CORPOS E IDENTIDADES MARCADAS PELO ESPORTE: NARRATIVAS DE MULHERES (EX)ATLETAS

BODIES AND IDENTITIES MARKED BY SPORT: NARRATIVES OF WOMEN (EX)ATHLETES

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202408241128


Anacelly Ramos Pereira da Silva1


RESUMO 

O corpo carrega várias marcas identitárias que são construídas de acordo com o contexto no qual o sujeito está inserido, devendo ser levado em consideração questões sociais e culturais, que vão muito além das características biológicas. O objetivo central do trabalho é identificar em narrativas de mulheres (ex)atletas – mais especificamente, opressões vividas a partir dos marcadores sociais gênero feminino e/ou corpo negro, no sentido de compreender o papel de espaços formativos no processo de construção de identidades, tendo em vista as aproximações e distanciamentos existentes durante a trajetória esportiva dessas mulheres, para que seja possível fazer apontamentos reflexivos que contribuam para ressignificar as práticas escolares e de clubes a partir das mesmas narrativas. A pesquisa é de natureza qualitativa, do tipo narrativa. O estudo utilizou duas entrevistas com narrativas de uma (01) ex-atleta – Joanna Maranhão – e uma (01) atleta – Etiene Medeiros -, ambas da natação, publicadas na plataforma digital da Rede Globo de Televisão, no portal Globo Esporte e Globo Play. No que se refere às discussões sobre o gênero e corpo negro, o estudo aponta, com base nas narrativas, que instituições como a escola e o clube esportivo, bem como, relações interpessoais vivenciadas, revelam práticas racistas, sexistas e estereotipadas que marcaram o corpo e suas identidades.

Palavras-chave: Corpo; Atletas; Gênero; Negro. 

ABSTRACT

The body carries several identity marks that are built according to the context in which the subject is inserted, and social and cultural issues that go far beyond biological characteristics must be taken into account. The main objective of the work is to identify in narratives of women (ex)athletes – more specifically, oppressions experienced from the social markers of the female gender and/or black body, in order to understand the role of formative spaces in the process of building identities, in view of the approximations and distances that exist during the sports trajectory of these women, so that it is possible to make reflective notes that contribute to resignify school and club practices from the same narratives. The research is qualitative in nature, of the narrative type. The study used two interviews with narratives of one (01) former athlete – Joanna Maranhão – and one (01) athlete – Etiene Medeiros -, both from swimming, published on the digital platform of Rede Globo de Televisão, on the portal Globo Esporte e Globo Play. With regard to discussions about gender and the black body, the study points out, based on the narratives, that institutions such as the school and the sports club, as well as experienced interpersonal relationships, reveal racist, sexist and stereotyped practices that marked the body and their identities.

Keywords: Body; Athletes; Gender; Black.

1. INTRODUÇÃO 

Historicamente todo ser humano produz e transmite cultura no âmbito da sociedade (HALL, 1997). Esta por sua vez é plural e permite que tenhamos acesso a uma grande diversidade de valores, religiões, maneiras de pensar, agir, ou seja, diversidade cultural. Para Neto (2003), na atualidade as questões culturais têm recebido muita atenção nos mais diferentes campos, sejam eles acadêmicos, políticos, cotidianos ou econômicos, fazendo com que sua importância no mundo contemporâneo cresça cada vez mais.

Sob a ótica sociocultural que atravessa o corpo, o estudo dialoga com Goellner (2008, p. 28), por afirmar que “o corpo é também seu entorno” e exemplifica com seus adornos, as intervenções que ocorrem de forma direta, sabendo que não é possível separar o sujeito das questões sociais.

Um corpo não é apenas um corpo. É também o seu entorno. Mais do que um conjunto de músculos, ossos, vísceras, reflexos e sensações, o corpo é também a roupa e os acessórios que o adornam, as intervenções que nele operam, a imagem que dele se produz, as máquinas que nele se acoplam, os sentidos que nele incorporam, os silêncios que por ele falam, os vestígios que nele exibem, a educação de seus gestos… enfim, é um sem limite de possibilidades sempre reinventadas e a serem descobertas. Não são, portanto, as semelhanças biológicas que o definem mas, fundamentalmente, os significados culturais e sociais que a ele se atribuem (GOELLNER, 2008, p. 28).

Com a globalização e a livre circulação de pessoas, a diversidade cultural acaba sendo cada vez maior e quando tratamos disso temos que levar em consideração a liberdade religiosa, étnica, sexual, entre outras. E o que todas elas têm em comum é que acabam por refletir no corpo as suas preferências, seja através da forma como os indivíduos se vestem, usam seus cabelos, tatuam o corpo, se maquiam, enfim, expressam-se. No entanto, estes corpos que mais se manifestam parecem não ser compreendidos ainda no ambiente escolar, pois a mesma insiste em excluí-los e atua de forma omissa sobre eles, por não achar que são “normais” ou “socialmente aceitáveis”, busca torná-los homogêneos através da aplicação de regras.

Para Zamboni (2014), o termo “marcadores sociais” refere-se a um campo de estudos das ciências sociais que tem como eixo central debater acerca do modo como são constituídas socialmente as desigualdades e hierarquias entre os indivíduos, assim como a maneira que as mesmas operam na vida social, produzindo e reproduzindo a diferença. Para Avtar Brah apud Souza (2016, p.106), marcadores sociais são “marcas produtoras de diferenciação social, que estabelecem lugares distintos para os sujeitos dentro da estrutura social”.

Um grande exemplo é a necessidade social de classificar os corpos, sem que haja ambiguidade, possibilitando o apontamento quanto ao gênero, a sexualidade ou a etnia.  Segundo Guacira Louro (2000), trata-se de um processo no qual o corpo deveria fornecer as garantias para tais identificações, para que assim seja possível reconhecer aquilo que o sujeito é e ao mesmo tempo, estabelecer o que ele não é – a diferença.

Nesse contexto, os corpos que trazem fortes marcadores sociais são aqueles que irão sentir maior dificuldade com relação a ideia de pertencimento nos mais distintos espaços sociais, sejam eles escola, igreja, clube, entre outros. Stuart Hall (1999, p.22) coloca que “uma identidade cultural enfatiza aspectos relacionados à noção de pertencimento a culturas étnicas, raciais, linguísticas, religiosas, regionais ou nacionais.”

A título de exemplo podemos citar o corpo negro, em que para falar sobre ele, rapidamente chega-se à marca da escravidão e consequentemente o pertencimento a uma condição socioeconômica, religiosa, etc. Essa associação é enfatizada pela escola, onde os conteúdos pautados nos livros didáticos, as imagens escolhidas para representar períodos históricos, a ênfase do corpo negro como escravo, numa condição natural da subserviência ao outro, sem abordar o protagonismo deste corpo na história brasileira teve e ainda tem implicações na construção identitária dos mesmos. 

No campo do esporte, outras marcas se mostram: a ausência de negros em esportes que necessitam de recursos financeiros para sua prática, como a natação e a ginástica, ou então, a predominância de negros em outros esportes pelo mesmo motivo, como o futebol e o atletismo. 

A representação dos negros nos livros didáticos sob o enfoque da escravidão ainda é muito forte e ultrapassa os muros da escola solidificando o racismo estrutural no campo escolar, do trabalho, do esporte, onde o corpo com suas linguagens ainda se vê incompreendido ou restrito ao cabelo cacheado ou crespo, nariz chato, lábios carnudos, entre outros. Essas características físicas desse corpo acabam sendo protagonistas das vivências e lembranças desde a infância na escola, principalmente, já que a mesma é um dos ambientes onde os corpos “marcados” transitam durante boa parte da sua vida e tem seus estereótipos reforçados. 

O processo de reconhecimento étnico do corpo vai se dá dentro de muitos conflitos passando por sentimentos de rejeição, ressignificação e até mesmo negação. Para Nascimento (1978), esses sentimentos podem ser reforçados pelo processo de embranquecimento que aconteceu no Brasil, que por sua vez, não deve ser de forma alguma ser romantizado.

O gênero ou a igualdade de gênero também é uma das questões que causa discussões quando associada ao debate cultural, escolar e esportivo, pois sabemos que nosso país ainda é composto de uma sociedade machista e racista. 

Por mais que estejamos caminhando a passos largos em direção a avanços, instituições que poderiam facilitar o processo, acabam por muitas vezes reproduzir as desigualdades que fortalecem a construção identitária circunscrita dentro de um determinado padrão na forma de ser mulher ou homem. Romper com o modelo heteronormativo reconhecendo outras formas de existir, pode causar atos de violência de gênero relacionada ao ambiente escolar, desde o assédio verbal ou sexual, abuso sexual, punição física, além do bullying, que segundo a Unesco (2015), afeta cerca de 246 milhões de meninos e principalmente meninas todos os anos.

