A PROPOSAL FOR A ENTRUSTABLE PROFESSIONAL ACTIVITY (EPA) ON COPPER T Cu 380 INTRAUTERINE DEVICE (IUD) INSERTION IN PRIMARY HEALTH CARE (PHC) FOR FAMILY AND COMMUNITY MEDICINE RESIDENCY PROGRAMS (PRMFC)
PROPUESTA DE ACTIVIDAD PROFESIONAL FIABLE (APC) EN COBRE T INSERCIÓN DE DISPOSITIVO INTRAUTERINO DE Cu 380 EN ATENCIÓN PRIMARIA PARA PROGRAMAS DE RESIDENCIA EN MEDICINA FAMILIAR Y COMUNITARIA
REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11176276
David Barbosa de Souza Junior1
Laura Lima Vargas Baldow2
RESUMO
A formação de especialistas em Medicina de Família e Comunidade (MFC) demanda aquisição de competências específicas. A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) desenvolveu o Currículo Baseado em Competência (CBC), sendo um marco e avanço para os Programas de Residência de Medicina de Família e Comunidade (PRMFC) no Brasil. A aplicação prática do CBC e a mensuração das competências, habilidades e atitudes dos residentes em MFC são um desafio ainda. As Atividades Profissionais Confiabilizadoras (APCs) surgiram com o intuito de operacionalizar essa atividade. O presente trabalho tem como objetivo elaborar uma APC sobre inserção de DIU de Cobre T 380 na APS para programas de PRMFC. Inicialmente foi realizado revisão nas bases de dados nacional e internacional sobre o assunto entre os meses de abril a julho de 2023. As formas de treinamento para habilidades semelhantes mencionadas em artigos encontrados nas plataformas foram vídeos, palestras e treinamentos em modelos anatômicos. Não foram encontrados estudos na literatura científica nas bases de dados científicas online PubMed®, Cochrane®, BVS (Biblioteca Virtual em Saúde), Scielo (Scientific Electronic Library Online) e Google Acadêmico. A confecção dessa APC necessita de 8 seções, tendo como eixo orientador as competências expertise médica, cuidado com a pessoa, comunicação, desenvolvimento pessoal e profissional.
Palavras chaves: Dispositivo intrauterino. Atividade profissional confiabilizadora. Residência médica.
ABSTRACT
Training specialists in General Practice (GP) requires the acquisition of specific skills. The Brazilian Society of Family and Community Medicine (SBMFC) developed the CompetencyBased Curriculum (CBC), which is a milestone and advance for Family and Community Medicine Residency Programs (PRMFC) in Brazil. The practical application of the CBC and the measurement of competences, abilities and attitudes of residents in FCM are still a challenge. Entrustable Profissional Activites (EPAs) emerged with the aim of operationalizing this activity. The present work aims to discuss how the elaboration of an EPA on the insertion of a Copper T 380 IUD in the APS for PRMFC programs would be. Initially, a review was carried out in national and international databases on the subject between April and July 2023. No studies were found in the scientific literature in the online scientific databases PubMed®, Cochrane®, BVS (Biblioteca Virtual em Saúde) , Scielo (Scientific Electronic Library Online) and Google Scholar. The making of an EPA requires 8 sections, having as a guiding axis the competences medical expertise, care for the person, communication, personal and professional development.
Keywords: Intrauterine Device. Entrustable Profissional Activites. Internship and Residency.
RESUMEN
La formación de especialistas en Medicina Familiar y Comunitaria (FCM) requiere la adquisición de competencias específicas. La Sociedad Brasileña de Medicina Familiar y Comunitaria (SBMFC) desarrolló el Currículo Basado en Competencias (CBC), que es un hito y un avance para los Programas de Residencia en Medicina Familiar y Comunitaria (PRMFC) en Brasil. La aplicación práctica del CBC y la medición de las competencias, habilidades y actitudes de los residentes de FCM siguen siendo un desafío. Las Actividades Profesionales Confiables (APC) surgieron para poner en práctica esta actividad. El objetivo de este estudio es desarrollar un APC sobre la inserción de DIU de cobre T 380 en APS para programas de CFRP. Inicialmente, se realizó una revisión en las bases de datos nacionales e internacionales sobre el tema entre los meses de abril y julio de 2023. Las formas de capacitación para habilidades similares mencionadas en los artículos encontrados en las plataformas fueron video conferencias. No se encontraron estudios en la literatura científica en las bases de datos científicas en línea PubMed®, Cochrane®, BVS (Biblioteca Virtual en Salud), Scielo (Biblioteca Electrónica Científica en Línea) y Google Scholar. La elaboración de este APC requiere de 8 apartados, teniendo como eje rector las competencias de pericia médica, atención a la persona, comunicación, desarrollo personal y profesional.
