinar e em campos específicos do conhecimento.

III- Formação básica comum, com concepção curricular integrada, de modo a assegurar as especificidades do trabalho do professor na formação para atuação multidisciplinar e em campos específicos do conhecimento. IV- Articulação entre os cursos de formação inicial e os diferentes programas e processos de formação continuada. (BRASIL, 1994)

Tais incisos não deixam claro qual de fato seja essa formação comum e nem levam em consideração as especificidades educacionais de determinados grupos, já no inciso IV vemos a questão da articulação com a formação continuada, onde não se estabeleceu ainda nem a inicial e seus propósitos. O que ocasionou formações sem objetivos bem definidos, sem a estruturação necessária para que se pudesse falar em continuidade desta formação que teve seus percalços e insucessos desde o início, para Pinto (2003, p. 43), “…a má qualidade de ensino advinha da baixa performance desses agentes sociais, performance esta fruto da formação profissional do professor nacional. ”

No já mencionado decreto fica determinado em seu Art.5º que o (CNE) Conselho Nacional de Educação definirá as diretrizes curriculares nacionais para formação de professores, assim foi publicada a resolução CNE/CEB nº2, de 19 de abril de 1999, que vai começar instituindo sobre a formação de professores para atuarem na Educação Infantil e nos ano iniciais de Ensino Fundamental, onde de fato é a base da educação, no entanto o programa referente ao fundo que seria liberado para tal formação se destina ao ensino fundamental.

No decorrer da trajetória em busca da melhoria da educação, muitos atropelos foram cometidos e pontos cruciais negligenciados. Afinal era uma demanda que clamava por urgência, onde a necessidade de muitos professores já atuantes era a básica formação inicial em nível de graduação para atuarem em uma sala de aula como professores e da sociedade era de professores para atuarem nas escolas.

A realidade apresentava muitos professores sem formação, conforme nos aponta Pinto (2003) os professores eram, mal qualificados, ou sem habilitação necessária para o exercício do magistério no ensino fundamental os denominados professores leigos, porém tais professores já estavam em exercício; o que lançou o desafio de atender as necessidades apresentadas no momento, em especial a de formação inicial dos profissionais da educação, no entanto não houve condições diante da demanda e da má estruturação para que os cursos fossem oferecidos a todos em instituições de ensino superior e nem de forma presencial. Desta forma os cursos oferecidos contavam com a modalidade semipresencial e em sua maioria eram concluídos em curto tempo para garantir a certificação aos professores da educação básica dentro do prazo estabelecido. Deste modo, constata-se que ‘‘A fragmentação formativa é clara, as generalidades observadas nos conteúdos curriculares também, o encurtamento temporal dos cursos é constatável nas suas práticas” Gatti (2013, p.54).

Já nos anos 2000 começou a ser estruturada a organização e planejamento das metas e ações que seriam realizadas para melhoria da educação e formação de professores. No ano de 2001 foi aprovado PNE (Plano Nacional de Educação), que promoveu a articulações ente as diversas ações que ainda seriam desenvolvidas e estabeleceu a implementação de políticas públicas para que houvesse avanço nas questões discutidas e para além destas aquelas que eram próprias de interesses particulares do governo no momento. A questão discutida até aqui é que os professores estavam no centro como sendo o problema de toda educação e que teriam suas “necessidades sanadas”, desse modo ‘‘é de grande importância a realização de pesquisas focadas em ações desenvolvidas pelo poder público que visam a melhorar a formação dos professores e incentivá-los a continuar na profissão”. Geglio, (2015, p.232). No entanto não se trouxe o profissional docente para estar junto na discussão, na elaboração de propostas e definições, na escuta quanto as suas necessidades da prática e na elaboração de um planejamento de formação que visasse além de metas, números, avanço científico e melhor qualificação da mão de obra que sai da escola para o mundo do trabalho, conforme salienta Nóvoa (2009) A necessidade da formação de professores construída dentro da profissão.

Neste cenário conturbado, sem conhecimento de fato de uma formação eficiente, que vemos as primeiras ações efetivas do poder público sendo desenvolvidas junto aos profissionais de educação. Ao longo dos anos alguns erros e comportamentos tem se perpetuado e refletem em políticas públicas mal analisadas e que continuam não dando vez e voz a quem atua na educação e tem propriedade pra expor as necessidades reais de tal área, a exemplo temos os documentos atuais mais famigerados do momento no que diz respeito a educação como a (BNCC)Base Nacional Comum Curricular e a Resolução CNE/CP Nº1, 27 de outubro de 2020, que versa sobre a formação continuada de professores e tem causado grande inquietação entre os profissionais docentes.