No entanto, essa construção identitária atrelada a um padrão não se restringe à escola, mas também a outras instituições, como clubes esportivos, federações e confederações representadas pelas pessoas que a constituem (gestores, técnicos, atletas e até mesmo a torcida). Muito recentemente, atletas e ex-atletas expuseram o assédio sexual cometido por técnicos, além o preconceito que vivenciaram, no âmbito do esporte, por serem mulheres, transgêneros e/ou serem negros(as). Nesse sentido, tais pautas vêm ganhando mais força no esporte de rendimento a partir de declarações de atletas brasileiros, exibidas nos meios de comunicação, que levantaram tais bandeiras demarcando sua exposição como ato libertário e político. Podemos citar Diego Hipólito (ginástica olímpica), Thiffany (voleibol), Etiene e Joana Maranhão (natação) que compartilharam suas narrativas no esporte relacionadas ao racismo, assédio sexual, violência de gênero, dentre outros. 

O estudo entende que a vivência no esporte (e demais práticas corporais) na escola ou fora dela também marcam o corpo e seu processo de construção de identidade, como atleta e ator social. Partindo desse contexto que compreende a importância da representatividade social, segundo a definição clássica apresentada por Jodelet (1985), como sendo modalidades de conhecimento prático, orientadas para que possamos nos comunicar e para a compreensão do contexto social no qual vivemos. O estudo opta por trazer narrativas de atletas e ex-atletas que carregam esses marcadores sociais (gênero feminino e corpo negro), no sentido de identificar nas narrativas a importância dessa representatividade para a construção da subjetividade e identidade no esporte rendimento.

A pesquisa apresenta as seguintes questões de estudo:

1. Qual(is) o(s) marcadores sociais mais emblemático(s) que a escola e/ou esporte reforçam em (ex)atletas mulheres, em seu processo de construção identitária?

2. Qual(is) os horizontes de sentido podem ser apontados para a ressignificação de práticas escolares e do esporte rendimento a partir das narrativas de (ex)atletas? 

2. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO

2.1 Corpo e Identidade

Em diferentes espaços de formação e de relações interpessoais, sejam eles formais ou não-formais, o corpo carrega em si, nem sempre de maneira consciente, marcadores sociais que atuam na sua construção identitária como ser humano, como também expressam saberes e linguagens próprias que se reconfiguram a partir de suas experiências. Nestes espaços existem também as intervenções sobre o corpo, nem sempre pedagógicas, libertárias e de autoconhecimento. Isso pode acontecer nos clubes esportivos que formam atletas e ginastas ou escolas de dança que formam dançarino profissional, como também na escola de educação básica. 

Dialogando com Costa (2004), ao tratar sobre os discursos do corpo na dança, o estudo se aproxima da autora para corroborar com a ideia de que cada ser humano em sua existência corpórea é singular, único, pois materializa a tecitura de fatores biológicos, genéticos, interrelacionais, onde vive, os lugares por onde transita. O viver com o outro – pessoas, instituições, experiências – torna o corpo um ser também plural. No campo biológico, o corpo carrega signos capazes de distingui-lo de forma imediata através de seus significados para que o sujeito seja enquadrado quanto ao seu gênero, etnia, sexualidade. Assim, pretendemos reconhecer a identidade de forma determinista, sem problematizar esses marcadores sociais.

O campo da cultura é definido a partir das vivências do sujeito que, através dos marcadores sociais que carrega, torna-o distinto dos demais. Vale salientar que, de acordo com o momento vivido dessa cultura, os significados desses marcadores podem se modificar. Por isso, é preciso levar em consideração aspectos históricos e sociais relacionados à hierarquia e à disputa sobre qual característica tem maior valor. Connell (1991:352) afirma que: 

O corpo nunca está fora da história e a história nunca está livre da presença do corpo e de seus efeitos. As dicotomias tradicionais subjacentes ao reducionismo agora têm que ser substituídas por uma explicação mais adequada e complexa das relações sociais nas quais essa incorporação e interação ocorrem.

O que o corpo vive, experimenta, recebe do outro no cotidiano, seja na família, escola, trabalho, clube ou rua, compõem a sua existência. Portanto, as pessoas e as instituições participam da formação do indivíduo de diferentes formas, a partir de suas próprias condutas, regras e estilos de vida produzidos socialmente. De um modo geral, a escola, por exemplo, como instituição educacional, ainda busca o controle e o vigiar do corpo, através de práticas organizacionais – estrutura das salas de aula em padrões de tamanho, cores, disposição das carteiras -, e equipamentos – câmeras instaladas -, demonstram essa intenção, bem como faz uso de estratégias pedagógicas para o controle, a disciplinarização e automatização dos comportamentos aceitáveis. Como tratado na obra Vigiar e Punir, de Michel Foucault (1987), corrigir, moldar e até mesmo vigiar para que, assim, possa “criar” cidadãos educados, homogêneos e civilizados.  

Freire (1993, p.115) destaca “[…] o corpo imita o poder em seu entorno nos contornos mais sutis […]”. Com essas palavras o autor refere-se às condutas que são impostas a esse corpo dentro de uma relação de hierarquia como uma forma de poder, onde o corpo por sua vez irá reproduzir os comportamentos que o cercam. Assim, ele consegue sintetizar como funciona a obra revolucionária de Foucault. 

Dessa forma, esse corpo fala através do seu condicionamento. “Uma postura reta”, diz um antigo texto marista, “supõe muito mais do que uma forma de posicionar as costas ou os membros ao longo do corpo, ela é indicativa de uma “retidão de caráter” (LOURO, 1995, p. 93). 

O estudo estabelece a relação entre corpo, identidades e instituições. As identidades são múltiplas e distintas, a partir das diferentes situações ou agrupamentos que o indivíduo passa a fazer parte, tornando essa identidade nada simples ou estável de se definir. 

Por sua vez, Baraó (1989, apud REY, 2003), define a identidade como resultado da ação do próprio indivíduo e da sociedade, de tal maneira que se forma na junção das forças sociais aplicadas sobre o indivíduo e na qual ele próprio atua para construir a si mesmo. Partindo dessa ideia, cada indivíduo possui muitas identidades que, por sua vez, podem ser atraentes provisoriamente e depois descartadas, já que também somos sujeitos de identidades transitórias, tudo isso vai além das características físicas que carregamos.

De acordo com Silva (2000, p. 80), identidade e diferença não se separam e que, “na medida em que são definidas, em parte, por meio da lingua­gem, identidade e diferença não podem deixar de ser marcadas, também, pela indeterminação e pela instabilidade”. Por isso, nem mesmo o corpo pode ser colocado como absoluto demonstrativo dessa identidade, pois ele também se modifica e não expressa todos os significados dos marcadores sociais carregados pelo sujeito.

A sociedade contemporânea é marcada por intensos processos de transformações que, por sua vez, envolvem aspectos econômicos, culturais, políticos e sociais. Hall (1987), trata que as velhas identidades2, que por tanto tempo tornaram estável o mundo social, estão em declínio, contribuindo para o surgimento das chamadas “novas identidades”3 estimulando o processo de fragmentação do indivíduo da pós-modernidade. 

Silva (2007) afirma que a identidade é aquilo que se é: “sou brasileiro”, “sou negro”, “sou heterossexual”, “sou jovem”, “sou homem”. Ainda para o autor, a identidade é sempre vista com um olhar positivo para aquilo que se é, e, juntamente com essa ideia, carrega um sistema de representações culturais. Esses símbolos são criados de forma inconsciente e abstrata pelos indivíduos. Woodward (2007, p. 17) diz que “esses sistemas simbólicos tornam possível constituir aquilo que somos e aquilo no qual podemos nos tornar”.  

2.2 Marcadores Sociais e Esporte 

Para melhor compreensão sobre os simbolismos na construção identitária, faz-se necessário considerar os marcadores sociais da diferença. Tais marcadores são derivações “que se encaixam de maneira que o eixo de diferenciação constitui o outro ao mesmo tempo em que é constituído pelos demais” (PELÚCIO, 2011, p. 79). Por isso, não se pode deixar de questionar a identidade e a diferença a partir das relações de poder, como, por exemplo, ao refletir sobre o corpo que carrega o marcador social do “gênero feminino e masculino” e quanto à étnica “branco e negro”. Dentro dessa relação binária há uma classificação simbólica na qual os signos são construídos mentalmente a partir da interação do indivíduo com os códigos sociais (WOODWARD, 2007). Diversos fatores influenciam diretamente na construção identitária e representações do sujeito, como a etnia, o gênero, a classe econômica, que se trata ainda de relações de poder responsáveis por diversos conflitos pela afirmação das identidades e diferenças.

Aproximando os marcadores sociais à vivência no esporte, o estudo compreende o esporte como um fenômeno sociocultural possuidor de características dinâmicas que acompanham as transformações da sociedade em diferentes tempos. O esporte como fenômeno globalizado possui relação com a cultura, o capital, o consumo, a ciência, a política, a construção de valores, a formação do sujeito, o processo de construção identitária. 

