A FORÇA NORMATIVA DOS REGULAMENTOS INTERNOS NO ÂMBITO DA POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ E A INEVITABILIDADE DE RESTRUTURAÇÃO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202408311209


João Gesuel Massaneiro Edilmara
Elizangela Senn Massaneiro


RESUMO

O presente estudo aborda os aspectos históricos das polícias militares do Brasil, e principalmente da polícia militar do Paraná, apresenta sua estrutura, funções e perfil do profissional integrante da instituição (PMPR). Como órgão regido pelo militarismo, faz referência a previsão Constitucional que ainda mantém polícia militar como força auxiliar e reserva do Exército, cabendo às funções de polícia administrativa, ou seja, policiamento ostensivo preventivo fardado, sendo dessa forma responsável por oferecer uma sensação de segurança, com o dever de patrulhar as ruas das cidades, para inibir e evitar a ação de criminosos, e quando não puder prevenir, prender o infrator logo após a prática do crime. O objetivo é estabelecer uma crítica construtiva e conscientização dos integrantes da Polícia Militar do Paraná, alertar os chefes militares, os administradores e sobretudo os legisladores sobre as mudanças de paradigmas relacionados ao modo de atuação pós Constituição Federal de 88, seja no âmbito interno (hierarquia e disciplina, rígidas), ou, no externo (atendimento ao público, policiamento ostensivo). Por ser esta profissão considerada uma das mais estressantes, em razão grande responsabilidade e cobrança por parte da sociedade, bem como da própria instituição, o estudo volta-se a avaliar à necessidade de reestruturação da Polícia Militar, seja quanto à aplicação de normas e regulamentos rígidos, divisão interna de funções, à formação e ao treinamento dos policiais. Quanto ao sistema hierárquico da Corporação, a rigidez a ser substituída por maior autonomia para o policial, acompanhada de maior controle da sociedade e transparência nas respectivas atuações. Nesse sentido, efetivar a aplicação dos conceitos da Filosofia de Polícia Comunitária, implantado na PMPR, há vários anos.

Palavras chaves: Polícia Militar, Constituição, militarismo, sistema hierárquico, polícia comunitária.

INTRODUÇÃO

O objetivo geral desta pesquisa é estabelecer uma crítica construtiva e conscientização dos integrantes da Polícia Militar do Paraná, alertar os chefes militares, os administradores e sobretudo aos legisladores sobre as mudanças de paradigmas relacionados ao modo de atuação pós Constituição Federal de 88, seja no âmbito interno e externo.

Quanto aos objetivos específicos, a presente pesquisa tem como foco, desenvolver uma proposição em torno da efetivação da cidadania e do princípio democrático, com o intento de demonstrar que eventualmente os policiais são cerceados em direitos em pleno século XXI, a exemplo da liberdade de manifestação de pensamento, o direito de sindicalização, bem como, analisar se a desmilitarização traria as mudanças esperadas pela sociedade com a eliminação do caráter militar das polícias, pois especialistas defendem como a única forma de tornar as corporações mais próximas da sociedade é dar a elas uma formação mais voltada para a proteção e cidadania, conscientizar os integrantes da Corporação sobre a aplicação dos conceitos da filosofia de Polícia Comunitária, tornando-a mais cidadã, uma vez que este conceito delineia direitos e obrigações do cidadão, bem como, possibilita atuar através da democracia participativa aos interesses do Estado e da sociedade, concretizando dessa forma o direito de ser cidadão a todo homem, independente de sua classe social, religião, cor, profissão, dentre outros.

Diante disso, a presente pesquisa buscou expor e abordar os aspectos históricos das polícias militares do Brasil, e principalmente da polícia militar do Paraná, sua estrutura, funções e perfil do profissional integrante da instituição (PMPR), visto ser esta profissão uma das mais estressantes, em razão da grande responsabilidade e cobrança por parte da sociedade, bem como da própria instituição, além de avaliar à necessidade de reestruturação da Polícia Militar, seja quanto à aplicação de normas e regulamentos rígidos, divisão interna de funções, formação e treinamento dos policiais.

Em fim, quanto ao sistema hierárquico da Corporação, a eventual excessiva rigidez a ser substituída por maior autonomia para o policial, acompanhada de maior controle da sociedade e transparência nas respectivas atuações.

1. POLÍCIAS MILITARES BRASILEIRAS – NOÇÕES HISTÓRICAS GERAIS

As forças policiais brasileiras foram criadas na época do Império, quando o Rei D. João III resolveu adotar o sistema de capitanias hereditárias, seguindo o modelo medieval de Portugal, onde as funções de polícia e justiça se completavam, permanecendo assim até o ano 1827. Com a promulgação do Código de Processo Criminal de 1841, a Intendência Geral de Polícia foi extinta, criando-se o cargo de Chefe de Polícia, que passou a ser auxiliado por delegados e subdelegados de polícia. Em 1842 o regulamento número 120 definiu as funções administrativa e judiciária, sob a chefia do Ministro da Justiça, nesse mesmo ano houve a separação de justiça e polícia proporcionando inovações que perduram até hoje, como o exemplo da criação do Inquérito Policial.

Nesse sentido dispunha o Código de Processo Criminal de1841,

Art. 1º Haverá no Município da Côrte, e em cada Província um Chefe de Policia, com os Delegados e Subdelegados necessários, os quais, sobre proposta, serão nomeados pelo Imperador, ou pelos Presidentes. Todas as Autoridades Policiais são subordinadas ao Chefe da Polícia.

Art. 2º Os Chefes de Policia serão escolhidos d’entre os Desembargadores, e Juízes de Direito: os Delegados e Subdelegados d’entre quaisquer Juízes e Cidadãos: serão todos amo viveis, e obrigados a aceitar.

Art. 3º Os Chefes de Policia, além do ordenado que lhes competir como Desembargadores ou Juízes de Direito, poderão ter uma gratificação proporcional ao trabalho, ainda quando não acumulem o exercício de um e outro cargo. (www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM261.htm, acesso em: 15/02/2016)

As polícias brasileiras foram criadas de fato na época do Império, passando pela Regência, pela República, inclusive no período ditatorial e persistem até os dias atuais. Aquele modelo de polícia que começa a se constituir no Brasil, teria que criar um corpo organizacional, ou seja, definir uma hierarquia, disciplinar os seus integrantes, de maneira a tornar seu trabalho uma forma integral e assalariada seguindo o modelo do exército, característica que pode ser percebida até hoje. Objetivando estabelecer um controle rígido sobre as policias militares, foram regulamentadas normas do exército para as corporações policiais.

Ocorre que devido às instabilidades políticas, nos mais diversos períodos da história nacional serviram de motivos para reformas constitucionais ou para alguns dos governos implantar o que achava melhor para a segurança nacional, com a justificativa de manutenção da lei e da ordem, conforme leciona Paulo Magalhães.

Em um lapso de tempo de 164 anos entre a primeira e a última constituição deste país, respectivamente a Constituição Federal de 1824 e a de 1988, existiram outras quatro. Isto significa uma constituição a cada vinte e sete anos. Evidenciam-se as inúmeras oportunidades para que a legitimação da Polícia Militar, junto ao poder Estatal, viesse de fato a ocorrer – como ocorreu, caso contrário, não seria a instituição de poder com finalidade de controle social e político mais eficaz dos últimos trezentos anos. (MAGALHÃES,2008, p.19)

Após a declaração da República, os estados se tornaram mais autônomos, ao mesmo tempo começam a organizar suas forças policiais nos moldes militares de forma aquartelada, que servia para a proteção do governo, como se fosse pequenos exércitos, segundo Jaqueline Muniz, é notável esta proximidade entre as polícias e o exército, não só na adoção do nome militar, mas em uma série de práticas comuns existentes entre as duas organizações1.

