REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11218369
Paulo Miqueias Freitas de Oliveira1
Ana Beatryz Alves Rezende2
Resumo
Introdução: O atendimento e acompanhamento do cirurgião-dentista durante a gestação é de suma importância, tendo em vista, as diversas variações fisiológicas, hormonais e arquitetônicas que a mulher pode apresentar. Dentre essas mudanças, alterações na qualidade da cavidade bucal podem estar presentes, como cárie e doenças periodontais. Objetivo: Relatar, por meio de uma revisão de literatura, a importância do atendimento odontológico durante a gestação, assim como, evidenciar as principais alterações e cuidados com a gestante e criança. Metodologia: Realizou-se uma busca exploratória nos principais bancos de dados, como PubMed, Google Acadêmico e Scielo, levando em consideração os trabalhos publicados do ano de 2010 a 2023. Utilizou-se as palavras chaves para busca: gestante, pré-natal odontológico, atendimento odontológico e cuidados. Revisão de Literatura: Observa-se que ainda há um impasse no atendimento durante o período gestacional, principalmente, pelos mitos presentes na sociedade. No entanto, o pré-natal odontológica é importante para manter a qualidade de vida da gestante e criança, uma vez que sintomas de dor e focos infecciosos são mais prejudiciais que o próprio atendimento. Além disso, já é evidente na literatura os protocolos de atendimento as gestantes, sejam eles preventivos, curativos ou cirúrgicos. Conclusão: Conclui-se que ainda é possível perceber uma considerável dificuldade dos atendimentos odontológicos nesse público, principalmente, pela razão das crendices na sociedade. Além disso, o profissional, antes de qualquer procedimento, deve levar em consideração o binômio risco-benéfico para a execução do atendimento e ser um promotor de saúde bucal.
Palavras chave: Atendimento Odontológico e Cuidados. Gestante. Pré-natal Odontológico.
Abstract
Introduction: The care and follow-up of the dental surgeon during pregnancy is of paramount importance, in view of the various physiological, hormonal and architectural variations that women can present. Among these changes, changes in the quality of the oral cavity may be present, such as caries and periodontal diseases. Objective: To report, through a literature review, the importance of dental care during pregnancy, as well as highlight the main changes and care for the pregnant woman and child. Methodology: An exploratory search was carried out in the main databases, such as PubMed, Google Scholar and Scielo, taking into account the works published from 2010 to 2023. The keywords for the search were used: pregnant, dental prenatal , dental care and care. Results: It is observed that there is still an impasse in care during the gestational period, mainly due to the myths present in society. However, dental prenatal care is important to maintain the quality of life of pregnant women and children, since symptoms of pain and infectious outbreaks are more harmful than the care itself. In addition, it is already evident in the literature the care protocols for pregnant women, whether preventive, curative or surgical. Conclusion: It is concluded that it is still possible to perceive a considerable difficulty in dental care for this public, mainly due to beliefs in society. In addition, the professional, before any procedure, must take into account the risk-benefit binomial for the execution of the service and be an oral health promoter.
Keywords: Dental Care and Care. Pregnant. Prenatal Dental.
Introdução
A Odontologia contemporânea busca tratar o ser humano como um todo, ou seja, de forma holística o processo de avaliação do processo saúde bucal e sistêmica (Massoni et al., 2015). Isso se dar pela razão de existir condições que tornam suscetíveis o paciente ao surgimento de doenças sistêmicas das quais tem-se sua origem da cavidade bucal, como, por exemplo, a doença periodontal, onde por meio de micro-organismos podem desenvolver diversas infecções crônicas, respiratórias e cardíacas (LIMA et al., 2011).
A medicina obstétrica considera uma mazela a o parto prematuro, uma vez que, é responsável pela maior causa de morbidade e mortalidade entre crianças e recém-nascidos (TURTON et al., 2017). No entanto, nascimentos de bebês prematuros e com baixo peso estão geralmente associados a atrasos ou nenhum atendimento pré-natal executados ao longo do período gestacional (Massoni et al., 2015). Assim, os cuidados para reduzir os efeitos desses fatores de risco através de intervenções preventivas durante o pré-natal são necessários (MARIQUE et al., 2019).
