NORMAS LEGAIS BRASILEIRAS NA EFICÁCIA DAS AUDITORIAS AMBIENTAIS: CONTRIBUIÇÕES E DESAFIOS

BRAZILIAN LEGAL STANDARDS IN THE EFFECTIVENESS OF ENVIRONMENTAL AUDITS: CONTRIBUTIONS AND CHALLENGES

REGISTRO DOI:10.69849/revistaft/th10248061525


Camila Santiago Martins Bernadini 1
Pedro Eugênio Oliveira Coêlho 2
José Lopes de Sousa Júnior 3
Camila Maria da Costa Gomes 4
Keila Rocha Ribeiro Costa 5
Kelvia Kelle Castro da Silva 6
Guilherme da Silva Santos 7
Juliana Gomes de Sousa 8
Franco Martins Frota 9
Raquel Jucá de Moraes Sales 10
Raphaelle Silva de Almeida 11
Anderson Ruan Gomes de Almeida 12


RESUMO

A Auditoria Ambiental é uma ferramenta estratégica na gestão ambiental contemporânea, proporcionando uma avaliação sistemática e independente das práticas ambientais de uma organização, com o objetivo de identificar áreas de risco, oportunidades de melhoria e garantir conformidade legal. Este artigo propõe analisar os dispositivos legais e normativos ligados a auditorias e seus impactos no segmento da auditoria ambiental. Evidenciou-se a importância da integração com sistemas de gestão ambiental e a utilização de ferramentas tecnológicas e reconheceu-se também os desafios enfrentados pelas empresas na implementação e manutenção de programas de auditoria ambiental. Explorou-se, por fim, as tendências emergentes na área de auditoria ambiental. Este artigo visou fornecer uma visão abrangente e atualizada sobre a auditoria ambiental, destacando sua importância como ferramenta de gestão essencial para organizações comprometidas com a sustentabilidade e a responsabilidade ambiental.

Palavras-chave: Direito, Dispositivos Legais,Auditoria Ambiental, Sustentabilidade.

SUMMARY

Environmental Auditing is a strategic tool in contemporary environmental management, providing a systematic and independent assessment of an organization’s environmental practices, with the aim of identifying areas of risk, opportunities for improvement and ensuring legal compliance. This article proposes to analyze the legal and normative provisions linked to audits and their impacts on the environmental audit segment. The importance of integration with environmental management systems and the use of technological tools was highlighted and the challenges faced by companies in implementing and maintaining environmental audit programs were also recognized. Finally, emerging trends in the area of ​​environmental auditing were explored. This article aimed to provide a comprehensive and up-to-date overview of environmental auditing, highlighting its importance as an essential management tool for organizations committed to sustainability and environmental responsibility.

Keywords: Law, Legal Devices, Environmental Audit, Sustainability.

INTRODUÇÃO

No Brasil, a legislação e diretrizes legais desempenham um papel fundamental tanto na facilitação, quanto na regulamentação dessas auditorias. Vamos explorar como essas normas contribuem ou interferem na realização de auditorias ambientais no ambiente corporativo. A Auditoria Ambiental é uma prática fundamental para organizações que buscam avaliar e melhorar seu desempenho ambiental.

Diante de crescentes preocupações globais com a sustentabilidade e a responsabilidade corporativa, a gestão ambiental tornou-se uma prioridade para empresas de todos os setores. Nesse contexto, a auditoria ambiental surge como uma ferramenta essencial para identificar áreas de risco, garantir conformidade legal, promover eficiência operacional e fortalecer a reputação das organizações.

A evolução da prática da auditoria ambiental pode ser compreendida à luz de uma série de fatores preponderantes no contexto socioeconômico e ambiental das últimas décadas. Entre esses fatores, destaca-se o crescente nível de conscientização pública sobre as questões ambientais e os impactos negativos das atividades humanas sobre os ecossistemas naturais. Este aumento na conscientização foi acompanhado por uma resposta legislativa por parte dos governos, resultando no desenvolvimento e implementação de legislações ambientais mais rigorosas e abrangentes.