Historicamente, o esporte institucionalizado vem sendo ressignificado pelo protagonismo de atletas, de rendimento e/ou olímpicos, que utilizaram sua imagem e o pódio para falar sobre os marcadores sociais e a diferença, subvertendo os códigos do esporte olímpico, por vezes, colocando em risco sua conquista, o resultado atingido. Um dos casos mais emblemáticos é o de Tommie Smith e John Carlos, nas olimpíadas do México, em 1968, onde o gesto (um dos códigos da linguagem do corpo): cabeça para baixo, braço erguido e mão fechada, vestida com uma luva preta, código do movimento dos Panteras Negras, os atletas revelaram ao mundo sua luta e resistência contra discriminação racial nos Estados Unidos na década de 60. 

Muito antes desse feito, nos jogos olímpicos da era moderna, restabelecidos em 1896, na Grécia, Stamati Revithi, mulher grega e pobre, no ímpeto de marcar a mulher no esporte, realizou a maratona extraoficialmente e a sua última volta concluiu por fora do estádio, pois sua entrada não foi autorizada. A atleta concluiu a prova em quatro horas e meia, sendo inclusive mais rápida que alguns homens. Por ser mulher, o feito de Stamati Revithi não foi reconhecido, tampouco repercutido internacionalmente; seu nome esquecido, de forma que passaram a chamá-la de Melpomene, fazendo referência à deusa grega da tragédia. Nos jogos da era moderna, as mulheres não participavam, pois os idealizadores do evento, os homens, não defendiam a inclusão da mulher, por acreditarem que elas não faziam jus ao ambiente de honras e conquistas. Foi o ato subversivo dessa mulher que desencadeou a inserção paulatina de outras figuras femininas nos jogos, tornando-se então, pioneira no enfrentamento da instituição esportiva, nos jogos olímpicos da era moderna (GOELLNER, 2006; OLIVEIRA et. al., 2008). 

Nesse contexto, o estudo delimita-se ao debate de dois marcadores sociais: gênero e étnico-racial no esporte.

O primeiro marcador social remete-se ao gênero. No ano de 1983 a bióloga, filósofa, escritora e professora estadunidense Donna Haraway, recebeu um pedido para que redigisse o termo “gênero” no dicionário marxista, pois, com o surgimento dos novos movimentos sociais, achou-se que faltavam algumas palavras ou precisavam ser reescritas para melhor explicação do vocábulo. Sendo assim, Donna levou em consideração a luta feminista, sem deixar de fora as narrativas históricas e remetendo às condições para emergência do novo sujeito histórico, – as mulheres -, e, dentro de uma perspectiva teórico e política, o feminismo. O resultado está no livro Ciencia, cyborgs y mujeres. La reinvención de la naturaleza, no qual afirma: “Gênero é um conceito desenvolvido para contestar a naturalização da diferença sexual em múltiplos terrenos de luta” (HARAWAY, 1995, p. 221).

O movimento feminista surge inicialmente com o “movimento sufragista” e “apresentava objetivos mais imediatos relacionados aos interesses das mulheres brancas de classe média” (LOURO, 2001, p. 15) o que não levava em consideração a diversidade dessas mulheres. No entanto, não se pode esquecer que o mesmo movimento não é passível de enquadramento em um bloco homogêneo de idéias, pois a sua história é marcada pela diversidade e um grande exemplo, é o fato do mesmo não está limitado ao reconhecimento das suas conquistas políticas, já que as teorias feministas surgem também com o intuito de questionar as evidências apontadas para naturalização das mulheres quando atreladas ao biológico que acabam por excluí-las de atividades consideradas masculinas. 

Estreitando a reflexão para o gênero e esporte de rendimento, atributos como fragilidade, submissão e vulnerabilidade, são logo tidos como inaceitáveis e apontados como características identitárias do corpo feminino. Sendo assim, durante muito tempo a Educação Física fincou seus fundamentos na naturalização da fêmea apenas como procriadora e os programas de atividade física eram pensados a partir da medicina desportiva que segundo (GOMES,  1958,  p.94-95). apontava:

“A educação física da mulher deve ser orientada em função de sua natureza específica,  e tendo,  além  disso,  em  consideração as circunstâncias de ordem moral que urge  ter  presente,  a  fim  de  que  essa Educação não se torne prejudicial ou escandalosa  e  socialmente  nociva.”

Juntamente com o crescimento da política do feminismo e analisando o contexto a partir de perspectivas das áreas de antropologia, sociologia, história e literatura, a Educação Física brasileira começou a refletir a temática do gênero, colocando em segundo plano os argumentos biológicos. Goellner (2005) explica o termo da seguinte forma:

O termo gênero desestabiliza (…) a noção de existência de um determinismo biológico cuja noção primeira afirma que homens e mulheres constroem-se masculinos e femininos pelas diferenças corporais e que essas diferenças justificam (…) desigualdades, atribuem funções sociais e determinam papéis a serem desempenhados por um ou outro sexo (GOELLNER 2005, p. 207).

Nesse segundo momento, as preocupações foram ampliadas e os estudos começaram a pensar em ambos os sexos e suas experiências no contexto social, assim como nas relações entre eles. Para Françoise Héritier (1996), em sua coletânea feita com pensamentos das diferenças sexuais, o autor não desiste da ideia de que o gênero se constrói a partir relação homem e mulher, pois alega que não existe indivíduo isolado, mesmo que cada um vivencie regras e representações sociais diferentes. 

Joan Scott (1998), explica a categoria gênero, como historicamente determinada, e que não é unicamente construída sobre a diferença de sexos, mas que também serve para “dar sentido” a essa diferença. Dessa forma, o termo gênero abrange o social, cultural e o histórico. Mas ainda podemos dizer que o mesmo é mutável, pois se modifica o tempo todo partindo das relações e interações dos indivíduos.

No âmbito do esporte de rendimento, a história da participação feminina é cheia de proibições, lutas e resistências. Para Hunt:

[…] a participação feminina no esporte sempre foi alvo de muitas controvérsias. Há algumas décadas, as mulheres eram interditadas a participar de qualquer atividade esportiva sob diversas alegações, desde a fragilidade física, passando pela sua condição materna e até mesmo pelo fato da arena esportiva fortalecer o espírito do guerreiro masculino, sendo apontado como único local no qual a supremacia masculina seria incontestável (HULT apud KNIJNIK e VASCONCELOS 2003, p. 51)

Na atualidade, a vivência do esporte ainda é demarcada pelo gênero. O exemplo mais clássico, temos um país apaixonado por futebol, especialmente o masculino, onde socialmente foi proibido para mulheres na década de 40 no Brasil causando impacto e consequências distintas para as equipes masculinas e femininas, como o questionamento da capacidade física – condição anátomo-fisiológica – para a prática que levaram à proibição4, após a suspensão da lei, as mulheres que jogavam futebol driblavam os xingamentos e ofensas, a falta de condições para treinos e competições, os uniformes da seleção masculina que restavam eram utilizados pela equipe feminina, a transmissão dos jogos, dentre outros aspectos. 

Para muitos, o futebol ainda não é “coisa de mulher”, pois o esporte é um lugar, na estrutura social, voltado ao homem. O argumento é também uma construção de sociedade e cultura, onde o corpo carrega a diferenciação social que produziu à mulher estereótipos que não lhe permitiam a prática de alguns esportes: graciosidade, delicadeza e beleza, típicos da “essência feminina”. Assim como, estes mesmos atributos não condizem ao homem e, por isso, muito provavelmente, se explica a ausência de equipe masculina na ginástica rítmica, nos jogos olímpicos. 

A escritora feminista Susan Brownmiller traz o termo feminilidade como sendo a estética da limitação. Associado diretamente a isso, tem-se os estereótipos, que apontam quais características esse corpo pode carregar. Como trata Markus (1977, p. 64), “o resultado desta organização é um padrão perceptivo, o qual será utilizado como base para futuros julgamentos, decisões, inferências e predições”. 

Social e culturalmente existe um padrão estético definido para feminilidade e masculinidade. Em um estudo realizado por Franzoi e Shields (1984) é afirmada a importância que as mulheres atribuem à imagem física, revelando de forma implícita a relação da feminilidade com o meio. No mesmo estudo, apresenta que a autoestima corporal das mulheres está ligada diretamente à preocupação com a aparência física vinculada à atratividade sexual e controle do peso.

Trazendo o debate para o campo do esporte de rendimento, a sistematização de treinos físicos e técnicos revela o corpo da mulher que, muitas vezes, rompe com a feminilidade padrão produzida para a mulher viver socialmente. Por isso, o biótipo de atletas de alto rendimento, em modalidades esportivas tradicionalmente masculinas, acabam gerando preconceitos e discriminações reproduzidos pelos estigmas construídos. Andersen (2000, p. 70) aborda que o Instituto Australiano de Esportes demonstrou que mulheres atletas vivenciam estados de ansiedade em relação às suas imagens corporais, devido “à pressão social que estabelece um tipo diferente de corpo, consistente com os padrões de gênero”.

