SAÚDE MENTAL E HUMANIZAÇÃO DO PARTO: EVIDENCIANDO A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA EM MULHERES VULNERÁVEIS

MENTAL HEALTH AND HUMANIZATION OF CHILDBIRTH: HIGHLIGHTING OBSTETRIC VIOLENCE IN VULNERABLE WOMEN

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11469807


Kathleen Melchior Altruda1;
Thallita Adriana Gomes Jardim2;
Orientador: Fledson de Sousa Lima;
Coorientador: Anderson Scherer


RESUMO

Este trabalho investiga a violência obstétrica em mulheres vulneráveis, incluindo aquelas de baixa renda, negras, imigrantes, moradoras de áreas livres, com deficiências e privadas de liberdade. A violência obstétrica é definida como uma série de violências durante o parto, incluindo abuso físico, verbal e psicológico, bem como a negação de escolhas e direitos das gestantes. Além disso, são discutidas as interseções entre a violência obstétrica e questões sociais, como racismo, discriminação de classe e deficiências, destacando a necessidade de intervenções sensíveis às necessidades específicas dessas populações. Os resultados são embasados em uma revisão bibliográfica narrativa, que incluiu 20 artigos selecionados de fontes acadêmicas reconhecidas, como a Scientific Electronic Library Online (SciELO), a Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), o Pubmed, a Literatura Latino-americana e do Caribe de Ciências da Saúde (LILACS), bem como nos registros ministeriais do Ministério da Saúde e nos acervos da Base de Dados de Enfermagem (BDENF). Por fim, destaca-se a importância de uma abordagem integrada e colaborativa para enfrentar a violência obstétrica e promover cuidados de saúde reprodutiva mais equitativos e respeitosos para todas as mulheres.

O propósito desta pesquisa consiste em analisar os efeitos da violência obstétrica (VO) sobre a saúde mental de gestantes em situação de vulnerabilidade, além de examinar os ganhos advindos da promoção da humanização do parto nestes cenários específicos.

Palavras-chaves: Saúde mental; Violência obstétrica; Humanização do parto; Mulheres vulneráveis. 

ABSTRACT

This study investigates obstetric violence against vulnerable women, including those with low income, black, immigrants, residents of informal settlements, with disabilities, and deprived of liberty. Obstetric violence is defined as a series of abuses during childbirth, including physical, verbal, and psychological abuse, as well as the denial of choices and rights of pregnant women. Furthermore, the intersections between obstetric violence and social issues such as racism, class discrimination, and disabilities are discussed, highlighting the need for interventions sensitive to the specific needs of these populations. The results are based on a narrative literature review, which included 20 articles selected from recognized academic sources such as the Scientific Electronic Library Online (SciELO), the Virtual Health Library (BVS), PubMed, the Latin American and Caribbean Literature in Health Sciences (LILACS), as well as ministerial records from the Ministry of Health and archives from the Nursing Database (BDENF). Finally, the importance of an integrated and collaborative approach to addressing obstetric violence and promoting more equitable and respectful reproductive health care for all women is emphasized. 

The purpose of this research is to analyze the effects of obstetric violence (OV) on the mental health of pregnant women in vulnerable situations, as well as to examine the benefits arising from the promotion of humanization of childbirth in these specific scenarios.

Keywords: Mental health; Obstetric violence; Humanization of childbirth; Vulnerable women. 

INTRODUÇÃO

Para inúmeras mulheres, o nascimento de um filho e o próprio parto representam alguns dos momentos mais significativos de suas existências. No entanto, violações dos princípios de cuidado respeitoso têm sido observadas em maternidades ao redor do mundo. Apesar de serem mais comuns em países com menor poder aquisitivo, mulheres residentes em nações economicamente desenvolvidas também relataram casos de coerção, intimidação e procedimentos realizados sem consentimento. O temor de sofrer desrespeito e abusos durante os cuidados pode, inclusive, desencorajá-las de buscar serviços de saúde no futuro (Britto et all., 2021).