Dessa forma, a evolução da prática da auditoria ambiental reflete não apenas a crescente preocupação com as questões ambientais, mas também a necessidade de as organizações se adaptarem a um ambiente regulatório em constante transformação e a uma sociedade cada vez mais exigente em relação à sustentabilidade e à responsabilidade corporativa. Nesse sentido, a auditoria ambiental se consolidou como uma ferramenta indispensável para a gestão ambiental eficaz, contribuindo para a promoção de práticas mais sustentáveis e para a mitigação dos impactos negativos das atividades humanas sobre o meio ambiente.

Este artigo tem como objetivo analisar os dispositivos legais e normativos ligados à auditorias e seus impactos no segmento da auditoria ambiental. Ao compreender melhor o papel e a importância da legislação e normas brasileiras na auditoria ambiental, pode-se auxiliar organizações na implementação de práticas mais sustentáveis e responsáveis.

Esta pesquisa é de natureza quanti-qualitativa, com abordagem de cunho exploratório. Foi realizado levantamento bibliográfico e documental, no período de julho de 2023 a abril de 2024, buscando trazer sustentação teórica à compreensão da sustentabilidade, métricas socioambientais, auditoria e sustentabilidade.

DESENVOLVIMENTO

A Auditoria Ambiental, enquanto processo essencial na gestão contemporânea das organizações, tem sido objeto de crescente interesse e desenvolvimento ao longo das últimas décadas. Em sua essência, este processo consiste em uma avaliação meticulosa e documentada das práticas ambientais de uma entidade, com a finalidade de verificar sua conformidade com as normas regulatórias vigentes, bem como com suas próprias políticas internas e padrões de desempenho ambiental estabelecidos. Esta avaliação abrange uma ampla gama de elementos, incluindo atividades operacionais, processos produtivos, produtos e serviços oferecidos pela organização.

A auditoria ambiental é uma ferramenta fundamental para empresas que buscam avaliar e melhorar seu desempenho ambiental. Tanto a auditoria interna quanto a externa desempenham papéis distintos, mas complementares, na gestão ambiental de uma organização.

É importante destacar que a década de 1970 marcou um ponto de inflexão significativo no desenvolvimento da auditoria ambiental, com o surgimento do movimento ambientalista global e a promulgação de leis ambientais pioneiras em diversos países. Estas legislações estabeleceram uma base legal sólida para a condução de auditorias ambientais, estipulando padrões mínimos de desempenho ambiental e requisitos de conformidade que as organizações deveriam atender. Neste contexto, a auditoria ambiental emergiu como uma ferramenta de gestão essencial para empresas que buscavam se adequar às novas exigências legais e se posicionar como agentes responsáveis perante a sociedade e o meio ambiente (LEE, 2018).

A auditoria ambiental interna é conduzida por funcionários da própria organização e visa avaliar a conformidade com políticas, procedimentos e regulamentações ambientais internas e externas. Kim e Perera (2017) destaca a importância da auditoria interna na identificação de práticas ambientais inadequadas e na implementação de medidas corretivas. Além disso, a auditoria interna pode ajudar a promover uma cultura de sustentabilidade (KRÜGER & HEITMANN, 2020) dentro da organização, conforme discutido por Stubbs e Higgins (2019).

A auditoria ambiental externa é realizada por auditores independentes, muitas vezes contratados pela empresa para fornecer uma avaliação imparcial de seu desempenho ambiental. Estudos como o de Darnall e Edwards (2006) destacam a credibilidade e a transparência proporcionadas pela auditoria externa, que pode ser decisiva para construir a confiança das partes interessadas, incluindo investidores, clientes e comunidades locais.

Em meio às diferenças entre auditoria interna e externa, há oportunidades para integração e complementaridade entre os dois processos. Pesquisas como a de Hassas Yeganeh e Jusoh (2016) enfatizam a importância de uma abordagem integrada para a auditoria ambiental, que combine elementos de ambos os tipos de auditoria para fornecer uma visão abrangente do desempenho ambiental de uma organização.

Ambos os tipos de auditoria ambiental enfrentam desafios significativos, como a complexidade de avaliar o impacto ambiental das cadeias de suprimentos globais e a falta de métricas padronizadas para avaliar o desempenho ambiental (ADAMS, MUIR e HOQUE, 2016). No entanto, esses desafios também representam oportunidades para inovação e melhoria contínua na prática da auditoria ambiental, conforme discutido por Oliveira et al. (2020).

