O MARCO TEMPORAL E O DIREITO DOS POVOS INDÍGENAS: UMA ANÁLISE JURÍDICA E SOCIOPOLÍTICA 

THE MARCO TEMPORAL AND THE LAW OF INDIGENOUS PEOPLES: A LEGAL AND SOCIOPOLITICAL ANALYSIS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12194058


Wania Ressutti1;
Everson Rodrigues de Castro2.


Resumo

Este artigo analisa a controvérsia do Marco Temporal como critério para demarcação das terras indígenas com ênfase nas dimensões jurídica e sociopolíticas, partindo do caso Raposa-Serra do Sol, sob a luz do Princípio da Vedação ao Retrocesso Social.  Utilizou-se o método indutivo com técnicas aplicadas ao procedimento bibliográfico contemplando revisões de literatura, interpretação normativa e jurisprudência específica ao caso. A análise dos fatos leva a crer que a Constituição Federal/1988 garante os direitos dos povos indígenas às suas terras tradicionais e a demarcação é um reconhecimento desses direitos. A  Lei nº 14.701/2023, ao impor critérios temporais, contraria o princípio da vedação ao retrocesso social, vital na garantia dos direitos territoriais dos povos. É de suma importância que a discussão sobre o tema não se restrinja às instituições, mas que a sociedade também discuta a aplicação dessa lei para evitar a redução dos direitos indígenas, protegendo suas culturas e tradições. 

Palavras-chave: Marco temporal. Terras indígenas. Vedação ao retrocesso. 

Abstract 

This article analyzes the Marco Temporal controversy as a criterion for the demarcation of indigenous lands with an emphasis on the legal and sociopolitical dimensions, starting from the Raposa-Serra do Sol case, in the light of the Principle of Prohibition of Social Regression. The inductive method was used with techniques applied to the bibliographic procedure, including literature reviews, normative interpretation and case-specific jurisprudence. Analysis of the facts leads us to believe that the Federal Constitution/1988 guarantees the rights of indigenous peoples to their traditional lands and the demarcation is a recognition of these rights. Law nº 14.701/2023, by imposing temporal criteria, contradicts the principle of prohibiting social regression, vital in guaranteeing the territorial rights of people. It is crucial that the discussion on this issue not be confined to institutions but that society also engages in the application of this law to prevent the reduction of indigenous rights, protecting their cultures and traditions. 

Keywords: Marco temporal. Indigenous lands. Prohibition of social regression. 

INTRODUÇÃO

O Marco Temporal é uma tese jurídica que estabelece que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem sob sua posse ou disputa em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal do Brasil. Esta tese está explícita na Constituição Federal de 1988, mais precisamente em seu artigo 231, que reconhece esses direitos. No entanto, a interpretação sobre quais são as terras “tradicionalmente ocupadas” tem sido motivo de grande controvérsia no país. O critério utilizado para o reconhecimento dessas terras indígenas e os argumentos que levaram às decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no caso Raposa-Serra do Sol, no ano de 2009, em Roraima, configuram-se no ponto de partida para traçar a trajetória do Marco Temporal até as discussões que ainda tramitam pelas esferas governamentais. No julgamento desse caso, o STF reconheceu que a posse indígena deveria ser comprovada até a data da promulgação da Constituição de 1988 (5 de outubro de 1988), estabelecendo o chamado “marco temporal” como critério. Tal reconhecimento ganhou repercussão e dividiu opiniões no campo sociopolítico e na interpretação de sua constitucionalidade. Com essa discussão, o debate acerca das demarcações das terras ganhou grande repercussão e vem sendo debatida desde então. 

A demarcação, que segundo o dicionário brasileiro da língua português Michaelis (2024)³, significa “ação de demarcar; delimitação de áreas, feita por balizas, marcos ou outros tipos de sinais: […]”, revela-se de extrema importância para os povos indígenas que têm na terra muito mais do que sua moradia, mas toda uma história de ancestralidade cultural e espiritual. Sendo a demarcação das terras indígenas um direito constitucional, entender o significado da terra para esses povos é primordial para entender a necessidade de garantir seus direitos, que são fundamentais para sua sobrevivência.   

O princípio da vedação ao retrocesso social traz a ideia de que, uma vez garantidos determinados direitos ou condições sociais, não se pode promover o retorno às situações anteriormente menos favoráveis. A Proposta de Emenda Parlamentar (PEC) nº 2.903/2023, também conhecida como tese do Marco Temporal, que trata do reconhecimento, demarcação, uso e gestão de terras indígenas, parece estar indo de encontro ao que prega o princípio. Nesse contexto, torna-se imprescindível levar à sociedade um conhecimento mais amplo sobre o tema e lançar luz sobre questões urgentes e controversas, fornecendo subsídios para formação de opinião e contribuindo para possíveis tomadas de decisões que levem à pacificação dos conflitos que o cercam.  

Assim, este projeto  visa analisar tal controvérsia em torno do Marco Temporal como critério para demarcação das terras, com ênfase nas dimensões jurídica e sociopolítica, visando contribuir para o debate e compreensão desse contexto na sociedade. Para isso, será utilizado o método indutivo com técnicas aplicadas ao procedimento bibliográfico contemplando a revisão de literatura, interpretação normativa e análise de jurisprudência específica ao caso. 

1. As terras indígenas 

À luz da Constituição da República Federativa Brasileira de 1988, as terras indígenas são aquelas ocupadas tradicionalmente pelos índios e por eles habitadas em caráter permanente, além das utilizadas para suas atividades produtivas, as que devem ser preservadas ambientalmente visando seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural para preservação de seus costumes (Art. 231, §1º, CRFB/1988) e que “destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nela existentes” ( Art. 231, §2º, CRFB/1988).  

A demarcação das terras indígenas é um processo complexo e tem a finalidade de garantir a proteção dos direitos territoriais e culturais dos povos originários. Souza e Filho4 define que, quando se enfatiza a palavra “originário”, tem-se que o direito dos índios antecede seu próprio direito e antecede à lei e a atual Constituição Brasileira reconhece aos índios esse direito originário sobre as terras que ocupam.  Essas terras representam não apenas espaços geográficos, mas também uma tradição marcada pela cultura de suas ancestralidades, espiritualidade e modo de vida singulares. Ao longo dos anos, essas terras foram ocupadas por povos originários que mantêm uma relação intrínseca com a natureza e seus recursos, fundamentada em saberes tradicionais transmitidos de geração em geração. São povos que têm a terra como geradora da vida, a Pacha mama, termo que se origina na cosmologia andina para se referir à “Mãe Terra”, a divindade que representa a natureza no seu conjunto. Para Tolentino e Oliveira5, embora os povos andinos que cultuam a Pacha mama tenham uma visão peculiar da natureza, isso é incomum na literatura jurídica, no entanto não diminui a importância de compreender esses conceitos especialmente quando se trata de assunto que envolvem a vida humana.  

Ferreira (2013), também traz uma reflexão acerca dos direitos da natureza, Pacha mama, sob a perspectiva da visão dos povos indígenas de entender o mundo que compreende a natureza como sujeito de direitos e traça um perfil da Constituição Brasileira que vem se repetindo desde a primeira Carta, em 1824, passando a ser uma constituição conservadora centrada no direito de propriedade individual, patriarcalista até os anos 30 do século XX, para somente em 1988, sem a opressão da ditadura, avançar nas questões de direitos coletivos, direitos culturais e proteção aos povos indígenas e ao meio ambiente. A Constituição de 1988 reconhece os direitos dos povos indígenas às suas terras tradicionais e à preservação de suas culturas, o que  implica um respeito aos valores e práticas culturais que incluem a reverência pela terra. Por isso, para Ferreira (2013) faz-se necessária uma releitura do Art. 225, da Constituição Federal de 1988, quando esta prevê o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe “ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, buscando a compreensão que a natureza não está exclusivamente em função dos humanos, mas sim que os humanos devem estar integrados à natureza.  