Desde 1980, o Brasil tem implementado diversas políticas públicas visando a transformação do modelo intervencionista de atenção obstétrica. Destacam-se, entre essas iniciativas, o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento (2000), a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (2004), a Rede Cegonha (2011), as Resoluções Normativas nº 368/15 e 398/16, a Diretriz de Atenção Integral à Gestante: a operação cesariana (2015), o Projeto Parto Adequado (2016), as Diretrizes Nacionais de Assistência ao Parto Normal (2017), e o Projeto Aprimoramento e Inovação no Cuidado e Ensino em Obstetrícia e Neonatologia (2017). Essas ações são parte de um esforço contínuo para reduzir a violência obstétrica e promover uma assistência ao parto mais humanizada e baseada em evidências científicas (GABIRA et all., 2023)

O debate sobre o termo “violência obstétrica” é controverso, com o Ministério da Saúde e o Conselho Federal de Medicina se opondo ao seu uso. Movimentos sociais e o Ministério Público Federal defendem sua relevância para combater práticas violentas na assistência ao parto. Eles argumentam que discutir o tema é fundamental para melhorar a qualidade e o respeito no atendimento durante a gravidez e o parto (LIMA, et all., 2019).

A violência obstétrica tem ganhado relevância significativa desde a segunda década do século XXI, com numerosos casos sendo investigados por diversas autoridades e denunciados quando identificados (Cavalheiro et al., 2021). De acordo com a Fundação Perseu Abramo (São Paulo – SP), uma pesquisa realizada em 2010 revelou que uma em cada quatro mulheres sofre violência obstétrica (VO) no Brasil.
Conforme Assis et al. (2021), a VO inclui violências físicas, verbais e psíquicas durante o parto. Caracteriza-se pela negação da autonomia da gestante no seu parto, ausência de participação nas decisões, ofensas verbais, psicológicas e físicas, procedimentos desnecessários e dolorosos, recusa de analgesia, uso de episiotomia não indicada e impedimento do contato imediato entre mãe e bebê após o nascimento.

A Lei de Santa Catarina nº 17.097, de 17 de janeiro de 2017, define violência obstétrica como “todo ato praticado pelo médico, pela equipe do hospital, por um familiar ou acompanhante que ofenda, de forma verbal ou física, mulheres gestantes, em trabalho de parto ou no período do puerpério”. A VO provoca danos psicológicos, fazendo com que a mulher se sinta coagida, intimidada, insultada e desmoralizada, além de discriminação baseada em xenofobia, religião, classe social, deficiência, escolaridade, orientação sexual, situação conjugal e a negação do direito a acompanhante, muitas vezes permitido apenas para acompanhantes do sexo feminino (Assis et al., 2021).

Recentemente, foi divulgada a declaração “Prevenindo e Eliminando Abuso, Desrespeito e Maus-Tratos no Parto em Instituições de Saúde” e a implementação da Iniciativa Hospitalar, confirmando a relevância da VO como um problema de saúde pública (Cavalheiro et al., 2021). 

A equipe de saúde desempenha um papel fundamental na implementação do parto humanizado. Segundo a OMS, a gestação de baixo risco pode ser acompanhada por um enfermeiro obstétrico, profissional capacitado para tal função (Nascimento et al, 2020).

A falta de informações adequadas, dor física, procedimentos realizados sem consentimento e interações negativas com profissionais de saúde durante o parto aumentam as chances de desenvolver sintomas depressivos pós-natais. A depressão pós-parto, que ocorre no primeiro ano após o nascimento, afeta 17,2% das mulheres em todo o mundo. Seus sintomas incluem humor deprimido, distúrbios do sono, perda de energia, sentimentos de culpa, irritabilidade, ansiedade e pensamentos suicidas, interferindo negativamente na interação mãe-bebê, amamentação, crescimento e desenvolvimento cognitivo e comportamental das crianças (Conceição et al., 2023).