A saúde bucal é imprescindível para todas as pessoas, principalmente, mulheres durante o período da gestação, pós-parto e também no bebê (Massoni et al., 2015). A gestação é um período em que os cuidados com a saúde bucal devem ser intensificados, no entanto, o pré-natal odontológico é frequentemente negligenciada, o que pod influenciar na saúde do bebê (CONCHA SÁNCHEZ et al., 2020; PACHECO et al., 2020).
No ciclo da atenção à saúde da gestante, o pré-natal odontológico é indispensável, tendo em vista a execução de atividades educacionais e preventivas, como a promoção da saúde, diagnóstico precoce de doenças, assim como a prevenção de enfermidades. (Massoni et al., 2015) Os cuidados odontológicos pré-natais, promovem a saúde materno-infantil, uma vez que, mulheres grávidas caracterizam um grupo de risco para doenças bucais devido às suas alterações físicas, hormonais, biológicas e comportamentais, além da elevada prevalência de cárie e doenças periodontais na gestação (Saliba et al., 2019). Há relatos na literatura do surgimento de patologias bucais durante essa fase, doenças essas como a doença periodontal, onde o avanço pode influenciar a ocorrência de desfechos desfavoráveis, como recém-nascidos prematuros e de baixo peso (ALMEIDA, 2014; BASTOS et al., 2014; MARTINELLI et al., 2020).
Justificativa
A saúde bucal durante a gestação é essencial para a saúde sistêmica e, quando há precariedade, pode vir a interferir negativamente na qualidade de vida dos indivíduos, tanto social, psíquico e gestacional.
O impacto da saúde bucal sobre a saúde sistêmica evidencia a necessidade de, quando a procura por algum tipo de atendimento, que o indivíduo consiga ter uma avaliação de forma integral e multiprofissional. O atendimento odontológico durante a gestação impulsiona hábitos saudáveis, tendo em vista ser uma fase da vida em que a gestante encontra-se receptiva a novos hábitos. Este pode ser o momento mais adequado para mãe analisar o estado de sua condição de saúde bucal, para concretizar sua importância e real necessidade.
O atendimento a gestantes ainda apresenta diversas crendices, pois as mesmas normalmente não procuram o atendimento pela desinformação da sua importância ou por acreditar que possa implicar em ameaça tanto para sua saúde, como para a de seu filho. Devido a isso, o conhecimento empírico e crenças populares, como riscos da anestesia, hemorragias e tomadas radiográficas, faz-se essas mulheres a não realizarem atendimentos odontológicos preventivos ou curativos.
Objetivos
Objetivo Geral:
- Relatar a importância da realização do pré-natal odontológico por meio de uma revisão de literatura.
Objetivos Específicos:
- Demonstrar as principais alterações fisiológicas durante o período da gestação.
- Relatar as alterações patológicas mais acometidas no período gestacional.
- Evidenciar as principais formas de manejo utilizado no tratamento odontológico em gestantes.
Metodologia
Para realização do artigo na modalidade revisão de literatura, adotou-se uma busca exploratória nos principais bancos de dados, tais como: Google Acadêmico, Pubmed, e Scielo, levando em consideração os artigos publicados no intervalo de tempo de 2010 a 2023. Adotou-se para busca as seguintes palavras chaves: gestação, saúde bucal, gestante, alterações bucais e alterações bucais.
Referencial Teórico
- Pré-natal Odontológico
Toda gestante deve ter acesso à assistência do pré-natal odontológico, pois garante o acompanhamento e monitoramento da saúde bucal da mãe e, futuramente, do bebê, para que se possa prevenir, detectar ou intervir nas mudanças patológicas que ocorram neste período, além de orientar sobre os aspectos da gestação, parto, pós parto e cuidados com o recém-nascido (ARAUJO et al., 2010).
Diversas literaturas comprovam a importância do cirurgião-dentista como membro da equipe do pré-natal, no entanto, a própria Política Nacional de Saúde Bucal diz que ao iniciar o acompanhamento, deve ter a consulta com o cirurgião-dentista, para que se possa orientar, avaliar condições de tecidos moles, doença periodontal e cárie dentária, além de reabilitar, elegendo o segundo trimestre como o melhor período para este último processo (MARIQUE et al., 2019). Apesar dessa política existente, o cuidado odontológico nem sempre está inserido ao pré-natal, portanto, sendo pouco efetivo na prática (FERREIRA et al., 2016).