Com o passar dos anos algumas instituições se destacaram profissionalmente, tendo aumentado substancialmente seus efetivos, como a de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, e para obter certo controle sobre tais forças, a União cria o serviço militar obrigatório que colocava as polícias militares como forças auxiliares do exército através da Lei n° 1860, de 4 de Janeiro de 1909.2

Concomitante com esse momento histórico, atuando como um exército, alguns acontecimentos de importante relevância tiveram a participação das polícias militares neste período, como a participação da polícia Baiana na luta contra a revolta de Canudos, a atuação das polícias do Paraná e Santa Catarina nos acontecimentos do Contestado, também relevante participação das forças públicas de São Paulo na revolução de 1924 e a atuação da Brigada Militar do Rio Grande do Sul na consolidação da Revolução de 1930, esta, leva Getúlio Vargas ao governo federal, que também interfere nas questões de segurança pública. Segundo Sócrates Ragnini Mezzomo:

Após aquela intervenção federal, o próprio governo Vargas assumiu a iniciativa de dirigir a revitalização das polícias militares, direcionando-as para o exercício de missões de segurança nacional, dando início à formação do Estado Unitário, que se definiu em 1937, com a configuração do Estado Novo. (MEZZOMO, 2005, p. 27)

Com a consolidação do Estado Novo e o centralismo do Estado, as competências das polícias militares aumentam e definem-se como forças de reserva do Exército, voltadas para a segurança interna e manutenção da ordem.

Sempre sobre forte influência dos governantes as polícias foram se fortalecendo, e consolidando-se, atualmente estão previstas de forma tácita no artigo 144 da Constituição Federal de 1988, cabendo às polícias militares, o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública. As polícias militares são ainda, na forma da lei, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

Em fim, a Polícia que temos hoje é um órgão governamental, presente em todos os países, politicamente organizados, cuja função é a de repressão e manutenção da ordem pública através do uso da força, ou seja, realiza o controle social. Todas as competências policiais apresentadas refletem a evolução desse serviço público, que hoje tem como função a manutenção da ordem pública e a implementação da Segurança Pública, conforme preceitua o artigo 144 da Constituição Federal do Brasil.

1.1 HISTÓRICO DA POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ

A Polícia Militar do Paraná foi criada no ano de 1854, como uma unidade de caçadores, denominada de Companhia de Força Policial. Sua história se funde a própria história do Paraná, e mostra uma significativa participação em episódios que marcaram a vida nacional.

A atual Polícia Militar do Paraná tem sua existência como corporação regularmente organizada a partir da Lei Provincial n.º 07 de 10 de agosto de 1854, sancionada após o desmembramento da 5ª Comarca da Província de São Paulo, pelo primeiro Presidente da nascente Província do Paraná, Conselheiro Zacarias de Goes e Vasconcelos, que criou a Companhia da Força Policial, para desempenhar funções de segurança pública no Estado conforme David Carneiro:

O decreto imperial de 29 de agosto de 1853 declara emancipada a antiga comarca de Curitiba, sendo instalado a 19 de dezembro seu primeiro presidente, Zacarias de Goes e Vasconcelos. Várias medidas necessárias são tomadas então, pelo encarregado de dar à província os serviços de que necessitava para viver na comunhão brasileira como irmã das demais províncias. Aos 10 de agosto de 1854 é criada a Companhia de Força Policial, com um comandante, dois oficiais, 12 inferiores e 52 praças. Neste total está ainda o que se chamou uma seção de cavalaria, com um sargento, dois cabos e dez soldados. (CARNEIRO, 1995, p. 253)

Esta organização policial também foi moldada no tipo militar, tendo como pilares a hierarquia e disciplina, organizada em quadros de oficiais e praças, com instruções específicas militares e ficou imediatamente subordinada ao Presidente da Província, que dela podia dispor em ordem ao serviço como julgasse mais conveniente.

Sua primeira denominação foi Companhia da Força Policial da Província do Paraná e para comandá-la foi escolhida a pessoa do Capitão Joaquim José Moreira Mendonça, Oficial do exército.

A Polícia Militar do Paraná desde a data de sua organização até o término da segunda guerra mundial teve várias denominações, conforme exposto em museu página oficial da Polícia Militar do Paraná,

a) Companhia de força policial, da província do Paraná, com que foi batizado na lei n.º 07 de 10 de agosto de 1854.
b) Corpo Policial, da província do Paraná, pela lei n.º 380, de 30 de março de 1874, então constituídas por duas companhias.
c) Corpo Militar de Polícia, do Estado do Paraná, pelo decreto de reorganização n.º 4, de 10 de dezembro de 1891, composta de três companhias e um esquadrão de cavalaria.
d) Regimento de Segurança do Paraná, pela lei n.º 36 de 05 de julho de 1892, contando com um Estado Maior e outro Menor, quatro companhias, um esquadrão de cavalaria e a banda de música.
e) Regimento Policial do Paraná, denominação que passou a ostentar durante a ocupação do Estado pelas tropas federalistas, em 1894, voltando posteriormente, a tomar o antigo nome de Regimento de Segurança.
f) Força Militar do Estado do Paraná, Pelo Decreto de reorganização n.º 473, de 09 de julho de 1917, consoante ao acordo firmado entre a União e o Estado para que a Corporação passasse a ser considerada Força de Primeira linha, Auxiliar do Exército.
g) Polícia Militar do Estado do Paraná, pelo Decreto-lei n.º 505, de 5 de julho de 1932, juntamente com a Companhia de Bombeiros- sozinha, a Corporação denominava-se segundo esse Decreto-lei, Força Pública do Estado.
h) Força Policial do Estado, pelo Decreto-lei n.º 9.315 de 26 de dezembro de 1939. Após a conflagração mundial, a Corporação passou a ostentar o nome de:
i) Polícia militar do estado do Paraná, que lhe foi conferido pelo Decreto lei n.º 544, de 17 de dezembro de 1946, permanecendo até os dias de hoje. (www.pmpr@pm.pr.gov.br, acesso em:)

Denominada, também de Corporação, é formada por brasileiros voluntários com aprovação em concurso público para oficiais e praças, sendo instituição militarizada, os postos e graduação, constituem carreira para os militares e tem a mesma denominação hierárquica do exército, até o posto de coronel.

1.2 POSTOS E GRADUAÇÕES

Na polícia militar, o maior posto é o de Coronel seguido do Tenente-Coronel e Major (oficiais superiores), Capitão (oficial intermediário), 1º Tenente e 2º Tenente (oficiais subalternos), seguido da graduação das praças-especiais – Aspirante-a-Oficial e das praças – Subtenente, 1º Sargento, 2º Sargento, 3º Sargento, Cabo e Soldado. Os postos e graduações estão divididos em quadros sendo, quadro dos oficiais superiores, dos oficiais intermediários, dos oficiais subalternos, das praças especiais, dos subtenentes e sargentos e dos cabos e soldados.

Os alunos das academias de polícia militar que se formarão oficiais são denominados Alunos-Oficiais ou então Cadetes. Os alunos dos cursos de formação de praças recebem a denominação de Aluno-Soldado ou Soldado de 2ª Classe, podendo existir até três classes para soldados.

O Comandante-Geral é escolhido pelo governador do Estado, dentre os Coronéis da ativa, sendo cargo comissionado, as demais promoções de oficiais são indicações do comando-geral e dependem de ato do Governador do Estado. As Praças são promovidas por atos do Comando–geral, dentro da disponibilidade de vagas em cada quadro.