Ademais, a violência obstétrica pode ser categorizada em institucional, material e midiática. A violência institucional é caracterizada por atitudes que impedem o acesso das gestantes aos seus direitos constitucionais. A violência material busca obter recursos financeiros através de procedimentos garantidos por lei para as gestantes. A violência midiática denigre e atinge emocionalmente as parturientes por meio de comunicação com fins sociais, econômicos e de dominação. A violência institucional é a mais prevalente nas maternidades públicas brasileiras, tratando as gestantes como meros objetos de intervenções (Vieira et al., 2020).

O plano de parto é uma ferramenta eficaz para enfrentar a VO no Brasil, embora ainda pouco utilizado. Ele convida a mulher a refletir, junto com a equipe de saúde, sobre seus direitos durante o parto, necessidades, valores e sentimentos, promovendo uma comunicação eficaz entre a parturiente e os profissionais de saúde (Matos et al., 2021). 

Diversos conceitos de vulnerabilidade em saúde foram definidos, incluindo letramento funcional, cognição, comportamento, situação psicoemocional, situação física, situação socioeconômica, identidade demográfica, diferenças culturais e violência verbal e psicológica (FLORÊNCIO; MOREIRA, 2021).

Ao investigar a violência que atinge a juventude negra, identificam-se danos pela negação da maternidade às mulheres negras, decorrentes do racismo e desigualdades raciais. Essas mulheres não podem usufruir do amor materno, perpetuando sofrimento, violência e racismo (Passos et al., 2020). As interseções entre a etnia institucional e a violência obstétrica mostram uma continuidade histórica, refletindo aspectos de uma realidade compartilhada onde o passado e o presente estão interligados (Campos et al., 2023). A violência obstétrica tornou-se um tema recorrente de aprendizado, especialmente no que se refere aos impactos na saúde da mulher negra, representando uma forma de intolerância Segundo Oliveira e Kubiak (2019).

Investigações primorosamente direcionadas às disparidades raciais na esfera da saúde têm ressaltado a condição de maior fragilidade ocupada pelas mulheres negras. Tal posição é justificada pela experiência concomitante da tríplice marginalização, advinda das dimensões de gênero, raça e classe, as quais exercem influência direta sobre a dinâmica de entrada e utilização dos recursos assistenciais, bem como nos desdobramentos relacionados à enfermidade e ao óbito (LESSA et all., 2022).

Mulheres com deficiência enfrentam diversas injustiças sociais, econômicas e de saúde, com maior propensão a complicações no parto. Estudos sobre acessibilidade em maternidades para gestantes/puérperas com deficiência motora, visual ou auditiva são escassos, mas há indícios de que a adequação da infraestrutura reduz mortalidade materna e infantil (Thomaz et al., 2020). 

Mulheres moradoras de áreas livres têm maior risco de complicações obstétricas e menor acesso a cuidados de saúde, tornando-se mais vulneráveis e propensas a piores desfechos de saúde (Schiav et al., 2023). A concepção de mulher e maternidade é uma construção social. Mulheres em situação de rua são frequentemente associadas à prostituição e marginalização. Pesquisas indicam que elas têm maior chance de engravidar, riscos elevados de complicações obstétricas e menos cuidados de saúde, enfrentando mais barreiras no acesso e uso de serviços de saúde (Santos et al., 2021). 

A Lei Federal 11.942/2009 assegura acesso a cuidados durante o período gestacional e pós-parto para mulheres em privação de liberdade, mas desafios persistem, especialmente no acesso à assistência médica, agravado durante o período gravídico-puerperal (Silva et al., 2020). 

Este estudo teve como objetivo caracterizar as mulheres que realizaram o pré-natal no Brasil, de acordo com variáveis sociodemográficas e raça/cor, além de verificar a associação entre indicadores de cuidado pré-natal e a raça/cor das mulheres, reconhecendo a importância da pesquisa científica sobre o acesso das mulheres a serviços qualificados, vítimas de preconceito e discriminação (Dalenogare et al., 2020).