A auditoria ambiental interna e externa desempenha papéis complementares na gestão ambiental de uma organização. Enquanto a auditoria interna oferece uma visão detalhada das práticas e processos internos, a auditoria externa fornece credibilidade e transparência para partes interessadas externas. Uma abordagem integrada e colaborativa para a auditoria ambiental pode maximizar os benefícios e minimizar os desafios associados à avaliação do desempenho ambiental de uma organização.

Existem várias metodologias e abordagens para a realização de auditorias ambientais, cada uma com suas características e aplicações específicas. Entre as mais comuns, destaca-se aqui as Auditorias de Conformidade Legal, Auditorias de Desempenho Ambiental, Auditorias de Sistemas de Gestão Ambiental (SGA), Auditorias de Due Diligence Ambiental e Auditorias para ESG (Ambiental, Social e Governança). Abaixo, ressalta-se a qual aplicação se refere cada uma das auditorias citadas:

  1. Auditorias de Conformidade Legal: Concentram-se na verificação do cumprimento das leis, regulamentos e normas ambientais aplicáveis a uma organização.
  2. Auditorias de Desempenho Ambiental: Avaliam o impacto ambiental das operações de uma empresa, analisando seus processos, práticas e resultados em termos de consumo de recursos naturais, emissões, resíduos e poluição.
  3. Auditorias de Sistemas de Gestão Ambiental (SGA): Avaliam a eficácia e adequação dos sistemas de gestão ambiental implementados por uma organização, como o ISO 14001, identificando áreas de melhoria e oportunidades de conformidade.
  4. Auditorias de Due Diligence Ambiental: Realizadas durante processos de fusões, aquisições ou financiamentos para avaliar os riscos ambientais associados a uma transação e garantir a conformidade com requisitos legais e regulatórios.
  5. Auditorias para ESG (Ambiental, Social e Governança): Representa uma abordagem integral na avaliação do desempenho das empresas em relação a questões ambientais, sociais e de governança. Essa prática, cada vez mais adotada por organizações em todo o mundo, visa não apenas a maximização do lucro, mas também a criação de valor sustentável a longo prazo, levando em consideração não apenas o impacto financeiro, mas também o impacto nas comunidades, no meio ambiente e na sociedade como um todo.

A metodologia utilizada para realização da auditoria ambiental num dado ambiente corporativo pode variar de acordo com as características específicas de cada empresa e setor, mas geralmente envolve a coleta de dados, análise de informações, coleta de informações, expectativas e perspectivas das partes interessadas e avaliação do desempenho em relação a padrões reconhecidos e melhores práticas do mercado.

Nesse contexto, é dever da equipe de auditoria ambiental e do cliente corporativo estarem atentos à existência de diversos dispositivos legais na estrutura jurídica e normativa brasileira que amparam as práticas de auditoria empresarial, sejam quais forem seus fins. Essa observância é fundamental para evitar desconformidades legais e possíveis punições e repercussões negativas ao negócio a ser auditado.

A fim de desenvolver um levantamento sistemático e análise do amparo legal brasileiro frente aos processos de auditoria ambiental empresarial, serão abordados a seguir:

  • Lei nº 6.404/1976
  • Lei nº 10.593/2002
  • Norma 10180/2001
  • Lei nº 11.638/2007
  • ISO 19011
  • Lei nº 8.218/1991

A Lei nº 6.404/76, conhecida como Lei das Sociedades por Ações, é uma das principais legislações que regulamentam o funcionamento das empresas no Brasil. Promulgada em 15 de dezembro de 1976, esta lei estabelece diretrizes essenciais para a constituição, organização e operação das sociedades por ações, incluindo normas sobre auditoria externa. Esta lei é composta por diversas disposições que abordam aspectos variados da governança corporativa, incluindo:

Constituição e Capital das Sociedades: Define os requisitos para a formação de sociedades por ações, incluindo regras sobre capital social, tipos de ações e direitos dos acionistas.

Administração e Fiscalização: Estabelece normas sobre a administração das sociedades, incluindo a composição e as responsabilidades dos conselhos de administração e fiscal.

Demonstrações Financeiras: Determina a obrigatoriedade da preparação e divulgação de demonstrações financeiras anuais, seguindo princípios contábeis estabelecidos.