Considerando a influência que a sociedade exerce sobre esse corpo, onde a sua aparência importa mais do que todos os outros aspectos que a torna indivíduo a condição de ser mulher numa relação de objeto sexual e de pertencimento do sexo masculino pode ser confirmado pelo alto índice de estupros e feminicídios ocorridos diariamente no Brasil. Como um extrato da sociedade, muito recentemente, o esporte de rendimento tem sido uma instituição – representada por técnicos e/ou atletas da equipe de clubes -, que tratam atletas nessa objetificação materializada em atos de violência e assédio sexual vividos por atletas de ambos os gêneros. Percebe-se, além de tornar possível uma aproximação dos relatos, com histórias de pessoas “comuns” que precisam de apoio para recontar e visualizar as suas histórias por outro prisma, o que pode tornar-se mais fácil a partir dessa representatividade.

No caso da mulher, um agravante é a hipersexualização que dá ênfase ao corpo e a sexualidade principalmente das atletas, onde reportagens e entrevistas são em sua maioria muito mais voltadas para o corpo do que para as próprias conquistas e habilidades delas no esporte. Diante disso, observa-se que um ambiente composto por maioria masculina, de posições hierárquicas distintas as das atletas (técnicos, diretores de clubes) reproduzem dentro do esporte a concepção do corpo como objeto sexual, de uso de controle e poder por meio de práticas abusivas, principalmente as de violência sexual5

Narrativas de atletas, vez por outra, ganham notoriedade nas mídias que revelam como os preconceitos e desigualdades foram vivenciados no esporte. No que se refere ao gênero, a ex-atleta Joana Maranhão, em entrevistas, aborda sua condição de mulher num esporte predominantemente masculino, que modifica o padrão do corpo feminino, o trato da equipe e como construiu sua identidade, além de abordar sobre abuso sexual vivido na natação, desde a infância, fase de maior vulnerabilidade. 

Sabendo que o esporte como um todo é uma instituição que tem forte influência na nossa sociedade por possuir um alto alcance, é de extrema importância trazer narrativas de personalidades do esporte como Joanna Maranhão, hoje, ex-atleta olímpica de natação que é um dos exemplos de mulheres que sofrerem por carregar o marcador social de gênero feminino em seus corpos e por consequência em suas identidades, gerando discussões na Educação Física como um todo e até mesmo no contexto escolar. 

Com relação ao marcador social étnico-racial, o estudo inicia a abordagem referenciando que no século XVI, ano de 1532, o Brasil começou a sofrer as suas primeiras invasões pelos portugueses, apresentados como representantes da cultura branca europeia, grandes escravocratas, que acabaram trazendo uma quantidade significativa de africanos em seus navios negreiros, para serem utilizados para o trabalho braçal nas lavouras de açúcar.  (Freyre, 2003)

Entre os muitos negros escravizados, havia aqueles que não aceitavam se submeter a exploração e fugiam, surgindo assim os quilombos. Narrativas como esta nos permite entender os simbolismos que o corpo negro carrega, a exemplo da ideia de menos capaz ou inferior. Essa reprodução acontece, muitas das vezes, pelos próprios espaços educacionais, que ao invés de incentivar a liberdade acaba por aprisionar esses corpos. 

Na ótica jurídica, os escravos estavam livres após o fim da escravatura em 1888, por isso foi necessário pensar em um sistema que mantivesse a hierarquia para manter os status de antes e para que esses novos cidadãos não se tornassem uma ameaça. Para isso, pós-abolição a elite que antes justificava essa hierarquia pelo próprio sistema, agora precisava construí-la através de uma ideologia informal. (De Almeida, 2018)

Quando se analisa os conflitos étnicos não se deve deixar passar a ideia que eles não se desenvolvem somente ao nível das instâncias econômicas e políticas, mas passam também pela estrutura simbólico-ideológica das culturas nas quais eles estão inseridos. O que é de extrema importância, porque é nele que os indivíduos formam e cristalizam suas ideias, estereótipos e preconceitos em relação ao “outro” (D’adesky, 2005).

Um grande exemplo dessa hierarquia informal e conflitos étnicos é o fato de que o nosso referencial de características fenotípicas serem voltadas para as do homem branco, europeu, deixando sempre o corpo negro como secundário e inferior. Segundo Hall (2013, p. 324), “dentro de toda exclusão e opressão sofrida na colonização, restou às populações de descendência africana o seu corpo como forma de expressão e identificação na diáspora”. Sendo assim ainda hoje é fato que um corpo negro tem sempre na sua história marcos de opressão, desvalorização e racismo. 

O racismo ainda existe e persiste na sociedade. Como trata, Almeida (2018, p. 25), “racismo é uma forma sistemática de discriminação que tem a raça como fundamento, e que se manifesta por meio de práticas conscientes ou inconscientes que culminam em desvantagens ou privilégios para indivíduos […]”.  Sendo assim, essa falsa noção que temos mais propriamente no Brasil, de que todos são e estão amparados de direitos iguais, na verdade foi criada para encobrir as mais diversas práticas racistas.

Os meios de comunicação, tem um grande papel midiático de mostrar os casos de racismo vividos por um corpo que durante muito tempo não teve sequer espaço e/ou oportunidade para contar as suas histórias. No entanto, nesse lugar de fala ainda existe muito silenciamento da história étnico-racial e cultural desse povo atrelado à naturalização – o chamado racismo estrutural. O termo também tornou-se livro, Racismo Estrutural:

O livro “O que é racismo estrutural?” provoca a reflexão sobre os conceitos de racismo como fundamento estruturador das relações sociais, com base em autores reconhecidos pelos estudos de teoria crítica racial, colonialismo, imperialismo e capitalismo, motivo pelo qual o livro evidencia a importância de compreensão dos fatos históricos, sociais, políticos, jurídicos e econômicos para se entender a existência do racismo. (BATISTA, 2018, p. 81)

A estrutura social é responsável por fazer com que o racismo transite por qualquer espaço ou âmbito de expressão e da existência, podendo tanto se escancarar, como se camuflar.

Para Moreira (2005), o esporte é tido como uma atividade antiga que com o passar dos anos esteve assumindo diferentes funções de acordo com a civilização e a época, sempre influenciado pela cultura. Por isso, o conceito se modifica na medida em que a sociedade muda seus valores e princípios (SOUTO, 2016). O ser humano está em constante movimento e por causa disso tudo ao seu redor deve acompanhar essa “dança” para adaptar-se às novas perspectivas sociais e não é diferente para o esporte. 

Sendo ainda um espaço no qual o preconceito com esse corpo marcado acontece corriqueiramente, no esporte a discriminação está presente seja nas quadras, estádios, complexos esportivos, entre outros, e podem partir tanto das torcidas como dos próprios atletas para com aqueles que estão dividindo espaço. 

Tem sido perceptível a maior divulgação da mídia dos casos de racismo sofridos dentro do esporte, assim como é inegável que o mesmo cada vez mais está ligado também a economia, estreitando as relações com a própria mídia e com o  público, o que também tem tornado os seus atletas “objetos” de conhecimento e “veículo” de informação dentro da sociedade.

Um exemplo do estreitamento dessa relação com a mídia e do uso do protagonismo desses atletas foi o posicionamento em 2020 acerca da morte de George Floyd, nos Estados Unidos, que desencadeou no mundo o movimento “Vidas Negras Importam”, onde atletas nacionais e internacionais e alguns patrocinadores se posicionaram publicamente sobre, colocando o esporte institucionalizado no combate do racismo dentro e fora do âmbito esportivo. 

Sabendo que o corpo negro carrega vários simbolismos e que a má relação esses começam muito cedo tendo como percursoras instituições formadoras -a exemplo da família, da escola, da igreja, do clube -, pois são nesses ambientes que surgem os primeiros apelidos que expressam a ideia de inferioridade e isso é tomado e carregado por muitos dos indivíduos durante toda a vida.

Na construção identitária do corpo negro, temos além do esquema corporal e as percepções, a atribuição da ideia de raça às características fenotípicas. O cabelo e a cor de pele são características indispensáveis da raça negra. Estas características físicas em si não são capazes de caracterizar um grupo de pessoas ou determinadas culturas como diz Hall (2013). Mas quando se trata da população negra as características fenotípicas acaba torna-se não só sinônimo de uma ancestralidade, mas também de preconceito. 

Nascem desta perspectiva as visões estereotipadas sobre essa população e entre esses discursos está a ideia de que o corpo negro não pode ocupar cargos de alta representatividade e que a sua condição social deve sempre ser sempre inferior. Este sentido ainda é um resquício da incorporado pela época colonial em que cabia ao corpo negro apenas a noção de pouca intelectualidade.  