METODOLOGIA

Este estudo foi elaborado mediante uma abrangente revisão bibliográfica de natureza narrativa, conduzida com um enfoque exploratório. A pesquisa foi meticulosamente realizada, embasada em uma ampla gama de fontes acadêmicas reconhecidas, tais como a Scientific Electronic Library Online (SciELO), a Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), o Pubmed, a Literatura Latino-americana e do Caribe de Ciências da Saúde (LILACS), bem como nos registros ministeriais do Ministério da Saúde e nos acervos da Base de Dados de Enfermagem (BDENF). Para a condução da busca bibliográfica, foram selecionados criteriosamente descritores específicos, a saber: saúde mental, humanização do parto, violência obstétrica e vulnerabilidade.

Dos 41 artigos pesquisados, após realizada uma leitura analítica, crítica, seletiva e imparcial, foram selecionados 20 artigos para análise. Destes, 4 artigos foram excluídos por abordarem exclusivamente o parto cesáreo, 8 artigos foram descartados por serem anteriores ao ano de 2019, 2 artigos foram eliminados por não apresentarem uma definição clara de vulnerabilidade no contexto da saúde, 3 artigos foram identificados como duplicatas e, portanto, excluídos, 3 foram descartados por não abordarem a questão da humanização do parto, 3 foram excluídos por não tratarem da violência obstétrica e 1 foi eliminado por não discutir o impacto da violência obstétrica na vida das mulheres, especialmente aquelas em situação de vulnerabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÕES:

O estudo, que entrevistou 2.000 mulheres que deram à luz em hospitais públicos e privados, constatou que 25% sofreram algum tipo de VO e 23% ouviram comentários agressivos durante o parto. Embora a maternidade seja uma das experiências mais gratificantes para a mulher, a concepção, gravidez e medo do parto foram considerados as situações mais adversas vividas (Assis et al., 2021).

Os resultados das pesquisas examinadas revelam a prevalência e a gravidade da violência obstétrica (VO) no Brasil, sublinhando a necessidade premente de políticas públicas eficazes para erradicar essa prática. A pesquisa da Fundação Perseu Abramo (2010) demonstrou que 25% das mulheres que deram à luz em hospitais públicos e privados no Brasil foram vítimas de algum tipo de violência obstétrica, com 23% relatando terem ouvido comentários agressivos durante o parto.

Estes dados são alarmantes e indicam a urgência de medidas concretas para mitigar essa violência. Assis et al. (2021) corroboram esses achados, detalhando as violências físicas, verbais e psíquicas sofridas, enquanto a Lei de Santa Catarina nº 17.097/2017 reforça a definição jurídica da VO, norteando as ações de prevenção e punição.
A investigação de Assis et al. (2021) expande a compreensão ao especificar os tipos de violência infligidos às mulheres durante o parto, incluindo a negação da autonomia da gestante, a exclusão da participação nas decisões, ofensas verbais e psicológicas, procedimentos desnecessários e dolorosos, recusa de analgesia, uso inadequado de episiotomia e impedimento do contato imediato entre mãe e bebê.

Esses elementos sublinham a necessidade de uma abordagem holística e centrada na mulher durante o parto.

Cavalheiro et al. (2021) destacam a importância de iniciativas globais, como a declaração “Prevenindo e Eliminando Abuso, Desrespeito e Maus-Tratos no Parto em Instituições de Saúde”, evidenciando a VO como uma questão de saúde pública. A implementação da Iniciativa Hospitalar e a recomendação da OMS para o acompanhamento da gestação de baixo risco por enfermeiros obstétricos, conforme  Nascimento et al. (2020), são estratégias cruciais para a redução da VO. Essas iniciativas sublinham a relevância dos profissionais de saúde na mitigação da VO e na promoção de um parto humanizado.