(…) O saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de vida e com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula e com os outros atores escolares na escola, etc. Por isso, é necessário estudá-lo relacionando-o com esses elementos constitutivos do trabalho docente. (TARDIF, 2014, P.11)

O agir apontado acima não é o que podemos ver na resolução que será analisada a seguir. Diferentemente do que já foi apontado o que vemos é pouca participação dos professores da Educação Básica nas tomadas de decisão que envolvem sua atuação profissional.

3 ANÁLISE DA RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 2020.

Para darmos início a análise do desdobramento das ações sequenciais que nos trouxeram até a atual resolução, destacamos que em 2016 foi promulgado o decreto nº 8.752, que dava encaminhamento as conquistas alcançadas ao longo da história da educação. Este decreto previa a colaboração entre o Ministério da Educação, Estados, Distrito Federal, Municípios e os sistemas de ensino. Esta articulação foi promovida pelo Plano Nacional de Educação com texto constante no Art. 3, inciso I. Entre os princípios que caracterizavam o Decreto nº 8.752 estão:

I – o compromisso com um projeto social, político e ético que contribua para a consolidação de uma nação soberana, democrática, justa, inclusiva e que promova a emancipação dos indivíduos e dos grupos sociais; V – a articulação entre teoria e prática no processo de formação, fundada no domínio de conhecimentos científicos, pedagógicos e técnicos específicos, segundo a natureza da função; VI – a articulação entre formação inicial e formação continuada, e entre os níveis, as etapas e as modalidades de ensino; VII – a formação inicial e continuada, entendidas como componentes essenciais à profissionalização, integrando-se ao cotidiano da instituição educativa e considerando os diferentes saberes e a experiência profissionais; VIII – a compreensão dos profissionais da educação como agentes fundamentais do processo educativo e, como tal, da necessidade de seu acesso permanente a processos formativos, informações, vivência e atualização profissional, visando à melhoria da qualidade da educação básica e à qualificação do ambiente escolar. (BRASIL, 2016).

Todavia, com a queda do governo da Dilma e ascensão do governo Temer, que perdurou de 2016 até 2018, tivemos uma ruptura no avanço de processos educacionais e do aperfeiçoamento das ações de fomento a política de formação de professores em caráter autônomo, democrático e crítico.

Diante de tantas desorientações e más proposições, no que diz respeito a formação docente, pudemos presenciar alguns avanços na área em questão, porém o que tanto se lutou, pesquisou, construiu e almejou para a educação vem sendo desconstruído com atuais movimentos de “desformação”, negação da educação, da ciência e do pensamento crítico. A este respeito temos muito o que rever e desconstruir no imaginário social, que se fortaleceu por práticas políticas que invalidavam o devido papel social da educação.

Uma grande perda para educação tem se configurado a partir de ações e políticas públicas fragmentadas e desarticuladas, que se apresentam como consequência de práticas governamentais recentes e agilidade com que BNC- FC (Base Nacional Comum Curricular-Formação Continuada), foi aprovada e divulgada. Portanto, revela-se a necessidade de trazer os profissionais da educação para o centro do debate e valorizar seus saberes; bem como suas necessidades profissionais. A forma mais recente de explicitar esse regresso a práticas antigas e desarticuladas foi a publicação da Resolução CNE/CP nº1, de 27/10/2020, que institui as diretrizes curriculares nacionais para formação continuada de professores da educação básica. A formação imposta tem como base a BNCC- FC e seus objetivos para padronização da educação.

No entanto, diante de todos os avanços obtidos na educação muito temos a perder se certas políticas não forem revistas e articuladas, debatidas com as instituições representativas dos profissionais da educação e com a universidade. Sendo assim destacamos o fato da Resolução CNE/CP n1º, de 27/10/2020 não levar em consideração os anseios dos que há anos tem estudado o tema trazido pelo documento nem as manifestações de quem vive a prática docente; bem diferente disto o que se pode ver é que as diretrizes trazidas ignoram as práticas reflexivas, as manifestações de repúdio e desaprovação apresentadas pelos docentes.