Auditoria Externa: Impõe a necessidade de auditoria externa para empresas de grande porte, garantindo a transparência e a confiabilidade das informações financeiras.

A obrigatoriedade de auditoria externa estabelecida pela Lei 6.404/76 é um dos seus aspectos mais relevantes. As principais implicações desta exigência são: transparência e confiabilidade, conformidade e rigor, e acesso ao mercado de capitais.

Com a crescente importância dos critérios ESG, a Lei 6.404/76, embora originalmente focada em aspectos financeiros, também influencia indiretamente as práticas de auditoria relacionadas ao ESG, uma vez que a exigência de auditoria externa motiva as empresas a incluírem informações ESG em seus relatórios financeiros, a presença de auditorias externas incentiva as empresas a adotarem práticas ESG mais rigorosas e confiáveis, sabendo que essas práticas serão examinadas por auditores independentes, e à medida que a demanda por informações ESG cresce, as empresas são incentivadas a integrar esses critérios em suas demonstrações financeiras, criando uma visão mais holística do desempenho corporativo.

Nesse contexto, mais recentemente, a Lei 10.593/2002, também conhecida como “Lei do Auditor Independente”, surgiu para estabelecer normas e requisitos para a atuação dos auditores independentes no país. Promulgada em 6 de dezembro de 2002, foi criada com o objetivo de fortalecer a transparência e a credibilidade das informações financeiras das empresas por meio da auditoria externa.

A Lei do Auditor Independente define o papel do auditor independente e estabelece os requisitos necessários para que um profissional ou uma firma de auditoria possa atuar como auditor independente. Isso inclui critérios de qualificação técnica, independência em relação à empresa auditada e conformidade com normas éticas e de conduta profissional. Ela determina que os auditores independentes devem seguir normas específicas de auditoria reconhecidas nacional ou internacionalmente. Essas normas visam assegurar que a auditoria seja realizada de maneira objetiva, competente e consistente, garantindo a qualidade e a confiabilidade das informações auditadas.

Ao exigir a auditoria independente, a lei 10.593/2002 contribui para fortalecer a governança corporativa das empresas, promovendo a transparência na divulgação de informações financeiras e protegendo os interesses dos investidores e demais stakeholders. Ela obteve um impacto significativo no ambiente regulatório e empresarial brasileiro, proporcionando maior confiança e segurança aos mercados financeiros. Ao estabelecer diretrizes claras para a atuação dos auditores independentes, a lei ajudou a elevar os padrões de auditoria no país, alinhando-os com práticas internacionais de transparência e governança.

Neste mesmo período, em 2001, a Norma 10180/2001 surge como uma regulamentação brasileira que estabelece diretrizes específicas para a auditoria independente no país. Ela foi criada com o objetivo de padronizar os procedimentos e as práticas adotadas pelos auditores independentes durante suas atividades de verificação das demonstrações financeiras das empresas.

Esta norma define claramente os objetivos da auditoria independente, que incluem a emissão de uma opinião sobre se as demonstrações financeiras estão livres de distorções relevantes e são apresentadas de acordo com as normas contábeis aplicáveis. Ela se aplica a todas as entidades sujeitas à auditoria externa no Brasil, independentemente do porte ou do setor de atuação.

Nela, as responsabilidades do auditor independente devem ser conduzidas com independência, objetividade e integridade. O auditor é responsável por planejar e executar a auditoria de acordo com normas técnicas reconhecidas, garantindo a adequada aplicação dos procedimentos de auditoria para obter evidências suficientes e apropriadas.

A Norma 10180/2001 se mostra como âncora na garantia da qualidade e da confiabilidade das informações financeiras divulgadas pelas empresas brasileiras. Ao estabelecer diretrizes rigorosas para a auditoria independente, ela promove a transparência, protege os interesses dos investidores e fortalece a governança corporativa.

Já a Lei nº 11.638/2007 se refere à modernização das práticas contábeis no Brasil e representa um marco significativo na contabilidade brasileira, ao modernizar e alinhar as práticas contábeis do país com os padrões internacionais. Promulgada em 28 de dezembro de 2007, esta lei trouxe mudanças substanciais na Lei das Sociedades por Ações (Lei 6.404/76), com o objetivo de aumentar a transparência e a comparabilidade das demonstrações financeiras das empresas.