1.2.1 Quem é o Policial Militar, sua Função e Atribuição?

O Policial Militar (PM) é um funcionário público de carreira pertencente, no caso do Estado do Paraná, à instituição Polícia Militar do Paraná (PMPR), de acordo com o Código da PMPR, é, aquele que ingressa na corporação, faz dela profissão até ser transferido para a reserva, sendo que a situação jurídica do oficial é definida pelos deveres e direitos inerentes à patente que lhe for outorgada e da praça pelos deveres e direitos correspondentes ao grau hierárquico que lhe for conferido.3

As atribuições estão determinadas na Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988, no Título V, da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas, Capítulo III, Da Segurança Pública, no artigo 144, parágrafos 5º e 6º, o qual determina que:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

  1. – polícia federal;
  2. – polícia rodoviária federal;
  3. – polícia ferroviária federal;
  4. – polícias civis;
  5. – policiais militares e corpos de bombeiros militares….

§5º Às policiais militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe à execução de atividade de defesa civil.

§6º As policiais militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. (CFRB/88)

Com isso se esclarece que aos policiais militares incumbem as atividades destinadas à segurança pública, realizadas através do policiamento ostensivo fardado, e as ocorrências policiais que afetem a ordem pública, a incolumidade das pessoas e dos patrimônios, públicos e privados.

Destarte, a função do Policial Militar está revestida de parcela do Poder coercitivo do Estado (Poder de Polícia), possibilitando a tomada de decisões, impondo regras, dando ordens, por vezes restringindo direitos individuais e coletivos, bens e interesses jurídicos, dentro dos limites autorizados por lei. Sendo que, para o desempenho da atividade o militar estadual deve possuir atributos físicos, intelectuais, técnico-profissionais, e, acima de tudo morais, colocando-se como espelho da cidadania, deve possuir firmeza de caráter, dedicação ao trabalho e profissionalismo, atuando sempre com justiça e bom senso, pré-requisitos que a sociedade espera e exige do verdadeiro militar estadual, que ao ingressar na carreira, prestará o compromisso de honra, em caráter solene afirmando a sua consciente aceitação dos valores profissionais, conforme artigo 49 do Código da PMPR.

Alistando-me soldado na Polícia Militar do Estado, prometo regular minha conduta pelos preceitos da moral, respeitar os meus superiores hierárquicos, tratar com afeto os meus companheiros de armas e com bondade os que venham a ser meus subordinados; cumprir rigorosamente as ordens das autoridades competentes e voltar-me inteiramente ao serviço do Estado e de minha Pátria, cuja honra, integridade e instituições, defenderei com o sacrifício da própria vida. (http://www.pmpr.pr.gov.br, acesso em: 15/02/2016)

Nesse sentido, pode-se dizer que a profissão Policial Militar é considerada um sacerdócio, exigindo de seus integrantes o máximo de dedicação, e muito sacrifício, o que os coloca em uma posição de desigualdade em relação às outras profissões, em razão de abdicação de certas liberdades permitidas aos demais, pois sendo um sacerdócio, somente os realmente vocacionados suportam esses sacrifícios, que muitas vezes não são compreendidos, a exemplo do policial que responde a um chamado para uma operação durante a noite, e deixa sua família e segue cumprir seu ofício.

1.2.2 A Mulher na Polícia Militar do Paraná

A história da policial militar feminina iniciou-se com a inclusão e matrículas de 42 recrutas, selecionadas para o 1º Curso de Formação de Sargentos PM Feminina (CFS PM), do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP). Entre elas, está a oficial Tenente- coronel Rita Aparecida de Oliveira, sendo a primeira a galgar este posto. Dessa forma, o Paraná passou a ser o segundo estado do país que permitiu o ingresso da mulher na sua Polícia Militar, depois de São Paulo. As primeiras mulheres foram incluídas em 20 de outubro de 1977.

O CFS PM Feminina, foi o primeiro na história da PMPR, realizou-se por meio do Decreto Estadual nº 3.238, novembro daquele ano até 16 de junho de 1978, formaram-se 27 sargentos policiais femininas, sendo as quatro primeiras colocadas promovidas à graduação de 2º e as demais a 3º sargentos. Em 1979 foram abertas vagas para Oficiais e Soldados, sendo que se iniciaram na Academia Policial Militar do Guatupê (APMG) e no Centro de Aperfeiçoamento de Praças (CFAP), respectivamente, os primeiros Cursos de Formação de Oficiais e de Formação de Soldados da PM Feminina, e em 1980, foi a vez do Curso de Formação de Cabos PM Femininas. Estes cursos todos pioneiros no Brasil. No Corpo de Bombeiros Militares que também faz parte da PMPR, o ingresso de soldados ocorreu somente em 2006.

Neste sentido, percebem-se avanços na organização da Polícia Militar do Paraná, pois a PM Feminina tinha inicialmente, a missão de policiamento ostensivo, atuando na segurança pública principalmente no que se refere à proteção de menores, mulheres e anciãos. A partir de agosto de 1981 pela primeira vez no Brasil as policiais militares foram aplicadas no policiamento de trânsito, segundo artigo da Tenente-coronel Rita Aparecida de Oliveira,

No primeiro semestre de 1982, em razão da necessidade de se expandir o policiamento feminino para o interior do estado e saindo mais uma vez na frente, criou-se o Pelotão PM Fem na cidade de Londrina. Em 1983, as cidades de Maringá e Ponta Grossa também foram agraciadas com a presença da mulher policial militar. No ano de 1984, foi a vez de Cascavel, e Foz do Iguaçu, em 1988. Posteriormente, foi a cidade de Guarapuava, e depois um pelotão com efetivo específico para o então Centro de Operações Policiais Militares (COPOM) e Policiamento de Trânsito. (www.pmpr.pr.gov.br, acesso em: 20/05/2016)

Atualmente elas estão ocupando todos os postos e graduações, e funções diversas inclusive de comando, numa corporação que outrora era predominantemente masculina. Como foi o caso, da Coronel Audilene Rosa de Paula Dias Rocha, chegou ao mais alto Posto, assumindo o Comando-Geral da PMPR. Ela faz parte da terceira turma da Escola de Oficiais, bem como, da Tenente-coronel Karin Krasinski, que atuou, dentre outras funções, comandante da Academia de Polícia do Paraná.

Essa quebra de paradigma teve significativa importância na PMPR, e vem corroborar com a ideia de uma polícia mais humana e cidadã, pois há vários anos a PMPR vem sendo implantado a filosofia de Polícia Comunitária, qual seja, uma polícia mais próxima da sociedade, nesse sentido, a policial feminina, possui algumas características que podem fazer a diferença, como a sensibilidade, afetividade, versatilidade, percepção aguçada, entre outras, que até pouco tempo eram consideradas fraquezas, hoje, passaram a somar e são consideradas essenciais no processo evolutivo da organização. Características que os homens escondem ou afogam para não parecer frágil, o que em contrapartida, as mulheres sempre cultivaram como um dom, buscando sempre desenvolvê-las e amadurecê-las em cada situação.