Lilian Schwarcz afirma que o racismo no Brasil tem como característica associar o corpo negro a uma condição social: 

“Tudo isso indica que estamos diante de um tipo particular de racismo, um racismo silencioso e que se esconde por trás de uma suposta garantia de universalidade e da igualdade das leis, e que lança para o terreno privado o jogo da discriminação. Em uma sociedade marcada historicamente pela desigualdade, pelo paternalismo das relações e pelo clientelismo, o racismo só se afirma na intimidade, não se afirma publicamente. No entanto, depende da esfera pública para a sua explicitação, numa complicada demonstração de etiqueta que mistura raça com educação e com posição social e econômica.” (SCHWARCZ, 2012, p.32)

Afunilando o nosso estudo não só a perspectiva do corpo negro, mas também do gênero feminino dentro do esporte de rendimento, é correta a afirmação de que a resistência institucional à presença da mulher no esporte se dirigiu ao gênero de um modo geral. No entanto, contra a mulher negra essa resistência assume também a forma de preconceito e discriminação baseada na cor (Farias, 2011; Bonzagni, 2017).

A limitação econômica associada a esse corpo no esporte acontece quando o “prendemos” em práticas esportivas que exigem um poder aquisitivo menor, seja pela pouca necessidade de material ou ainda o fácil acesso a mesma, não precisando recorrer a clubes com altas mensalidades – o atletismo e o futebol são exemplos desses esportes. 

Sendo o Brasil um país onde mais da metade da população é negra6, é preocupante a ideia que esse corpo não habita outros esportes, ou ainda quando vivenciam essas práticas corporais, exerce o papel de minoria. A natação como esporte olímpico no nosso país, já teve grandes personalidades reveladas, como César Cielo, Kaio Márcio, Thiago Pereira entre outros. Mas nenhum deles carrega a marca do corpo negro. 

Diante do exposto, optamos por trazer para o trabalho a narrativa de Etiene Medeiros, atleta de rendimento da natação brasileira, mulher e negra -, mas que ainda é exceção nesse cenário e conta como é viver com todos os simbolismos que o seu corpo carrega dentro de um esporte de maioria homens brancos. Para que, partindo da importância social que o esporte como um todo apresenta, possamos gerar a aproximação e discussões acerca da temática. 

3. METODOLOGIA

3.1 Natureza da pesquisa

O presente trabalho é de natureza qualitativa. Para Minayo (2001, p.14), a pesquisa qualitativa trata-se de um “universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.”

Quanto ao método, trata-se de uma pesquisa narrativa. Para Connelly e Clandinin (1995); Clandinin & Connelly (2011); Telles (1999); Galvão (2005) e Moreira (2011) apud Monteiro et. al. (2017), a narrativa é fenômeno e método de pesquisa, simultaneamente. Para Polkinghorne (1995) apud Monteiro et. al. (2017), a pesquisa narrativa “trata-se de uma associação de eventos e acontecimentos com o intuito de produzir uma história explicativa. Usando as narrativas tanto como método, quanto como fenômeno de estudo.” Compreende-se a partir dos autores que existe uma necessidade de compor relatos que, quando problematizados, apontem outros sentidos e significados. As narrativas de atletas e ex-atletas, com base nestes autores, ao viverem e contarem suas experiências com o esporte de rendimento, elas refletiram sobre si mesmas na condição de mulher associada ou não a outros marcadores sociais (cor da pele, socioeconômica e outros). Elas apontaram sentidos que foram significativos. Para Monteiro et. al. (2017, p.6), nesse movimento vão construindo suas identidades, avaliando posicionamentos, concepções, enfim, vão se constituindo enquanto sujeitos. 

Na pesquisa narrativa a experiência é o eixo central e basilar. É a narrativa que dá estrutura a experiência humana, afirma Telles (1999) apud Monteiro (2017). “O narrar torna-se condição essencial do ser humano, à medida que a organização do pensamento humano é narrativa, sendo a melhor forma de se pensar, construir juízos, explicitar e construir sentidos sobre as experiências vividas.” O uso de narrativa, no campo da pesquisa, possibilita ao pesquisador significar e ressignificar suas experiências, dada a relação de contar e recontar histórias ou parte delas, como trata Monteiro et. al. (2017, p. 6-7): 

“para os pesquisadores narrativos, o importante é a forma como as pessoas – os participantes da pesquisa e o próprio pesquisador – impingem um olhar atento para si próprios, para suas histórias pessoais e experiências, e junto com os participantes vão construindo sentidos sobre as experiências que estão vivenciando, mas não só isso, é necessário que reflitam sobre a forma como organizam, problematizam e interpretam tais experiências, de forma que ganhem significação para eles, pois, tornando-se significativas, tornam-se formativas” 

3.2 Fonte de produção de dados

Como fonte de produção de dados, a pesquisa utilizou duas entrevistas com narrativas de uma (01) ex-atleta e uma (01) atleta, ambas da natação, publicadas na plataforma digital da Rede Globo de Televisão, no portal Globo Esporte e Globo Play.

3.3 Grupo investigado

Constituído por duas mulheres, Etiene Medeiros e Joanna Maranhão (atleta e ex-atleta olímpicas, respectivamente), da mesma modalidade esportiva (natação), sendo uma narrativa apresentada no formato de texto digital e a outra no formato audiovisual, mas que possuem em comum narrativas que revelam situações de preconceito e desigualdade em razão dos marcadores sociais na vivência com o esporte de rendimento. 

A escolha do grupo foi delimitada após a análise de algumas entrevistas realizadas pelo programa e disponíveis ou acessíveis na internet, onde se identificou a participação das duas mulheres com narrativas marcantes e relevantes para a pesquisa.

3.4 Procedimento de coleta de dados

Inicialmente foi realizado um levantamento na internet sobre entrevistas concedidas por atleta e ex-atleta que abordassem suas vivências com o esporte de rendimento, bem como, temas como gênero e o corpo negro no esporte, através de termos de busca como: entrevistas com atletas, mulheres no esporte, esporte e o corpo negro, gênero feminino no esporte de rendimento, dentre outros.

Nessa exploração na internet, identificou-se o Globo Esporte – programa, da Rede Globo de Televisão, que possui em sua essência falar sobre o esporte como um todo, incluindo entrevistas com personalidades do mundo esportivo, a exemplo das duas escolhidas.

Em seguida, foi elaborada uma ficha de apreciação das narrativas. Na primeira parte (de identificação), apresente dados técnicos, como fonte, data, contexto/momento da entrevista, tempo, etc. Na segunda parte, consta a transcrição na íntegra de toda a entrevista do formato audiovisual, revelando a temporalidade das falas do entrevistado (Joanna Maranhão). Já na última transcrição não houve demarcação de tempo das falas, pois trata-se de uma entrevista escrita digitalmente (Etiene Medeiros). Em ambas foram destacados, em negrito, trechos das narrativas diretamente relacionados ao objeto de estudo e objetivos desta pesquisa. 

As categorias de análise foram produzidas, considerando os dois marcadores sociais centrais investigados pelo estudo: gênero e corpo negro narrados pelas participantes. O esforço de tal empreendimento pressupõe uma experiência relacional diferenciada na composição das narrativas, criando e recriando suas histórias, expectativas e significados que cada participante vai produzindo nas vivências, ampliando, por consequência, as possibilidades na investigação.

As narrativas estão disponíveis e foram publicadas pela Rede Globo de Televisão, sendo que uma delas no portal do GE (Globo Esporte) e a outra na Globo Play. No GE, com o título da entrevista ‘Tinha que ser preto’ foi concedida por Etiene Medeiros e apresentada no portal no formato de texto digital. A entrevista intitulada ‘Em entrevista emocionante Joanna Maranhão reconta história’, encontra-se disponível no Globo Play, no formato audiovisual, com 18’58’’ de duração. Ambas foram acessadas em 08 de maio de 2021.

3.5 Procedimento de análise e tratamento dos Dados

1º As narrativas foram lidas sem interrupção, de maneira contínua, atentando-se para os registros potenciais das narrativas de cada atleta e ex-atleta na relação com os eixos centrais da pesquisa, portanto, foram definidas as narrativas que trataram especificamente a historicidade de mulheres atletas na natação, experiências relacionadas aos treinos e competições, dentro da piscina e dos clubes;

2º Após as narrativas da leitura, iniciou-se o processo de transcrição na íntegra, especificamente, no caso da narrativa apresentada no formato audiovisual. Em ambas narrativas, buscou-se destacar o esporte de rendimento e as relações entre corpo, gênero e negro. Nesse momento, foram se delineando as primeiras categorias de análise, onde foram registrados o tempo de início e término de cada narrativa relacionada, isso no caso da audiovisual. 

3º A partir das categorias de análise, buscou-se compreender e interpretar a experiência das atletas e ex-atletas num exercício simultâneo de diálogo com elas e de indagação, denominada de colaborativa por Gadamer (1997) apud Monteiro (2017), que possibilita outras ressignificações sobre o objeto investigado.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A pesquisa, propondo-se a investigar as narrativas de atletas, em esportes de rendimento, para refletir sobre marcadores sociais e construção identitária, elegeu duas mulheres da natação: Etiene Medeiros e Joanna Maranhão.