É primordial que haja o empenho do cirurgião-dentista, assim como dos demais profissionais que atuam na linha de cuidado à gestante para que haja a quebra de paradigmas sociais e/ou desmistificar saberes populares sem comprovação científica, bem como, informar sobre as patologias bucais, controle da placa, uso de flúor e cuidados necessários com a chegada do bebê (MOIMAZ et al., 2011).
- Alterações hormonais e fisiológicas em gestantes
O ciclo gestacional é uma fase constantemente marcada por várias alterações, tanto físicas, biológicas, hormonais, anatômicas e psicológicas (Saliba et al., 2019; Silva et al, 2020). Dentro da normalidade, a gestação dura por volta de 9 meses, mais especificamente 40 semanas, períodos que são divididos por trimestres, onde cada trimestre terá alterações fisiológicas importantes que devem ser conhecidas pelo cirurgião-dentista, afim de saber estabelecer os cuidados necessários de acordo com as fases (Moimaz et al., 2015; Reis et al., 2010).
Na fase inicial da gestação (primeiro trimestre) a existência de náuseas e vômitos é comum na maioria das mulheres, podendo persistir por toda gestação (MARIQUE et al., 2019). Estes são ocasionados pelo desequilíbrio da ação metabólica, provocado pelo aumento das taxas hormonais, inclusive a progesterona (Reis et al., 2010).
Entre a 25° e 36° semana de gestação, observa-se na mulher uma discreta elevação da pressão arterial que pode vir acompanhada de taquicardia, sendo uma condição considerada normal, onde, pode-se ocorrer um diagnóstico de hipertensão durante a gravidez quando os níveis da pressão arterial encontram-se maiores que 140/90 mmHg. Este aumento da pressão pode ser classificado como pré-eclâmpsia, quando a hipertensão arterial aparece depois da 20° semana de gestação ligada a proteinúria (Aleixo et al. 2016; Reis et al., 2010). Em relação ao sistema respiratório, alterações fisiológicas como o aumento no consumo de oxigênio de cerca de 15 a 20% e a capacidade de reserva funcional diminui pela compressão do diafragma pelo constante aumento do tamanho do útero, eleva o risco de dispneia e apneia na posição supina (Aleixo et al. 2016; Bastos et al., 2014; Lessa, 2013; Reis et al., 2010).
O útero gravídico, já no terceiro e último trimestre, causará compressão da artéria aorta e veia cava, aumentando a chance da mulher apresentar hipotensão ortostática, quando em posição supina (Bastos et al., 2014; Reis et al., 2010). Durante a evolução da gravidez, o aumento do volume uterino, comprime o estômago, e consequentemente leva ao aumento do número de refeições em menores quantidades. Esse aumento da frequência de alimentação associado a falta de uma boa higiene bucal, eleva a probabilidade do desenvolvimento da doença cárie na gestante (Reis et al., 2010).). O aumento do volume uterino leva ao ganho de peso e frequente necessidade de urinar (Almeida, 2014; Bastos et al., 2014; Konzen Júnior et al., 2019).
A gravidez é um período transitório, e a variedade de mudanças ocorridas dá-se pela influência contínua de hormônios, como estrogênio e progesterona, onde, a elevação destes vai se apresentar de variados sinais e sintomas, que podem modificar o estado de saúde geral, interferir na cavidade bucal, exacerbando patologias como as doenças periodontais (Marla et al., 2018; Silva et al., 2020).
- Alterações bucais
A boca, como parte integrante do organismo, também pode passar por modificações na gravidez (Reis et al., 2010). Com as alterações hormonais, observa-se um aumento na vascularização periférica, aumento do fluxo de fluido gengival, aumento da síntese de prostaglandinas e maior permeabilidade dos vasos sanguíneos da gengiva pelo aumento de progesterona, o que pode levar ao início de processos inflamatórios, com a presença do biofilme dental, ou ao aumento da intensidade dos mesmos (Aleixo et al., 2016; Catão et al., 2015; Reis et al., 2010).