2. NORMAS E REGULAMENTOS MILITARES E ATUAL DEMOCRACIA.

A evolução da sociedade brasileira ocorreu de forma muito rápida a partir da segunda metade do século XX, foram inúmeras mudanças, evolução tecnológica, a globalização, dentre outras, neste contexto de interações múltiplas foram efetivados muitos direitos à sociedade e aos trabalhadores civis, tendo estes, alcançado várias conquistas. No entanto, esses direitos reconhecidos e implantados pela Constituição de 1988, não atingiram os servidores militares integralmente, que ainda encontram-se regidos por normas em desconformidade com alguns dos preceitos estatuídos no artigo 5º da Constituição. Pois a própria Constituição, chamada Constituição Cidadã, admite que o militar seja cerceado do direito de ir e vir, seja preso administrativamente por decisão monocrática do seu comandante, enquanto, se compararmos ao delinquente civil que somente pode ser preso em flagrante delito ou por ordem fundamentada da autoridade judiciária competente, ao servidor militar é negado o mesmo habeas corpus que é concedido ao cidadão infrator.

O inciso LXVIII do artigo 5º da Constituição Federal menciona que, conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.

Ocorre que este inciso não se aplica ao servidor militar, por força da própria Constituição, que no artigo142, parágrafo 2.º, dispõe que: não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares, entretanto, a doutrina e jurisprudência entendem que não cabe habeas corpus no tocante ao mérito das punições disciplinares, o entendimento majoritário é de que todos os princípios de Direito Penal devem ser aplicados para as infrações administrativas, inclusive o da legalidade, dentre outros, conforme cita Paulo Gomes da Silva em Artigo enviado a JurisWay,

…todas as garantias do Direito Penal devem valer para as infrações administrativas, e os princípios como os da legalidade, tipicidade, proibição da retroatividade, da analogia, do ne bis in idem, da proporcionalidade, da culpabilidade, etc, valem integralmente inclusive no âmbito administrativo. Por tal motivo, entende-se que, nada impede que o Poder Judiciário examine os pressupostos de legalidade da punição, cabendo neste caso, a interposição de Habeas Corpus, mas não para a análise do mérito.(SILVA, publicado JurisWay em 22/04/2011-acesso em: 30/05/2016)

Além do Habeas Corpus, ao militar é proibida a sindicalização e greve, dispositivo mantido na atual Carta. Contudo, essa proibição, na prática já vem sendo superada, através das associações de militares espalhadas pelo país, as quais indiretamente representam os direitos trabalhistas dos seus membros.

Diante do exposto, verifica-se que o retorno da democracia não foi totalmente assimilado nos quartéis das polícias militares, e que, do ponto de vista da legislação militar pouca coisa mudou, em relação ao período ditatorial, a exemplo do Estado do Paraná, em que o regulamento principal aplicado à polícia militar, ainda é o do Exército, carecendo a instituição do seu próprio regulamento. Raul Canal leciona que,

os servidores militares ainda não tiveram seus estatutos adaptados a atual Constituição, ainda mantém uma legislação que atravessou vinte e um anos de ditadura, sendo uma das poucas leis básicas da Nação que não sofreu a influência dos novos tempos de exercício pleno dos direitos. Esses decretos que regem as polícias militares oriundos da época da ditadura tornam o militar um sub cidadão, sem os diretos conferidos ao cidadão civil pelo constituinte de 1988, os militares ainda são regidos por leis retrogradas, ultrapassadas e injustas, ou seja, essa forma de estrutura que permanece é um tipo de substrato do arbítrio daquela época, em forma de regulamentos, regimentos, portarias e outros instrumentos ainda em vigor na polícia militar.(CANAL, 1999, p.14)

Enfatize-se, que o instrumento mais apto a salvaguardar as instituições militares é com certeza o Regulamento Disciplinar do Exército, o qual, se revogado poderá deixar Força Militar sem ter como manter a disciplina e a hierarquia. Acontece que isso ocorre porque as Forças Armadas subordinam-se constitucionalmente à autoridade suprema do Presidente da República, que também detém competência para expedir decretos e exercer o comando supremo das Forças Armadas e indiretamente das forças auxiliares, as quais em tese deveriam ser subordinadas integralmente aos governadores dos Estados.

2.1. REGULAMENTO DISCIPLINAR DO EXÉRCITO E TRANSGRESSÕES MILITARES.

O instituto jurídico traz a definição das transgressões militares a que estão sujeitos os militares do Exército Brasileiro e a maioria das polícias, é o Regulamento Disciplinar do Exército (RDE), esta ferramenta jurídica estabelece normas relativas à aplicação das punições disciplinares.

Dentre as punições previstas no Regulamento Disciplinar do Exército estão, somente às decorrentes de transgressões militares ou transgressões disciplinares, afastando-se, as punições decorrentes do crime militar que são objeto de estudo do Direito Penal Militar, sendo assim, o próprio regulamento em seu artigo 14 caput define transgressão disciplinar como:

…toda ação praticada pelo militar contrária aos preceitos estatuídos no ordenamento jurídico pátrio ofensiva à ética, aos deveres e às obrigações militares, mesmo na sua manifestação elementar e simples, ou, ainda, que afete a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe. (RDE, 2002)

Define também que são transgressões disciplinares, todas as ações especificadas no Anexo I deste Regulamento, nesse sentido, o militar quando comete uma conduta irregular no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-la poderá responder nas três esferas, a cível; penal e a administrativa a depender da infração.

Além disso, o item 9 do Anexo I do Regulamento Disciplinar do Exército possibilita o enquadramento do militar em outras normas, cuja violação afete os preceitos da hierarquia e disciplina, a ética militar, a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe, este número deverá sempre estar atrelado com a lei ou regulamento que foi transgredido pelo militar.4

A Polícia Militar do Paraná que ainda utiliza o RDE-2002 tem também um Código, a Lei 1.943/54 que, prevê no artigo 102 os deveres do militar, a letra “b” por exemplo, “o de exercer, com dignidade e eficiência, as funções que lhes forem atribuídas”. Portanto o militar que não exercer, com dignidade e eficiência suas funções comete transgressão disciplinar item 9 do anexo I do RDE-2002 combinado com o artigo 102, letra “b” do Código da PMPR. Tudo isso, devidamente fundamentado, com narrativa dos fatos que motivaram tal enquadramento, conforme anexo I RDE:

[…] 9. Deixar de cumprir prescrições expressamente estabelecidas no Estatuto dos Militares ou em outras leis e regulamentos, desde que não haja tipificação como crime ou contravenção penal, cuja violação afete os preceitos da hierarquia e disciplina, a ética militar, a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe;

Lei 1.943/54

Art. 102. São deveres do militar:

[…] b) exercer, com dignidade e eficiência, as funções que lhes forem atribuídas; (http://www.pmpr.pr.gov.br/RDE, 2002, acesso em: 20/05/2016)

Neste caso, por ser um tipo muito aberto, a autoridade competente para aplicar a punição deve descrever a conduta praticada pelo militar e explicar como esses fatos praticados caracterizam a ofensa ao dever militar e à legislação indicada. Não há um rigorismo existente do direito penal na definição de transgressão disciplinar, em razão das inúmeras condutas que caracterizam as transgressões militares, pois caso ocorresse, haveria uma infinidade de condutas irregulares que não seriam punidas administrativamente, mesmo porque é impossível descrever todas as condutas que caracterizam transgressão disciplinar. O prejuízo aos princípios da hierarquia e da disciplina militar seria evidente.

Percebe-se que a hierarquia e disciplina são princípios preservados e valorizados acima de tudo no militarismo, que se sobrepõem até mesmo aos princípios constitucionais fundamentais, pois com base nos princípios hierarquia e disciplina, o militar pode ter restringindo vários direitos, inclusive restrição à liberdade.

A punição disciplinar (pena) é uma consequência do cometimento da transgressão disciplinar, visa o caráter educativo tanto ao punido, quanto à coletividade a que pertence e sendo assim, o julgamento e a aplicação da punição disciplinar “devem ser” feitos com justiça, serenidade e imparcialidade, para que o punido fique consciente e convicto de que ela se inspira no cumprimento exclusivo do dever, na preservação da disciplina e que tem em vista o benefício educativo do punido e da coletividade.