Conceição et al. (2023) destacam os efeitos deletérios da VO na saúde mental das mulheres, evidenciando que a falta de informações adequadas, dor física e procedimentos realizados sem consentimento aumentam as probabilidades de desenvolvimento de sintomas depressivos pós-natais. Esta condição, que afeta 17,2% das mulheres globalmente, possui consequências graves para a interação mãe-bebê e o desenvolvimento infantil. Portanto, assegurar um atendimento respeitoso e informativo durante o parto é fundamental para a saúde mental das mulheres.

Vieira et al. (2020) discutem a violência obstétrica institucional, material e midiática, sublinhando que a violência institucional é a mais prevalente nas maternidades públicas brasileiras. A objetificação das gestantes como meros meios de intervenções impede que elas exerçam seus direitos constitucionais e perpetua um ciclo de desrespeito e abuso. Este tipo de violência reflete a necessidade de mudanças estruturais e culturais nas instituições de saúde.

Matos et al. (2021) e Florêncio e Moreira (2021) oferecem soluções práticas para mitigar a VO, como o uso do plano de parto e a consideração das diversas vulnerabilidades em saúde. O plano de parto é uma ferramenta valiosa que promove a comunicação eficaz entre a mulher e a equipe de saúde, permitindo que a gestante expresse suas necessidades e desejos. A identificação das vulnerabilidades, incluindo aspectos psicossociais e culturais, é essencial para a prestação de um cuidado equitativo e respeitoso.

A análise de Passos et al. (2020) sobre a violência que atinge a juventude negra e a negação da maternidade às mulheres negras devido ao racismo revela uma dimensão interseccional da VO. As interseções entre racismo e violência obstétrica, discutidas por Campos et al. (2023), mostram uma continuidade histórica de discriminação e exclusão. Segundo Oliveira e Kubiak (2019), ressaltam que a violência obstétrica contra mulheres negras é uma forma de intolerância que perpetua desigualdades.

Estudos sobre mulheres com deficiência, como o de Thomaz et al. (2020), indicam a necessidade de adaptações nas maternidades para reduzir a mortalidade materna e infantil. A vulnerabilidade das mulheres em situação de rua, conforme Schiav et al. (2023), e a associação dessas mulheres à prostituição e marginalização destacam a necessidade de políticas inclusivas que garantam o acesso aos cuidados de saúde. 

A análise de Santos et al. (2021) e Silva et al. (2020) sobre mulheres em privação de liberdade revela que, apesar da Lei Federal 11.942/2009 assegurar cuidados durante o período gestacional e pós-parto, desafios persistem no acesso à assistência médica. A violência física e sexual entre mulheres privadas de liberdade, mencionada por Silva et al. (2020), e a atenção à saúde reprodutiva de mulheres imigrantes, discutida por Supimpa et al. (2023), evidenciam a necessidade de uma abordagem holística e inclusiva na assistência ao parto.

A violência contra gestantes varia entre 1,2% e 66%, dependendo da modalidade específica. Entre mulheres privadas de liberdade, a escassez de pesquisas limita comparações, mas indica a ocorrência de violência física e sexual (Silva et al., 2020). A atenção à saúde reprodutiva de mulheres imigrantes também é crucial, devido às vulnerabilidades e formas de violência decorrentes das disparidades sociais, de gênero, sexuais e reprodutivas (Supimpa et al., 2023). A proposta de humanização da assistência ao parto no Brasil destaca diferentes percepções e desafios, sobretudo em contextos institucionais e sociais diversos (GIACOMINI; OLÍVIA, 2019).
Por fim, Dalenogare et al. (2020) enfatizam a importância de caracterizar as mulheres que realizam o pré-natal no Brasil, considerando variáveis sociodemográficas e raça/cor, para entender melhor as disparidades no acesso e na qualidade dos cuidados pré-natais. A pesquisa científica sobre preconceito e discriminação no acesso aos serviços de saúde é crucial para o desenvolvimento de políticas que garantam a equidade e a justiça na assistência obstétrica.