Isto nos leva a aceitar que a Natureza, como construção social, ou seja, como termo conceitualizado pelos seres humanos, deve ser reinterpretada e revisada integralmente se não quisermos colocar em risco a vida do ser humano no Planeta. Para começar qualquer reflexão, aceitemos que a humanidade não está fora da Natureza e que esta tem limites.6

Ou seja, os recursos naturais não devem ser vistos como uma condição para o crescimento econômico, mas sim como uma condição de vida que dever respeitada e protegida, condição essa absorvida pelos povos indígenas que mantêm uma relação de cuidado e respeito com o meio ambiente, compreendendo que a terra não é apenas um recurso a ser explorado, mas sim um ser vivo com o qual se deve coexistir harmoniosamente. 

1.1. Posse civil e posse indígena 

No Brasil, as normas relacionadas à posse civil podem ser encontradas no Código Civil Brasileiro que, em seu art. 1.196, define a posse como “o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.”. No que tange à posse indígena, refere-se ao controle e ocupação de terras por povos indígenas de acordo com suas próprias normas e tradições, muitas vezes reconhecidas pelo Estado. O 

Estatuto do Índio, em seu capítulo 23º,  diz que “considera-se posse do índio ou silvícola a ocupação efetiva da terra que, de acordo com os usos, costumes e tradições tribais detém e onde habita ou exerce atividade indispensável à sua subsistência ou economicamente útil”, sugerindo que a posse de terra para os indígenas não se limita apenas à habitação, mas também às atividades relacionadas à sua sobrevivência ou ao desenvolvimento econômico da comunidade.  

A Constituição Brasileira de 1988 reconhece os direitos territoriais dos povos indígenas estabelecendo, em seu artigo 231, que “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, entretanto diz competir “à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens” (CRFB/88, caput do  art. 231) e, em seu parágrafo 2º determina que “as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.” (CRFB/88,  §2º, do art. 231). Como se vê, a Constituição  reconhece os direitos territoriais dos povos indígenas e da importância da sua autonomia, da preservação de sua cultura e da sua relação com o meio ambiente, garante-lhes o direito ao usufruto exclusivo das terras tradicionalmente por eles ocupadas, entretanto, define que essas terras não lhes pertencem. 

Para melhor enteder essa questão busca-se o conceito de posse, partindo da teoria possessoria de dois juristas alemães do século XIX, Friedrich Carl von Savigny e Rudolf von Iherin. De acordo com Gurjão (2015)7, a teoria de Savigny foi a responsável por conceder à posse, autonomia em relação aos direitos reais, ou seja, a relação que o possuidor terá de direito sobre a coisa. Savigny, em sua obra “Tratado de Posse” defende que o elemento material da posse não seria a coisa em si, mas o poder físico que a pessoa exerce sobre essa coisa. Trata-se de uma teoria subjetiva onde, para se ter posse, seria necessário ter contato com a coisa (corpus), e ter a intenção de ter a coisa (animus). Para Savigny (Gurjão, 2015), o corpus transcende a ideia da posse, é ter o direito de se apropriar, usufruir e gozar da coisa, tendo que ter relação com essa coisa e dar publicidade a isso, enquanto o animus é o que caracteriza a intenção de ser o dono da coisa. Nesse contexto, de acordo com o pensamento de Savigny, o possuidor seria aquele que tem algo em seu poder e se sente como se dono fosse. Para Ihering (Gurjão, 2015), a posse nada mais é do que um direito, o corpus é o único elemento para que exista a posse, não interessando o animus, não há necessidade da intenção de ser dono, mas sim, de forma mais objetiva, se a pessoa tem ou não tem relação com a coisa. Essa teoria tem uma proximidade com o pensamento darwiniano, onde há uma evolução, ou seja, antes de ser proprietário houve uma posse preliminar, assim, toda propriedade é uma evolução mais moderna da posse. Nessa concepção, são considerados possuidores todos que tiverem a coisa em seu poder, independentemente da vontade de tê-la. 

O Código Civil Brasileiro, tanto o de 1916 quanto o de 2002, adotaram a doutrina objetiva, considerando apenas o corpus como definidor da posse. Assim, considera-se possuidor aquele que tem de fato algum poder inerente ao domínio ou á propriedade Gurjão (2015) atenta que haverá situações em que a teoria de Savigny será aplicada, a exemplo da usucapião, bastando para isso “que possua a coisa com vontade de ser o proprietário para que tenha acesso aos interditos […]”. Nesta situação, a posse de boa-fé ou de má-fe é um elemento marcante para as consequências da aquisição ou não da propriedade. Vale salientar que, embora a posse e a propriedade andem juntas, existem diferenças entre elas: Na teoria de Savignyt, a posse seria um fato e a propriedade um direito. O animus, na posse seria transitório, enquanto a propriedade tem animus permanente. 

A posse indígena tem características semelhantes à posse civil, mas também tem algumas especificidades, como:  o vínculo ancestral e o histórico com as terras, essenciais para a sua sobrevivência física, cultural e espiritual; a demarcação de terras, cujas legalmente ocupadas são reconhecidas e delimitadas, garantindo-lhes a posse exclusiva e permanente; o uso sustentável e conservação ambiental, prática comum dos povos indígenas, servindo muitas vezes como modelos de conservação. São características da posse indígena, o direito ao autogoverno e autodeterminação garantidos pela Constituição Federal de 1988 nas tomadas de decisões sobre suas terras e recursos naturais; O Brasil, como signatário de convenções internacionais, assegura às comunidades indígenas o direito de serem consultadas e de consentirem previamente sobre medidas que afetem suas terras; os direitos territoriais coletivos: sobre as terras reconhecidos como pertencentes à comunidade, refletindo a importância do coletivismo na organização indígena; e a proteção constitucional que que determina ao Estado combater explorações ilegais e invasões a fim de garantir a integridade das comunidades indígenas. 

1.2. A Constituição Federal e o processo de demarcação da terra indígena 

A promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 trouxe inovações para os povos indígenas que passaram a ter proteção e direitos garantidos. Em seu artigo 231, garantiu o reconhecimento e a tutela dos direitos territoriais dos povos indígenas, assegurando-lhes a posse permanente e o usufruto das terras que tradicionalmente ocupam e declarou a imprescritibilidade dos direitos sobre elas, sua inalienabilidade e indisponibilidade, vedando a retirada de grupos indígenas de suas terras por motivos outros que não sejam “em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País […] nos termos do parágrafo 6º do arquivo citado. Nesse contexto a Constituição é clara quanto a responsabilidade do Estado em proteger os direitos territoriais dos povos indígenas quanto às terras que ocupam, não podendo favorecer “a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros” (art. 174, § 3º, CRFB/1988) em terras indígenas, conferindo aos índios, suas comunidades e organizações a legitimidade para defender seus direitos e interesses (art. 232, CRFB/1988).  