O RDE traz ainda, a classificação do julgamento da transgressão, a que estão sujeitos os militares, que são em ordem crescente de gravidade: a advertência; o impedimento disciplinar; a repreensão; a detenção disciplinar; a prisão disciplinar; o licenciamento e a exclusão a bem da disciplina.

A conduta profissional do militar é avaliada também por comportamentos, que são classificados de acordo com o RDE em, “comportamento mau; comportamento insuficiente; comportamento bom; comportamento ótimo e comportamento excepcional”, esta ordem crescente. As mudanças de comportamentos ocorrem de acordo com as punições sofridas num determinado espaço de tempo.

2.2. Anexo I do RDE e a Desconformidade com a Atividade Policial Militar.

Tendo a Constituição Federal, reservado um capítulo especial ao militar, seja ele, federal ou estadual, essa categoria é tratada de forma diferenciada em relação aos demais trabalhadores, no que se refere a direitos e obrigações.

O constituinte ao elaborar a Carta Magna restringiu alguns direitos aos militares, apesar deste, ter elevado vários direitos à categoria de direitos humanos fundamentais, existem exceções, para os militares, pois este quando acusado de cometer transgressões poderá perder a liberdade, contudo nem todo o rol de transgressão previsto no anexo I do RDE possuir tal finalidade.

O grande problema são os possíveis abusos que podem ser cometidos e a incompatibilidade deste regulamento, ainda ser aplicado à polícia, principalmente face ao subordinado, já que o comandante possui o poder discricionário para punir o militar, baseado na oportunidade e conveniência, ferindo desta forma, o princípio da legalidade, visto que algumas transgressões disciplinares tipificadas no anexo I do regulamento são muito amplas e abarcam diversas atitudes, e que de certo modo, algumas tornam-se incompatível como Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido o inciso LXI da Constituição Federal preceitua que a transgressão disciplinar seja definida em lei, o que inviabilizaria a prisão administrativa do militar, assim a autoridade não poderia ceifar a liberdade do subordinado se não houver lei definida para isso. Pois reza a Constituição “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. Frise-se, que não é o caso das transgressões, que são previstas por decreto.

Ante ao exposto, verifica-se ainda, que vários números para enquadramento de transgressão disciplinar do Anexo I do RDE são incompatíveis com o serviço policial, conforme segue:

[…]45. Conversar ou fazer ruídos em ocasiões ou lugares impróprios quando em serviço ou em local sob administração militar; […]

[…]49. Deixar alguém conversar ou entender-se com preso disciplinar, sem autorização de autoridade competente;

50. Conversar com sentinela, vigia, plantão ou preso disciplinar, sem para isso estar autorizado por sua função ou por autoridade competente; […]

 […]52. Conversar, distrair-se, sentar-se ou fumar, quando exercendo função de sentinela, vigia ou plantão da hora;

53. Consentir, quando de sentinela, vigia ou plantão da hora, a formação de grupo ou a permanência de pessoa junto a seu posto; […]

[…]69. Transitar o soldado, o cabo ou o taifeiro, pelas ruas ou logradouros públicos, durante o expediente, sem permissão da autoridade competente; […]

[…] 71. Entrar em qualquer OM, ou dela sair, o militar, por lugar que não seja para isso designado;

72. Entrar em qualquer OM, ou dela sair, o taifeiro, o cabo ou o soldado, com objetoou embrulho, sem autorização do comandante da guarda ou de autoridade equivalente;

73. Deixar o oficial ou aspirante-a-oficial, ao entrar em OM onde não sirva, de darciência da sua presença ao oficial-de-dia e, em seguida, de procurar o comandante ou o oficial de maior precedência hierárquica, para cumprimentá-lo;

74. Deixar o subtenente, sargento, taifeiro, cabo ou soldado, ao entrar emorganização militar onde não sirva, de apresentar-se ao oficial-de-dia ou a seu substituto legal; […]

[…]77. Adentrar ou tentar entrar em alojamento de outra subunidade, depois da revista do recolher, salvo os oficiais ou sargentos que, por suas funções, sejam a isso obrigados;

79. Entrar ou sair de OM com tropa, sem prévio conhecimento, autorização ou ordem da autoridade competente; […](http://www.pmpr.pr.gov.br/)

Em fim, resta claro que o rol de números acima tem aplicabilidade apenas aos militares do exército, pois tem sua tropa aquartelada, sendo estes enquadramentos incabíveis para aplicabilidade ao policial militar, que trabalha no seio da sociedade e precisa ser comunicativo, pois é um mediador de conflitos.

3. NECESSIDADE DE REESTRUTURAÇÃO

Diante das considerações anteriores, onde foi traçado um perfil das Corporações, verifica-se a necessidade de reestruturação, cuja prioridade para parte da população é desmilitarizar as Polícias Militares, para outros a unificação seria solução, ou seja, uma polícia de ciclo completo, isto é, transformando numa única corporação policial realizando o policiamento ostensivo (fardado) e as atividades de investigação (polícia judiciária). Para o público interno existe a necessidade de amenização da rigidez na aplicabilidade dos regulamentos, para que seja possível torná-la mais humana e cidadã, tornando possível a aplicabilidade dos fundamentos da filosofia de Polícia Comunitária, contudo existe uma parcela de praças que defendem a desmilitarização.

A alternativa de desmilitarização, ou a criação de uma só polícia de natureza civil, traz uma série de questionamentos, será possível essa transformação na PMPR, instituição com mais de 170 anos? Como será a taxa de atrito entre os integrantes oriundos das diferentes polícias? O que fazer com os integrantes da corporação que for extinta, qual seria a função de um sargento, por exemplo? Seria a Polícia Civil menos truculenta e letal realizando o policiamento ostensivo?

Nestas possibilidades, não é possível garantir que a unificação das polícias diminuiria as condutas desajustadas e, até mesmo, criminosas dos integrantes das corporações policiais. Existe também o problema de como será esta polícia ostensiva sem o rigor da hierarquia e disciplina militares, diante dos mesmos desafios que hoje se impõem à Polícia Militar. Dessa forma, resta claro que a unificação ou a desmilitarização precisam ser estudadas mais a fundo para amenizar os problemas de segurança pública no estado do Paraná.

Acerca da desmilitarização, em seu projeto de lei nº1, de 4/6/1991, quando deputado por São Paulo, o jurista Hélio Bicudo, adverte que,

…estas duas polícias são constituídas, porém, com aspectos diferentes, a começar por atividades distintas, estrutura hierárquica e disciplinar também diferente, sem contar a remuneração, que causa atrito entre os membros das duas corporações. É importante frisar que ambas têm objetivos iguais: o controle da criminalidade. Sem a soma de esforços, porém, o controle e o combate à criminalidade tornam-se muito mais difíceis. (BICUDO, 2000).

Há os interesses corporativos, representados, particularmente, pelos oficiais da Polícia Militar, e, mormente as praças que, desejando livrar-se da hierarquia e disciplina militares, se manifestem pela desmilitarização das respectivas corporações utilizando-se dos argumentos, como o discurso de que existe uma divisão, os oficiais versos praças. Por outro lado os governadores das unidades da Federação, provavelmente nenhum, abririam mão de ter sua própria corporação militar e, nesse caso, não custa lembrar o controle que os Chefes dos Executivos estaduais têm sobre as suas bancadas no Congresso Nacional. O Governo federal, por sua vez, dificilmente abdicaria da poderosa reserva do Exército, mais de 400 mil homens/mulheres, representada pela soma das Polícias Militares em todo País, muito maior que a Marinha, o Exército e a Aeronáutica juntos.