Nessa fase, juntamente com a maior vascularização do tecido periodontal, onde Saliva e colaboradores (2019) correlaciona tal acontecimento pela presença de biofilme, a elevação dos níveis de estrogênio e progesterona, carências nutricionais e ainda o estado transitório de imunodepressão, ocorre também, uma hipersecreção das glândulas salivares, especialmente nos meses iniciais da gestação, onde este fenômeno (sialorreia) não tem ainda uma causa definida, podendo durar a gestação inteira (Lessa, 2013; Reis et al., 2010). Diversas são as manifestações de alterações bucais que podem ser encontradas na gravidez, onde as mais comuns são a doença periodontal, cárie dentária e granuloma gravídico, no entanto, vale salientar que o período da gravidez não é um fator determinante para o surgimento de tais ocorrências, e podem ser evitáveis (Almeida, 2014; Catão et al., 2015; Moimaz et al., 2015; Saliba et al., 2019).
- Predisposição de doenças bucais em gestantes
Várias são as alterações bucais que podem ocorrer no período da gestação, dentre as mais comuns, temos as doenças periodontais e a cárie dentária (Reis et al., 2010). É enfatizar que as alterações hormonais refletem na fisiologia oral, e que alteram o equilíbrio normal da boca, porém, a gravidez não é um fator determinante para o aparecimento de tais manifestações, o que ocorre, é que essas alterações se já preexistentes, tendem a se agravar, principalmente se houver descuido da saúde bucal (Lira et al., 2019). Então, os cuidados da saúde bucal durante o período gestacional são de grande importância, por mais que a maioria da população não tenha conhecimento das alterações relativas a esse período (Reis et al., 2010; Massoni et al., 2015).
A cárie dentária é uma doença multifatorial, e existem evidências do aumento da incidência de cáries em mulheres grávidas, sendo que o principal fator para tal aparecimento é a presença do biofilme dental (Massoni et al., 2015). O estado das lesões cariosas durante a gestação pode ser sugestionado por fatores comportamentais, visto que, ocorre uma mudança nos padrões alimentares, onde a gestante passa a ter um consumo constante de alimentos adocicados, o que leva a diminuição do pH oral, favorecendo a produção de ácidos e, consequentemente, a desmineralização e posteriormente o aparecimento da lesão (Costa et al., 2017; Lessa, 2013; Marla et al., 2018; Oliveira et al., 2014).
Os episódios de vômitos, também levam a diminuição do pH bucal e capacidade tampão saliva, que podem interferir no aparecimento da cárie dentária (Costa et al., 2017). A incidência da cárie é ainda ampliada, pela questão que, os enjoos matinais, levam também a erosão das superfícies dentárias, além de atrapalhar os hábitos de higiene oral de rotina (Bastos et al., 2014; Marla et al., 2018). A escovação dentária é imprescindível para a prevenção da doença cárie, pois evita o processo de desmineralização do esmalte dentário e desorganiza a placa bacteriana (Massoni et al., 2015).
A ocorrência de cárie dentária não está diretamente ligada à gravidez, no entanto, contribui para essa condição (Aleixo et al., 2016). A falta de cuidados adequados; e, consequentemente, a exposição ao ácido gástrico; a frequência alimentar costuma ser aumentada, além de mudanças alimentares, com inclusão de alimentos cariogênicos (Reis et al., 2010).
A doença periodontal é uma infecção bacteriana, advinda da associação do biofilme dental não removido com os tecidos periodontais, e tal infecção, além de levar a problemas na cavidade oral (como a gengivite e periodontite), pode levar ao desenvolvimento de problemas sistêmicos durante a gestação, como um parto pré-maturo, por meio da liberação de mediadores que podem estimular a musculação uterina (Catão et al., 2015). A inflamação gengival, observada no período da gestação, normalmente recebe o nome de gengivite gravídica e é intensificada pela produção dos hormônios sexuais femininos, que provocam alta produção de prostaglandinas, aumentando o processo inflamatório na região (Aleixo et al., 2016). Geralmente, a gengivite gravídica inicia-se por volta do 3° a 4° mês de gestação e atinge sua maior severidade por volta do 8° mês, nesse período, ocorre um desenvolvimento de periodontopatógenos, como a Prevotella intermedia, e ao decorrer da gravidez a microbiota subgengival torna-se cada vez mais anaeróbia (Aleixo et al., 2016; Bastos et al., 2014; Reis et al., 2010; Saínz et al., 2019; Cardoso et al., 2021).