Em suma, os estudos analisados destacam a complexidade da violência obstétrica e a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e interseccional para seu combate. A implementação de políticas públicas, a capacitação de profissionais de saúde e o empoderamento das mulheres são estratégias fundamentais para a erradicação da VO e a promoção de um parto humanizado e respeitoso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

A violência obstétrica (VO) continua sendo uma preocupação significativa no contexto da saúde materna, tanto no Brasil quanto em outras partes do mundo. Os resultados deste estudo, em consonância com outras pesquisas, destacam a prevalência alarmante da VO e suas ramificações negativas para a saúde física, emocional e psicológica das mulheres (Assis et al., 2021). A complexidade desse fenômeno requer uma abordagem abrangente e interdisciplinar para sua prevenção e erradicação.

As políticas públicas implementadas ao longo dos anos no Brasil têm sido um passo importante na direção certa, visando a transformação do modelo de atenção obstétrica e a promoção de um parto humanizado e baseado em evidências científicas (GABIRA et all., 2023). No entanto, como evidenciado neste estudo, ainda há desafios significativos a serem enfrentados. A VO persiste em diversos contextos, especialmente em maternidades públicas, onde as gestantes muitas vezes são tratadas com desrespeito e submetidas a práticas desnecessárias e dolorosas.

A marginalização dessas mulheres nas políticas de saúde pública amplifica as desigualdades, sublinhando a necessidade de uma atenção específica e direcionada.

A capacitação dos profissionais de saúde e a conscientização sobre os direitos das gestantes são aspectos fundamentais na luta contra a VO (Nascimento et al., 2020). A implementação de estratégias como o plano de parto e a consideração das diversas vulnerabilidades em saúde são passos concretos na direção de um cuidado mais centrado na mulher e respeitoso com sua autonomia e dignidade (Matos et al., 2021; Florêncio; Moreira, 2021).

É crucial reconhecer as interseções entre raça, classe social, gênero e outras formas de discriminação na experiência da VO (Passos et al., 2020). As mulheres negras, com deficiência, em situação de vulnerabilidade social e outras minorias enfrentam desafios adicionais no acesso aos cuidados pré-natais e no parto, ampliando as disparidades existentes.

Além disso, nota-se uma escassez de pesquisas científicas sobre o significado de vulnerabilidade na saúde, principalmente no contexto das mulheres no momento da maternidade. A falta de estudos sobre as mulheres com deficiência cognitiva, auditiva ou de fala é preocupante, pois essas mulheres enfrentam desafios únicos no acesso aos cuidados de saúde reprodutiva. Essas deficiências podem criar barreiras significativas à comunicação e ao entendimento, dificultando a provisão de cuidados adequados e respeitosos.

Outra lacuna identificada é a falta de pesquisa sobre os instrumentos disponíveis para a equipe de enfermagem no momento da assistência no pré-natal, parto e pós-parto. O desenvolvimento e a avaliação de protocolos de atendimento específicos para as diferentes etapas do processo reprodutivo podem contribuir significativamente para a melhoria da qualidade e da segurança do cuidado obstétrico. Protocolos bem elaborados podem garantir que as práticas de enfermagem sejam consistentes, seguras e baseadas em evidências.

Diante dessas lacunas, sugerimos a realização de estudos mais aprofundados sobre a maternidade das mulheres vulneráveis, explorando suas necessidades, desafios e experiências no contexto da assistência obstétrica. Essas pesquisas podem fornecer insights valiosos para o desenvolvimento de políticas e práticas mais inclusivas e sensíveis às necessidades das mulheres em situações de vulnerabilidade, promovendo uma maternidade mais segura, respeitosa e equitativa para todas. A investigação contínua e a implementação das descobertas dessas pesquisas são essenciais para a criação de um sistema de saúde que verdadeiramente atenda a todas as mulheres, independentemente de suas circunstâncias sociais, econômicas ou físicas.

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1RA: 12523210167;
2RA: 1252320918