Palabras clave: Dispositivo intrauterino. Actividad profesional fiable. Residencia.
1. INTRODUÇÃO
A formação do Médico de Família e Comunidade requer o desenvolvimento de competências específicas. A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) desenvolveu o Currículo Baseado em Competência (CBC) engendrado no Workshop dos canadenses realizado no Brasil em 2014. Os professores Cynthia Whitehead, Karl Iglar e Perle Feldman da Universidade de Toronto contribuíram para a confecção deste documento balizador da Matriz de Competências de Medicina de Família e Comunidade (MFC) publicado em 2019 (SBMFC, 2019).
Descrever as qualidades que o médico deve ter não se traduz diretamente nas suas atividades cotidianas (Cate, 2020). O CBC foi um avanço para orientação na formação dos especialistas em MFC no Brasil, mas sua organização desconexa de competências torna-o difícil para adaptação prática na clínica diária, além de não apontar estratégias de ensino, estágios de desenvolvimento ou forma de avaliar o educando (Costa et al., 2018).
As Atividades Profissionais Confiabilizadoras (APCs) foram criadas no intuito de sobrepujar a distância entre o CBC e a sua execução prática. Elas são unidades práticas profissionais confiáveis ao educando assim que ele demonstra a competência necessária para sua execução (Costa et al., 2018), ou seja, unidades de trabalho ou tarefas que devem ser realizadas na atenção ao paciente (Cate, 2020).
Vários países ocidentais, entre eles Estados Unidos da América (EUA), Canadá e Holanda estão buscando adotar as APCs para aprimorar seus currículos (FRANCISCHETTI; HOLZHAUSEN; PETERS, 2020). Sua implantação permite uma melhor viabilização do CBC e o aperfeiçoamento dos processos avaliativos (FRANCISCHETTI et al., 2020). Todavia, a introdução das APCs em programas de residência de MFC pode ser um desafio em função da complexidade do cuidado médico (Bonnie et al., 2019).
A inserção dos dispositivos intrauterinos (DIU) de cobre destaca-se entre os procedimentos ginecológicos (RODRIGUES et al., 2019a). Esse é um método anticoncepcional de longo prazo, necessita ser trocado somente dez anos após a inserção, é reversível, eficaz, possui poucos efeitos colaterais e apresenta ótimo custo-benefício. As taxas de gravidezes são menores que 1 em 100 mulheres/ano em pacientes que utilizam esse método e realizam revisão médica periódica, mas ainda assim é um método subutilizado no Brasil (RODRIGUES et al., 2019b).
O Brasil ainda enfrenta o desafio do planejamento reprodutivo devido ao alto percentual de gravidezes não planejadas. Estas constituem cerca de 55,4% entre as puérperas. Também é um dos fatores contribuintes ao abortamento e ao aumento da mortalidade materna, que em 2019 alcançou uma razão de 60,9 mortes a cada 100.000 nascidos vivos no país (DA SILVA BARRETO et al., 2021a).
A Atenção Primária à Saúde (APS) é um cenário importante para oferta do DIU, pois é a principal porta de entrada do usuário aos serviços de saúde, incluindo o planejamento reprodutivo. A ampliação das possibilidades de método contraceptivo permite ajustes à real necessidade dos usuários, além de favorecer uma melhor escolha destes (DA SILVA BARRETO et al., 2021a).