Ao longo da gravidez, os tecidos gengivais são mais susceptíveis a inflamação, porém, tal inflamação não ocorrerá em todas as mulheres, visto que, a uma forte influência da higienização saúde bucal da gestante, além da alimentação e os hábitos de higiene oral (Saínz et al., 2019). A mobilidade dentária também pode ser observada durante a gravidez e se dá ao agravamento do estado periodontal da gestante, por distúrbios na lâmina dura, que surgem pela microflora mais anaeróbia e o aumento de mediadores inflamatórias na região gengival (Marla et al., 2018).
Estudos científicos associam os mediadores da inflamação da doença periodontal com a diminuição do peso de crianças ao nascer, já que quando o periodonto infectado produz interventores que entram na circulação sistêmica, podem transpor a barreira corioaminiônica, sendo encontrado no fluido amniótico, e quando atingem de forma precoce os níveis, o trabalho de parto é iniciado, podendo ser detectados micro-organismos bucais no fluido, podendo a microflora disseminar no sangue (Lira et al., 2019; Marla et al., 2018).
Também induzido pelas alterações hormonais decorrentes da gravidez, outra alteração frequente encontrada em gestantes é o chamado granuloma piogênico (Marla et al., 2018). Este é considerado um tumor reativo, benigno, de maior prevalência em mulheres e encontrado em cerca de 5% das mulheres grávidas, por isso o nome bastante conhecido como “granuloma gravídico”. Sua etiologia é decorrente de traumas crônicos e por longa duração, como raízes residuais, dentes cariados e a presença de biofilme que culminam em tártaro dentário subgengival (Marla et al., 2018; Lira et al., 2019).
Clinicamente apresenta-se como um aumento de volume exofítico, de coloração rosa ao vermelho intenso, podendo ser de base séssil ou pediculada, com a superfície lisa ou lobulada e ainda ulcerada, geralmente nodular e bem circunscrito, com uma prevalência maior na maxila na região gengival, podendo surgir ainda em língua, mucosa, lábios e menos frequente em palato duro (Sá de Lira et al., 2019). Dependendo do volume, espera-se a regressão espontânea após o período da gravidez com normalização dos níveis hormonais (Bastos et al., 2014; Oliveira et al., 2014; Sá de Lira et al., 2019).
- Prevenção das alterações bucais
Quando se fala em cuidados com a saúde bucal durante o período gestacional, tem-se por objetivo o estabelecimento de uma condição saudável da mãe, e, consequentemente, também do seu bebê (Marla et al., 2018). Além disto, a inclusão de hábitos saudáveis, principalmente nessa fase, pode favorecer a prevenção de doenças bucais no início da infância da criança e que podem refletir na saúde bucal do indivíduo durante toda sua vida (Garbin et al., 2011; Silva et al., 2020).
A promoção de saúde, é uma estratégia para buscar a melhora na qualidade de vida da população, sendo assim, a Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde, que foi realizada em Ottawa, no Canadá, em 1986 determinou uma série de princípios éticos e políticos, definindo campos de ação, e de acordo com este documento, promoção de saúde é “o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo maior participação no controle desse processo” (Lessa, 2013).
A literatura descreve o desconhecimento das gestantes quanto as razões dos problemas bucais e o processo saúde-doença, e também na auto-percepção de saúde bucal (Marla et al., 2018). Diante disto, métodos educativos e a promoção de saúde se fazem eficazes para a melhora do conhecimento e interesse das gestantes sobre sua saúde bucal, e de como tais cuidados podem ser benéficos a elas (Mattos, Davoglio, 2015; Moimaz et al., 2015).
A gestante deve ser orientada quanto a importância do atendimento odontológico nessa fase, de forma acessível a procura e realizar o pré-natal odontológico, já que, o baixo acesso a atendimentos pode estar relacionado a vários fatores, principalmente, o desconhecimento da importância do acompanhamento pelo cirurgião-dentista (Mattos, Davoglio, 2015; Reis et al., 2010).