Os dois primeiros parágrafos do art. 231, da Constituição Federal se referemse às “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente”, ou seja, para Do Vale (2018) isso não significa que em função do passado se obtenha uma ocupação efetiva, mas sim uma garantia que essas terras serão destinadas eternamente para seu habitat. No entanto, o processo de demarcação de terras indígenas no Brasil tem sido historicamente controverso e enfrenta uma série de desafios políticos, econômicos e sociais, principalmente relacionados a conflitos de interesses com setores agropecuários, mineração e exploração de recursos naturais. A constituição diz que compete à União demarcar as terras indígenas (art. 231, CRFB/88), ficando sob responsabilidade do poder executivo promovera demarcação das terras ainda não demarcadas no prazo de cinco anos (art. 65, Lei 6001/1973) e. de acordo com o art. 67, do Ato das Disposições Transitórias em 1988, a conclusão da demarcação das terras deveria ser concluída em 1993, cinco anos, após a promulgação da Constituição. Mas embora esses prazos não tenham sido cumpridos, não é a demarcação que define os direitos dos povos indígenas. “A demarcação não é título de posse nem de ocupação de terras. Os direitos dos índios sobre suas terras independem de demarcação, esta é constitucionalmente exigida no interesse dos índios.”8

Hoje, com mais de trinta anos da promulgação da Constituição Federal Brasileira, é possível perceber algumas conquistas, como a inclusão de políticas públicas, as instituições em defesa da causa no sistema de justiça, a reafirmação étnica, e a demarcação de vários territórios, principalmente na região da Amazônia Legal. Entretanto, são as demarcações que geram os maiores conflitos que ameaçam gravemente a sobrevivência dos povos indígenas a exemplo do que revela Cunha (2018) ao salientar que os povos indígenas são acuados de um lado pelo Estado que quer explorar os recursos hídricos e minerais, e de outro o agronegócio que vê nas terras indígenas um entrave para a exploração econômica e expansão da fronteira agrícola, o que tem gerado as grandes desavenças deste século. 

A insatisfação com os efeitos do comando constitucional, que é claro acerca do dever estatal de demarcar as terras, e da ausência do dever de indenizar os proprietários […] tem levado os opositores da causa indígena a se organizarem na bancada ruralista do Congresso Nacional para minar as conquistas consolidadas na Constituição de 1988.9

Além de estar previsto na Constituição Federal de 1988, o processo de demarcação das Terras Indígenas está regulamentado no Decreto nº 1.776/1996. É com base nele que são identificados e sinalizados os limites do território tradicional ocupado pelos povos indígenas. A demarcação das terras indígenas é o ápice do processo de reconhecimento do seu caráter ou natureza, mas para Souza Filho (2012) “[…] a demarcação não é o ato administrativo que constitui a terra indígena, mas é mero ato de reconhecimento, de natureza declaratório”10, ou seja, têm-se dado importância mais à demarcação do que a própria realidade. 

Assim, como a própria Constituição define, basta que essas terras sejam tradicionalmente ocupadas para se garantir os direitos originários. Os indígenas já a habitavam quando os não-indígenas chegaram. Para Souza e Filho (2012), isso também leva à reflexão que ao se expandir a fronteira agrícola e se deparar com povos indígenas desconhecidos, não oficialmente identificados, mesmo que o Estado tenha dito que aquelas terras não eram indígenas, elas são terras indígenas, pois são ocupadas por indígenas, portanto, deve protegê-las.  

2. O princípio da vedação ao retrocesso social 

Os princípios constitucionais desempenham um papel fundamental na organização e no funcionamento de um Estado de Direito, servindo como diretrizes para interpretação e aplicação das normas jurídicas contidas na Constituição Federal. Seu papel também é crucial na proteção e promoção dos direitos sociais e da dignidade humana, estabelecendo os fundamentos jurídicos e éticos para a construção de uma sociedade justa, livre e igualitária. Para Ingo Wolfang Sarlet, o princípio da vedação ao retrocesso também está relacionado com as questões de segurança jurídica e dignidade humana. 

Com efeito, a dignidade não restará suficientemente respeitada e protegida em todo o lugar onde as pessoas estejam sendo atingidas por um tal nível de instabilidade jurídica que não estejam mais em condições de, com um mínimo de segurança e tranquilidade, confiar nas instituições sociais e estatais (incluindo o Direito) e numa certa estabilidade das suas próprias posições jurídicas.11

Gilmar Ferreira Mendes12 traz a definição de proibição de retrocesso como sendo “o princípio segundo o qual não seria possível extinguir direitos sociais já implementados, evitando-se, portanto, um verdadeiro retrocesso ou limitação tamanha que atinja seu núcleo essencial”. Para Tash (2017) esse conceito  não traduz a amplitude que o ordenamento constitucional dá aos direitos fundamentais, principalmente os que se referem às garantias (§§ 2º e 3º, do art. 5º, CRFB/88) e traz o que ele considera uma posição mais amplificada, conceituada por Ítalo Roberto Fuhrmann, que define a proibição de retrocesso social como “um princípio jurídico decorrente do sistema nacional e do sistema internacional de proteção dos Direitos Humanos que invalida todo e qualquer ato estatal”13 seja do Legislativo ou do Executivo, que retroceda na aplicação dos direitos sociais garantidos pela Constituição, mesmo que não afete direitos já adquiridos. Isso é válido tanto para o conteúdo da norma quanto para o alcance de seus beneficiários, a menos que haja uma política compensatória ou alternativa prevista. 

Canotilho14 possui uma posição mais branda apontando que o núcleo fundamental dos direitos sociais já implementados e efetivados por meio de medidas legislativas (como a “lei da segurança social”, “lei do subsídio de desemprego”, “lei do serviço de saúde”) deve ser considerado garantido pela Constituição. Portanto, qualquer medida estatal que resulte na anulação desses direitos, sem a criação de esquemas alternativos ou compensatórios, deve ser considerada inconstitucional. Nesse contexto, o princípio  da vedação ao retrocesso social vem para garantir a proteção dos direitos sociais já conquistados ao longo tempo, com fundamento na ideia de que, uma vez conquistados, não podem ser retrocedidos ou suprimidos sem demonstrar que tal medida é indispensável para a consecução de objetivos legítimos e que não existem alternativas menos prejudiciais aos direitos sociais em questão. Essa doutrina está associada ao princípio do progresso social, que sustenta que o Estado deve promover o avanço contínuo das condições sociais, econômicas e culturais de sua população. O que se extrai desses conceitos é que o princípio da vedação ao retrocesso social está intrinsecamente relacionado a importância dos direitos sociais e do progresso social para a concretização da dignidade da pessoa humana e para a efetivação dos direitos fundamentais. Nesse sentido, a dignidade da pessoa humana também precisa ser protegida, principalmente a atos que apresentam retrocessos, o que configura o princípio da vedação ao retrocesso, um subprincípio do princípio da segurança jurídica. 

Quando se relaciona o princípio da vedação ao retrocesso à questão das terras dos povos indígenas no Brasil e à tese do Marco temporal, pode-se observar uma tensão entre a proteção dos direitos sociais dos povos indígenas e os interesses econômicos e políticos envolvidos na exploração dessas terras. Do lado dos povos indígenas, há o interesse em garantir a preservação das terras tradicionalmente ocupadas e que são essenciais para sua sobrevivência, além de assegurar o respeito aos seus direitos humanos e reconhecimento de sua cultura e modo de vida. Há ainda os interesses econômicos ligados à expansão do agronegócio, à exploração de recursos naturais, cujas terras indígenas ainda são ricas. Os interesses políticos têm gerado muita tensão tanto por aqueles que buscam apoio político alinhando-se ao interesse de terceiros, como na criação e modificação de leis e políticas públicas favorecendo o interesse de detentores do poder econômico, a exemplo da própria tese do marco temporal. 