Contudo é visível, necessidade de reestruturação conforme mostra uma pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública que, para 87,3% dos entrevistados, o trabalho policial precisa ser reorientado para a proteção dos direitos humanos e da cidadania. Conforme cita Karina Gomes, nas palavras do sociólogo Ignácio Cano, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro,

é necessário acabar urgentemente com o que chama de regulamentos extremamente autoritários que regem as forças policiais no Brasil. As instituições de ensino policiais precisam ser integradas, existe uma tensão entre o treinamento policial – que alguns até chamam de adestramento – e a educação. O conceito de dignidade humana precisa ser central, e ainda não é. O foco deve ser a prevenção da criminalidade. (www.cartacapital.com.br/…/excessos-cometidos-por-PMs, acesso em 18/05/2016)

Notável, é, que a segurança pública vem sendo realizada com muita dificuldade, pois mesmo com vários projetos não consegue atender seus objetivos, dessa forma, nada mais natural que haja desejo em reestruturá-la. Cabe salientar que a PMPR, vem tentando implantar projetos visando garantir o disposto na Constituição, mas muitas das vezes estes projetos são políticas de governos que vão embora juntamente ao fim do mandato eletivo dos governadores, como exemplo, Projeto POVO do governo Roberto Requião de Mello e Silva, implantado nas duas vezes que esteve no poder, o Projeto Totem do governo Jaime Lerner, e outros que foram abandonados juntamente ao fim das suas gestões.

Isso ocorre porque muitas vezes os gestores da polícia, normalmente, não esclarecem ao público interno, quais são as diretrizes e, muitas vezes nem os próprios gestores sabem, tornando impossível a obtenção de resultados desejáveis e esperados.

Assim advertem José Luiz Ratton e Marcelo Barros,

…os gestores geralmente não sabem e nem se interessam em responder, acaba vindo uma enxurrada de discursos vazios e de muita retórica, somado a ações de pouco significado, para contrabalancear a pressão externa por uma maior eficiência, gerando desperdício de recursos em projetos desprovidos de significado, além de favorecer a progressiva descrença, por parte dos seus funcionários em novos projetos ou programas (RATTON , BARROS, 2007, p.74)

A PMPR vem tentando remediar essa deficiência com implantação de medidas como o Sistema de Gerenciamento e Controle Administrativo e Operacional da PMPR (Sisgcop), para conseguir entender o perfil dos seus principais usuários, internos e externos, qual a qualidade do seu serviço, quais os pontos fortes e fracos, quais são as maiores demandas, quais os períodos e turnos de picos, se a qualificação exigida para os servidores é compatível com os serviços.

3.1. Polícia De Segurança Pública Ou Força Auxiliar Do Exército?

A atual Constituição Federal mantém uma dicotomia que já vem de algum tempo na estrutura das polícias militares, pois as organizações policiais são em sua essência muito mais militares que policiais, há muito tempo as polícias militares têm mantido uma função dupla ao longo das constituições federais brasileiras. Elas são órgãos de segurança pública dos estados federados e, ao mesmo tempo, forças auxiliares e reserva do Exército Brasileiro. Esta dicotomia é um paradoxo, pois não se pode um órgão de segurança urbano, que usa a técnica policial, e é em tese preparada para proteger a sociedade, ser mobilizado para defender a Nação, lutar contra forças militarizadas, que são preparadas para destruir e dominar.

Acontece que na Constituição da República Federativa do Brasil 1988, as polícias militares pareciam ganhar uma nova dimensão e passaram a figurar entre os órgãos de segurança pública, juntamente aos demais órgãos do setor, foram criadas para preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. A União perdeu parte da competência no que se refere legislar privativamente sobre a instrução militar das instituições, mas manteve a competência de instituir normas gerais sobre a organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização.

Nesse sentido percebe-se que a existência deste padrão paradoxal, no qual as Polícias Militares são consideradas forças de segurança interna, em tempos de paz, e forças de segurança externa, em tempo de guerra. A Constituição Federal de 1988, a exemplo das constituições anteriores, manteve o vínculo institucional das polícias às Forças Armadas.

Segundo Luis José Ratton e Marcelo Barros no caso particular da polícia militar, tem alguns dados que merecem atenção como a previsão no artigo 144 constituição federal, bem como, decreto 88.777/83, o decreto 667/69 modificado pelo decreto 1.406/75 e o decreto 2.010/83, estes conjuntos de referências legais tem o seguinte significado: o exército é responsável pelo controle e coordenação das polícias militares, enquanto os governos estaduais tem autoridade sobre sua orientação e planejamento5. Acontece que não fica claro o que compete ao exército e o que compete a governo estadual, estes dispositivos trazem ambiguidades, e ambas as teses encontram amparo legal nos institutos acima citados. Acerca do exposto José Ratton e Marcelo Barros, esclarecem:

a polícia se obriga a cumprir regulamentos disciplinares inspirados no regime vigente do exército, segundo o artigo 18 do Decreto -lei 667 de 1969. Estamos falando do AI-5, onde o regime disciplinar da polícia ainda é aquele do exército, inspirado no regimento do exército de um período ditatorial. A polícia militar como seu nome diz, é policia e não uma força armada orientada para a defesa do território e a segurança nacional. A polícia militar tem que zelar pelo cumprimento da lei, respeitando a cidadania- mais ainda com o fito precípuo de proteger os cidadãos. Pois é este o mandado conferido pela Constituição à polícia militar: uso comedido da força, de modo adequado, tecnicamente, e em conformidade constitucionalmente com as leis penais, protegendo direitos e liberdades. Exército e Polícia militar têm formações distintas, estruturas organizacionais diversas, exatamente porque suas finalidades são diferentes. (RATTON, BARROS, 2007,  p. 12)

Anote-se que o objetivo da União em outras Constituições era manter certo controle sobre as polícias militares, evitando-se assim que os estados estabelecem suas forças de segurança e tentassem um golpe separatista, na atual conjetura apesar de vedação sobre qualquer forma de separação dos estados, essa dictomia permanece nas instituições policiais militares.

Ocorre que a polícia de segurança que pretende assegurar a ordem e a paz social é exercida, indistintamente, pelas polícias militares, que devem se aproximar da formatação das polícias civis dos estados e trabalharem com coesão e integração, sendo isto que a sociedade espera para o sucesso no combate a criminalidade e não uma força preparada para destruir e conquistar.

3.1.1. Maior autonomia, controle da sociedade, transparência e aplicação de conceitos da filosofia de polícia comunitária.

A Polícia Militar do Paraná vem de um longo tempo com vários projetos, que muitas vezes são estratégias e políticas governamentais, com o fito de garantir eleições ou reeleições, que de certa forma vem estagnando as alternativas de garantir uma segurança pública de qualidade, com isso, aumentando o descrédito na instituição.

Atualmente devido o clamor da sociedade em busca de uma sensação de segurança, estudiosos estão se aventurando com projetos audaciosos em busca de uma segurança melhor. Em meio esse contexto, foi implantado na polícia militar do Paraná uma nova Filosofia de Polícia conhecida como “Polícia Comunitária”.

Este sistema adotado não é pioneiro no Brasil e nem no mundo, pois já existe em outros estados como Bahia, Rio de Janeiro e nos países como Japão e EUA. Apresenta-se como uma forma simples e direta de prestação de segurança, aproximando cada vez mais a polícia militar da comunidade, cuja finalidade são as trocas de informações e experiências.