São diversos os pontos que tem promovido esse repúdio, dentre eles destacamos o fato de que o não debate para o estabelecimento desta resolução só trouxe como resposta a acentuação ainda maior das condições precárias de trabalho destes profissionais e sua desvalorização. Não dizemos aqui condições precárias quanto a estrutura das escolas, escassez de materiais e segurança em seu ambiente de trabalho, mas precarização quanto ao fato de agregar mais uma responsabilização ao professor pelo fracasso ou sucesso dos rumos da educação no país, bem como trazer de forma meritocrata a participação em programas de formação continuada. Com as atitudes negacionistas apresentadas na atuação do governo anterior e o fortalecimento destas atitudes na população, ignora-se o fato de o professor ter sobrecarga de horas trabalhadas, acúmulo de funções e situações emergentes para administrar todos os dias que fogem a seu controle. Portanto o professor é simplesmente convidado a participar e os cursos são meramente oferecidos, quem concluir cada curso o fará por seus esforços e não por planejamento estratégico que torne possível a participação efetiva dos profissionais. Os profissionais não participativos nesses cursos tendem a serem taxados de negligentes ou indolentes; já os ativos em tais cursos serão bem adestrados a cumprir sua função a partir de mera execução de tarefas, conforme uma das dimensões apontadas nesta resolução.

Vale ressaltar que quando falamos em planejamento e incentivo não estamos falando em divulgação e propagandas, ainda que pouco vinculadas; mas estamos falando em possibilitar uma estrutura organizacional de forma holística que torne possível a participação de professores em situações de formação contínua e não só em cursos. Agindo assim desconsidera-se as reais dificuldades tidas pelos professores que não encontram horas disponíveis para participação em programas formais e longos de formação, desconsiderando o potencial de formação presente em grupos de pesquisas e ações de extensão como fica claro no Art.7º

– A formação continuada, para que tenha impacto positivo quanto á sua eficácia na melhoria da prática docente, deve atender as características de: foco no conhecimento pedagógico do conteúdo; uso de metodologias ativas de aprendizagem; trabalho colaborativo entre pares; duração prolongada da formação e coerência sistêmica. (BRASIL, 2020).

Neste artigo é colocada que a formação continuada deve ser positiva e eficaz, porém não se sabe em que parâmetros se estabelece essa eficácia, uma vez que não há descrição de qual seja o objetivo desta resolução para o profissional docente em si e não deixa claro o que queremos alcançar. Ainda no artigo citado, podemos ver o enfoque no conteúdo e fortalecimento do ensino ativo para a atuação no mercado de trabalho com a conscientização da importância de adquirir habilidades técnicas para execução em nome do capital, bem como o professor também reduzido a mero executor. Para tanto, o professor torna-se esse executor que deve apenas acompanhar a aprendizagem dos alunos; de acordo com Curado Silva (2020).

[…] um instrumento de transmissão do conteúdo, [ou seja], assume a tarefa de desenvolver no discente a capacidade para aprender continuamente; trabalhar em equipe, ser flexível e cooperativo; saber solucionar problemas; dinâmicas que também cabe a ele, no processo de aprender a aprender, elementos que compõe as competências. (CURADO SILVA, 2020, p. 108).

O ponto de partida para as ações e competências impostas a serem adquiridas pelos professores está descrito no segundo parágrafo do documento, onde considera o estabelecido no Art. 13 da (LDB) Lei de Diretrizes e Bases em que o foco é “Zelar pela aprendizagem dos alunos”, portanto já inicia-se um documento que regulamenta sobre a formação de professores não valorizando o mesmo e suas necessidades. O que nos transmite a ideia de um professor “a serviço” e não “em formação”, conforme podemos ver no inciso 4 do Art.7

IV- Duração prolongada da formação – adultos aprendem melhor quando têm a oportunidade de praticar, refletir, e dialogar sobre a prática, razão pela qual formações curtas não são eficazes, precisando ser contínua a interação entre os professores e os formadores, sendo, assim, a formação em serviço na escola a mais efetiva para melhoria da prática pedagógica, por proporcionar o acompanhamento e a continuidade necessários para mudanças resilientes na atuação do professor […] (BRASIL, 2020).

Este inciso traz a falácia de formações curtas não serem eficazes. Porém, não sabemos que pesquisas suportam esta informação e o porquê de terem desconsiderado o caráter formador em ambientes não formais. A respeito da educação não formal. Nesse sentido, Fernandes (2015, p.14) ressalta que:

[…] a formação continuada compreende dimensões coletivas, organizacionais e profissionais, bem como o repensar do processo pedagógico, dos saberes e valores, e envolve atividades de extensão, grupos de estudos, reuniões pedagógicas, cursos, programas e ações para além da formação mínima exigida ao exercício do magistério na educação básica, tendo como principal finalidade a reflexão sobre a prática educacional e a busca de aperfeiçoamento técnico, pedagógico, ético e político do profissional docente.