Estudos apontam taxa de dificuldade na inserção de DIU entre 3,6% e 20%, dentre as quais: identificação da posição uterina, identificar e pinçar o colo, realizar heterometria e presença de estenose do colo. É importante ressaltar que médicos encontram dificuldades no critério de elegibilidade, demonstrando uma real necessidade de treinamento durante a formação nos programas de residência em MFC (DA SILVA BARRETO et al., 2022b). A falta de treinamento constitui uma das principais barreiras que dificultam a ampliação e a inserção de DIU (DA SILVA BARRETO et al., 2021).
Confeccionar uma APC para inserção de DIU pode ser um caminho para habilitação da competência necessária. Marcos de desenvolvimento com metas precisas de progressão de competência orientaram o aprendizado e facilitariam a avaliação de forma eficaz (COSTA et al., 2018b). Escalas formais de supervisão estruturariam o papel do preceptor e sua relação com os aprendizes (ROMÃO, 2023).
Ressalta-se que a inserção e retirada de DIU fazem parte do CBC da Residência de MFC e da Carteira de Serviços da APS. É esperado que o médico atuante na APS tenha o treinamento e conhecimento necessários para ofertar e realizar este procedimento. Estudos sobre o DIU na APS podem ampliar o acesso e a oferta desse método de longa duração, possibilitando mais autonomia na decisão do planejamento familiar (DA SILVA BARRETO et al., 2021a). Diante do exposto, pretende-se elaborar uma APC sobre treinamento para inserção de DIU de cobre na APS para Programas de Residência de Medicina de Família e Comunidade (PRMFC).
2. OBJETIVOS
2.1 Objetivo Geral
Elaborar uma proposta de Atividade Profissional Confiabilizadora (APC) sobre treinamento de inserção de Dispositivo Intrauterino (DIU) de cobre na Atenção Primária à Saúde (APS) para Programas de Residência de Medicina de Família e Comunidade (PRMFC).
2.2 Objetivos Específicos
• Descrever como é realizado o treinamento para inserção de DIU nos PRMFC;
• Discorrer sobre o que é necessário para confecção de uma APC para inserção de DIU;
• Padronizar as etapas do procedimento entre residentes e preceptores de PRMFC;
3. METODOLOGIA
As buscas foram realizadas nos meses de abril, maio e junho de 2023, através das bases de dados educacionais online PubMed® e Cochrane® com os seguintes descritores MeSH (Medical Subheadings): Intrauterine Device AND Entrustable Professional Activites AND Internship and Residency. Nas bases de dados BVS (Biblioteca Virtual em Saúde), Scielo (Scientific Electronic Library Online) e Google Acadêmico foram utilizados os descritores DeCS (Descritores em Ciência da Saúde): Dispositivo Intrauterino AND Atividade Profissionais Confiáveis AND Internato e Residência.
Foi produzida revisão de literatura sobre como é realizado o treinamento em PRMFC para inserção de DIU na atenção primária após o levantamento de artigos nas bases de dados online. Após esse passo, foi produzida uma revisão de literatura brasileira sobre como é realizado o treinamento em PRMFC para inserção de DIU na atenção primária. Por fim, foi realizada uma revisão de literatura sobre como confeccionar uma APC para inserção de DIU, tendo como estudos balizadores o Guia Atualizado sobre Atividades Profissionais Confiáveis (CATE, 2020) e Avaliação de Competência no Internato: Atividades Profissionais Confiabilizadoras Essenciais para a Prática Médica (NEUMANN et al., 2019).
4. RESULTADOS
Não foram encontrados resultados nas bases de dados indexada online nacional e internacional sobre APC para inserção de DIU na APS para PRMFC e nem estudos para avaliar a competência da inserção de DIU por residente de MFC ou como estes são treinados. A ausência de estudos sobre APCs para inserção de DIU sugere uma lacuna sobre o tema.
A partir da verificação nas bases de dados foi realizada revisão da literatura sobre confecção de uma APC para inserção de DIU na APS para PRMFC.Recomenda-se que as APCs sejam elaboradas a nível nacional (ROMÃO, 2023). Atualmente os profissionais a serem capacitados para inserção de DIU devem possuir conhecimento sobre anatomia pélvica feminina e receber treinamento teórico e prático (LOPES; GALVÃO; GUEDES, 2022). As APCs são atividades que mobilizam uma série de competências (ROMÃO, 2023), sendo este termo frequentemente usado para descrever a impressão sobre conhecimento, habilidade e atitude de um prestador de cuidados de saúde (GOMES; RUA, 2019b) (CATE, 2020). Alguns domínios de competência integram a execução de uma APC, dentre eles, especialista ou expertise médica, comunicação, colaboração, acadêmico, liderança, advogado e profissionalismo (CATE, 2020).