Embora não haja nenhuma norma específica, a jurisprudência brasileira reconhece como decorrência lógica dos direitos fundamentais, a vedação ao retrocesso social como um princípio implícito consagrados na Constituição e consolidado nos tribunais brasileiros. Isso traz à tona que qualquer medida que vise restringir ou eliminar os direitos territoriais dos povos indígenas, como no caso do marco temporal, deve ser avaliada à luz desse princípio, demonstrando que tal medida é indispensável para a consecução de objetivos legítimos e que não existem alternativas menos prejudiciais aos direitos sociais em questão. Luís Roberto Barroso traz a ideia de que por esse princípio, “[…] entende-se que se uma lei, ao regulamentar um mandamento constitucional, instituir determinado direito, ele se incorpora ao patrimônio jurídico da cidadania e não pode ser absolutamente suprimido.”15 

A vedação ao retrocesso social assegura que os direitos territoriais dos povos indígenas, uma vez reconhecidos e formalizados, não possam ser revogados ou diminuídos, ou seja, as terras que foram demarcadas e reconhecidas como indígenas não poderiam ser retiradas dessas comunidades com base em novos critérios restritivos, como a tese do marco temporal.  Assim, a vedação ao retrocesso social é uma garantia fundamental para a proteção dos direitos dos povos indígenas à terra, assegurando que esses direitos sejam preservados e promovidos ao longo do tempo, em consonância com os princípios constitucionais e os tratados internacionais de direitos humanos. 

3. O caso Raposa-Serra do Sol 

O caso Raposa-Serra do Sol, referente às terras indígenas localizadas  ao norte de Roraima, entre os municípios de Pacaraima, Normandia e Uiramutã, região norte do Brasil, foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal em 19 de março de 2009 e tornouse um marco na demarcação de terras indígenas no Brasil. Para melhor compreender a importância desse caso no contexto do marco temporal é preciso contextualizar a ocupação história dessas terras até o momento que se deu o conflito e as decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal para julgar a ação popular ajuizada em 20 de maio de 2005, pelo senador da República Augusto Affonso Botelho Neto contra a União. 

A ocupação histórica das terras indígenas Raposa-Serra do Sol não é recente, ela atravessa séculos de história e tradição dos povos indígenas, principalmente os Macuxi, Wapixana, Taurepang, Ingarikó e Patamona. Lima16 explica que esses povos mantiveram uma relação ancestral com a terra, utilizando-a para suas práticas culturais, econômicas e sociais, incluindo agricultura, caça, pesca e rituais religiosos. A partir do século XIX, com a expansão do processo de colonização na região norte do Brasil, as terras indígenas passaram a ser alvo de diversos tipos de pressão e exploração. Com a chegada de colonos, fazendeiros, garimpeiros e outros agentes não indígenas, também chegaram os conflitos pela posse da terra, resultando em disputas territoriais, violência e expulsão forçada das comunidades indígenas de suas terras tradicionais. Os conflitos se intensificaram ao longo do século XX, com a implementação de políticas governamentais de colonização e desenvolvimento na região amazônica, muitas vezes ignorando ou desrespeitando os direitos territoriais dos povos indígenas. A falta de demarcação e proteção efetiva das terras indígenas  contribuiu para a invasão e ocupação ilegal dessas áreas por não indígenas. Mota e Galafassi (2009, apud LIMA, 2023) apontam que os primeiros estudos para as demarcações das terras Raposa-Serra do Sol surgiram em 1975, quando um grupo de trabalho interinstitucional criado em 1992 elaborou no ano seguinte um relatório que previa um total de 1.678.800 hectares a serem demarcados para esses povos. Entretanto foi entendido como incompatível com a Constituição Federal de 1988, pelo então Ministro Nelson Jobim, culminando na edição, pelo presidente da República, do Decreto nº 1.775, de 1996, dispondo sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas. O art. 2º, § 8º desse Decreto passou a determinar que desde o início do procedimento de demarcação até noventa dias após a publicação, os estados e municípios onde a área em questão está localizada, bem como outros interessados, poderão se manifestar. Eles podem apresentar ao órgão federal de assistência aos indígenas suas razões, acompanhadas de todas as provas pertinentes, com o objetivo de solicitar indenização 

Em meio a esse contexto de conflito e pressão sobre as terras indígenas, o processo de demarcação da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol teve início na década de 1970, mas enfrentou inúmeras dificuldades e resistências por parte de setores contrários à demarcação, incluindo fazendeiros e políticos locais. A demarcação só foi efetivamente homologada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2005, conforme estabelecido pelo Ministério de Justiça, após décadas de luta e mobilização dos povos indígenas e de organizações sociais. No entanto, a partir dessa homologação, a disputa jurídica se intensificou, culminando em um julgamento histórico do Supremo Tribunal Federal que, em 2009, manteve, por unanimidade, a demarcação contínua da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, reconhecendo o direito dos povos indígenas à terra tradicionalmente ocupada, conforme estabelecido pela Constituição Federal de 1988 e pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Com o acórdão, também se determinou a saída imediata de não indígenas da área demarcada 

4. A tese do Marco Temporal 

No debate acerca da demarcação das terras indígenas, o Marco Temporal, traz inúmeras preocupações levantadas por organizações indígenas e indigenistas que veem na tese uma ameaça ao futuro dos povos e territórios indígenas. Aprovada pelo senado na forma da Lei nº 14.701 de 27 de setembro de 2023, a Tese foi sancionada com veto pelo presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva no dia 20 de outubro do mesmo ano e, dois meses depois (14 de dezembro de 2023), o veto, foi derrubado pelo Congresso Nacional que retomou a definição de que “terras indígenas tradicionalmente ocupadas” são aquelas “habitadas e utilizadas pelos indígenas para suas atividades produtivas quando da promulgação da Constituição  de 1988”, ou seja, 5 de outubro de 1988. Se com o veto do presidente a tese já era considerada preocupante por organizações indígenas e indigenistas que veem no Marco Temporal uma ameaça ao futuro dos povos e de seus territórios, a sua derrubada trouxe mais preocupação corroborando com a ideia que o Marco Temporal, da forma como vem sendo proposto, contraria interesse público e incorre em vício de inconstitucionalidade por usurpar direitos já previstos na Constituição Federal, além de ferir o princípio da vedação ao retrocesso social, colocando em questão a própria identidade dos povos indígenas. Fernandes e Amaral (2023), que também trazem essa preocupação, alegam tratar-se de uma tese inconstitucional e imoral, uma vez que não reconhecem os direitos dos povos indígenas sobre suas terras, como já preceitua a própria Constituição, pois além de pretender restringir os direitos já garantidos dos povos indígenas, 

a tese do marco temporal é um exemplo típico de medida colonial e inconstitucional que se chancelada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ou transformada em lei pelo Congresso Nacional reforçará práticas epistémicas, ontológicas e de poder que negam a diversidade cultural amplamente defendida pela Constituição Federal.17

Esses autores consideram que a tese, além de legalizar as violências que esses povos já vêm sofrendo desde o período colonial, ignora o fato que antes da Constituição de 1988, os povos indígenas eram tutelados pelo Estado, sem autonomia para lutar judicialmente por seus direitos, ou seja, a história dos povos indígenas não começou em 1988. Nessa perspectiva, ao estabelecer uma data para reconhecer as terras étnicas sem respeitar a peculiaridade histórica de expropriação, o Estado comete uma injustiça contra os povos indígenas. 