Conforme Iudícibus, Martins e Gelbcke (2008, p. 32), essas mudanças também fazem parte do processo de convergência através da “[…] adoção da filosofia de que as normas contábeis devem ser centradas muito mais nos princípios e nos objetivos do que se pretende obter como informação, do que em um enorme conjunto de regras a serem observadas”.  Estará sendo aplicado o julgamento do profissional, o que se chama de Subjetivismo Responsável.

A lei de modernização das práticas contábeis introduziu novas perspectivas na contabilidade e na governança corporativa no Brasil, incluindo:

Adoção de Normas Internacionais de Contabilidade: A lei promoveu a convergência das normas contábeis brasileiras com as Normas Internacionais de Relatório Financeiro (IFRS). Isso facilitou a harmonização das práticas contábeis e aumentou a comparabilidade das demonstrações financeiras das empresas brasileiras com aquelas de outros países.

Demonstrações de Resultado Abrangente: A lei introduziu a obrigatoriedade da elaboração da Demonstração do Resultado Abrangente, que inclui todas as variações no patrimônio líquido que não estão relacionadas a transações com os sócios, como ajustes de avaliação patrimonial e ganhos e perdas atuariais.

Ativos Intangíveis e Avaliação a Valor Justo: A Lei nº 11.638/2007 trouxe maior ênfase na contabilização e divulgação de ativos intangíveis e a aplicação do valor justo para mensuração de certos ativos e passivos, aumentando a relevância e a fidedignidade das informações contábeis.

Demonstração dos Fluxos de Caixa: A lei tornou obrigatória a elaboração da Demonstração dos Fluxos de Caixa, proporcionando uma visão mais clara sobre a liquidez e a saúde financeira das empresas.

Embora a Lei nº 11.638/2007 tenha focado principalmente na modernização das práticas contábeis financeiras, suas disposições também facilitam a integração de critérios ESG nas auditorias empresariais: A adoção das Normas Internacionais de Relatório Financeiro (IFRS) no Brasil promove a harmonização das práticas de auditoria ambiental com padrões globais, cujo formato visa satisfazer as expectativas de investidores e stakeholders internacionais preocupados com a sustentabilidade. A melhoria na qualidade das demonstrações financeiras, com maior divulgação de ativos intangíveis e passivos ambientais, não só aumenta a transparência, mas também reforça a confiabilidade das informações ESG. Além disso, as exigências crescentes por detalhamento e transparência nas demonstrações financeiras criam um ambiente favorável para auditorias ESG mais abrangentes, proporcionando uma avaliação mais profunda das práticas de sustentabilidade adotadas pelas empresas.

O dispositivo da ISO 19011 é uma norma internacional que estabelece diretrizes para a realização de auditorias de sistemas de gestão, independentemente do tipo de organização ou setor em que atuam. Publicada pela International Organization for Standardization (ISO), esta norma fornece orientações detalhadas sobre como planejar, conduzir, gerenciar e melhorar auditorias internas e externas de sistemas de gestão.

Seu escopo e aplicação se valem a todos os tipos de sistemas de gestão, incluindo qualidade, meio ambiente, saúde e segurança ocupacional, segurança da informação, entre outros. Ela define os princípios fundamentais e requisitos gerais para a auditoria, independentemente do tamanho, complexidade ou natureza da organização. A norma estabelece que o objetivo principal das auditorias é avaliar a conformidade e a eficácia do sistema de gestão, bem como identificar oportunidades de melhoria. Isso ajuda as organizações a assegurar que seus sistemas de gestão estejam funcionando conforme planejado e que continuem a atender aos requisitos e expectativas relevantes.

Em suas diretrizes, a ISO 19011 define uma série de princípios que devem guiar o processo de auditoria, incluindo: integridade, imparcialidade, competência profissional, confidencialidade, abordagem baseada em evidências e foco no risco. Esses princípios garantem que as auditorias sejam conduzidas de maneira ética, rigorosa e eficaz. Desse modo, ela norteia o planejamento da auditoria, incluindo a seleção de auditores, a definição do escopo e dos critérios de auditoria, a preparação do programa de auditoria e a execução das atividades de auditoria.