Uma APC necessita de oito seções, dentre elas: título, especificações e limitações, riscos potenciais em caso de falha, ligação com uma escala de competência prevalente, conhecimento, habilidade, atitudes e experiência, fonte de informação que subsidiem as decisões de atribuição, nível de supervisão esperado para esta APC neste programa educacional e opcionalmente um prazo de validade pode ser adicionado (CATE, 2020).
Sugere-se, a fim de confeccionar uma APC para inserção de DIU para PRMFC, o domínio das competências mais relevantes: expertise médica, cuidado com a pessoa, comunicação, desenvolvimento pessoal e profissional (NEUMANN et al., 2019).
Sobre a expertise médica e o cuidado com a pessoa, a observação de habilidades básicas para procedimentos, o uso de precaução universal e técnica asséptica, as indicações e contraindicações do DIU, potenciais riscos e complicações e abordagem das complicações seriam indicativos de confiabilidade (NEUMANN et al., 2019). Ainda nesse item, a escuta atenta do paciente e familiares, expressando cuidado, preocupação e empatia, se mantém tom respeitoso e raramente usa jargões médicos, se verifica o entendimento do paciente e da família, se reconhece que a circunstância do paciente é variável, se envolve o paciente e a família em decisões compartilhadas (NEUMANN et al., 2019). Ainda sobre a técnica, a perfuração uterina é a complicação mais grave delas (TEIXEIRA et al., 2019) e a Doença Inflamatória Pélvica (DIP) ligada à inserção de DIU não é frequente. Entretanto, ressalta-se a importância do exame clínico prévio (FERNANDES et al., 2021).
Na comunicação, a observância do registro médico, oportuno e legível, se a documentação está completa e disponível para que outros o analisem, se manuscrita de forma legível, evitando se o uso de abreviaturas, com data, hora e assinatura. Além do mais, na comunicação interpessoal, se o profissional prevê, interpreta e reage às emoções em tempo real com comportamento apropriado e profissional, incluindo aquelas que despertam fortes emoções e se usa essas habilidades para ganhar e manter alianças com os outros (NEUMANN et al., 2019). Desde a década 1980, pesquisas apontam à baixa qualidade de registros em saúde no Brasil, mesmo após o surgimento dos prontuários eletrônicos (ALVES; SZPILMAN; POTON, 2015) e em média 70% dos motivos de abertura de processo contra médicos deve-se a conflito de comunicação entre estes e os pacientes (DOHMS, 2018).
A avaliação do profissionalismo médico na formação de especialistas é incipiente (FEITOSA et al., 2020). Ao confiabilizar um profissional de MFC espera-se que este demonstre compromisso com os princípios éticos relativos à prestação ou à suspensão de cuidados, com a confidencialidade, com o consentimento informado, incluindo a conformidade com as leis, com as políticas e com as regulamentações relevantes (NEUMANN et al., 2019). Ferramentas como o Professionalism Mini-Evaluation Exercise (P-MEX) podem ser utilizadas para essa função (HOLDEFER et al., 2021). De acordo com o Conselho Nacional de Justiça, a cada hora, três novas ações são ajuizadas contra médicos em um cenário de aumento do número de demandas judiciais por erro médico e má prática no Brasil (HOLDEFER et al., 2021).
Por fim, sugere-se no que tange ao desenvolvimento pessoal e profissional, avaliar se o profissional demonstra autoconfiança, deixando à vontade pacientes, familiares e membros da equipe de saúde. Também ter consciência sobre quando se está confiante com base no conhecimento e nas habilidades e quando expressar a incerteza com situações e diagnósticos (NEUMANN et al., 2019). O Colégio Real de Médicos e Cirurgiões do Canadá reconheceram a importância da autoavaliação para manutenção dos programas de ensino daquele país (SULLIVAN; TROMP, 2012a, 2012b). Reconhecer potenciais preocupações relacionadas com a baixa confiança ou uma necessidade percebida de maior supervisão pode ajudar a reduzir a ansiedade e melhorar o bem-estar dos residentes (SMITH; CRAIG; YOST, 2018).