Para os ruralistas, que defendem que os indígenas só terão demarcadas as terras ocupadas por eles desde antes de 5 de outubro de 1988, o Marco temporal representaria a segurança jurídica para os proprietários de terra e inibiria disputas retroativas sobre posse de terras que foram adquiridas de boa-fé. O ministro Nunes Marques, que em 2021 votou favorável ao Marco Temporal no caso dos indígenas Xokleng, em Santa Catarina, alega que “uma teoria que defenda os limites das terras a um processo permanente de recuperação de posse em razão de um esbulho ancestral naturalmente abre espaço para conflitos de toda a ordem, sem que haja horizonte de pacificação”.18 Além da segurança jurídica, aqueles que são favoráveis à tese, veem o marco temporal como uma ferramenta para assegurar direitos de propriedade e evitar conflitos na questão da demarcação de terras. Para eles, pesa ainda o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal no caso Raposa-Serra do Sol, quando, em 2009, reconheceu o marco temporal. Tal questionamento foi levantado porque a 2ª Turma do STF tem aplicado a tese para fundamentar anulações de terras indígenas, como nos casos da Terra Indígena Guyraroká, em Caarapó, e na Terra Indígena Limão Verde, em Aquidauana, ambas no Mato Grosso do Sul. No caso da área indígena Raposa-Serra do Sol, no Pará, embora o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido a sua demarcação e garantido os direitos originários dos povos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam, declarou que “a Constituição Federal trabalhou com data certa – a data da promulgação dela própria (5 de outubro de 1988) – como insubstituível referencial para o dado da ocupação de um determinado espaço geográfico por essa ou aquela etnia aborígene; […].”19

Para o Conselho Indígena Tapajós Arapiuns – CITA20, a tese do marco temporal poderá impedir o reconhecimento dos territórios indígenas de povos que resistiram ao extermínio e ao genocídio que até hoje ainda os atinge” O Conselho alerta ainda que a tese pode inviabilizar a demarcação de terras indígenas, cuja previsão é a declaração de nulidade dos documentos fundiários referentes à área a ser demarcada. Sem a declaração de nulidade, em caso de aplicação do marco temporal, o Estado vai ter que indenizar os proprietários, o que dependeria de significativa destinação orçamentária.  

De acordo com o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)21 de 2022, 1.693.535 indígenas autodeclarados de 305 etnias vivem no Brasil, o que representa 0,83% do total de habitantes do país. Portanto, tem sido considerada essencial a demarcação das terras indígenas a fim de preservar o ambiente e evitar o aumento indiscriminado de agricultores que tem colaborado para o desmatamento e desequilíbrio ambiental.  

4.1. Os argumentos e a interpretação do STF 

No ano de 2009 o Supremo Tribunal Federal abraçou o caso da demarcação de terras com afinco, a fim de pacificar a tão polêmica controvérsia sobre as terras indígenas Raposa-Serra do Sol, em Roraima. A PET 3.388 de 2009 trouxe acaloradas discussões, controvérsias e ações para derrubar a decisão tomada em 2005. O caso Raposa Serra do Sol, como enfatizou o ministro Gilmar Mendes se mostrou ser “um dos mais difíceis e complexos já enfrentados por esta corte em toda a sua história”22. Esse caso perdurou por vinte e cinco anos, debaixo de morosidade acentuada pelas objeções de forças políticas e econômicas contrárias à demarcação. 

O acórdão do Supremo Tribunal Federal pela improcedência do pleito de ilegalidade do processo demarcatório das terras indígenas de Roraima, em 2009, reconhecendo os direitos sobre as terras e retirando os não-indígenas que lá estivessem indevidamente, representou uma grande conquista para os povos indígenas daquela região.  A ação  questionava a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e pedia a declaração de nulidade da Portaria nº 534/2005 do Ministério da Justiça23, que havia sido homologada pela Presidência da República em 15 de abril de 2005.  Com o acórdão da Suprema Corte, uma nova interpretação foi dada ao art. 231 da Constituição Federal e estabeleceu o “Conteúdo Positivo do Ato de Demarcação das Terras Indígenas”24 que trouxe dezenove condicionantes, propostas pelo Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Além de ser um marco sobre as demarcações de terra habitadas por indígenas, o resultado do julgamento também acarretou importantes consequências nos aspectos jurídico, político e social. Do ponto de vista jurídico, o relator Ministro Carlos Ayres Brito entendeu que não houve violação à soberania nacional com relação à proximidade da fronteira do estado brasileiro com a Guiana e com a Venezuela, o que fortaleceu o reconhecimento dos direitos territoriais dos povos indígenas e estabeleceu jurisprudência sobre a demarcação de terras indígenas no Brasil. Politicamente, trouxe grandes e acalorados debates sobre a soberania nacional e os interesses econômicos na região amazônica. Na questão social trouxe o entendimento contrário ao do então governador de Roraima, e dos ruralistas que alegavam a propriedade das terras, desencadeando processos de desocupação de não indígenas da área demarcada, além de reacender discussões sobre a necessidade de proteção ambiental e respeito aos direitos dos povos indígenas.  

O plenário da Corte também revisitou matérias como o recurso extraordinário 1.017.365/SC (Tema 1.031)25 com repercussão geral, reconhecida no ano de 2019, definindo o cabimento da fixação do marco temporal, a fim de dirimir a problemática envolvendo o reconhecimento de direitos territoriais de ocupação tradicional indígena.  O Tema 1.031, trata da vedação ao retrocesso social no âmbito dos direitos previdenciários e trouxe, de forma indireta, o debate sobre o Marco Temporal da demarcação de terras indígenas, na aplicação e interpretação do princípio da vedação ao retrocesso social. Nesse Tema, a vedação ao retrocesso social foi discutida em relação à proteção dos direitos previdenciários, garantindo que as conquistas sociais não sejam revogadas ou reduzidas.  Esse mesmo princípio é crucial no debate sobre o Marco Temporal, pois se argumenta que os direitos territoriais indígenas conquistados não devem ser diminuídos ou revogados. A aplicação desse princípio aos direitos indígenas sugere que qualquer retrocesso nas demarcações de terras previamente reconhecidas seria inconstitucional, pois os direitos territoriais, uma vez reconhecidos, devem ser protegidos contra qualquer tentativa de revogação ou limitação. Com a revisita à matéria, os ministros transportam para o debate sobre o Marco Temporal, as suas visões sobre a vedação ao retrocesso social.  

Passa-se aqui a fazer uma análise superficial das decisões destacando os votos dos ministros e seus argumentos, iniciando a análise com o voto do ministro relator do caso, Carlos Ayres Brito que, ao votar favorável à demarcação contínua das terras e contra a tese do Marco Temporal, destacou a importância de cumprir a proteção constitucional aos direitos territoriais indígenas e a necessidade de assegurar a integridade das terras para a preservação das culturas indígenas. Ayres Brito enfatizou ainda que qualquer tentativa de modificar a demarcação das terras indígenas de maneira que prejudique os direitos já reconhecidos configuraria um retrocesso social inaceitável. Ele argumentou que a proteção constitucional dos direitos indígenas representa um avanço civilizatório que não pode ser revertido. Essa posição foi central para a defesa da demarcação contínua das terras indígenas, reforçando que a manutenção desses direitos é essencial para a proteção e a dignidade dos povos indígenas.  