Com base no artigo144 caput da Constituição de 1988, essa filosofia busca trazer parte da responsabilidade pela segurança pública à sociedade, conforme cita Roberson Luiz Bondaruk,

A atividade de Polícia Comunitária é um conceito que abrange todas as atividades voltadas para a solução de problemas que afetam a segurança de uma determinada comunidade, que devem ser praticados por órgãos governamentais ou não. A polícia comunitária envolve a participação das seis grandes forças da sociedade, frequentemente chamadas de “os seis Grandes”. São eles a polícia, a comunidade, as autoridades civis eleitas, a comunidades dos negócios, outras instituições e a mídia. (BONDARUK, 2004, p. 48)

Esta filosofia que busca a participação da comunidade procura dar maior autonomia ao policial militar e faz parte de um trabalho em conjunto com a polícia, na busca a solução de problemas de criminalidade e qualidade de vida, de forma que é concedido poderes a sociedade, que passa a influenciar as políticas de segurança, pois através dessa parceria a instituição passa a ter maior conhecimento de problemas específicos de determinada região.

Ademais, o policiamento passa a ser descentralizado tornando-se mais eficiente, visto que o policial torna-se conhecido de todos ali naquela comunidade, tendo contato direto com as pessoas, tendo autonomia para atividades a serem desenvolvidas, visto que é sabedor dos problemas que afetam a sua jurisdição, conforme leciona Bondaruk,

o policial comunitário ultrapassa sua função predominantemente reativa, atuando mais preventivamente. A reatividade e a força repressiva de qualquer policial permanecem no policial comunitário, posto que, são indispensáveis, mas estas deixam de ser a tônica da vivência profissional policial militar. (BONDARUK, 2004, p. 51)

Nesse sentido, as ações policiais serão mais transparentes, pois todos da comunidade lhe conhecem, o que torna as atividades de segurança pública, mais efetivas e concretas, visto que trarão satisfação e orgulho pessoal, em razão do reconhecimento pelos serviços prestados de forma personalizada.

3.2. CRIAÇÃO DE UM REGULAMENTO PRÓPRIO

A PMPR, bem como, as demais polícias brasileiras não são forças voltadas para guerra, mas para a segurança pública, sendo assim se faz necessária a revisão do atual Regulamento e a elaboração de um Regimento Próprio.

O RDE, que serviu para garantir a integridade da instituição, através da hierarquia e disciplina, é uma norma confrontante com várias regras e princípios constitucionais garantidos ao cidadão ou servidor civil, em que pese estarem dispostas exceções à regra aos militares na própria constituição, o militar não é desigual, para ser tratado com desigualdade, qual seja o desdobramento do princípio da igualdade, conforme Willian Lofy, nas palavras de Rui Barbosa,

A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. (LOFY, www.direitonet.com.br2005, acesso em: 22/05/2016)

Ademais, o artigo 5º da Constituição determina que todos são iguais sem distinção de qualquer natureza, incluindo neste caso a profissão. Em razão do princípio da igualdade, a lei não deve ser fonte de privilégios ou perseguições, mas um instrumento que regula a vida em sociedade, tratando de forma equitativa todos os cidadãos, já que a Constituição é para todos e não apenas para o cidadão civil.

Nesse sentido, a elaboração de um regulamento próprio, para que o policial tenha segurança na sua vida pessoal e na sua vida militar, sem, porém, acabar com a hierarquia e disciplina princípios basilares que construíram e regem a Polícia Militar do Paraná, em toda sua história.

No contexto atual, verifica-se que alguns estados já criaram seus RDPMs, porém estes, mais parecem cópias do RDE, com nome de regulamentos próprios, como é o caso de Santa Catarina, Bahia, entre outros. A modernização do sistema é mais do que necessária, tendo em vista que hoje, vários militares não lutam por seus direitos, com medo de retaliações.

Protesta Raul Canal, acerca dos regulamentos:

Arcaicos de várias décadas, os regulamentos que regem a vida militar são claramente inconstitucionais e antidemocráticos, porque foram feitos por meia dúzia de oficiais e aprovados por um ou por alguns comandantes. Não passaram pelo legislativo, não foram nem discutidos nas assembleias legislativas estaduais nem no Congresso Nacional. Afinal, o poder legislativo é aquele que sacramenta a vontade da sociedade. Os militares são regidos por leis que não representam a vontade do povo.(CANAL, 1999, p. 123)

O estado do Paraná, que já deu um grande passo nesse sentido, com a implantação da Polícia Comunitária, que se traduz numa ideia de polícia cidadã, respeitadora dos direitos humanos, agora se faz necessário que ocorram as mudanças internas. Não se pode exigir, um policial comunitário, respeitador dos direitos humanos, se no interior da instituição, este não é tratado com dignidade e respeito à sua condição de pessoa humana. Sobre a dignidade ensinam, Alice Bianchini e| Luiz Flávio Gomes,

[…] trata-se do valor-fonte, isto é, do valor supremo consagrado dentro da ordem constitucional e que congrega todos os direitos fundamentais do homem (José Afonso da Silva). Até porque o indivíduo é o objetivo principal da ordem jurídica. O princípio, porém, não tem – nem seria apropriado que tivesse – um conteúdo normativo específico ou historicamente enclausurado. Contudo, o princípio importa na total repulsa do constituinte a quaisquer normas ou práticas a colocar alguma pessoa em posição de inferioridade substancial perante as demais, assim como em situação na qual se lhe desconsidere a condição de humano, seja para reduzir ou assemelhar a pessoa à condição de “coisa”, seja para privá-la dos meios minimamente necessários à subsistência com dignidade. Nessa linha, o STF já considerou violado o princípio da dignidade da pessoa humana em razão: (a) da duração prolongada e abusiva da prisão cautelar; […] (BIANCHINI e GOMES, 2012, p. 70)

A criação de um novo regulamento, aproveitando a ideia de polícia comunitária, no sentido de tornar o regulamento mais próximo dos estatutos dos servidores civis, traduzindose na ideia de igualdade, preconizada na Constituição. Para que não se tenha uma disparidade muito grande de tratamento entre servidores, pois segundo Celso Bandeira de Mello,

…rezam as constituições – e a brasileira estabelece no art. 5º, caput- que todos são iguais perante a lei. Entende-se […] que o alcance do princípio não se restringe a nivelar os cidadãos diante da norma legal posta, mas que a própria lei não pode ser editada em desconformidade com a isonomia. Estamos diante do que a doutrina denomina de cláusula geral de igualdade”.(DE MELLO)

Há o argumento de que a punição disciplinar, segundo entendimento majoritário dos comandantes, possui dupla finalidade, a correção de atitudes e a prevenção, ou seja, a correção do seu procedimento é a necessidade de melhorar a sua conduta. Já em relação à prevenção, está no sentido de que a pena procura evitar que o faltoso volte a transgredir, servindo ainda, de exemplo e de alerta a todos os outros militares, mostrando-lhes as consequências da má conduta. Ocorre que este argumento não é suficiente para manutenção do atual regulamento, pois não consegue coibir desvios de conduta, pois os maus intencionados sempre encontrarão um meio para burlar o sistema.

Nessa estrutura hierarquizada e desconcentrada das diversas funções administrativas, assegura aos superiores o poder de rever os atos dos subordinados, delegar e avocar atribuições, dar ordem e punir, dentre outras situações, isto para a administração em geral.

Para a Administração Militar o princípio da hierarquia ultrapassa esse patamar com contornos rígidos, com a alegação de se evitar a subversão e promiscuidade nas instituições militares.