O que nas palavras de Rodrigues et al (2015, p. 132-133) o não formal:

Caracteriza-se pelo processo que resulta em aprendizagens de conteúdos considerados valiosos, através do desenvolvimento de atividades (de ensino e ou autoaprendizagem), que não estão vinculadas ao Currículo e programas oficiais, nem visam, necessariamente, uma qualificação ou graduação.

Nos inquieta ainda o fato de todas as diretrizes para a organização da formação continuada de professores terem como referência a BNCC- Educação Básica, não pelo fato de supor que os professores sejam superiores e não possam ter uma formação baseada em objetivos propostos para alunos de educação básica, mas sim pelo desrespeito em não observar necessidades próprias da prática docente que não se assemelham com necessidades próprias de qualquer outro nível de ensino. O que fica evidente é que professores estão sendo direcionados a adquirirem “competências” que lhes doutrinem a fazer um trabalho instrucional pedagógico que leve os alunos a adquirirem as tais competências necessárias para o mundo do trabalho e para não perturbação da ordem pretendida pelo governo que assinou tal documento.

As competências que o professor deve adquirir são pautadas em três dimensões: O engajamento profissional, prática profissional e conhecimento profissional; nos levando a entender o professor como um robô e não como um ser com necessidades humanas, vivências ao longo da prática docente e saberes adquiridos com esta, conforme aponta (TARDIF, 2014) Os saberes que os professores mobilizam para o exercício de sua profissão, não se resumem aos conhecimentos científicos, mas sobretudo os conhecimentos adquiridos ao longo de sua experiência profissional.

Descartando a hipótese de que fatores externos à educação, porém internos do ser em questão, possam interferir em seu desempenho profissional a criticidade e autonomia do fazer docente são anuladas tornando o ensino um mero seguir de regras e alcance de competências. Não há educação neste processo, como aponta Silva et al (2018, p. 1)    

[…] destaca-se que a educação significa o meio em que os hábitos, costumes e valores de uma comunidade são transferidos de uma geração para a geração seguinte, dessa maneira, a educação vai se formando através de situações presenciadas e experiências vividas por cada indivíduo ao longo da sua vida. Além disso, a ideia de educar pode variar de região ou país de tal forma que ela pode interferir diretamente na formação do indivíduo diante da sociedade, pois nem todos possuem a mesma cultura ou veem a educação como uma responsabilidade mútua entre o Estado, a escola e a família.

Não se sabe, desde a formulação da BNCC- Educação Básica, qual a ideia de competência que se pretende trabalhar. O que temos passivo sobre a conceituação do termo “competência” na educação é o que nos afirma Perrenoud (1999, p.7), que define o termo “como sendo uma capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles.” Conforme nos indica tal conceituação, o propósito de se adquirir uma competência não é o de limitação, o que nos parece ser bem diferente do propósito da utilização deste termo no documento em estudo.

Diante da trajetória conturbada pela qual vem passando a formação de professores no Brasil, pudemos perceber um jogo político e a prática de ações por interesses, de ambos os lados. ‘‘A troca de favores e a barganha dos votos’’ Pinto (2003, p.54), contribuíram significativamente para um início conflituoso da atuação dos profissionais do magistério; sendo assim estabeleceu-se por décadas esta política de troca de favorecimentos, onde em nenhum momento a prioridade era a educação de fato, mas sim os ganhos que se podia ter com os envolvidos nesta esfera da sociedade e com a comunidade escolar como um todo.

Há alguns feitos que merecem destaque com relação aos benefícios trazidos para educação, porém com passar do tempo as necessidades educacionais vem se revelando outras que não as de décadas passadas. Este fato tem sido negligenciado pelos órgãos oficias do governo que têm em suas atribuições o dever de oferecer a população uma educação pública de qualidade e igualitária; educação esta que valorize os profissionais da educação e seus saberes. Saberes que são constituídos nas práticas cotidianas, nas interações com a comunidade escolar, no seu histórico de formação ao longo da vida e em suas necessidades pessoais, emocionais e psicológicas; considerar que todos esses fatores constituem o fazer docente. Não de modo a entender a educação de forma polarizada e prevalecer o “sociologismo” em detrimento do “mentalismo” sugeridos por (TARDIF, 2014, p.14) Em suma, pouco importa em que sentido consideramos o saber dos professores, não devemos esquecer sua “natureza social”, se quisermos realmente representá-lo sem desfigurá-lo. Entretanto, ao tentarmos escapar do mentalismo, não devemos cair no sociologismo.