Medidas de auto cuidado, como a escovação dentária e uso de fio dental diários, mesmo sendo considerados a principal medida para prevenir problemas bucais no geral, ainda é considerado falho entre gestantes (Marla et al., 2018). Com isso, ainda há necessidade de aprimorar as diferentes formas de abordagens sobre a importância com a saúde bucal e doenças bucais (Moimaz et al., 2015).
Quando falamos da modificação de determinados hábitos, como por exemplo, da dieta da gestante, para alimentos com menos carboidratos e açúcares, que aumentam o risco de desenvolvimento da cárie dentária quando associada a falta de higienização bucal, não basta meramente recomendar a mudança, mas orienta-las sobre como executá-las e fazer com que tomem conhecimento dos benefícios, pois o ponto de partida de qualquer processo de intervenção é constituído na relação entre o ser humano e o conhecimento (Mattos, Davoglio, 2015).
- Cautelas no atendimento a gestantes
As gestantes durante o tratamento odontológico requerem cuidados especiais e abordagem diferenciada devido às alterações que são inerentes ao período gestacional, mas isso não significa que nenhuma necessidade de atendimento odontológico vindo de pacientes grávidas deve ser negligenciada por medo de expor a gestação em risco (Cardoso, 2010; Oliveira et al., 2014).
Esta condição, ao contrário do que se pensa, não impede a maioria dos tratamentos odontológicos realizados em rotina, como por exemplo, instruções de higiene oral, avaliação da condição bucal da gestante, profilaxias, raspagens e alisamentos radiculares, aplicação tópica de flúor, polimentos de restaurações, remoção de cárie e restaurações, visto que, tais cuidados odontológicos são de bem menos risco ao bebê do que por exemplo o aumento de prostaglandinas por causa de um foco infeccioso na cavidade oral (Marla et al., 2018). Contudo, estudos demonstram que qualquer tipo de intervenção odontológica pode e deve ser realizado no período gestacional, pois sabe-se que a manutenção da saúde bucal é de grande importância nesse período, e quando avaliado o risco-benefício para a saúde bucal, a intervenção odontológica é menos riscos do que a causa clínica propriamente dita (Almeida, 2014; Camargo et al., 2014; Cardoso, 2010; Moimaz et al., 2015; Oliveira et al., 2014).
O primeiro trimestre da gestação, é onde ocorre todos os fenômenos de desenvolvimento do embrião, que progride para à formação do feto, sendo então, um momento delicado, pois qualquer tipo de complicação, pode contribuir para o aparecimento de efeitos teratogênicos no feto em desenvolvimento, e ainda, ao aborto (Marla et al., 2018; Piccirillo, 2012). E falando em saúde bucal, geralmente a recomendação é que as pacientes gestantes passem apenas por avaliações, adequações do meio bucal e que sejam instruídas quanto à manutenção da sua saúde oral, não passando por intervenções invasivas (Almeida, 2014; Piccirillo, 2012; Rodrigues et al., 2017;)
Entretanto, é unânime entre autores, que os tratamentos devem ser preferencialmente realizados durante o segundo trimestre da gestação, pois este se caracteriza como o espaço de tempo de maior estabilidade da gravidez, sendo o 3° trimestre também, seguro para procedimentos eletivos, contudo, como corresponde a fase de término da gestação, causa maiores desconfortos à mãe (Marla et al., 2018; Oliveira et al., 2014; Rodrigues et al., 2017).
A prevenção sempre é priorizada, mas na presença de urgências e emergências, como dor, infecções e patologias comprometedoras, essas situações devem ser tratadas em qualquer período gestacional, por meio de endodontias, extrações, drenagens e remoções, uma vez que o risco instalado pode causar mais danos com o desenvolvimento do problema, do que com o tratamento quando feito um diagnóstico (Almeida, 2014; Camargo et al., 2014; Cardoso, 2010; Lopes et al., 2018; Martins et al., 2013; Oliveira et al., 2014).