O ministro Carlos Alberto Menezes Direito destacou que o caput do artigo 231 da Constituição de 1988 traz dois elementos indeclináveis: o advérbio “tradicionalmente” e o verbo “ocupam”, que na sua visão refere-se às terras ocupadas pelos indígenas ao tempo da Constituição, desconsiderando a teoria do Indigenato – que considera o direito dos povos indígenas sobre as terras tradicionalmente ocupadas como um direito nato, anterior a própria criação do Estado, adotando, portanto, a teoria do fato indígena, proposta durante o julgamento do STF sobre a demarcação das terras indígenas Raposa-Serra do Sol. Foi Menezes Direito quem propôs as dezenove condições para garantir a soberania nacional e a segurança jurídica. O ministro reconheceu a importância dos direitos indígenas, mas suas condições visavam equilibrar esses direitos com outras questões de interesse nacional, como a defesa e a exploração de recursos naturais e, apesar das condições, não propôs nenhuma medida que reduzisse os direitos já garantidos, respeitando o princípio da vedação ao retrocesso. O ministro Marco Aurélio Mello pronuncia-se no sentido de que “a atual Carta não assegura aos indígenas o retorno às terras que outrora ocuparam, seja qual for a situação jurídica atual e o tempo decorrido desde que as deixaram” (BRASIL, Petição nº 3.388, 2009), mas apresentou algumas ressalvas. Reforçou a necessidade de proteger os direitos dos povos indígenas, reconhecendo a demarcação contínua como um direito fundamental que não deve ser reduzido ou revogado, enfatizando que qualquer retrocesso nesses direitos adquiridos pelas comunidades indígenas seria inconstitucional e contrário ao princípio da vedação ao retrocesso social.  

Já, o ministro Celso de Mello é categórico em também afirmar que o artigo 231 da Constituição de 1988 estabeleceu marco preciso a respeito da ocupação indígena anuindo à fixação da tese do marco temporal. Afirmou que os direitos indígenas são direitos fundamentais e que a demarcação descontínua comprometeria a sobrevivência cultural e física das comunidades indígenas. Essa anuência também foi seguida pelos ministros Ricardo Lewandowski, que enfatizou que a proteção aos direitos indígenas é um imperativo constitucional e que qualquer tentativa de fragmentar essas terras violaria esses direitos; Carmen Lúcia, que defendeu que a Constituição garante aos indígenas o direito sobre as terras que tradicionalmente ocupam e que esse direito não pode ser restringido pela tese do Marco Temporal; Eros Grau, que destacou a necessidade de garantir a integridade territorial das terras indígenas como forma de proteger os direitos previstos na Constituição; Cezar Peluso, que argumentou acerca da necessidade de proteger os direitos já adquiridos pelas comunidades indígenas, enfatizando que a demarcação contínua é crucial para garantir a integridade territorial das terras indígenas e, de forma implícita, reconheceu a importância da proteção dos direitos fundamentais dos povos indígenas, devendo ser evitada qualquer medida que pudesse reduzi-los; e Gilmar Mendes, que ao se pronunciar pela demarcação contínua com ressalvas, ressaltou a importância de garantir os direitos já adquiridos pelos povos indígenas, destacando a necessidade de harmonizar esses direitos com outros interesses públicos, como a segurança e o desenvolvimento nacional. Embora tenha proposto condições, Gilmar Mendes respeitou, em seu voto, a vedação ao retrocesso para evitar a diminuição dos direitos indígenas, buscando um equilíbrio que preservasse os direitos fundamentais das comunidades indígenas. O Ministro Joaquim Barbosa votou favorável à demarcação contínua e contra a tese do Marco Temporal argumentando sobre a importância da demarcação contínua para garantir a preservação cultural e física dos povos indígenas. A ministra Ellen Grace, votando com o relator pela demarcação contínua, abordou a necessidade de respeitar e proteger os direitos constitucionais dos povos indígenas e defendeu a continuidade dos direitos adquiridos e garantir a segurança jurídica das demarcações já realizadas.  

O voto dado pelo ministro Edson Fachin teve por alicerce o fato de que a tese do Marco Temporal representa injustificada restrição ao direito fundamental às terras tradicionalmente ocupadas, porque obstaculiza sobremaneira as demarcações. Fachin foi enfático ao afirmar que os direitos já reconhecidos e conquistados pelos povos indígenas não podem sofrer retrocessos. Ele argumenta que a vedação ao retrocesso social é um princípio constitucional que impede a revogação ou a diminuição de direitos fundamentais já estabelecidos e que as decisões já tomadas em favor dos direitos indígenas devem ser respeitadas para evitar insegurança jurídica e instabilidade social, afirmando que a fragmentação das terras indígenas poderia comprometer a sobrevivência e o modo de vida dessas comunidades. Em contraposição o ministro Kássio Nunes Marques abriu divergência à tese proposta pelo relator e votou pelo não provimento do recurso. Sua alegação foi a preservação da segurança jurídica, estabilidade das relações sociais e econômicas, além de prestigiar a manutenção do precedente, destacando ainda eventuais prejuízos econômicos em razão de futuras desapropriações e reversões de terras, podendo-se buscar uma posição intermediária, respeitando direitos indígenas, mas aberto a ajustes necessários.  

O ministro Alexandre de Moares, acerca da controvérsia na revisita ao Tema 1.031 ressaltou que acompanhou o relator quanto ao provimento do recurso, mas que propôs tese de repercussão geral parcialmente distinta da apresentada por Fachin, destacando que a vedação ao retrocesso não impede ajustes legislativos desde que o núcleo essencial do direito seja preservado. Em seu voto ao Marco Temporal disse ainda que os direitos indígenas são fundamentais e devem se valer de todos os direitos baseados nos princípios da vedação ao retrocesso; da proibição à proteção deficiente; da máxima efetividade e das normas constitucionais, e reafirmou sua posição que “a tese do marco temporal fere frontalmente os ditames do artigo 231 da Constituição Federal de 1988, porque implementa requisito inexistente e injustificado ao reconhecimento dos direitos territoriais indígenas.” (MORAES, 2023 apud FELKER, 2023). 

Conhecidas as argumentações dos ministros, tem-se a percepção que o julgamento refletiu a complexidade e a sensibilidade das questões envolvendo direitos indígenas e a aplicação da vedação ao retrocesso social. Todos votaram a favor da demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e, embora alguns tenham proposto condições adicionais, eles reconheceram a importância dos direitos indígenas e a necessidade de protegê-los, alinhando-se ao princípio da vedação ao retrocesso social ao evitar qualquer redução desses direitos adquiridos. À luz da teoria hermenêutica de Robert Alexy, pode-se interpretar essa decisão como um exemplo de aplicação da interpretação por princípio, onde os direitos fundamentais são entendidos como mandamentos de otimização, ou seja, 

os princípios como mandamentos de otimização decorrem do fato de eles serem normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes, sendo que as possibilidades jurídicas são determinadas pelos princípios e regras em oposição.26

Essa interpretação por princípio exige que os direitos fundamentais, como os direitos dos povos indígenas, sejam protegidos na maior medida possível, considerando as possibilidades fáticas e jurídicas. Assim, a votação no STF sobre a demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e a rejeição da tese do Marco Temporal refletiu um compromisso firme com a proteção dos direitos indígenas previstos na Constituição, entendidos como princípios que demandam proteção máxima. 