5. DISCUSSÃO
O conceito de APCs foi introduzido em 2005 por Ten Cate (GOMES; RUA, 2019b), mas somente em 2021 no Brasil, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) definiu e elaborou 21 APCs para residência nesta especialidade (ROMÃO, 2023). Não foram encontrados na literatura APC para PRMFC, talvez pela atualidade do tema.
O PRMFC de Fortaleza (Ceará) em 2018 realizou revisão da literatura sobre CBC com o intuito de subsidiar a elaboração de sua matriz de competência e servir de ferramenta para outros programas de residência (COSTA et al., 2018a). Nesse modelo de currículo os residentes seriam avaliados de acordo com sua performance ao longo do curso e passariam por diferentes APCs até atingirem um grau de atividade profissional sem a necessidade de supervisão (COSTA et al., 2018a).
Estudos para avaliar a competência da inserção de DIU por residentes de MFC ou como estes são treinados não foram encontrados. Entretanto, Lopes, Galvão e Guedes (2022) propuseram o desenvolvimento de uma ferramenta para esta finalidade dos enfermeiros.
A capacitação dos profissionais para inserção de DIU é realizada utilizando-se modelos de treinamento (RODRIGUES et al., 2019b), vídeos e palestras (HIRSCH et al., 2021).
De acordo com Garcia-Rodriguez e Donnon (2016), a utilização de vídeo educacional associado a modelo anatômico pélvico e a presença do preceptor para instruir e avaliar o desempenho da inserção de DIU dos residentes em MFC, tem como vantagens fornecer treinamento processual, seriam reprodutíveis facilmente em qualquer horário de diferentes ambientes de ensino, além de possibilitar a realização de feedback mais objetivos aos residentes.
A existência do Manual Técnico, Guias e Procedimentos Operacionais Padrões (POPs) tem como finalidade produzir conteúdo teórico (BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018) para qualificar os profissionais de saúde na inserção de DIU. Entretanto, questiona-se se tais publicações seriam os melhores modelos educativos para o PRMFC.
De acordo com Neumann e colaboradores (2019), a intenção óbvia de Ten Cate ao propor as Entrustable Professional Activities (EPAs) foi referir-se às atividades profissionais que se prestavam ao processo de confiabilização do estudante de medicina. Essa percepção foi fortemente validada pelas dezenas de publicações acerca das EPAs que surgiram desde então, sempre destacando o caráter de processo longitudinal e complexo das relações de ensino aprendizagem que levam à confiabilização do estudante para assumir a responsabilidade pelas tais atividades profissionais.
Ao adaptar o termo EPA para a língua portuguesa, na qual só temos a palavra confiar para significar tanto ter confiança em alguém ou algo (trust), como entregar a responsabilidade de algo a alguém com confiança (entrust), fica-se com um impasse linguístico. Tanto trustable como entrustable acabariam traduzidos como confiáveis. Entretanto, é claro que nós, falantes do português, só entendemos confiável como digno de confiança (NEUMANN et al., 2019).
Segundo Neumann e colaboradores (2019), diante desse dilema, surgiu o termo confiabilizar – forjado por necessidade, em função dessa lacuna de um significado vernáculo correspondente. Entende-se que tais atividades evidentemente não são confiáveis; isso não faz sentido em português, já que, na nossa língua, confiável é aquilo ou aquele em quem confiamos. Em contrapartida, se são passíveis de delegação, o ato de consigná-las não garante que o “credor-fiduciário” – o aluno – seja efetivamente digno de confiança. Agora, dizer que são “atividades confiabilizadoras”, como neologismo necessário pela situação, endereça à ideia de que teriam servido de base a um cuidadoso processo de capacitação e que as passamos com confiança de que o “credor-fiduciário” as desempenhará com competência, sem supervisão direta.