Joanna de Albuquerque Maranhão Bezerra de Melo, ou simplesmente Joanna Maranhão, como é conhecida, teve sua carreira iniciada na natação, aos 3 anos de idade, no Clube Português, localizado na cidade de Recife – PE. Durante a sua carreira como atleta de rendimento, Joanna passou por outros clubes (Sport, CPR, Náutico e Pinheiros), participou de diversos Pan Americanos, onde foi medalhista e também de competições olímpicas, onde garantiu quinto lugar nos 400 metros medley, a melhor colocação obtida até hoje por uma nadadora brasileira. Joanna se aposentou das piscinas aos 31 anos de idade e hoje dedica-se a um projeto social “Emancipa Esporte” e à ONG “Infância livre”, ambos fundados por ela. 

Etiene Pires de Medeiros, nordestina, nascida em 24 de maio de 1991 na cidade do Recife – PE. Começou na natação por orientação médica quando foi diagnosticada com asma. Passou pelo clube do Sport Recife, onde se destacou na primeira prova individual no nado de costas. Ao decidir seguir carreira dentro do esporte de rendimento, mudou-se para Sesi/Nikita em busca de um melhor desenvolvimento técnico e profissional. A atleta já participou de diversas competições defendendo o Brasil, a exemplo de Mundiais de Pan-Pacífico e Olimpíadas. Carrega o título de melhor nadadora do estilo Costas no país e um dos nomes para as Olimpíadas de Tóquio, em 2021.

4.1 O desvelar dos marcadores sociais no início da experiência

Quadro 1 – As Primeiras Braçadas 

NarrativasEtiene MedeirosJoanna Maranhão
O início com a nataçãoEu comecei a praticar esporte quando era adolescente. […]por indicação médica, por ser asmática, mas muito por minha mãe ter trabalhado e ter me dado privilégios. Minha primeira lembrança de piscina é de um festival que teve lá no Clube Português, que tinha que atravessar a piscina de 25 metros para passar de nível. Aí, eu bati o pé e falei que não ia, a professora falava “vai, pula”, e eu “não, eu não vou”. Tipo, não que eu não quisesse ir, mas não fazia sentido pra mim cumprir a ordem dela, até que a minha prima chegou e falou: “Ju, se você for, vai ganhar um pacote de bala”. Aí eu fui [risos da entrevistada].
As primeiras marcas tatuadas nos Corpos de menina/adolescente[…] nas aulinhas de natação no Recife, tinha duas amigas negras dentro de um universo de 90 atletas. Ao todo, éramos eu, meu irmão [Jamison], o Eric, a Érica, a Louise e o Marquinhos. Eram esses, não passavam de seis negros, e todos irmãos, dentro de um grupo de 90 atletas. Não havia representatividade, e não digo nem só dentro da água. Mas, também, fora dela. Eu não vi um técnico negro, não via um auxiliar negro. Os negros que a gente via eram o piscineiro, que cuidava da piscina, ou a moça terceirizada que limpava o banheiro.[…]aos nove anos, eu não sabia o que era, eu sabia que doía, mas não sabia o que era [referindo-se ao ato do seu técnico em colocar as mãos por dentro de seu maiô] […].A minha mãe diz, eu não me lembro, que eu tentei contar para ela algo como: “mãe, ele tentou me dar um beijo” e ela “não filha, você confundiu, ele jamais faria isso.” E depois dessa minha tentativa eu me lembro de ter perguntado algumas meninas por alto “ele já foi com você no banheiro?”, “Ele já deixou você sozinha?”, e o povo tipo, “não Joanna, é claro que não”. É melhor calar, sabe? Eu percebi que era vergonhoso demais para mim, era muito delicado, e, acima de qualquer coisa, tinha aquela pessoa que era acima de qualquer suspeita. 

No quadro 1, observa-se que as atletas iniciaram a natação em tempos distintos, Etiene já adolescente por motivações médicas e da mãe, e Joanna ainda na primeira infância. As narrativas de Etiene Medeiros possuem a centralidade de vivências de uma atleta negra e o racismo. Já as de Joanna Maranhão versam sobre sua trajetória na natação e a violência sexual dentro do esporte. 

Destaca-se então, que tais narrativas apresentadas neste quadro, revelam pontos distintos na trajetória destas mulheres, na época uma menina e uma adolescente. No caso de Etiene Medeiros, os trechos narrados refletem a falta de representativa negra dentro das piscinas, numa desproporcionalidade entre negros e brancos no início de sua carreira de atleta. Como também destaca os cargos ocupados por pessoas de cor preta, dentro dos clubes: piscineiros e de serviços gerais. Estando eles ausentes de cargos como técnicos, gestores de clubes, etc. 

Logo no início da edição apresentada pelo GE, Etiene Medeiros ressalta que sua vida foi rodeada por negros, no bairro em que morava Lagoa do Araçá/Recife/PE, até deparar-se com outra realidade usando a expressão estourar da bolha:

Meus pais foram criados lá, um reduto de muitas famílias negras. Eu cresci ali, em um bairro com representatividade negra. Se eu fosse até uma padaria, encontrava negros. Na escolinha em que estudei quando era bem nova, que ficava dentro do bairro, havia muitos negros. Quando comecei a sair daquela minha “bolha” de Lagoa do Araçá para frequentar uma escola de inglês, ou então para frequentar um colégio particular que era mais para o centro, passei a sentir a diferença de presença. Eu já não via tantos negros. Os negros são periféricos. É difícil você ver um negro tipo o (ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama), tá ligado? Era raro ver um professor negro. 

A narrativa de Etiene é enfatizada pelo estudo, pois os corpos atletas que nadam nas piscinas de clubes trazem ainda outro marcador social que se associa, ainda no Brasil, à cor da pele, que é o socioeconômico, considerando as oportunidades de crianças brasileiras ao acesso às piscinas. Este sentido “cercado” por preconceitos está associado ainda a estereótipos defendido desde os tempos coloniais, no qual o corpo negro é colocado como inferior, inclusive, economicamente. 

A natação ainda é uma prática corporal que acaba segregando corpos por falta de políticas econômicas e sociais que equalizem as distorções, bem como, políticas de educação, esporte e lazer que amplificam as oportunidades, dentre outras. Trata-se de um grupo socioeconômico privilegiado que tem acesso aos clubes pagos, possui piscina em casa ou em condomínios residenciais ou frequentam escolinhas de natação na educação básica. Etiene Medeiros mostra isso em sua narrativa destacando a cor da pele, os traços físicos e o fator socioeconômico como marcas tatuadas, inclusive pela vivência da natação. 

Eu moro em um condomínio de padrão médio, podemos dizer assim, em São Bernardo do Campo. Até agora, de 200 e poucas casas, só vi dois negros. Estou em um nível social em que não encontro meus pares. Parece que, quanto mais se sobe no nível econômico, mais nítido fica. Quando vou ao aeroporto e entro numa sala vip, não me sinto representada. Não encontro negros. Quanto mais você evolui em nível social e econômico, mais o racismo é visível. E como que a gente muda isso? Hoje, eu não sei. Talvez com um acesso maior, para discutir maneiras de ampliar essa inclusão. Nós temos muitos atletas negros bons no Brasil. Falta acesso. Falta inclusão. (Etiene Medeiros)

O estudo aponta que o clube, a escola foram instituições que classificaram o corpo da atleta Etiene, não de forma intencional, mas como reflexo da estrutura racista da qual a nossa sociedade faz parte, tendo influenciado diretamente no processo de construção identitária, enfatizado por estes marcadores sociais desdobrando-se na ausência de representatividade no esporte e na escola, de forma a demarcar socialmente diferenças. Encontrar um lugar na natação, esporte esse, ainda socialmente elitista.

Na narrativa de Joanna Maranhão, a vivência da natação trouxe marcas ao corpo de menina impactantes ao revelar que aos 9 anos de idade iniciou a série de violência sexual cometida pelo seu técnico. Podemos entender ao decorrer da narrativa que esse abuso sexual sofrido pela ex-atleta irá refletir por toda a sua vida. Para Sharma e Gupta (2004) uma criança que tenha passado por episódio de abuso sexual, será traumatizada por toda a vida, mas a ajuda especializada somente será procurada nos casos em que, futuramente, os traumas emocionais e psicológicos venham a se agravar. 

No caso de Joanna, a piscina do clube que treinava, a partir de então, passou a ser o espaço de controle e de silenciamento do corpo. A relação de poder entre técnico e uma criança atleta influenciou na negação do sujeito, de sua identidade, na adolescência de Joanna Maranhão. 