As consultas odontológicas, muitas vezes podem ser motivo de grande estresse e ansiedade para as gestantes (Cardoso, 2010). Diante de tal quadro, algumas recomendações podem ser convenientes, como: a realização de consultas curtas, no período da segunda metade da manhã, monitoramento dos sinais vitais, como frequência cardíaca e pressão da paciente a observação do nível de glicose no sangue, a optação por procedimentos mais conservadores e menos invasivos, adequação do posicionamento da cadeira odontológica, com o encosto da cadeira ligeiramente elevado ou a paciente em posição de decúbito lateral esquerdo, evitando prolongadas posições supinas (principalmente no terceiro trimestre, pois o aumento da pressão uterina pode provocar náuseas, tonturas e síndrome hipotensiva supina (Camargo et al., 2014; Lopes et al., 2018; Marla et al., 2018; Cardoso et al., 2021).
Aos procedimentos que requerem o uso de anestésicos locais, estes de maneira geral, podem ser usados com segurança na gestante (Almeida, 2014; Camargo et al., 2014; Cardoso, 2010). Mas algumas ressalvas como, que a Prilocaína e Articaína devem ser evitadas pelo risco de ocorrer metemoglobinemia (Martins et al., 2013). O vasoconstritor Felipressina também deve ser evitada pelo risco de diminuir a circulação placentária, além de dificultar a fixação do embrião ao útero e ainda induzir contrações uterinas, mesmo os efeitos adversos sendo observados apenas na administração de altas doses do medicamento, o que não é observado em procedimentos odontológicos de rotina (Bastos et al., 2014; Saliba et al., 2019). Diante disto, dentre os diversos anestésicos disponíveis no mercado, o sal anestésico mais recomendado para a utilização em gestante compreende a Lidocaína a 2% (Almeida, 2014; Rodrigues et al., 2017). Quanto ao vaso constritor, se não tiver nenhuma contra indicação sistêmica, estes devem sim ser usados, pois prolongam o efeito anestésico, aumentando o tempo de trabalho, consequentemente, dando mais conforto para a paciente, diminuem a quantidade de doses e a toxicidade, onde o mais indicado para gestantes é epinefrina/adrenalina 1:100.000 juntamente com a Lidocaína 2%, no máximo 2 tubetes por sessão (Bastos et al, 2014; Rodrigues et al., 2017; Saliba et al., 2019).
Em relação ao uso de medicamentos prescritos, o ideal é que em uma gravidez não se utilize medicamentos, contudo, mesmo os indicados, devem ser utilizados em casos de real necessidade, pois grande maioria dos medicamentos utilizados tem a capacidade de ultrapassar a barreira placentária (Camargo et al., 2014). Más formações fetais são geralmente causadas pelo uso de medicamentos no primeiro trimestre da gestação, fase essa onde encontra-se o desenvolvimento dos folhetos embrionários. A exposição a medicamentos no segundo e terceiro trimestres estão relacionados a efeitos de funcionamento dos órgãos do bebê (Cardoso, 2010). Todas as drogas possuem concentrações que não devem ser ultrapassadas na sua utilização no período gestacional, o que tem de ser de conhecimento do cirurgião-dentista para evitar possíveis anormalidades no feto (Bastos et al, 2014).
O uso de medicação na fase gestacional deve ser avaliado, em relação a antibióticos, a penicilina tem sido considerada para primeira escolha nos tratamentos de infecções bucais, enquanto que ao uso de anti-inflamatórios, estes devem ser usados com grande cautela, pois são contraindicados durante a gravidez, principalmente no último trimestre da gestação, pois os anti-inflamatórios não esteroidais (AINE’s) podem provocar inércia uterina e/ou um fechamento prematuro no canal arterial do feto, hipertensão arterial pulmonar, prolongar o trabalho de parto, e se associados ao uso de Aspirina podem interferir na agregação plaquetária, predispondo a hemorragias em casos de cirurgias odontológicas (Bastos et al., 2014; Camargo et al., 2014; Saliba et al., 2019). Sobre o uso de analgésicos, o Paracetamol seguido da Dipirona sódica são considerados seguros para uso contra dor orofacial na gestação (Bastos et al., 2014; Saliba et al., 2019).