Sendo assim, o termo “Atividades Profissionais Confiabilizadoras” é uma boa sugestão para caracterizar o sentido apropriado de entrustable professional activities. O termo em português respeita a demarcação conceitual de todo um conjunto de variáveis do cenário comunicativo e do quadro epistemológico envolvido e faz toda a diferença na compreensão e aplicação desse conceito na educação médica (NEUMANN et al., 2019).
Apesar da inserção de DIU apresentar baixas taxas de complicações (FRANÇA, 2021), algumas são possíveis, sendo elas: perfuração uterina, hemorragias, dor, aborto séptico, gravidez ectópica e migração (CORTEZ et al., 2016).
Embora a confecção de uma APC não tenha objetivo educacional (CATE, 2020), elas são elementos facilitadores, que auxiliam na objetivação do aprendizado e avaliação de competência (ROMÃO, 2023), podendo ser utilizada para esse propósito (PEDROLLO, 2021).
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não obstante as Atividades Profissionais Confiabilizadoras serem um tema de importância crucial no ambiente formativo dos PRMFC, há escassez de publicações no Brasil. Carecem de estudos sobre como se ensina e se desenvolve a competência do residente de MFC para inserção de DIU.
Este trabalho se propôs a debater o que é necessário para aquisição das competências, habilidades e atitudes do residente do PRMFC, utilizando uma APC. Esta APC pode contribuir de forma vultuosa para a profissionalização do especialista, diminuir as complicações relacionadas ao procedimento, além de aumentar o acesso ao sistema de saúde, empoderar as mulheres nas suas escolhas, colocando-as no centro do seu próprio cuidado.
REFERÊNCIAS
ALVES, M. A.; SZPILMAN, A. R. M.; POTON, W. L. Avaliação do registro médico nos prontuários de um ambulatório de ensino, Vila Velha, ES. Revista Brasileira de Pesquisa em Saúde/Brazilian Journal of Health Research, v. 17, n. 3, p. 69–77, 2015.
BONNIE, L. H. A. et al. Trainers’ and trainees’ expectations of entrustable professional activities (EPAs) in a primary care training programme. Education for Primary Care, v. 30, n. 1, p. 13–21, 2019.
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. MANUAL TÉCNICO PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE – DIU COM COBRE T Cu 380 A. Brasília Ministério da Saúde, , 2018.
CATE, O. TEN. Guia atualizado sobre Atividades Profissionais Confiáveis (APCs). Revista Brasileira de Educação Médica, v. 43, p. 712–720, 2020.
CORTEZ, J. et al. Cálculo Vesical por Dispositivo Intrauterino. CEP, v. 99170, p. 000, 2016.
COSTA, L. B. et al. Competências e Atividades Profissionais Confiáveis: novos paradigmas na elaboração de uma Matriz Curricular para Residência em Medicina de Família e Comunidade. 2018a.
COSTA, L. B. et al. Competências e Atividades Profissionais Confiáveis: novos paradigmas na elaboração de uma Matriz Curricular para Residência em Medicina de Família e Comunidade. 2018b.
DA SILVA BARRETO, D. et al. Dispositivo Intrauterino na Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, v. 16, n. 43, p. 2821, 2021a.
DA SILVA BARRETO, D. et al. Dispositivo Intrauterino na Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, v. 16, n. 43, p. 2821, 2021b.
DA SILVA BARRETO, D. et al. Dificuldade relatada na inserção do dispositivo intrauterino na Atenção Primária à Saúde. Revista de APS, v. 25, n. 1, 2022.
DOHMS, M. C. Videogravação de consulta como instrumento docente para ensino da comunicação clínica na atenção primária à saúde. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2018.
FEITOSA, E. S. et al. Profissionalismo na formação do especialista médico: revisão integrativa da literatura. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 43, p. 692–699, 2020.
FERNANDES, B. T. et al. Dispositivo intrauterino e doença inflamatória pélvica: uma real associação? Revista Interdisciplinar de Saúde e Educação, v. 2, n. 2, 2021.
FRANÇA, N. D. D. E. Avaliação da experiência da implementação do dispositivo intrauterino no pós parto imediato na maternidade do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW). 2021.