Por fim, a Lei nº 8.218/1991, promulgada em 29 de agosto de 1991, estabelece disposições sobre a fiscalização e o controle das atividades financeiras de empresas no Brasil. Esta lei é relevante para a governança corporativa e a transparência nas operações empresariais, pois determina a obrigatoriedade de auditoria independente para certas empresas devido ao seu porte e importância econômica.

Ela estabelece que empresas de grande porte ou com significativa importância econômica deve ser submetidas à auditoria independente. Isso inclui empresas com receitas, ativos ou número de empregados acima de determinados limites estipulados pela legislação. A obrigatoriedade de auditoria independente visa assegurar que as demonstrações financeiras dessas empresas sejam revisadas por auditores externos qualificados, aumentando a transparência e a confiabilidade das informações financeiras divulgadas.

A Lei nº 8.218/1991 especifica critérios para determinar quais empresas estão sujeitas à auditoria independente. Esses critérios geralmente incluem o valor do ativo total, a receita bruta anual e o número de empregados, embora possam variar com base em regulamentações complementares emitidas por órgãos governamentais ou reguladores. Nelas, auditores independentes são responsáveis por examinar as demonstrações financeiras das empresas obrigadas e emitir um parecer sobre a adequação e a veracidade dessas informações. Estabelece que os auditores sigam padrões técnicos e éticos rigorosos, garantindo que as auditorias sejam conduzidas de maneira imparcial e profissional.

Esta legislação também define os mecanismos de fiscalização e controle para assegurar o cumprimento das obrigações de auditoria. Isso inclui a possibilidade de penalidades para empresas que não atendam aos requisitos de auditoria independente.

   A obrigatoriedade de auditoria independente para grandes empresas é de grande valia para as auditorias ambientais corporativas, pois assegura que as empresas sejam avaliadas de maneira regular e rigorosa. Isso aumenta a transparência das informações financeiras e não financeiras divulgadas, promovendo a confiança dos investidores e outras partes interessadas.

Percebeu-se que os dispositivos legais e normativos observados apresentam diversas benesses para a alta qualificação e melhoria de desempenho corporativos. Por outro lado, tais dispositivos enfrentam desafios significativos, como a complexidade de avaliar o impacto ambiental das cadeias de suprimentos globais e a falta de métricas padronizadas para avaliar o desempenho ambiental (ADAMS, MUIR e HOQUE, 2016).

A análise sistemática da letra da lei dos dispositivos analisados permitiu identificar aspectos positivos e negativos em suas aplicações: aspectos positivos voltados para sua contribuição para o fortalecimento das auditorias ambientais corporativas, como tanto aspectos negativos ligados a limitações neles existentes a sua plena aplicabilidade e eficientização nos processos de auditoria empresarial.

O Quadro 1 abaixo sistematiza a relação entre cada dispositivo legal e normativo abordado e sua respectiva descrição breve, sua contribuição para as auditorias ambientais, bem como limitações identificadas.

Quadro 1: Sistematização das legislações brasileiras relacionadas às auditorias ambientais corporativas