Logo quando começou a puberdade eu não queria ser reconhecida como menina, tipo, eu tinha muita agonia com os meus seios, porque ele tinha manipulado muito, então eu tinha agonia, comecei a ficar muito curvada numa posição e o único tecido que eu admitia que tocasse era o maiô, porque era necessário para nadar. Então, tudo era muito folgado, não querer ser reconhecida como menina me fez buscar uma imagem mais masculina possível, roupa folgada, tirei brinco, cortei o cabelo curto. E eu me lembro muito nitidamente assim, uma vez eu estava indo para Itamaracá, minha mãe parou para fazer compras e eu estava esperando e eu lembro de um homem falar assim “aquilo ali é uma menina ou um menino?

Partindo dessa fala é possível refletir sobre como o gênero feminino está associado a características impostas socialmente a demarcadores de feminilidade, a exemplo do cabelo longo, roupas justas mostrando as curvas do corpo e acessórios. Esse mesmo corpo que deve “exalar” feminilidade   acaba por ser hipersexualizado muitas vezes desde a infância, como aconteceu com a própria Joanna, que chegou a questionar se o abuso sofrido teria sido por sua culpa, se o maiô utilizado estava ou não muito cavado para ter despertado o desejo do seu técnico. A tentativa de distanciar-se dessas características durante a puberdade pode ter sido a forma encontrada para se defender desse olhar sexual sobre o seu corpo. 

Sendo assim, precisamos levar em consideração que as identidades aqui tratadas foram construídas, passam por um processo de disputa que estabelece classificações, ordem e uma hierarquia relacionada à diferença influenciada pelo do meio e pelo outro. 

Ambas as entrevistadas apresentam singularidades que vão além do fato de habitar um corpo feminino e terem vivenciado a prática da natação como modalidade de alto rendimento. Nascidas na região Nordeste, mais precisamente no estado de Pernambuco e na Capital (Recife), as duas passaram por diversos clubes para chegar ao esporte de rendimento.

4.2 Atleta mulher: a exigência do referencial masculino

Quadro 2 – A piscina como espaço hierárquico e de poder

Narrativas Etiene Medeiros Joanna Maranhão 
A exigência de resultados  O negro tem que mostrar, silenciosamente, que é bom. Sempre tem que provar, porque é visto com desconfiança. No meu caso, é comum ouvir “Nossa, mas você não é nadadora?”, “Você foi para os Jogos Olímpicos?”. Com surpresa. É mais ou menos assim, sabe?[…] pegar um jornal daqui e está lá assim: “Joanna fracassa de novo”, “Joanna não aguenta pressão”. E aquilo me dava muita raiva, porque eu queria falar para as pessoas, que era tudo menos fracasso, sabe?“Eu já tive patrocínio, já fiz dinheiro com a natação. Mas aquele caminho, aquela Joanna que tinha patrocínio e que fazia propaganda e que só falava de se sustentar aquilo, não era eu, aquilo era uma imagem que estava sendo vendida. Eu sou essa pessoa aqui, que tem empresa que pensa “pow, será que vale a pena investir nela? Ela fala de tudo” e eu digo “realmente, eu falo de tudo

Falando das experiências dessas mulheres com o esporte, mais diretamente com a natação, está também um esporte de predominância do sexo masculino e atletas brancos. Isso remete a ideia hierárquica e de poder que ainda na sociedade contemporânea vivencia quando se fala do “masculino x feminino.” A ideia de Hans (1984) ainda é atual, daí o estudo aproximar o pensamento do autor ao debate desta pesquisa, onde a sociedade ainda mostra que o homem é a norma, o padrão da sociedade. O cenário não é o mesmo de séculos passados, mas ainda no século XXI as mulheres vivem os resquícios de uma construção social normatizada pelo padrão homem branco. 

Trazendo Hans (1984) para este estudo, então, as narrativas mostram que ser mulher representou um desvio à norma, ou seja, estabeleceu o que é diferente, portanto, tem um valor secundário, subserviente ou inferior. Com essa fala, podemos justificar a dificuldade de destaque que esses atletas enfrentam. Apesar desse ponto em comum, em uma das falas de Etiene que como Joanna também já subiu no pódio em campeonatos mundiais de natação, comenta sobre a dificuldade que o corpo negro como um todo tem em conseguir um lugar de destaque. 

Se fizermos uma breve pesquisa no google sobre quem são as principais nadadoras brasileiras, entre as atletas listadas quase nunca o nome de Etiene Medeiros irá aparecer – diferente de Joanna Maranhão -, mesmo tendo contribuído bastante para essa modalidade nacionalmente.

Já para a ex-atleta Joanna Maranhão o destaque midiático aconteceu, mas não de todo positivo, sendo apontada na maioria das vezes como atleta que fracassou, sem levar em consideração os seus esforços e o momento psicologicamente difícil que a mesma estava passando: “[…] pegar um jornal daqui e está lá assim: “Joanna fracassa de novo”, “Joanna não aguenta pressão”. E aquilo me dava muita raiva, porque eu queria falar para as pessoas, que era tudo menos fracasso, sabe?”

Após conseguir verbalizar para a mídia a situação de abuso sexual que havia enfrentado, assim como se posicionar sobre diversas situações que aconteciam dentro da Federação – CBDA (Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos), a mesma ainda precisou lhe dar com certos questionamentos dos seus próprios patrocinadores da época, ou que ainda almejavam ser patrocinadores da sua carreira: 

Eu já tive patrocínio, já fiz dinheiro com a natação. Mas aquele caminho, aquela Joanna que tinha patrocínio e que fazia propaganda e que só falava de se sustentar aquilo, não era eu, aquilo era uma imagem que estava sendo vendida. Eu sou essa pessoa aqui, que tem empresa que pensa “pow, será que vale a pena investir nela? Ela fala de tudo” e eu digo “realmente, eu falo de tudo”. (Joanna Maranhão)

A partir da fala da própria Joanna, conseguimos refletir como o posicionamento feminino ainda é capaz de gerar incômodo, ser politizada, ativa socialmente e utilizar o seu lugar de fala dentro do esporte para trazer questões sociais como a ex-atleta fez, causa um espanto, pois o pensamento machista de que essa mulher deve calar e se submeter a diversas situações ainda está impregnado na nossa construção como indivíduos. 

4.3 Os simbolismos relacionados ao corpo e algumas de suas “marcas”

Quadro 3 – A influência das características fenotípicas 

Narrativas Etiene MedeirosJoanna Maranhão 
Características que incomodam Naquela época do ensino fundamental, o negócio era o meu cabelo. Por várias vezes eu escutava que tinha “cabelo pixaim”, “cabelo de bombril”, ou então ouvia uma ordem como “prende esse cabelo, menina” ou um insulto na linha do “teu cabelo é feio”. O primeiro choque racial, de preconceito, foi nessa questão da beleza. A mensagem que eu percebia era que a minha beleza era uma beleza feia. Uma beleza inferior.
Sempre ouvia as pessoas dizerem que os traços negros são mais grossos. Que negro tem nariz grande e boca grande, enquanto a sociedade tinha como padrão de beleza uma boca mais sutil. Isso é muito sem noção, isso é ridículo, não é aceitável. A questão do racismo mesmo ficou bem encravada de que o negro não era bonito, a menina preta não era bonita. Bonito era quem tinha olhos claros e cabelo liso.
[…]Então tudo era muito folgado, não querer ser reconhecida como menina me fez buscar uma imagem mais masculina  possível, roupa folgada, tirei brinco, cortei o cabelo curto. E eu me lembro muito nitidamente, assim, uma vez eu estava indo para Itamaracá, minha mãe parou para fazer compras e eu estava esperando e eu lembro de um homem falar assim “aquilo ali é uma menina ou um menino?

Fazendo um “link” entre o comportamento desse corpo que é marcado pelo feminino e sendo a natação um esporte que exige do corpo uma certa força física, muitos são os questionamentos acerca da feminilidade dessas atletas. Os ombros largos, braços fortes e corpo musculoso como consequência da prática e do esporte de rendimento, chega a incomodar aqueles que pregam que o corpo feminino é visto como fraco e delicado. 

Para Siqueira e Faria (2007), o corpo é fruto tanto da natureza quanto da construção cultural. Se por um lado é a referência para estados individuais de sentimentos, por outro, normas sociais e exigências culturais regulam os limites individuais e a qualidade de suas experiências (Wagner, 1998). 

Com essas citações é possível entender que esse corpo vai além das exigências culturais da sociedade que estamos inseridos, ele também conta sobre as nossas experiências, como é o caso não só das duas atletas citadas, mas também de uma porção de outras mulheres que escolhem o esporte de rendimento. 