FRANCISCHETTI, I.; HOLZHAUSEN, Y.; PETERS, H. O tempo do Brasil traduz para a prática o currículo Médico Baseado em Competência por meio de Atividades Profissionais Confiáveis (APCs). Interface-Comunicação, Saúde, Educação, v. 24, 2020.
GOMES, M. D.; RUA, M. As Atividades Profissionais Confiáveis como parte da Avaliação de Competências em Prática Clínica: uma revisão integrativa da literatura The Entrustable Professional Activities as part of Competency Assessment in Clinical Practice: an integrative literature review. Indagatio Didactica, v. 11, n. 4, p. 153–168, 2019a.
GOMES, M. D.; RUA, M. As Atividades Profissionais Confiáveis como parte da Avaliação de Competências em Prática Clínica: uma revisão integrativa da literatura The Entrustable Professional Activities as part of Competency Assessment in Clinical Practice: an integrative literature review. Indagatio Didactica, v. 11, n. 4, p. 153–168, 2019b.
HIRSCH, H. et al. Using Video Modules and Simulation Learning to Improve IUD Counseling Among Internal Medicine Residents—a Randomized Controlled Educational Trial. Journal of general internal medicine, v. 36, p. 1446–1447, 2021.
HOLDEFER, M. M. DE L. et al. Tradução e adaptação transcultural do instrumento de avaliação do profissionalismo P-MEX para uso em médicos residentes. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 45, 2021.
LOPES, R. R. DE S.; GALVÃO, E. L.; GUEDES, H. M. Desenvolvimento e validação de uma ferramenta para avaliação por competência da inserção do dispositivo intrauterino. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, v. 22, p. 283–295, 2022.
NEUMANN, C. R. et al. Avaliação de competências no internato: atividades profissionais confiabilizadoras essenciais para a prática médica. 2019.
PEDROLLO, D. F. Implantação de atividades profissionais confiabilizadoras (EPAs) no ensino baseado em competências em medicina de emergência em um hospital universitário. 2021.
RODRIGUES, B. D. et al. Modelo de Treinamento para Inserção de Dispositivos Intrauterinos. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 43, p. 47–53, 2019a.
RODRIGUES, B. D. et al. Modelo de Treinamento para Inserção de Dispositivos Intrauterinos. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 43, p. 47–53, 2019b.
RODRIGUES, B. D. et al. Modelo de Treinamento para Inserção de Dispositivos Intrauterinos. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 43, p. 47–53, 2019c.
ROMÃO, G. S. Entrustment Professional Activites (EPAs). UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. DIRETORIA DE TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO. Curso de Formação de Preceptores da Educação em Saúde – FORPRES – O Eu preceptor no contexto da educação em saúde São Luís, 2023.
SBMFC. Matriz de Competências de MFC é publicada pelo MEC. https://www.sbmfc.org.br/noticias/matriz-de-competencias-de-mfc/, 8 ago. 2019.
SMITH, H. L.; CRAIG, S. R.; YOST, W. J. Examination of entering residents’ self-reported confidence and supervision needs performing AAMC entrustable professional activities. Journal of Graduate Medical EducationThe Accreditation Council for Graduate Medical Education, , 2018.
SULLIVAN, M.; TROMP, M. Measuring learning and learning about self-assessment and competence. Canadian Journal of Anesthesia, v. 59, n. 10, p. 928, 2012a.
SULLIVAN, M.; TROMP, M. Measuring learning and learning about self-assessment and competence. Canadian Journal of Anesthesia, v. 59, n. 10, p. 928, 2012b.
TEIXEIRA, J. P. C. R. et al. Paciente com perfuração uterina assintomática após inserção de Dispositivo Intrauterino–Relato de Caso e Revisão de Literatura. Revista de Medicina e Saúde de Brasília, v. 8, n. 1, 2019.
1Especialista em Medicina de Família e Comunidade
Sociedade Brasileira de Medicina e Comunidade Endereço: Brasilia, DF, Brasil e-mail: dbsouzajr@gmail.com
2Residência de Medicina de Família e Comunidade
Secretaria Municipal de Saúde de Governador Valadares
Endereço: Governador Valadares, MG, Brasil E-mail: laurinhavargas13@gmail.com