Legislação/ NormaDescriçãoContribuição para Auditorias Ambientais CorporativasLimitações
Lei 6.404/76: Lei das Sociedades por AçõesEstabelece a obrigatoriedade da auditoria externa para empresas de grande porte, criando um ambiente de maior transparência e confiabilidade nas informações divulgadas.Facilita a inclusão de informações ESG nos relatórios anuais devido à exigência de transparência nas demonstrações financeiras.Foca principalmente em aspectos financeiros, limitando a abrangência das auditorias ESG.
Lei 11.638/2007: Altera e revoga dispositivos da Lei no 6.404/1976, e da Lei no 6.385/1976, e estende às sociedades de grande porte disposições relativas à elaboração e divulgação de demonstrações financeiras.Atualiza as práticas contábeis no Brasil, alinhando-as com os padrões internacionais e promovendo a transparência e comparabilidade das informações financeiras.Facilita a incorporação de critérios ESG nas auditorias, atendendo às exigências de investidores internacionais.Exige treinamento e atualização contínua dos auditores para se adaptarem às novas exigências ESG.
Lei 10.593/2002: Lei do Auditor IndependenteRegula a profissão de auditor no Brasil, enfatizando a qualificação e a ética dos profissionais.Assegura que os auditores envolvidos nas auditorias ESG sejam competentes e sigam altos padrões éticos, contribuindo para a credibilidade dos relatórios de sustentabilidade.Falta de regulamentações específicas sobre ESG, limitando a especialização dos auditores nesse campo.
Norma 10180/2001: Organiza e disciplina os Sistemas de Planejamento e de Orçamento Federal, de Administração Financeira Federal, de Contabilidade Federal e de Controle Interno do Poder Executivo Federal, e dá outras providências.Estabelece diretrizes para a auditoria independente, promovendo a objetividade e a integridade do processo de auditoria.Apoia as auditorias ESG ao assegurar que os relatórios sejam imparciais e baseados em evidências sólidas.Tradicionalmente focada em auditorias financeiras, exigindo adaptação das práticas para incluir critérios de sustentabilidade.    
ISO 19011: Diretrizes para Auditorias de Sistemas de GestãoOferece diretrizes abrangentes para a auditoria de sistemas de gestão, incluindo critérios ESG.Fornece um framework estruturado para auditorias ESG, promovendo uma abordagem sistemática e integrada.Nenhuma limitação significativa especificada.
Lei 8.218/1991: Dispõe sobre Impostos e Contribuições Federais, Disciplina a Utilização de Cruzados Novos, e dá outras Providências.Determina que certas empresas devem ser submetidas a auditoria independente devido ao seu tamanho e importância econômica.Assegura que grandes empresas, com impacto significativo na sociedade e no meio ambiente, sejam regularmente avaliadas em suas práticas de sustentabilidade.Concentra-se mais em obrigações financeiras, limitando a profundidade das auditorias ESG, exigindo ampliação do escopo para incluir critérios não financeiros.

Fonte: os autores, 2024.

A Lei nº 6.404/76 desempenha um papel estrutural na estruturação e operação das sociedades por ações no Brasil, promovendo a transparência e a confiabilidade das informações financeiras através da auditoria externa. No contexto das auditorias ESG, essa legislação, embora não especificamente destinada a critérios de sustentabilidade, cria um ambiente propício para a integração de práticas ESG nas demonstrações financeiras e na governança corporativa. A adaptação contínua das práticas de auditoria para incluir critérios ESG e a expansão das regulamentações são essenciais para que as empresas possam responder às crescentes demandas por sustentabilidade e responsabilidade social.

Em resumo, a Lei nº 10.593/2002 desempenha um papel fundamental na proteção dos interesses públicos e na promoção da integridade das informações financeiras das empresas no Brasil, assegurando que a auditoria independente seja conduzida de maneira imparcial e profissional, essencial para a confiança dos investidores e a estabilidade do mercado.

A Norma 10180/2001 é essencial para o funcionamento eficaz do mercado de capitais no Brasil, assegurando que as empresas sejam auditadas de acordo com padrões técnicos rigorosos e que os relatórios resultantes sejam utilizados como ferramentas fundamentais para a tomada de decisões pelos diversos stakeholders.

A Lei nº 11.638/2007 foi um marco importante para a modernização das práticas contábeis no Brasil, promovendo a transparência, a comparabilidade e a qualidade das demonstrações financeiras das empresas. Além de seus impactos diretos nas práticas contábeis financeiras, a lei também contribui indiretamente para a auditoria de critérios ESG, facilitando a integração de práticas sustentáveis nas avaliações contábeis e aumentando a confiança dos stakeholders nas informações divulgadas. A contínua adaptação às normas internacionais e a capacitação dos profissionais de contabilidade são essenciais para manter a relevância e a eficácia dessas mudanças no cenário corporativo brasileiro.

A ISO 19011 desempenha um papel fundamental, ponto de vista mercadológico, ao fornecer um guia estruturado e uniforme para a condução de auditorias de sistemas de gestão em nível global. Isso ajuda as organizações a melhorar continuamente seus processos, identificar áreas de risco e oportunidades de melhoria, e demonstrar conformidade com requisitos regulamentares e normativos. Além disso, a norma promove a confiança e a credibilidade nos resultados das auditorias, beneficiando tanto as próprias organizações quanto seus clientes, parceiros e outras partes interessadas.