Neste sentido, afetando o equilíbrio psicológico, tão indispensável na ação da polícia, passa, também, pela saúde emocional da própria instituição. Mesmo que isso não se justifique, sabemos que policiais maltratados internamente tendem a descontar sua agressividade no cidadão. Evidentemente, a polícia não funciona sem hierarquia. Há, contudo, clara distinção entre hierarquia e humilhação, entre ordem e perversidade. O respeito aos superiores não pode ser imposto na base da humilhação e do medo. Não pode haver respeito unilateral. Não pode haver respeito sem admiração.

Este respeito deve ser mantido em todas as circunstâncias, entre os militares da ativa e os reformados, mesmo fora de suas atividades. Além do mais o acesso às autoridades superiores deve seguir rigorosamente o canal de comando, ou seja, a sequência hierárquica dos postos e graduações descritas no Estatuto dos militares, sob pena de transgressão da disciplina castrense.

Para o servidor militar a própria Constituição proíbe, com a argumentação do constituinte de que instituições armadas, são homens que portam armas, se não estiverem submetidos à disciplina e à hierarquia, viram bandos armados. As armas a eles confiadas, para a manutenção da ordem pública e da incolumidade das pessoas, passam a ser fonte de insegurança.

Em que pese a estrutura democrática de que se reveste a Constituição Federal de 88, esta, criou uma espécie de cidadãos de segunda classe ao não aplicar integralmente aos militares os direitos garantidos aos demais servidores do Estado, não permitir direitos humanos universais e inalienáveis, é negar a plena condição de cidadania.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Estruturadas nos moldes do Exército as Polícias Militares, agora com previsão constitucional, sempre se subordinaram aos governantes. No Paraná tem mais de 170 (cento e cinquenta) anos de história, agora organizada em comandos regionais, desenvolve várias atividades com o objetivo de manutenção da ordem pública e diminuição da violência na sociedade, porém com a crescente onda de violência, vê-se a necessidade de reestruturação, tornando sua atuação mais próxima da sociedade, com integração aos demais segmentos da segurança, diminuição do caráter militar, criação de regulamento próprio para tornar seus integrantes mais assemelhados aos servidores públicos civis, pois não se trata a sua missão, combater inimigos do Estado e sim atendimento à população, nas mais diversas situações, seja prendendo criminosos em flagrante delito, seja mediando conflitos, ou prestando assistência. Aqui entra o conceito de polícia de proximidade.

Com Normas e Regulamentos baseados na hierarquia e disciplina rígidas, a polícia militar, veio se consolidando ao longo dos anos, porém com as mudanças ocorridas no cenário político, e na sociedade brasileira, o surgimento de várias tecnologias de informações e transmissão de dados, globalização, onde todo acontecimento é amplamente divulgado, o cidadão ciente dos seus direitos, cobra cada vez mais das ações da polícia.

Dessa forma, a instituição, tenta acompanhar o rápido cenário de mudanças, inclusive em sua estruturação legislativa, mas com parte de suas normas e regulamentos da época da ditadura, obrigando-se, questionar sobre qual rumo seguir, diante do crescimento da violência na sociedade e supressão de direitos no âmbito interno das instituições, o que não combina com a ideia de democracia republicana, buscada desde a Revolução Francesa, através dos princípios, liberdade, igualdade e fraternidade.

Há necessidade de reestruturação, pois a sociedade alterou-se drasticamente nos últimos anos, sendo que não aceita mais aquele policial que resolvia ocorrências a base de truculência, hoje se faz necessário que este seja um mediador de conflitos e respeitador dos direitos humanos. Isto para o âmbito externo. No âmbito interno, verifica-se que o legislador não se preocupou em acompanhar as mudanças ocorridas, mantendo uma legislação que ultrapassou mais de 20 anos de ditadura, e ainda encontra vigência nos quartéis.

Nota-se que ocorreram avanços, no tocante ao atendimento da população com a implantação da Filosofia de Polícia Comunitária, que se traduz na ideia de polícia cidadã, no entanto há a necessidade de mudança interna, não se pode acreditar que o cidadão policial seja tratado de forma arbitrária por seus superiores e ainda consiga fazer totalmente ao contrário no seu dia-dia frente à sociedade.

No ensino policial, as mudanças vêm ocorrendo gradativamente, com implantação de disciplinas voltadas aos direitos humanos, dentre outras.

Quanto as punições para a correção de atitudes, os desmandos de alguns comandantes que agindo com convicções pessoais de forma desarrazoada, com base num regulamento que há muito tempo deixou de ser condizente com a realidade hoje vivenciada na PMPR, vê-se então a necessidade de um novo regramento para aplicabilidade das punições, que seja ao menos, próximo do estatuto dos demais servidores do Estado.

Diante do exposto, é notável a força das Normas e Regulamentos Militares, porém estes estão em desconformidade com os princípios do Estado Democrático de Direito, quando faz distinção entre pessoas, ao tratar com desigualdade os militares em relação aos cidadãos civis, pois reza o artigo 5º da Constituição que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.


1 A Crise de Identidade das Polícias Militares Brasileiras – Jaqueline Muniz em Dilemas e Paradoxos da Formação Educacional.
Em verdade, a proximidade das PMs com os meios de força combatente, sobretudo após a criação do estado republicano, não se restringiu apenas à adoção do sobrenome “Militar”. Elas nasceram, em 1809, como organizações paramilitares subordinadas simultaneamente aos Ministérios da Guerra e da Justiça portugueses.

2 Da obrigação do serviço militar
CAPITULO I
Art. 1º Todo o cidadão brasileiro, desde a idade de 21 á de 44 anos completos, é obrigado ao serviço militar, na forma do art. 86 da Constituição da Republica e de acordo com as prescrições desta lei.

3 Lei 1943/54- Código da PMPR
Art. 5º.São militares de carreira os componentes da Corporação com vitaliciedade assegurada ou presumida.
§ 1º.A vitaliciedade é assegurada ao oficial desde o momento do seu compromisso no primeiro posto.
§ 2º.Vitaliciedade presumida é a da praça com mais de dez anos de serviço.
Art. 6º.Militar da ativa é o que, ingressando na carreira, faz dela profissão, até ser transferido para a reserva ou reformado.
Art. 7º.Militar da reserva remunerada é o que para esta foi transferido, com proventos determinados, como prêmio pelos serviços prestados.
Art. 8º.Militar da reserva não remunerada é o que, na forma prevista neste Código, foi a ela incorporado.
Art. 9º.Militar reformado é o que está isento, na forma deste Código, de obrigações militares.

4 Art.6oPara efeito deste Regulamento, deve-se, ainda, considerar:

I–honra pessoal: sentimento de dignidade própria, como o apreço e o respeito de que é objeto ou se torna merecedor o militar, perante seus superiores, pares e subordinados;
II–pundonor militar: dever de o militar pautar a sua conduta como a de um profissional correto. Exige dele, em qualquer ocasião, alto padrão de comportamento ético que refletirá no seu desempenho perante a Instituição a que serve e no grau de respeito que lhe é devido.

5 Polícia Democracia e Sociedade -José Ratton e Marcelo Barros
…Mas o fato é que não há indicações precisas sobre a circunscrição semântica adequada, dada essa constelação tão variável, tão rica, e nos perdemos na ambiguidade, do ponto de vista legal. Não sabemos o que compete ao exército e o que compete ao governo estadual. Mas há mais ambiguidades e zonas cinzentas: a indicação dos comandantes gerais das polícias militares é prerrogativa do exército e cabe ao governador indicá-lo…..


REFERÊNCIAS

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