Nos inquieta o fato de sabermos que as ações não são articuladas, mas sim totalmente fragmentadas levando a comunidade escolar a ficar à mercê de erros e poucos acertos obtidos, bem como a torcer para que tais órgãos que são responsáveis pela administração dos fundos da educação se solidarizem em dispor de recursos para projetos e políticas voltados à educação. Espera-se ainda que um terceiro órgão tenha presteza e bom senso em ditar as diretrizes para que as políticas se desenrolem. E assim estamos à mercê de repasses e mais repasses para que aconteça qualquer ação no âmbito da educação. Por fim este telefone sem fio, que não faz contato com os que de fato fazem a educação acontecer, se torna ineficiente e pouco interessado na entrega final da mensagem.

As atuais legislações e políticas públicas corroboram para que haja o retrocesso no que diz respeito a formação crítica e emancipadora, dos profissionais de educação.

Neste sentido, a educação libertadora, problematizadora, já não pode ser o ato de depositar, ou de narrar, ou de transferir, ou de transmitir “conhecimentos” e valores aos educandos, meros pacientes, à maneira da educação bancária, mas um ato cognoscente. (FREIRE 1921 – 1997, p.163).

Na resolução analisada neste artigo fica explícita a ideia de um retorno à educação tecnicista e ensino mecânico e disciplinar, pois entre tantos aspectos a mesma reforça a metodologia de alcance de competências e conhecimentos já pré-estabelecidos que devem ser colocados como base comum a todos, onde não há espaço para autonomia, criação e respeito as necessidades reais do cotidiano escolar conforme denota-se o Art. 5 incisos IV.

O professor está sendo posto novamente no lugar de solucionador, ou causador de tudo; recaindo sobre ele diversas responsabilidades para se adquirir esta melhora na educação. Os aspectos atribuídos a responsabilidade do professor vão desde a preparação do ambiente até sua prática pedagógica para evitar que haja maior índice de evasão ou atrair os já evadidos, alcançando assim novas metas. O que nos parece é que há realmente interesse político em que um grande número de jovens e adolescentes estejam fora das escolas e das atividades promovidas pelas mesmas, por diversos fatores: visão internacional, contenção de ideologias, produção de mão de obra útil, capacitação (não formação) profissional, elevados índices de escolarização (não de educação), possível diminuição da criminalidade e de movimentos sociais por causas especificas.

Por fim, entendemos que a resolução nos encaminha para o retorno da atuação de professores leigos, não por não terem formação, mas por terem acesso negado à informação que descortina toda a dinâmica por detrás das ações direcionadas a formação de professores. Está sendo imposta a nós uma formação desrespeitosa, sem bases emancipatórias e críticas, arbitrária e sem espaço para diálogo, que nos direciona a pensarmos assim, agirmos assim e exercermos nossa prática pedagógica assim; o que em pouco tempo doutrinará nossos educandos a também agirem da mesma forma. Para (NÓVOA, 2009, p.28)

Os anos 70 foram marcados pela racionalização do ensino, a pedagogia por objectivos, a planificação. Os anos 80 pelas reformas educativas e pela atenção às questões do currículo. Os anos 90 pela organização, administração e gestão dos estabelecimentos de ensino. Agora, parece que ter voltado o tempo dos professores.

A respeito de uma resolução que se desenrolou às escuras, enquanto o mundo pensava em sobreviver, pareceu o cenário perfeito com o desvio de foco para que se promovesse, somente entre os interessados tal proposição arbitrária, que tem o professor como marionete e não como autor do seu processo de educação e mediador no processo de outros tantos cidadãos em formação; segundo as colocações de Nóvoa (2009), parece oportuno voltarmos a pensar na questão sobre o que é de fato um bom professor.