A Lei nº 8.218/1991 é um marco importante na regulação das auditorias independentes no Brasil, promovendo a transparência e a credibilidade das informações financeiras. Sua implementação é essencial para garantir que grandes empresas sejam submetidas a avaliações rigorosas e regulares, o que pode ser expandido para incluir critérios ESG, alinhando-se com as melhores práticas globais de sustentabilidade e governança corporativa.

Os dispositivos legais brasileiros delineiam um cenário onde a auditoria ESG é não apenas uma obrigação, mas uma oportunidade estratégica. No entanto, a implementação eficaz dessas auditorias enfrenta desafios significativos. Entre eles, destacam-se a necessidade de desenvolvimento de metodologias específicas para critérios ESG, a capacitação contínua dos auditores e a integração das práticas ESG nas estratégias corporativas de forma holística.

Por outro lado, as tendências indicam um movimento crescente em direção à digitalização e automação dos processos de auditoria. Ferramentas de big data e inteligência artificial estão sendo progressivamente incorporadas, proporcionando análises mais detalhadas e previsões mais precisas sobre os impactos ESG. Além disso, há uma pressão crescente por relatórios integrados, que combinam informações financeiras e não financeiras, oferecendo uma visão completa e transparente sobre o desempenho das empresas.

CONCLUSÃO

A legislação e diretrizes legais brasileiras desempenham um papel fundamental na realização de auditorias ambientais empresariais, proporcionando um arcabouço de transparência, ética e comparabilidade. Ao promoverem transparência, ética e rigor metodológico, essas leis e normas estabelecem as bases para uma auditoria ambiental eficaz e confiável.

Embora as leis existentes contribuam significativamente para a credibilidade e a qualidade das auditorias, há uma necessidade crescente de adaptar e expandir essas regulamentações para abranger de maneira mais completa os critérios de sustentabilidade valorizados mundialmente. Isso inclui a capacitação contínua dos auditores, a adoção de normas internacionais como a ISO 14001 e a integração mais ampla de práticas de sustentabilidade nas exigências legais existentes. Dessa forma, o Brasil pode avançar rumo a uma maior sustentabilidade corporativa, beneficiando a sociedade e o meio ambiente.

Superar os desafios inerentes e aproveitar as tendências emergentes serão fundamentais para que as empresas alcancem uma sustentabilidade corporativa robusta, beneficiando não apenas os acionistas, mas toda a sociedade.

REFERÊNCIAS

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1 Pós-Graduada em Gestão de Projetos, Faculdade do Leste Mineiro. Minas Gerais-MG. Fortaleza-CE. E-mail: milabernadini@yahoo.com.br

2 Pós-Graduado em Direito e Processo Civil, Centro Universitário Estácio, Fortaleza-CE. E-mail: pedroeoc@hotmail.com

3 Pós-Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Faculdade UniChristus. Fortaleza-CE. E-mail: lopesjunioradv@yahoo.com.br

4 Pós-Graduada em Administração Patrimonial, Faculdade UNIBF. Fortaleza-CE. E-mail: gomes@inoverdes.com.br

5 Pós-Graduada em Direito Processual, UNISUL – Universidade do Sul de Santa Catarina. E-mail: adv.keila@gmail.com

6 Pós-Graduada em Gestão Empresarial Avançada, Faculdade FANOR, Fortaleza-CE. E-mail: kelviakelle@gmail.com;

7 Pós-Graduado em Direito Constitucional, Faculdade FOCUS, Cascavel-PR. E-mail: guisantoss1987@gmail.com;

8 Pós-Graduado em Direito do Tributário, Instituto de Educação e Cultura de Capanema. Capanema-PR. E-mail: juliana.adv.fic@gmail.com;

9 Graduado em Direito, Faculdade Princesa do Oeste, Crateús-CE. E-mail: francofrota@gmail.com;

10 Doutora em Engenharia Civil, Universidade Federal do Ceará – UFC. Fortaleza-CE. E-mail: raqueljuca@unifor.br;

11 Doutora em Engenharia de Transportes, Universidade Federal do Ceará – UFC. Fortaleza-CE. E-mail: raphaelle@unifor.br;

12 Mestrado em Engenharia Civil, Universidade Federal do Ceará – UFC. Fortaleza-CE. E-mail: andersonalmeida@unifor.br;