5. A lei nº 14.701/2023 

A Lei 14.701, de 20 de outubro de 2023, conhecida como Lei do Marco Temporal, foi originada pelo projeto de lei 2.903/2023, de autoria do então deputado Homero Pereira, do estado de Mato Grosso. O seu propósito foi o de regulamentar o art. 231 da Constituição Federal de 1988, para dispor sobre o reconhecimento, a demarcação, o uso e a gestão de terras indígenas, e alterar as Leis nº s 11.460, de 21 de março de 2007, 4.132, de 10 de setembro de 1962, e 6.001, de 19 de dezembro de 1973. Antes de ser sancionada, a Lei recebeu 34 vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sendo o principal ponto vetado, o item que estabelecia o direito apenas aos povos indígenas  que ocupavam ou reivindicavam as terras em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal de 1988. À época, o presidente Lula justificou sua decisão alegando que a proposição legislativa vai contra o interesse público ao exigir a comprovação da ocupação indígena na área reivindicada na data de 5 de outubro de 1988 ou de um esbulho renitente que persista até essa data, dizendo que “tal exigência desconsidera a dificuldade material de obter essa comprovação, dada a dinâmica de ocupação do território brasileiro e os seus impactos na mobilidade e fixação populacional em diferentes regiões geográficas.”27. Em setembro desse mesmo ano, o Supremo Tribunal Federal já havia fixado a teses de repercussão geral no Recurso Extraordinário RE 1.017.365/SC (Tema 1.031), rejeitando a data proposta para o marco temporal. 

Outro veto importante do presidente da República foi o que permitia a retomada de áreas reservadas aos indígenas caso houvesse alteração de seus traços culturais ou mesmo fatores ocasionados pelo decurso do tempo, o que, de acordo com a justificativa da equipe da presidência tal dispositivo descumpre a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Lula vetou ainda outros pontos que permitiam a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, sem consulta às comunidades indígenas envolvidas ou ao órgão competente; a instalação, pelo poder público, de equipamentos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte; além de trechos que permitiria a interferência de políticas públicas do Estado no caso de indígenas isolados, justificando vicio de inconstitucionalidade na questão da política de não contato com os povos indígenas isolados constante na Constituição Federal, e a desconsideração de riscos associados à vulnerabilidade socioepidemiológica desses povos que se encontram em situação de isolamento. Porém, em 28 de outubro de 2023, o Congresso derrubou os vetos do presidente Lula e promulgou a Lei do Marco Temporal em seu texto original. 

Ao analisar os reflexos da Lei Nº 14.701/2023 sob a perspectiva da vedação ao retrocesso social, é possível identificar diversos aspectos positivos que podem levar ao avanço do fortalecimento do direito dos indígenas às terras, e negativos, caracterizando restrições capazes de delimitar os direitos dos indígenas. Como ponto positivo, tem-se que a lei reforça alguns direitos e estabelece garantias para a participação e decisão das comunidades sobre suas terras, o que pode ser visto como um avanço na proteção dos direitos indígenas. Como exemplo, a lei reafirma os direitos indígenas, como o reconhecimento da organização social, dos costumes, das línguas e das tradições indígenas (art. 2º, I) mantendo a imprescritibilidade, a inalienabilidade e a indisponibilidade dos direitos indígenas (art. 2º, V). No que diz respeito à demarcação das terras, especifica os critérios e modalidades de terras indígenas, abrangendo áreas tradicionalmente ocupadas, áreas reservadas e áreas adquiridas (art. 3º); garante o uso e gestão das terras atribuindo às comunidades indígenas a responsabilidade de decidir sobre o uso e ocupação de suas terras (art. 19); e permite o exercício de atividades econômicas pelas próprias comunidades indígenas, com a possibilidade de cooperação com não indígenas (art. 26); e as terras ocupadas por comunidades indígenas e o usufruto exclusivo das riquezas naturais nas terras gozam de plena isenção tributária (art. 29). No aspecto negativo, a exigência de comprovação da ocupação tradicional em 5 de outubro de 1988 pode desconsiderar situações de esbulho ou substituição imposta anterior a essa data, limitando o reconhecimento de terrenos (art. 4º, § 2º). Ao impor tais restrições temporárias e outras limitações, a lei pode ser vista como uma medida que reduz ambientalmente os direitos previamente adquiridos ou que dificulta a expansão desses direitos, podendo vir a configurar em retrocesso social. Outro aspecto negativo está na obrigatoriedade da participação de estados e municípios no processo de demarcação (art. 5º). Essa obrigatoriedade pode gerar conflitos de interesses e atrasos no reconhecimento das terras indígenas. E ainda tem a intervenção do Estado que, ao permitir a livre instalação de equipamentos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte em terras indígenas sem consulta às comunidades Art. 22), pode violar a autonomia indígena e causar impactos negativos ao meio ambiente e à cultura local. 

Enfim, a Lei Nº 14.701/2023 apresenta tanto avanços significativos quanto algumas restrições relevantes em relação ao reconhecimento e à demarcação das terras indígenas. Os avanços podem ser atribuídos à garantia de vedação ao retrocesso social, pois reforçam e ampliam os direitos sociais das comunidades indígenas, assegurando que os direitos já conquistados não sejam diminuídos. Entre esses avanços destacam-se: a reafirmação dos direitos indígenas e a preservação de sua cultura, línguas e tradições; a clareza nos critérios para demarcação, evitando interpretações que possam restringir os direitos das comunidades indígenas; a autonomia da gestão das terras no uso e ocupação, possibilidade de exercício de atividade econômica; isenção tributária para terras ocupadas e usufruto exclusivo das riquezas naturais. Esses avanços se coadunam com o princípio da vedação ao retrocesso social, assegurando que os direitos já adquiridos pelas comunidades indígenas sejam mantidos e protegidos, e que novas garantias sejam introduzidas para fortalecer ainda mais esses direitos. Quanto às restrições, essas podem ser vistas como potenciais violações ao princípio da vedação ao retrocesso social, uma vez que podem limitar ou dificultar a expansão dos direitos territoriais e culturais das comunidades indígenas. Entre as restrições destaca-se a obrigatoriedade de comprovação da ocupação tradicional em 5 de outubro de 1988, desconsiderando as situações de esbulho e deslocamento forçado anterior a data; a obrigatoriedade da participação de Estados e Municípios no processo de demarcação. A permissão de intervenção do Estado sem prévia consulta às comunidades, São restrições que caracterizam um retrocesso na proteção dos direitos já adquiridos. 

6. Considerações finais 

As terras indígenas no Brasil possuem proteção constitucional, refletindo o compromisso com a preservação das culturas, tradições, espiritualidades e modos de vida únicos dos povos originários. A Constituição de 1988 reconhece os direitos desses povos às suas terras tradicionais, enfatizando a necessidade de uma leitura ampliada do Art. 225, que defende o meio ambiente equilibrado para as presentes e futuras gerações, considerando que a natureza deve ser integrada aos humanos e não apenas servir a eles. Deve-se considerar ainda que a posse indígena, embora semelhante à posse civil, possui características distintivas fundamentais, como o vínculo ancestral e histórico com as terras, essenciais para a sobrevivência física, cultural e espiritual dos povos indígenas. A demarcação de terras é um ato de reconhecimento que assegura a posse exclusiva e permanente, promovendo o uso sustentável e a conservação ambiental. Conforme a Constituição brasileira, trata-se de um ato declaratório, não constitutivo, bastando que essas terras sejam tradicionalmente ocupadas para garantir os direitos originários dos povos indígenas. A ausência de demarcação não deve impedir a proteção jurídica dessas terras, um ponto crucial que reforça a obrigação do Estado de proteger terras ocupadas por indígenas, mesmo quando não oficialmente reconhecidas. 

O princípio da vedação ao retrocesso social é essencial na garantia dos direitos sociais conquistados, assegurando que não sejam revogados ou diminuídos sem justificativas legítimas e que alternativas menos prejudiciais não estejam disponíveis. No contexto das terras indígenas, esse princípio é fundamental para impedir a adoção de critérios restritivos, como a tese do Marco Temporal, que ameaça os direitos territoriais reconhecidos. O caso das terras indígenas Raposa-Serra do Sol destacou a importância da demarcação e proteção efetiva das terras indígenas, representando um marco na luta pelos direitos territoriais desses povos. A decisão do STF em favor da demarcação contínua das terras reafirmou a necessidade de proteger os direitos indígenas e evitar qualquer redução desses direitos adquiridos, alinhando-se ao princípio da vedação ao retrocesso social. 