Em sua narrativa Joanna conta sobre o momento que optou por não carregar os traços femininos após um episódio de abuso sexual que sofreu na infância e que gerou consequências e traumas ao decorrer da sua vida. Ela afirma: 

“[…] Então tudo era muito folgado, não querer ser reconhecida como menina me fez buscar uma imagem mais masculina  possível, roupa folgada, tirei brinco, cortei o cabelo curto. E eu me lembro muito nitidamente, assim, uma vez eu estava indo para Itamaracá, minha mãe parou para fazer compras e eu estava esperando e eu lembro de um homem falar assim “aquilo ali é uma menina ou um menino?”” (Joanna Maranhão)

Diante desse trecho nos cabe destacar  que romper com as características e simbolismos atrelados ao corpo feminino foi uma das reações que a ex-atleta teve ao lhe dar com o abuso sexual, que também é colocado pela mesma como uma experiência que não se supera “tem sempre que ter um cuidado e um carinho com aquela cicatriz, uma proteção. Acho que isso é viver as vezes de um abuso.”

Ainda sobre esses os simbolismos que o corpo marcado pelo gênero feminino carrega precisamos fazer aqui apontamentos também para as divergências sobre os mesmos a partir das histórias narradas pelas duas atletas. 

Etiene, além do marcador social do gênero feminino, carrega consigo o corpo negro. Este, por sua vez, é colocado na narrativa da atleta olímpica como alvo de muitos preconceitos a partir de um olhar da sociedade para ela.  

Naquela época do ensino fundamental, o negócio era o meu cabelo. Por várias vezes eu escutava que tinha “cabelo pixaim”, “cabelo de bombril”, ou então ouvia uma ordem como “prende esse cabelo, menina” ou um insulto na linha do “teu cabelo é feio”. O primeiro choque racial, de preconceito, foi nessa questão da beleza. A mensagem que eu percebia era que a minha beleza era uma beleza feia. Uma beleza inferior. (Etiene Medeiros)

Passagens como essa acontecem de forma corriqueira principalmente na infância, que é o período de maior vulnerabilidade, onde esses corpos começam a conviver com os diferentes, além de serem bombardeados por uma série de conteúdos midiáticos que reafirmam a falsa ideia de inferioridade. 

Segundo Gomes (2006, p. 20), “cabelo crespo e corpo podem ser considerados expressões e suportes simbólicos da identidade negra no Brasil.” É inegável que o cabelo é um dos maiores símbolos que o corpo negro carrega, junto com ele existem muitos significados, pois ao mesmo tempo que é alvo de um racismo velado ou escancarado, o cabelo do negro carrega a ancestralidade desse corpo, foi símbolo de movimentos cultural de identidade negra como o “Movimento Black Power”7 e se comporta como uma característica de resistência e afirmação da beleza negra.

Um outro ponto do racismo trazido por Etiene é a ideia do que é ou não bonito para a sociedade: 

“Sempre ouvia as pessoas dizerem que os traços negros são mais grossos. Que negro tem nariz grande e boca grande, enquanto a sociedade tinha como padrão de beleza uma boca mais sutil. Isso é muito sem noção, isso é ridículo, não é aceitável. A questão do racismo mesmo ficou bem encravada de que o negro não era bonito, a menina preta não era bonita. Bonito era quem tinha olhos claros e cabelo liso.” (Etiene Medeiros)

Em uma sociedade completamente miscigenada como a do Brasil onde mais da metade desta é negra, estar preso a um padrão de beleza europeu como resquício de um processo de colonização é inadmissível. Sem falar que essa miscigenação está atrelada para além de questões étnicas, envolvendo também questões políticas, sociais, culturais e econômicas que são responsáveis por produzir as classificações sociais, onde o corpo negro é ainda colocado como minoria e menos capaz. 

5. CONCLUSÃO

Considerando as questões tratadas no início deste trabalho, nesse momento de apontamentos finais pode-se considerar que o esporte de rendimento permite que os corpos marcados pelo gênero feminino e/ou ainda pela etnia vivenciem questões que estão além da prática da modalidade escolhida. Joanna Maranhão e Etiene Medeiros nos comprovam isso através de suas narrativas que estão carregadas de reflexões acerca de questões sociais. 

O clube, assim como a escola nos permite conviver com pessoas culturalmente distintas e ao termo cultura estamos nos referindo às experiências diferentes que esse sujeito teve ao longo de sua vida, influenciando diretamente pelo meio. Portanto, é necessário que as práticas presentes nesses ambientes sejam rapidamente repensadas, pois por meio das narrativas podemos entender que na relação dos corpos marcados com os ambientes citados, a opressão e o preconceito de fazem presentes e interferem na construção identitária e na visão que o indivíduo tem sobre o próprio corpo.

Também é perceptível que a luta dos corpos que carregam esses marcadores sociais acontece diariamente nos mais diversos espaços e a representatividade tem um papel indispensável nesse processo. Essa palavra por sua vez tem como significado aquele que representa politicamente os interesses de um grupo, de uma classe ou de uma nação. A mesma, só se torna concreta através da adesão e participação efetiva dos seus representados, que no caso das personalidades do esporte retratadas no trabalho, ainda são enquadrados como minorias sociais (mulheres e/ou negos(as)).

No que se refere às discussões sobre o gênero feminino tanto nos estudos da área como nas próprias entrevistas, percebemos que ainda há muito a se avançar, pois apesar desse corpo marcado ter ocupado espaços que antes eram improváveis, acaba por ainda ser objetificado e colocado como inferior.

Quanto ao corpo negro, podemos perceber que mesmo após anos de um processo de exploração desse povo a nossa sociedade ainda está replicando comportamentos preconceituosos de cunho racista, dificultando a ascensão de um corpo que não suporta mais precisar explicar suas crenças, suas características físicas e a sua beleza. 

A pesquisa aponta a urgência de um olhar crítico e reflexivo acerca dos corpos que carregam esses marcadores sociais, para que possamos possibilitar novos sentidos as histórias desses indivíduos, sejam eles atletas, estudantes, professores, enfim, que estes não sejam rotulados ou colocados na posição de submissos por simplesmente serem quem são. 

Para tanto optamos gerar essa aproximação por meio das personalidades do esporte utilizando-as como “vitrine” e levando em consideração a ideia de que o esporte é um fenômeno social e tem passe livre em diversas vidas – seja direta ou indiretamente -, o que torna possível não deixar a discussão apenas nesse âmbito. 

Para a pesquisadora o estudo também possibilitou refletir a temática a partir de um outro prisma, pois mesmo estando imersa nas categorias de corpo marcado que foram elencadas,- como mulher, preta e que também durante muito tempo experimentou o esporte de rendimento, inclusive na modalidade natação -, estar em outra condição permitiu um olhar mais atento para comportamentos que antes passariam despercebidos o que contribui diretamente para o papel de professora possibilitando fazer apontamentos a partir de agora também para escola,  que é uma das principais instituições formadoras  e a Educação Física escolar


2Para o autor a identidade no iluminismo é colocada como “velha identidade” que está pautada no conceito individualista. Ainda nas palavras do autor “[…] o sujeito do iluminismo, visto como tendo uma identidade fixa e estável, foi descentrado, resultando nas identidades abertas, contraditórias, inacabadas, fragmentadas, do sujeito pós-moderno” (Hall, 1987, p.46).
3O sujeito pós-moderno, forma o conceito de uma identidade que não é fixa ou permanente – nova identidade. A identidade torna-se uma “celebração móvel”, formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall, 1987)
4O Estado Novo (Governo de Getúlio Vargas) criou o Decreto Lei 3199 que criou o Conselho Nacional dos Desportos – vigorando até 1975 –, e que trazia, no seu artigo 54, existia a seguinte orientação de acordo com as recomendações da época: “Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza”. O Decreto estipula: “Não é permitida a prática feminina de lutas de qualquer natureza, futebol, futebol de salão, futebol de praia, pólo, halterofilismo e baseball”. (MOREL; SALLES, 2005). 
5A Lei Maria da Penha (Lei 11.3340/2006) compreende a violência sexual como: […] qualquer  conduta  que  a  constranja  a  presenciar,  a  manter  ou  a participar  de  relação  sexual  não  desejada,  mediante  intimidação, ameaça,  coação  ou  uso  da  força;  que  a  induza  a  comercializar  ou  a utilizar,  de  qualquer  modo,  a  sua  sexualidade,  que  a  impeça  de  usar qualquer  método  contraceptivo  ou  que  a  force  ao  matrimônio,  à gravidez,  ao  aborto  ou  à  prostituição,  mediante  coação,  chantagem, suborno  ou  manipulação;  ou  que  limite  ou  anule  o  exercício  de  seus direitos sexuais e reprodutivos. (s.p)
6Dados do IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística mostram que 54% da população brasileira é negra.
Foi um movimento que, nascido nos Estados Unidos nos anos 60, deu voz ao orgulho negro e possibilitou a criação novas instituições políticas e culturais.
7Foi um movimento que, nascido nos Estados Unidos nos anos 60, deu voz ao orgulho negro e possibilitou a criação novas instituições políticas e culturais.

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1Especialista em Educação Física Escolar pela UEPB, Bacharel em Educação Física (UNOPAR) – Contato: anacellyramos@gmail.com