Os exames radiográficos não precisam ser adiados durante a gestação, podendo ser realizados sempre que necessário, pois sabe-se que as doses de radiação utilizadas nas tomadas radiográficas odontológicas são insignificativas para causar algum tipo de má formação no feto em desenvolvimento (Cardoso, 2010). As gestantes devem ser informadas em relação à segurança de tais exames radiográficos, além disso, o uso de filmes ultrarrápidos, o uso de colares tireoidianos, não direcionamento da ampola para o abdômen, o maior cuidado para não ocorrer erro da técnica para evitar repetição do exame, e ainda o uso do avental de chumbo, que se encontra cobrindo todo o abdômen da gestante, garantem uma eficaz proteção para a futura mamãe (Moimaz et al., 2017; Piccirillo, 2012).
Discussão
O pré-natal odontológico durante a gestação é uma prática importante para a saúde bucal da mãe e do bebê, pois é uma fase onde as gestantes encontram-se receptiva e apresenta diversas alterações fisiológicas, hormonais e comportamentais (CORREDOR et al., 2014). De acordo com estudos de Costa (2014), a realização do pré-natal odontológico reduz a incidência de cárie dentária e doença periodontal em gestantes, em razão de estarem em acompanhamento rotineiro com o cirurgião dentista, tanto curativo e preventivo (Bastos et al, 2014). Além disso, a prevenção de problemas bucais durante a gestação pode reduzir o risco de parto prematuro e baixo peso ao nascer, como evidenciado nos estudos de (MARTINELLI et al., 2020).
As principais alterações fisiológicas durante a gestação incluem aumento dos níveis hormonais, aumento da circulação sanguínea e redução da imunidade. Estas alterações podem levar a um aumento na sensibilidade, sangramento gengival, desenvolvimento de cárie dentária e aparecimento de lesões oportunistas dessa fase, como o granuloma gravídico. Por isso, o pré-natal odontológico é fundamental para monitorar e tratar essas condições (COSTA, 2014). No entanto, ainda continua sendo um impasse em muitos locais. Como evidenciado por Lima e colaboradores (2011), ainda há locais que não fazem esse acompanhamento em gestante ao longo dos meses.
As alterações patológicas na boca durante a gestação também são comuns. No trabalho de SALVATERRA e colaboradores (2017), relatam que a doença periodontal, por exemplo, pode ser agravada pelo aumento dos níveis hormonais durante a gestação, o que pode levar a um maior risco de perda dentária. Além disso, as gestantes podem apresentar lesões de cárie, infecções dentárias, hiperplasia gengival e alterações salivares, que podem afetar a saúde geral da mãe e do bebê e, em casos mais severos, levando ao parto prematuro (Bastos et al, 2014).
O protocolo medicamentos já é bem estabelecido na literatura quando levado em consideração o emprego a gestante. Dentre os diversos analgésicos disponíveis, de acordo com Silva, Sanches (2017), o acetominofeno (paracetamol) é o mais indicado quando há necessidade e na classe dos antibióticos, considera-se de primeira escolha a amoxicilina. E, quando necessário a utilização de anestésico local, a lidocaína 2% com com epinefrina na concentração de 1:100.000 é o sal anestésico e vaso constritor, respectivamente, primeira escolha em gestante, não devendo ultrapassar o limite de três tubetes por sessão.
Existem diversos tabus ainda presentes na sociedade sobre a intervenção odontológica durante essa fase da mulher, principalmente, quanto nas tomadas radiográficas. De acordo com o trabalho de Silva, Sanches (2017), as tomadas radiográficas podem ser realizadas, preferencialmente, após o primeiro trimestre. Quando realizado, deve-se adotar medidas de proteção a gestante e ao bebê, como a utilização filmes ultrarrápidos, posicionadores e avental plumbífero (PACHECO et al., 2020).
A realização do pré-natal odontológico em gestantes é fundamental para prevenir e tratar problemas bucais, dos quais podem vir a comprometer a saúde da mãe e bebê. De forma geral, os profissionais da saúde da área multiprofissional devem estar preparados para identificar e tratar essas condições, seguindo um protocolo de atendimento específico para gestantes, a fim de possibilitar uma gestante livre de intercorrências, paradigmas e crendices.
Referências Bibliográficas
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1paulo.miqueias1232@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0009-0003-8996-0795
2Email: bia.3rk@gmail.com