A Lei nº 14.701/2023, ou Lei do Marco Temporal, traz diversas alterações significativas no reconhecimento, demarcação, uso e gestão de terras indígenas no Brasil, porém, impõe critérios temporais e processuais que dificultam o reconhecimento e a demarcação de terras indígenas, desconsiderando a história de esbulho e deslocamentos forçados. A lei contraria os direitos de participação e consulta prévia garantidos pela legislação internacional e pela própria Constituição Federal, potencialmente violando o princípio da vedação ao retrocesso social. 

Em suma, a proteção das terras indígenas no Brasil é uma questão complexa e de extrema importância, que exige um compromisso contínuo com os direitos constitucionais e internacionais. A aplicação do princípio da vedação ao retrocesso social é vital para garantir que os direitos territoriais dos povos indígenas sejam preservados e promovidos, impedindo que interpretações restritivas ou medidas legislativas comprometam esses direitos. A sociedade brasileira, indígena e não indígena, deve discutir amplamente e tratar com seriedade a aplicação da Lei nº 14.701/2023, a fim de evitar um retrocesso nos direitos sociais e culturais dos povos indígenas, assegurando um futuro mais justo e respeitoso para todas as comunidades.


³MICHAELIS, Dicionário da Língua Portuguesa, disponível em: https://michaelis.uol.com.br/busca?id=zp1R. Acesso em: 12 de junho de 2024.
4SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. O renascer dos povos indígenas para o Direito. p. 122.
5TOLENTINO, Z.T. OLIVEIRA, L.P.S. Pacha mama e o direito à vida: uma reflexão na perspectiva do Novo Constitucionalismo Latino Americano. Veredas do Direito – Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. v. 12 n. 23 (2015). Disponível em: https://revista.domhelder.edu.br/index.php/veredas/article/view/393. Acesso em 10 de junho de 2024.
6FERREIRA, Marcilene Aparecida. Pacha Mama: Os Direitos da Natureza e o Novo Constitucionalismo na América Latina. 2013. Disponível em: https://www.indexlaw.org/index.php/rdb/article/view/2644. Acesso em: 04 de novembro de 2023.
7GURJÃO, Victor. Posse: conceito, teorias fundamentais e classificação, 2015. Disponível em:. Acesso em 04 de maio de 2024.
8SILVA (2009, p.862), apud DO VALE, Eliara Bianospino Ferreira. As terras indígenas e a Constituição Federal, 2018. Disponível em: https://revistas.fibbauru.br/jurisfib/article/view/282. Acesso em 12 de junho de 2024.
9CUNHA, Manoela Carneiro da. Samuel Rodrigues Barbosa (orgs) Direitos dos povos indígenas em disputa, p. 179.
10SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. O renascer dos povos indígenas para o Direito, p. 148
11SARLET, Ingo Wolfgang apud ANDRADE, Os direitos Fundamentais sociais à luz do princípio da vedação ao retrocesso social, 2016. Disponível em:
https://periodicos.univali.br/index.php/rdp/article/view/87081. Acesso em 29 de abril de 2024
12MENDES, Gilmar F. apud TATSCH, Ricardo L. L. O princípio da proibição de retrocesso social na Constituição brasileira: sede material, aplicação e limites. 2017, p 51. Disponível em: https://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/7744. Acesso em: 29 de abril de 2024
13FUHRMANN, I. R. apud TATSCH, Ricardo L. L. O princípio da proibição de retrocesso social na Constituição brasileira: sede material, aplicação e limites. 2017, p 51. Disponível em:
https://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/7744. Acesso em: 29 de abril de 2024.
14CANOTILHO, J. J. Gomes. apud TATSCH, Ricardo L. L. O princípio da proibição de retrocesso social na Constituição brasileira: sede material, aplicação e limites. 2017, p 52. Disponível em:
https://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/7744. Acesso em: 29 de abril de 2024.
15BARROSO, Luís Roberto apud ANDRADE, Júlio Thalles de Oliveira. Os direitos Fundamentais sociais à luz do princípio da vedação ao retrocesso social, 2016, p. 191. Disponível em: <https://periodicos.univali.br/index.php/rdp/article/view/87081>. Acesso em 29 de abril de 2024.  
16LIMA, Marcelo Perez da Cunha. A proteção constitucional da terra indígena e a tese do marco temporal: uma análise à luz da jurisprudência do STF. 2023, p. 76. Disponível em:
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17HELD; BOTELHO apud FERNANDES; AMARAL; SOUSA. Direito ao território indígena no regime democrático: marco temporal como projeto neocolonialista. 2023, p. 72-89. Disponível em:
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18AGÊNCIA CÂMARA. O que é marco temporal e quais são os argumentos favoráveis e contrários. Disponível em: . Acesso em 12 de junho de 2024.
19BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Petição no 3.388 – Roraima, 2009. Disponível em
https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630133. Acesso em 13 de novembro de 2023.
20FERNANDES, E. C. da S.; AMARAL, N. do N.; SOUSA, N. B. P. Direito ao território indígena no regime democrático: marco temporal como projeto neocolonialista. 2023, p. 79. Disponível em: https://editoralicuri.com.br/index.php/ojs/issue/view/9. Acesso em: 16 de outubro de 2023.
21BRASIL. Fundação Nacional dos Povos Indígenas. Dados do Censo 2022 revelam que o Brasil tem 1,7 milhão de indígenas, 2023. Disponível em: .Acesso em 14 de junho de 2024.
22MENDES, Gilmar, apud FELKER, Maitê Caurio. A (in) constitucionalidade da tese do marco
temporal das terras indígenas: da segurança jurídica à interpretação constitucional. 2023, p. 31.
Disponível em: https://repositorio.ufsm.br/handle/1/29845. Acesso autorizado em 13 de novembro de
2023.
23BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Petição no 3.388. Ementa: Ação Popular. Liminar Indeferida.
Demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol. Disponível em:
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630133. Acesso em: 02 mai 2024.
24BRASIL. STF. Emb. Decl. na Petição no 3.388 Roraima (Pet no 3.388/RR-ED). Disponível em
https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5214423. Acesso em 13 de
novembro de 2023.
25BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 1.017.365/SC (Tema 1.031).
Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5109720 . Acesso em: 02 de
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26FERREIRA, Natália Braga. Notas sobre a Teoria dos Princípios de Robert Alexy. Disponível em: https://periodicos.pucminas.br/index.php/DireitoSerro/article/view/1290. Acesso em 16 de junho de 2024.
27AGÊNCIA SENADO. Terra Indígenas: Lula veta marco temporal aprovado pelo Congresso. Senado Notícias. Brasília: Senado Federal, 23/10/2023. Acesso em 05 de junho de 2023

Referências das fontes citadas 

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1Graduanda em Direito pela Faculdade Católica de Rondônia, Jornalista, especialização em Educação, Gestão e Legislação Ambiental, e em Gestão e Planejamento Estratégico de Comunicação, Porto Velho, e-mail: wania.ressutti@sou.fcr.edu.br.
2Graduado em Direito, História e Filosofia, Mestre em História e Estudos Culturais, especialização em Direito Civil e Processo Civil; em Segurança Pública e Direitos Humanos; em Museografia e Patrimônio Cultural; e em História Cultural; Docente no Ensino Superior da Faculdade Católica de Rondônia , Porto Velho, e-mail: everson.rodrigues@fcr.edu.br