Diante do exposto, os profissionais da educação e legisladores precisam agora traçar planos em uma ordem de prioridades que nos permita reorganizar o ensino médio, a estrutura da Base Nacional Comum Curricular e a formação deste profissional docente, para que o mesmo possa atuar de acordo com seus ideais e preceitos educacionais nos quais acredita. A educação necessita de muita atenção. E partindo deste pressuposto reforçamos a urgência de empreendermos estudos a respeito da formação daqueles que irão formar os novos cidadãos e profissionais brasileiros. Considerando os manifestos de repúdio, por parte dos educadores, direcionados à resolução em questão unimos neste artigo nossas críticas as demais análises já divulgadas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se que ao longo da trajetória da formação de professores sempre houveram lacunas que até hoje não foram preenchidas e aspectos de extrema relevância que são ignorados, ou mal pensados para que se promova formação de qualidade e com equidade.

Nos documentos analisados e na resolução em questão pode-se perceber que o profissional docente não é chamado a participar de forma ativa dos processos que envolvem os rumos da sua área de atuação, de sua atuação profissional e dos educandos com quem este profissional lida diariamente; para tanto há urgência em valorizar as solicitações reais apresentadas pela educação como um todo e não usá-la como instrumento oportuno de ganhos e trocas, onde o professor fica à mercê de programas e cursos de formação mal elaborados e que em nada colaboram, com o que se entende a luz de estudiosos educadores, com a educação.

A educação pela qual lutamos e defendemos que professores sejam formados para sua atuação, é uma educação que liberte, que valorize os processos formativos presentes em diversos meios sociais, que dê voz e autonomia ao professor e que reconheça suas falhas nos primórdios, não penalizando, assim, apenas o professor com cursos formatados e doutrinários de formação como se isso resolvesse todo, ou grande parte, de um problema que é estrutural e tem raízes históricas.

A aprovação da resolução em questão demonstra que outros interesses para além dos educacionais estão envolvidos nesta determinação, uma vez que as manifestações legais e fundamentadas não foram, e não estão sendo consideradas. Por tanto, vemos a prática docente ser reduzida aos poucos em um conjunto de técnicas com cartilha a ser seguida. Outorgando àqueles que assim a seguirem, o grau de competente ou incompetente segundo as diretrizes da Base Nacional Comum Curricular- formação continuada (BNCC-FC).

Desta forma, estamos diante de um cenário educacional que retrocedeu em aspectos legais, éticos e científicos. A valorização do saber e a priorização dos investimentos em educação foram apagados. Vivenciamos o investimento em ensino; ensino técnico, tradicional e formação de mão de obra. As tentativas de fazer do professor um agente de formação de mão de obra qualificada foi dantesco para os rumos da educação em nosso país; no entanto em nossas mãos temos, agora, a responsabilidade de contribuição para retomada dos avanços científicos no campo da educação. Para tanto, diversas legislações precisam ser revistas e a política de formação continuada do professor reelaborada. O incentivo e promoção deste processo de formação continuada possibilita ao professor até mesmo a análise crítica e social das imposições colocadas sobre nós, profissionais da educação.

Contudo, desejamos aqui esclarecer aspectos que necessitamos tomar conhecimento; para que como educadores possamos reconstruir nossa área de atuação e valorizarmos o percurso e os movimentos de resistência que foram empreendidos em nome de nossa não desqualificação, bem como categorização de agentes de interesses puramente econômicos e estritamente polarizado.

REFERÊNCIAS

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1 Mestre em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, Marabá, 2024. e-mail: Camila.azevedo@unifesspa.edu.br

2 Mestre em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, Marabá, 2024. e-mail: valdete.silva@unifesspa.edu.br

3 Mestre em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, Marabá, 2024. e-mail: jerumartins216@gmail.com

4 Licenciatura em Geografia pelo Instituto Federal de Pernambuco (IFPE); E-mail: danielvercozavale91@gmail.com

5 Graduanda em Licenciatura em Pedagogia pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci. E-mail: rafaelaalbuquerque181@gmail.com

6 Formada em Pedagogia (Faculdade Guaraí) 2005; Pós-Graduação Lato Sensu: Mídias na Educação (Universidade Federal do Tocantins) 2011; Orientação Supervisão e Inspeção Escolar (Faculdade Focus) 2023, E-mail: nubiabezerra@seduc.to.gov.br

7 Licenciatura em Pedagogia (Claretiano) 2022. Pós graduação em Orientação Educacional ( Faveni) 2023. E-mail: euda.r.albuquerque@gmail.com

8 Formado em História pela Universidade Estadual Do Piaui (UESPI) 2007. Pos-graduação Lato sensu:  História e Historiografia do Brasil – Universidade Estadual do Piauí (UESPI),  E-mail: jocymarsales@hotmail.com